Decisão da Justiça

Parte não pode escolher foro de ações nos JEF

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20 de maio de 2009, 15h40

A incompetência relativa dos Juizados Especiais Federais no tocante as demandas previdenciárias vem se tornando uma questão recorrente no âmbito dos Juizados Especiais Federais. A questão tornou-se mais intricada com a Súmula 689 do STF, que exara o entendimento segundo o qual "o segurado pode ajuizar ação contra a instituição previdenciária perante o juízo federal do seu domicílio ou nas varas federais da capital do estado-membro".

Parte dos atores jurisdicionais passaram à interpretar a Súmula 689, como tendo o segurado o direito de propor a demanda na Justiça Estadual do seu domicílio, no Juízo Federal que sobre ele tenha jurisdição, na Capital do Estado e no Distrito Federal.

Os Juizados Especiais Federais vieram agilizar a demanda jurisdicional, dando maior celeridade e efetividade processual face ao seu rito sumário e os princípios a que lhe são aplicáveis tais como o da informalidade, celeridade, simplicidade, entre outros, sendo um diferencial nas demandas previdenciárias em que figura como parte o INSS, tendo em vista o objeto mediato do litígio, verbas alimentares.

Na busca pela efetividade jurisdicional, as partes, aliás, a parte autora, passou a buscar o foro reconhecidamente mais ágio. Logo surgiram as correntes sobre a possibilidade da escolha do foro a ser ajuizado a demanda previdenciária.

Segundo a corrente que acolhe a possibilidade de escolha do JEF, a norma, há de ser interpretada como tendo sido instituída em prol da comodidade processual do segurado que, em face dela, já não se vê compelido a deslocar-se para a sede da autarquia, ou de sua agência obrigada à prestação do benefício, com a finalidade de ajuizar a ação cabível. Inverte-se no interesse do autor, a regra de competência de foro, prevista na legislação processual, que beneficiava o réu. Emprestar a esta, portanto, caráter absoluto, ou conferir uma interpretação literal ao texto constitucional, significaria desnaturar o favor maior com que foi o segurado contemplado pelo constituinte nas ações da espécie.

Por outro lado, a corrente contrária entende que essa faculdade não se reveste de extensão ilimitada, já que a previsão do legislador, no artigo109, parágrafo 3º da Constituição Federal de 1988, foi no sentido de beneficiar o segurado que porventura tivesse dificultado o acesso à tutela jurisdicional em face de questões de organização da estrutura judiciária federal.

Contudo, não foi concedido o direito de ingressar com ação previdenciária em qualquer lugar do país, em atenção apenas aos seus interesses pessoais. Não utilizando o segurado da opção de ingressar com ação no foro da justiça estadual da comarca onde reside, deve fazê-lo onde haja sede de vara da justiça federal no Estado em que tem o seu domicílio.

Segundo a Súmula 689 do STF, "o segurado pode ajuizar ação contra a instituição previdenciária perante o juízo federal do seu domicílio ou nas varas federais da capital do estado-membro".

Discorrendo sobre a interpretação da Súmula 689, a juíza Maria Divina Vitória, da 1ª Turma do JEF do Estado de Goiás de forma irretocável, no processo 2008.35.00.700953-0, esmiuçou o teor da Súmula. Vejamos:

“Segundo a culta juíza, a súmula do STF favorece a interpretação de que o segurado tem a faculdade de optar entre propor a reclamação ou no JEF da Subseção em que está domiciliado ou no JEF da Seção Judiciária respectiva.

Todavia, como se vê do teor dos julgamentos dos precedentes que deram ensejo à súmula, a questão dessa suposta "faculdade" do segurado foi mal posta pelo STF.

Inicialmente, nos julgamentos do AgRg no AI 208.834, do AgRg no AI 207.462 e do AgRg no AI 208.833, o problema do STF era saber se se tratava o § 3º do art. 109 de regra de incompetência absoluta ou relativa. O STF entendeu que a hipótese era de incompetência relativa, de modo que o juiz a quem fosse distribuída a ação não poderia declinar a competência ex officio.

