Regulamentação da rede

Reforma de campanha pela internet censura eleitor

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4 de setembro de 2009, 12h17

Após a publicação da minirreforma que tratou de uma mudança de regras sobre a propaganda eleitoral na internet, é necessário firmar o entendimento sobre alguns equívocos ou medidas de efeito duvidoso.

A maior crítica ao legislador brasileiro corresponde à tentativa de equiparar a regulamentação da propaganda eleitoral na internet com as mídias tradicionais (TV, Rádio, Jornais e Revistas). A internet não deveria ter este tratamento, pois não é objeto de concessão estatal.

Além disso, o estágio atual da internet é caracterizado por um inegável estímulo ao eleitorado para criar e compartilhar conteúdo por twitter, blogs, youtube e redes sociais. O legislador vedou a propaganda eleitoral nesses canais de comunicação. Isso é retrocesso.

Também foi criada uma distinção conceitual entre o conteúdo publicado por blogs e os sites de notícia — estes devem ser encarados como sendo sites gerenciados pelos próprios provedores do conteúdo. Em outras palavras, a propaganda eleitoral só poderá ocorrer nos sites de notícia, sendo vedada sua divulgação pelos blogs. Segundo o legislador, essa regra deverá ser aplicável já que seria impraticável exigir direito de resposta dos blogs.

Blog deve ser encarado como forma de expressão popular. Não vejo motivos para prevalecer o entendimento de calar a divulgação de conteúdo pelos blogs para justificar uma duvidosa regra de impossibilitar a execução do direito de resposta.

Forçar a criação desta distinção conceitual entre canal de notícias e blogs para controlar a divulgação de conteúdo não tem um resultado prático perceptível. Está prevalecendo o interesse do legislador de entender que a internet deve ser regulamentada, modelando a conduta dos cidadãos, como se a rede fosse um novo canal da mídia tradicional (TV, rádio, jornal), cuja circulação das notícias se dá sem interatividade.

Impor o entendimento de que o Tribunal Superior Eleitoral poderá exercer um eficaz controle da internet da mesma maneira como se opera na mídia tradicional é um erro que demonstra a distância que os nossos legisladores estão da realidade de como funciona a interatividade na grande rede atualmente.

Hoje, cada cidadão é um canal de mídia por meio de blogs, youtube, twitter e redes sociais. Mas o legislador brasileiro não quer que este poder de liberdade de expressão instantânea seja tratado dessa forma ampla. Por esse motivo, veda a propaganda eleitoral na mídia originada pelo eleitorado. Um grave equívoco.

Os próprio sites noticiosos estão se tornando cada vez mais interativos, onde o conteúdo é gerado simultaneamente pelo próprio eleitorado, pelo inegável apelo de instantaneidade, fidelidade e divulgação que as mídias digitais proporcionam. 

A medida pretendida não tem efeito prático. Consideremos o exemplo de um brasileiro que mora na Inglaterra, tem um blog, e resolve publicar uma propaganda eleitoral de um determinado candidato. O controle do TSE sobre esta conduta estará vulnerável. É inegável que os usuários da internet sejam estimulados a gerar e compartilhar conteúdo, que podem estar hospedados no exterior e, por esse motivo, o controle da soberania do Estado brasileiro será limitado.

A ineficácia desta medida também acontecerá nos casos em que o blogueiro optar por modificar o layout de seu site e torná-lo um canal de notícias, nos termos da regulamentação. Será que a vedação proposta para a divulgação da propaganda eleitoral seria aplicada ?

Outro ponto que merece registro é o fato de que não houve uma regulamentação detalhada sobre como será possível criar e gerenciar um cadastro de e-mails para divulgação de ações de marketing direto durante a campanha. Nessa regulamentação, não houve menção expressa sobre como o eleitor possa denunciar qualquer prática do recebimento de mensagens sem sua autorização por meio de divulgação de marketing praticado pelo candidato.

Se não há definição expressa sobre o procedimento a ser adotado, a eficácia da medida é restrita. A maneira mais eficiente seria fazer com que houvesse garantia aos eleitores de que as mensagens lhes seriam enviadas somente em decorrência da manifestação de sua vontade própria em aderir ao recebimento. Dessa forma caberá ao candidato ter competência para alavancar simpatia, audiência e tráfego em seu site, de onde deverá ser gerado este cadastro.

Foi instituída também vedação de eficácia duvidosa para proibir os sites de notícia de divulgar sites de candidatos, mesmo com caráter meramente informativo. Talvez a justificativa seja evitar que um candidato que seja dono de um canal de mídia possa agir de forma disfarçada para divulgar determinada candidatura. Medidas dessa natureza, como a vedação ao eleitor de criar referências em seu blog quanto a propaganda eleitoral, só servem para afastar o eleitor do candidato.

Foi incoerente a opção do legislador pela vedação da divulgação da propaganda eleitoral vinculada aos conteúdos digitais gerados pelo eleitor, sob alegação de que essa medida poderia favorecer prioritariamente aos políticos que são proprietários dos canais de mídia. Atualmente, na internet, cada eleitor é um canal de mídia próprio e este direito não pode ser censurado pelo legislador brasileiro.

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    é advogado, sócio do escritório Aristoteles Atheniense Advogados, presidente da Comissão de Tecnologia da Informação do Conselho Federal da OAB, coordenador e professor do Curso de Pós-Graduação de Direito de Informática da Escola Superior de Advocacia da OAB/SP

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