Escritório de advocacia

OAB pede inviolabilidade de departamento jurídico

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31 de março de 2009, 20h54

O presidente da OAB de São Paulo, Luiz Flávio Borges D’Urso, quer que o Conselho Nacional de Justiça se manifeste sobre a inviolabilidade dos departamentos jurídicos das empresas. A entidade entende que os departamentos jurídicos estão equiparados aos escritórios de advocacia.

Nesta terça-feira (31/3), D´Urso entregou ao presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ, ministro Gilmar Mendes, uma Carta Aberta, pedindo manifestação do conselho. “Esperamos que o ministro acate nosso pedido para que o CNJ se manifeste sobre o tema, a pacificar a matéria, prevista em lei, isto é, o departamento jurídico se equipara aos escritórios de advocacia em todos os pontos”, afirmou D´Urso.

Gilmar Mendes disse que a questão é concreta e terá de ser examinada. “Existe lei que define as prerrogativas profissionais dos advogados, que não existe no sentido de proteger exclusivamente os advogados. É preciso que estejamos atentos em relação a isso, pois o que se quer proteger é o sagrado direito de defesa, o contraditório. À medida que se ameace as prerrogativas dos advogados, se coloca em xeque o direito de defesa”, afirmou.

O juiz da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, Fausto De Sanctis, negou o pedido da Comissão de Prerrogativas da OAB-SP para que não fossem cumpridos mandados de busca e apreensão nas salas dos advogados da empreiteira Camargo Corrêa, acusada de crime financeiro. A OAB sustenta que os mandados só poderiam ter sido expedidos se houvesse indício de que os advogados estavam envolvidos no crime. Para o presidente da OAB-SP, a lei é clara e não estabelece desigualdades.

“Certamente, departamentos jurídicos não guardam provas sobre recursos doados a partidos políticos. A advocacia é uma das funções do Estado, é séria e se os magistrados consideram que há provas criminais em departamentos jurídicos, devem colocar isso no papel, sob pena de que decisões judiciais percam legitimidade e se coloque o Estado de Direito em risco”, afirma o presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB-SP, Sergei Cobra Arbex. D´Urso disse que vai recorrer da decisão do juiz.

Para o juiz De Sanctis, impedir busca e apreensão nas salas ocupadas por advogados poderia fazer com que os demais funcionários que se submetem às diligências policiais se sentissem em situação de inferioridade. “Em outras palavras, invocariam diferenciação injustificada de tratamento, sentimento experimentado de tratamento não igualitário, aliás, o que é sentido pelo cidadão comum quanto à alegada desigualdade de repressão penal, a consciência de que a injustiça é mais aguda e a Justiça severa para as classes mais desfavorecidas”, disse em sua decisão.

Leia a carta

Exmo. Sr.
Ministro Gilmar Mendes
D Presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça

Senhor Presidente.

A Ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo – pleiteou junto à Justiça Federal que a lei da inviolabilidade de escritórios e arquivos de advogados fosse aplicada ao Departamento Jurídico de determinada empresa, como prevê a lei federal 11.767/08, o Estatuto da Advocacia (lei 8.906/94), estando já ensejada no Art. 133, da Constituição Federal. Dessa forma, vimos solicitar a Vossa Excelência que o assunto seja analisado pelo Conselho Nacional de Justiça.

O local de trabalho do advogado, as comunicações e os arquivos relativos aos interesses dos clientes são invioláveis porque estão abrangidos pelo sigilo profissional. Ignorar tal fato, nos parece um descaso com as garantias constitucionais, um arbítrio inaceitável. Na verdade, o sigilo entre advogado e cliente, contemplado pelas prerrogativas profissionais dos advogados, previstas em lei, tem o papel de proteger direitos essenciais do cidadão, como a ampla defesa e o contraditório. Sem a garantia do sigilo profissional, o advogado não poderá exercer com liberdade e total independência seu mister.

A lei é bastante clara e não estabelece desigualdades. Na verdade, quando estipula que o local de trabalho do advogado, bem como seus instrumentos de trabalho e sua correspondência são invioláveis, está impedindo que se vá buscar nos arquivos do advogado provas contra o cliente. Assim sendo, não podemos concordar com o emprego de métodos ilícitos de coleta de provas. A garantia dessa inviolabilidade não tem caráter absoluto. A lei prevê apenas uma exceção para se permitir a busca e apreensão em escritórios e arquivos do advogado, no caso em que o próprio advogado for o investigado.

Essa inviolabilidade não é do prédio físico ou do arquivo enquanto móvel que guarneça o escritório, mas de seus conteúdos, assim nenhuma distinção deve ser feita entre os arquivos de um escritório e de um departamento jurídico.

O sigilo profissional é um dever legal do advogado que, se for violado, leva o profissional a responder ética e criminalmente.

O Supremo Tribunal Federal tem sido uma instância que vem pacificando decisões sobre as garantias das prerrogativas profissionais dos advogados. Assim foi com a Súmula Vinculante 14, que assegura aos advogados acesso aos inquéritos policiais, mesmo que estejam sob sigilo, pois de outra forma não teriam como assegurar o direito de defesa aos cidadãos.

Por isso, consideramos fundamental que o CNJ avalie essa questão para que o Departamento Jurídico de uma empresa, exemplo de  um escritório de advocacia autônomo – os quais guardam documentos confidenciais relativos ao exercício profissional – sejam equiparados e sua violação, constitua quebra de premissa constitucional. A advocacia não busca imunidade penal para acobertar práticas delituosas, mas exige o cumprimento da Constituição Federal e dos preceitos fundamentais. O advogado é o guardião dos documentos do cliente e não se admite que se vasculhe seus arquivos com o intuito de incriminar tais clientes.

Assim como denunciamos violações às prerrogativas profissionais dos advogados em 2005, quando escritórios de advocacia foram invadidos, afrontando-se a Constituição Federal; buscamos nessa ocasião reiterar o que a lei já prevê, ou seja, assegurar aos Departamentos Jurídicos a mesma inviolabilidade dos escritórios de advocacia no sentido de proteger direitos e garantias individuais.

Confiamos que o Conselho Nacional de Justiça jogue luz sobre essa matéria e pacifique tal entendimento. É o que se requer.

São Paulo, 31 de março de 2009
Luiz Flávio Borges D´Urso
Presidente da OAB SP

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