Falando ao povo

Transmissão de julgamentos do STF ensina sociedade

Autor

  • Walter Ceneviva

    é advogado e ex-professor de direito civil da PUC-SP. É autor entre muitas outras obras do livro "Direito Constitucional Brasileiro". Mantém há quase 30 anos a coluna Letras Jurídicas na Folha de S. Paulo.

5 de setembro de 2009, 12h50

Cada leitor interessado nas questões da Justiça e cada profissional da área jurídica pode e deve ter uma posição, quanto à transmissão ao vivo, pela TV, entre outras, de sessões plenárias do STF (Supremo Tribunal Federal). Sou favorável ao televisionamento.

Com as transmissões, os tribunais se abrem ao conhecimento da população, como se viu no julgamento do ex-ministro Antonio Palocci Filho. A apresentação do Procurador Geral da República, minudente e clara, antecipou os fatos do julgamento. Puderam ser compreendidos por amplos segmentos da cidadania, mesmo no envolvimento do inocente caseiro. Os advogados (Batocchio, Toron, Roriz) brilharam na sustentação da defesa.

O voto do relator, ministro Gilmar Mendes, desenvolveu ponto a ponto os elementos dos autos. Afastou a acusação contra Palocci, só a aceitando contra um dos acusados. A maioria manteve o processo apenas contra o presidente da Caixa Econômica, atribuindo-lhe o clássico papel do bode expiatório.

Quatro julgadores acompanharam Mendes, favorecendo Palocci (Ellen Gracie, Eros, Lewandovski e Peluso). Outros quatro (Carmem Lucia, Britto, Marco Aurélio e Celso) receberiam a denúncia contra os três acusados. Em minha opinião esses disseram melhor o direito, embora minoritários. Palocci teve sorte ao se livrar do processo.

O leitor poderia até perguntar porque os outros dois ministros não votaram, se o Supremo Tribunal Federal tem onze magistrados? É que dois estavam de licença (Barbosa e Menezes Direito, falecido nesta semana).

Nove intervieram no julgamento. O leitor poderia perguntar ainda se o placar estreito (cinco a quatro), com duas ausências, permite dizer que o resultado expressou a verdadeira opinião da Corte? Evidentemente não expressou toda a opinião, mas é difícil saber naquele dia, como votariam Barbosa e Direito. Expressa, contudo, o quorum regimental.

O RISTF (Regimento Interno do STF), no art. 143, exige oito ministros presentes para a votação. Logo, foi obedecido. Teria sido melhor em agosto passado, esperar a composição plena, para colocar o caso em pauta? A presença dos onze magistrados, nas questões mais controvertidas, corresponde ao ideal.

Há, porém, ocasiões em que o ideal é sacrificado sem ferir a lei. Além disso, supondo-se que naquela oportunidade apenas Joaquim Barbosa houvesse retornado e votado contra Palocci, não modificaria o resultado. Mendes, sendo presidente do STF teria, além de seu voto, o do desempate (art. 146 do RISTF).

Há mais a ponderar, quanto à popularização dos julgamentos. Nos primeiros quatro séculos do Brasil, a máxima muito repetida era: "O juiz só fala nos autos do processo".

Na segunda metade do século 20, a eletrônica e a informática mudaram o mundo. Hoje os profissionais do direito, juízes, promotores, procuradores do Estado e a classe mais numerosa e heterogênea, dos advogados, desbastam o caminho da fala direta com a sociedade.

Foi o que aconteceu no julgamento de Palocci e há de ser ampliado. Será inerente ao Estado Democrático de Direito (Constituição, artigo 1º). A comunidade, dentro de alguns anos, entenderá melhor o que há de bom e de mau no processo. Tirará conclusões. Influenciará na realização da justiça e saberá claramente quando esta faltar.

[Artigo publicado originalmente na edição de sábado, 5/9, do jornal Folha de S.Paulo.]

Autores

  • Brave

    é advogado e ex-professor de direito civil da PUC-SP. É autor, entre muitas outras obras, do livro "Direito Constitucional Brasileiro". Mantém há quase 30 anos a coluna Letras Jurídicas, na Folha de S. Paulo.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!