Estado laico

Igreja Católica deveria excomungar homicidas

Autor

  • José Carlos Blat

    é promotor do Patrimônio Público e Social em São Paulo professor de Direito Penal Processo Penal e prática forense integrou o Gaeco entre os anos de 1998 a 2004 e foi um dos fundadores do Grupo Nacional de Combate ao Crime Organizado. Associado do MP Democrático.

7 de março de 2009, 16h05

A Igreja Católica excomungou a mãe da menina de nove anos de Alagoinha (230 km do Recife) e os médicos responsáveis pelo aborto feitopor força do que dispõe o artigo 128 do Código Penal, que prevê a possibilidade do aborto em casos de risco de morte da gestante e de estupro. A decisão do arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho causa espécie, pois, a fundamentação da excomunhão tem por base que “a lei de Deus está acima de todas as coisas”, refletindo-se a ira divina sobre os médicos e a mãe da menor violentada.

A criança violentada só escapou do ato do clérigo por ser menor de idade! Enquanto a igreja católica simplesmente ignora que o Brasil é um Estado laico olvida-se que o autor da violência sexual não foi punido pela Justiça divina e mesmo encarcerado manteve-se habilitado pela Igreja Católica para ser recebido em seus templos e participar de determinados cultos como o casamento religioso e comungar.

Se a igreja Católica resolveu agora afrontar decisões judiciais e a legislação mundana deveria então convocar todos os seus quadros e passar a examinar processos criminais transitados ou não em julgado e excomungar todos aqueles que praticaram crimes de homicídio, crimes patrimoniais, crimes contra os costumes e crimes de corrupção, só para começar.

Mesclar assuntos que envolvem a fé, a aplicação da lei penal e o direito de punir do Estado é querer ressuscitar a Santa Inquisição, além do que a intolerante decisão da igreja católica nesse caso de excomunhão representa uma afronta aos preceitos norteadores dos direitos fundamentais da pessoa humana.

A decisão de realização do aborto foi adequada e certamente busca diminuir um trauma que perseguirá a criança violentada por toda a sua existência. Se ela quiser buscar o conforto divino será recebida na igreja católica com uma marca indelével, até porque sua mãe poderá acompanhá-la nas missas, porém, no momento da comunhão deverá dirigir-se sozinha até o altar para receber a hóstia sagrada.

Membros do Ministério Público e juízes, além de médicos e familiares, correm o risco da excomunhão e a Igreja Católica vai utilizar esse instrumento como forma de pressionar o Estado Democrático de Direito para fazer valer as regras religiosas confrontando o ordenamento jurídico e a independência funcional desses operadores do Direito. Tenho a plena convicção que a lei mundana nesses casos de sofrimento intenso e injustificável vai prevalecer, se Deus quiser!

Autores

  • é promotor de Justiça criminal em São Paulo, professor de Direito Penal, Processo Penal e prática forense, integrou o Gaeco entre os anos de 1998 a 2004, foi um dos fundadores do Grupo Nacional de Combate ao Crime Organizado.

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