Solução para demanda

Juizado é o modelo e formalismo a ameaça a evitar

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7 de setembro de 2009, 7h12

Se há um modelo a ser seguido para se buscar a rapidez da Justiça comum, já temos: o dos Juizados Especiais Cíveis, com poucos recursos, simplicidade, rito concentrado, informalidade, muita informatização. A constatação é do juiz Eduardo Oberg, titular da 5ª Vara de Fazenda Pública do Rio de Janeiro.

Além de dar aula na PUC do Rio sobre o tema, Oberg falou à revista Consultor Jurídico da experiência que teve à frente do IV Juizado Especial Cível, no Catete, cartório movimentado na Zona Sul da cidade do Rio. Para ele, juiz de Juizado é um administrador: sem gestão, não há como dar conta da demanda de massa.

Como a estrutura não aumenta na mesma proporção do número de processos, afirmou, é preciso criatividade para fazer frente à situação. Ele conta que com a explosão da demanda um dos pontos que ajudou os juizados foi a figura do juiz leigo, iniciativa do ex-presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, desembargador Sérgio Cavalieri Filho. O juiz leigo está previsto em lei. Como não havia juiz togado suficiente, o juiz leigo passou a ajudar. Com isso, aumentou o número de audiências e foi possível manter a pauta de julgamentos.

Um prazo razoável e que é possível atingir para a solução de um caso no Juizado, entende, é de 60 dias. Atualmente não tem como alcançar, já que a demanda explodiu e não houve um aumento na estrutura física. “Teria de dobrar o número de funcionários, juizados, juízes togados e leigos. Chegamos em uma encruzilhada. A solução é ter inventividade para procurar mecanismos com a estrutura que se tem e uma demanda grande, dar conta do recado”, disse.

Autor do livro Os Juizados Especiais Cíveis e a Lei 9.099/95 – Doutrina e Jurisprudência do STF, STJ e dos Juizados Cíveis, o juiz conta que na época em que era titular no Juizado do Catete, eram emitidos cerca de 1.200 Avisos de Recebimento por mês. “Metade era para a Telemar, que fica em Botafogo. O AR saía do Catete [bairro vizinho a Botafogo], ia para o malote do Fórum Central, depois para os Correios na Presidente Vargas para ser entregue em Botafogo”, explicou. Ele conta que havia todos os dias um preposto da Telemar que ficava no Juizado. O juiz resolveu chamar o diretor da Telemar e disse que não emitiria mais AR de citação e intimação para a empresa, devendo o preposto pegar os documentos três vezes por semana. “Além de economia de dinheiro para o tribunal, tirei três funcionários que trabalhavam na emissão de AR e coloquei no cartório e garanti a certeza de audiência, porque sabia que o AR tinha chegado, com uma medida de custo zero.”

O juiz também contou quando resolveu fazer uma espécie de pautão para resolver questões de reajuste de plano de saúde. Entraram 600 ações, afirma, que foram resolvidas em 10 audiências, com 60 sentenças em um ato de audiência.

Oberg lembrou do plano de expansão da Telerj, em 1995. Segundo ele, a empresa tinha 100 mil linhas fixas para instalar. Resolveu fazer uma publicidade prometendo instalar telefones fixos em uma semana para quem adquirisse a linha nas primeiras 72 horas da promoção. “Se dissessem os 100 mil primeiros, a publicidade seria legal. Mas não delimitaram”, disse. O número de pedidos foi superior à estrutura da empresa para atender à demanda. “De repente, eram mil ações por dia.”

Ele conta que resolveram fazer guichês separados para atender a demanda especifica e julgava de 500 em 500. “Se usasse sistema clássico que se aprende na faculdade, de Justiça individual, como daria conta disso?”. Ele diz que não há lei determinando que pode ser feito isso, nem que não pode. “Não há ilegalidade nisto.”

Para ele, não há como dizer que isso afeta a qualidade. “Estou aplicando a lei corretamente, dando ao jurisdicionado a Justiça que quer, rápida, com economia processual, de maneira informal”, disse.

Ele explica que nas Turmas Recursais os recursos são julgados em lote, separando por temas. Existem casos isolados que não têm parâmetro, afirma, mas grande parte deles é sobre o mesmo tema, em que se aplica Código de Defesa do Consumidor.

Ele conta que já se deparou com um caso em que um idoso entrou com ação contra um vizinho, acusando-o de fazer bagunça. O vizinho, por sua vez, entrou com ação contra o idoso porque este ficava batendo a vassoura no teto. “Esse caso não é para Juizado. É uma causa de maior complexidade. Resolvi extinguir o processo para que fosse resolvido na Justiça Comum; fazer perícia e dilação probatória. Não tenho condições de em um juízo de mero conhecimento na audiência saber quem tem razão ou não”, afirmou.

Oberg constata que a realidade dos Juizados é diferente nos grandes centros e em cidades menores. Ele afirma que as pessoas já descobriram os juizados no interior. Entretanto, diz, não funcionam como Juizados. “São apensos da Justiça comum”, afirma. Segundo ele, fora dos grandes centros, os juizados estão “impregnados” de formalismos do Código de Processo Civil. “É exatamente o que não queremos fazer.” Ele diz que um dos requisitos que exige para dar aula na PUC sobre Juizado é não ter teoria Geral do Processo Civil. “Não quero que meu aluno esteja impregnado pela teoria geral do processo”, diz.

Mais acionadas
Questionado sobre o papel do juiz diante das inúmeras ações contra prestadores de serviços que, mesmo punidos, continuam com a mesma conduta, Oberg diz que não é o Judiciário que tem de punir as empresas. A punição mais rigorosa em um caso concreto levado à Justiça, diz, deve ser aplicada quando há necessidade de punir com mais rigor.

O juiz explica que o dano moral punitivo pedagógico foi vetado pelo Congresso e é uma construção jurisprudencial. Como não há parâmetro sobre o valor, fica a cargo do julgador determinar a quantia. Oberg defende o equilíbrio. Assim, pune-se a empresa que realmente têm condutas reiteradas, mas dentro de patamar que seja aceito pelos tribunais e pelos pares. “De que adianta dar sentença para ser aplaudida e na segunda instância ser cassada?”

Para o juiz, quem tem de multar são as agências reguladoras. “Essa conta não é do Judiciário. Quem vai estabelecer que a concessionária não está cumprindo seu contrato e merece ser punida é a agência reguladora”, disse.

Ele disse que o Ministério Público também pode agir, através de Ações Civis Públicas. O juiz cita a ação movida contra empresas administradoras de cartões de crédito que enviam os cartões sem os consumidores pedirem. No início, conta Oberg, enviava ofício para Anatel sempre que condenava uma empresa de telefonia. Segundo ele, nunca houve resposta. “Falta cultura cidadã madura para o enfrentamento dessas questões”, diz.

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