LIVRO ABERTO

A biblioteca básica de Paulo de Barros Carvalho

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21 de outubro de 2009, 7h00

Spacca
Paulo de Barros Carvalho - Spacca

Alicerçar as ideias sobre Direito, para o professor e advogado Paulo de Barros Carvalho, é dedicar tempo ao estudo da Comunicação. A explicação dada por um dos mais admirados tributaristas do país está na natureza do processo de criação das leis. “O Direito e as leis são um processo comunicacional, composto por emissores e receptores. A comunicação sem ruídos é fator de segurança para sociedade e para o Estado”. Ver o Direito como fenômeno comunicacional, segundo ele, permite analisar o assunto de forma científica.

É sob essa perspectiva que Barros Carvalho, um dos pensadores do Direito Tributário mais citados em petições e decisões na Justiça, encara a leitura, que faz aleatoriamente nos pequenos intervalos durante a semana. Sobre a mesa, o livro Manual de Semiótica, do professor italiano Ugo Volli, comprova o interesse.

Fora da mesa, o acervo é um pouco maior. Barros Carvalho já conta 12 mil exemplares em sua biblioteca, a maioria sobre Direito e Filosofia, tanto do Direito quanto Geral. “Também leio muito sobre Teoria Geral do Direito, assim como sobre Direito Constitucional, Administrativo e Civil”, diz.

Conseguir tempo para ler um livro por mero prazer, no entanto, é praticamente um milagre. O advogado, parecerista e professor só encontra uma folga quando vai ao médico ou ao dentista. “Se tenho que esperar 20 minutos ou meia-hora para ser atendido, não fico bravo. Aproveito para ler”, diz. Não é para menos. Além de atender a clientes de seu escritório com ações e pareceres, o professor dá aulas nas Faculdades de Direito da Universidade de São Paulo e na Pontifícia Universidade Católica, no Instituto Brasileiro de Direito Tributário e no grupo de estudos de Teoria Geral do Direito Tributário que coordena pela editora Noeses — também dirigida por ele. Além disso, é diretor da Revista de Estudos Tributários e da Revista de Direito Tributário.

Uma visita quinzenal à sua fazenda em Botucatu (SP) completa a agenda. Lá, o professor se dedica a outro prazer: a criação de cavalos de competição. Seu garanhão, um “quarto-de-milha”, já foi vice-campeão brasileiro na categoria Laço de Bezerro, que avalia o cavalo em atividades práticas no trabalho rural. Na fazenda de 600 alqueires, o professor cria também gado de corte e frangos. “As duas granjas já contam com 33 mil pintos”, orgulha-se.

Filho de pai pernambucano, o tributarista é aficcionado pelo Rei do Cangaço, Virgulino Ferreira da Silva. “Lampião é o personagem brasileiro sobre quem mais se escreveu”, garante. Da estante atrás de sua cadeira, Barros Carvalho puxa rápido e certeiro a re-edição de 1998 de Lampeão, sua História, de Erico de Almeida, primeiro biógrafo do cangaceiro. A versão original foi publicada em 1926. “Tenho quase tudo o que já foi escrito a respeito. O cangaço é um fenômeno histórico e sociológico”, explica. “Era uma sociedade paralela, peculiar pelo modo de vestir, de falar, e pelo código moral a que se submetia”. A coleção, para o tributarista, é preciosa. “Os livros que saem sobre Lampião e o cangaço esgotam rapidamente”.

O interesse também é dividido com a religião. Católico praticante, o professor é assíduo leitor de obras doutrinárias. “Li quase tudo que se escreveu sobre Santa Teresinha do Menino Jesus”, conta. A devoção pela santa levou o professor a visitar por seis vezes a cidade onde ela morreu, Lisieux, na França.

Zeloso de seu acervo, Paulo de Barros Carvalho tem exemplares que afirma não poderem faltar em qualquer biblioteca. Os eleitos são Filosofia do Direito, do jurista Miguel Reale, os Escritos Jurídicos e Filosóficos, do jusfilósofo Lourival Vilanova, e os tratados do professor Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado e Tratado da Ação Rescisória.

Como não poderia deixar de ser, o próximo título que o professor irá devorar trata de Filosofia aplicada à interpretação das leis. Pensamento e Movimento, do filósofo do Direito português J. Pinharanda Gomes, é fruto da Filosofia portuguesa no Direito.


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Edgar Rice Burroughs - Tarzan, o Filho das Selvas - ReproduçãoPrimeiro livro
As noites na infância já eram filosóficas, passadas ao lado de O Pequeno Príncipe, do jornalista e piloto de aviação francês Antoine de Saint-Exupéry. “Meu pai punha sempre na cabeceira da minha cama. Foi o primeiro livro que li sistematicamente, indo e voltando”, lembra o professor. Apesar de ser uma obra basicamente infantil, o livro trata de temas filosóficos de maneira poética e enigmática, despertando a imaginação.

