De olhos fechados

Corregedorias dos tribunais deixam a desejar

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29 de março de 2009, 16h32

As vistorias realizadas pelo Conselho Nacional de Justiça revelam que as corregedorias dos tribunais pouco ou nada fazem para investigar e punir irregularidades de juízes. A constatação levará o CNJ a punir os corregedores corporativistas. A reportagem é do jornal O Estado de S. Paulo.

“As corregedorias não estão atuando como deveriam. Elas têm sido falhas e omissas na apuração de irregularidades”, afirmou o corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp. “Na média, as corregedorias têm deixado a desejar”, disse o presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ, Gilmar Mendes.

O processo administrativo é lento e quando há punição, ela é incompatível com a gravidade do caso. No Maranhão, por exemplo, o prazo entre a denúncia de irregularidade praticada por um juiz e a instauração da sindicância chega a dois anos. Há processos desde 2003.

Os mutirões carcerários e as vistorias do CNJ têm revelado situações em que o próprio juiz descumpre a lei. No Piauí policiais diziam a alguns juízes quais criminosos deveriam permanecer presos, independentemente de condenação ou denúncia do Ministério Público. Entre eles, havia um código: inquéritos de presos que os policiais consideravam perigosos eram remetidos dentro de capas pretas.

A prática foi abolida por ordem judicial. “É um mundo de horrores a Justiça criminal brasileira”, disse o ministro Gilmar Mendes.

Também no Piauí, um juiz guardava processos que já deveriam ter sido julgados em um cofre. O fato deu origem à suspeita de que poderia negociar com as partes a demora do julgamento.

No Maranhão, policiais requisitados pelo Tribunal de Justiça faziam a segurança da casa de desembargadores. Alguns, de acordo com relatos de juízes do CNJ, ajudavam nas compras de supermercado. No estado, também foram encontrados indícios de que juízes fraudavam a distribuição de processos para beneficiar empresários.

Descontrole administrativo

O problema mais comum encontrado pelo CNJ em seis estados vistoriados é o descontrole processual e administrativo em varas e tribunais. Processos perdidos ou confiscados por advogados e promotores, julgamentos que esperam quatro anos para ter os acórdãos publicados, autores de crimes graves que nem sequer são procurados pela Justiça, gastos supérfluos e decisões que nunca são executadas e poderiam se converter em receita para os cofres públicos são alguns dos problemas decorrentes da falta de organização.

No Maranhão, por exemplo, o CNJ identificou pagamentos de salário a funcionários fantasmas, milhares de processos parados há anos, casos de nepotismo e a permanência nos presídios de pessoas que já deveriam ter sido liberadas.

Com base em orientações do conselho, a rotina dos tribunais começa a mudar. No Maranhão, parentes de juízes começaram a ser demitidos. Também foram abertos processos administrativos para apurar irregularidades cometidas por juízes e o pagamento a funcionários fantasmas foi suspenso.

Nos próximos meses, o conselho fará novas vistorias. Em abril, serão vistoriados os presídios do interior do Amazonas, assim como tribunais e varas de Alagoas e Paraíba.

Casos inusitados

No Pará, um advogado retirou um processo da 7ª Vara Cível de Belém em 1998 para estudar a defesa de seu cliente. Passados 11 anos, o processo ainda não foi devolvido. Na vara, há outros 748 processos em situação semelhante. Na 2ª Vara do Júri, o CNJ ouviu relatos de que 25 processos foram extraviados e estariam nas mãos de uma juíza aposentada.

No Maranhão, foi o Ministério Público que retirou 280 inquéritos e ações penais da 8ª Vara Criminal para análise. Todos estão com prazo vencido e já deveriam ter voltado às mãos dos juízes – o mais antigo datava de 2005.

Na 9ª Vara Criminal de São Luís, um processo está com o advogado desde 2004. E os juízes só percebem que devem cobrar a devolução dos autos quando a outra parte da ação reclama.

Na Bahia, processos criminais prescrevem todos os dias por falta de julgamento. No Pará, centenas de processos permanecem nas prateleiras à espera da reclamação das partes.

Não são só os atrasos que chamam a atenção do CNJ. A rapidez com que a 6ª Vara Cível de São Luís julgou a execução de um título judicial de R$ 1,5 milhão levantou suspeitas. A sentença, apesar do tempo exíguo de duas horas, tinha 20 laudas. Isso porque há processos parados há mais de um ano.

Em Belém, a 12ª Vara Criminal não dispõe de máquina copiadora. Os juízes precisam apelar ao prédio vizinho para copiar documentos. No Piauí, a corregedoria do CNJ se deparou com cartórios judiciais privatizados. Alguns desses cartórios foram divididos para prestar atendimento diferenciado à população rica e à população pobre. Para a população pobre, a estrutura é precária.

Outro destaque do CNJ são desembargadores do TJ do Maranhão que têm à sua disposição até 18 servidores. São 426 funcionário comissionados, ou seja, sem aprovação em concurso público. De acordo com a presidência do tribunal, as indicações dos comissionados estariam amparadas pela legislação estadual e por uma resolução do tribunal.

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