Mas o grito que chamou Barros Carvalho ao gosto pela leitura veio das selvas. Tarzan, o homem-macaco, foi o personagem que fez o professor devorar a sequência de livros escrita a partir de 1912 pelo jornalista e escritor norte-americano Edgar Rice Burroughs. “Foi criado por uma macaca, conversava com os bichos, era um herói”, diz o professor, relembrando o interesse juvenil pela aventura. O primeiro título da série foi Tarzan of the Apes (foto), publicado no Brasil como Tarzan, o Filho das Selvas. No Brasil, os livros só chegaram em 1933, com traduções feitas por Monteiro Lobato e Manuel Bandeira.

Quando o prazer por ler amadureceu, Barros Carvalho passou a se dedicar aos romances de Machado de Assis e Eça de Queiroz. “De vez em quando ainda releio Memórias Póstumas de Brás Cubas”, conta. “É realismo na veia”, diz sobre o clássico do escritor brasileiro. Do português, os que mais gostou foram O Crime do Padre Amaro e Os Maias.


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Tratado de Direito Penal - José Frederico Marques - ReproduçãoLivros didáticos
O Direito deve agradecer ao professor de Direito Penal José Frederico Marques pela adesão de Barros Carvalho à profissão. Foi folheando o livro Tratado de Direito Penal, escrito por Marques, que o tributarista teve a curiosidade despertada. “Foi o primeiro contato. Eu abri o livro, li alguma coisa, mas não entendi. Mesmo assim, me interessei pelo Direito”, diz. “Acabei sendo aluno dele na PUC”.

Outra obra que introduziu o advogado na carreira foi A Cidade Antiga, do historiador Fustel de Coulanges. O livro, lido logo no primeiro ano de faculdade, é um estudo profundo da formação cultural e do Estado na civilização greco-romana. “Um advogado amigo da família me disse que eu entenderia melhor o Direito Romano depois que o lesse”, conta.

No Direito Tributário, foi com Uma Introdução à Ciência das Finanças, do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal e professor Aliomar Baleeiro, que o tributarista debutou nas obras sobre o assunto.


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Teoria Geral do Direito Tributário, do jurista e poeta gaúcho Alfredo Augusto Becker - ReproduçãoLivros jurídicos
Dentro do assunto que mais gosta, o Direito Tributário, Barros Carvalho elenca de bate-pronto as obras que mais impressionaram. Teoria Geral do Direito Tributário, do jurista e poeta gaúcho Alfredo Augusto Becker, é o primeiro da lista. O livro mostra ao leitor a cobrança de impostos sob o aspecto da Teoria Geral e da Filosofia do Direito, provocando uma avaliação sobre o poder do Estado por meio da tributação.

“Hipótese de Incidência Tributária, do professor Geraldo Ataliba, me introduziu no mundo jurídico do Direito Tributário. Fui seu discípulo assíduo”, conta. A influência no assunto também vem de outro professor, Rubens Gomes de Sousa, com Compêndio de Legislação Tributária. “Ele criou o atual Sistema Tributário Brasileiro do nada, foi o principal coautor do projeto, e o sistematizador do Direito Tributário no país”.


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Gerardo Mello Mourão, A Invenção do Mar - ReproduçãoLiteratura
Fora do Direito, a admiração de Barros Carvalho se derrama sobre a poesia do escritor, poeta e jornalista cearense Gerardo Mello Mourão, morto em 2007. O livro mais popular de Mourão foi A Invenção do Mar, poema épico ganhador do Prêmio Jabuti em 1999, escrito em comemoração aos 500 anos do descobrimento. Além disso, “ele era considerado um dos maiores entendedores da língua grega no mundo”, diz.

O professor lê com frequência obras sobre temas religiosos. Glórias de Maria, do advogado Affonso Maria de Liguori, é o preferido. A biografia do apóstolo Paulo, intitulada São Paulo pelo advogado português Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos, é um “livro lindo”, segundo o professor. Vasconcelos assina a obra de 1934 com o pseudônimo Teixeira de Pascoais. “É muito bem escrito, feito com paixão. Um livro raro, só se encontra em sebos, e com muita sorte”, afirma. Confissões, do bispo e teólogo Aurélio Agostinho, o Santo Agostinho, foi lido pelo menos três vezes. “Leio anotando”.


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Escritos Jurídicos e Filosóficos, do jusfilósofo Lourival Vilanova - ReproduçãoLi e recomendo
Incumbido de juntar os escritos do jusfilósofo e professor pernambucano Lourival Vilanova após sua morte, em 2001, Barros Carvalho afirma encantar-se com a obra. “Li toda a obra dele e releio sem parar. É um dos pensamentos mais lúcidos da jusfilosofia brasileira”, diz. O tributarista reuniu a maior parte dos escritos em um compêndio de dois volumes chamado Escritos Jurídicos e Filosóficos, publicado em 2003. “É o maior filósofo das Américas”. 

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