Já nos RR. EE. 223.139 e 239.594, o STF decidiu caso diverso, que tratava de saber se havia opção entre ajuizar o feito no foro da justiça estadual ou no foro da seção judiciária (portanto, Justiça Federal). A Suprema Corte reputou, então, que a regra do § 3º do art. 109 da CF/88 era norma que beneficiava o segurado e que, por isso, não poderia ser interpretada contra seu próprio beneficiário.


Porém, é preciso deixar claro que a faculdade constitucional assegurada ao segurado-autor só existe quanto à opção entre as duas hipóteses previstas no § 3º do art. 109 da Constituição, i.e., entre a justiça estadual, sempre que a comarca não seja sede de vara do juízo federal, e a Justiça Federal da seção judiciária em que for domiciliado o autor. Fora daí, a Constituição não autoriza outro tipo de privilégio de foro concedido em razão do domicílio do segurado (art. 19, III).

A hipótese do § 3º do art. 109 é norma excepcional que privilegia com opção de foro os segurados cujo domicílio recaia em comarca que não seja sede de vara do juízo federal, sem que isso pudesse implicar a extensão do mesmo direito de escolha aos segurados domiciliados em municípios sedes de vara federal.

Todavia, sem o devido cuidado a respeito, a partir do RE 224.799/RS (rel. Min. NELSON JOBIM, DJU de 7-5-99), o STF deu por certo que os acórdãos antes mencionados tivessem firmado uma facultatividade que incluiria até dois juízos federais localizados dentro da mesma unidade federativa, faculdade que, como visto, nunca existiu na Constituição.

Pelo contrário. Segundo julgado do próprio STF: "Cuidando a ação de benefício previdenciário e havendo no domicílio do segurado ou beneficiário vara federal, descabe o ajuizamento da ação em juízo diverso, a teor do disposto no § 3º do artigo 109 da Constituição Federal" (AgRg no RE 227.132/RS, 2ª Turma, rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJU de 27-8-99).

Aliás, do voto vencedor, nesse precedente, acatado por unanimidade, lê-se: "Ora, conforme explictado na decisão do Juízo Federal de folhas 13 e 14, confirmada pelo acórdão impugnado mediante o extraordinário, o ora Agravante não tem domicílio em Porto Alegre. Portanto, bem andou o Juízo da capital em declinar da competência. Ao fazê-lo, obstaculizou a possibilidade de o próprio jurisdicionado escolher o órgão competente para julgar a demanda. O que o dispositivo constitucional [§ 3º do art. 109] prevê é a atuação da Justiça comum quando não se conta, no domicílio do segurado ou beneficário, com vara federal. Logo, havendo esta última, não pode ele optar pelo ajuizamento da ação em juízo diverso. Daí não se poder ter o extraordinário enquadrado na alínea ‘a’ do inciso III do art. 102 da Carta da República. A existência de varas especializadas na capital não implica o deslocamento da competência, sob pena de olvidar-se a regra constitucional".

Mas, infelizmente, essa confusão que principiou no RE 224.799/RS se difundiu nos demais precedentes dados como paradigmas da súmula: RE 232.275/RS (rel. Min. NELSON JOBIM, DJU de 12-3-99), RE 231.771/RS (rel. Min. NELSON JOBIM, DJU de 18-6-99), RE 224.101/RS (rel. Min. ILMAR GALVÃO, DJU de 13-8-99), RE 223.146/RS (rel. Min. ILMAR GALVÃO, DJU de 13-8-99), RE 251.617/RS (rel. Min. MOREIRA ALVES, DJU de 17-9-99) e RE 293.244/RS (rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJU de 6-4-2001).

Do exposto, percebe-se que o STF, ao editar a Súmula 689, procedeu não só à criação de regra de competência judicial facultativa como também estabeleceu privilégio discriminatório quanto aos segurados residentes em município incluído na esfera de jurisdição da seção judiciária, os quais, diferentemente dos que residam em município abrangido pela jurisdição de alguma subseção judiciária, não disporiam da mesma faculdade de escolher o juízo natural.

Contudo, noves fora a circunstância de não ser vinculante essa equivocada súmula, radica na Lei 10.259/01 o argumento mais forte para se rebater a tese da facultatividade, entre dois juízos federais da mesma seção judiciária. Veja-se art. 20 da lei, verbis: "Art. 20. Onde não houver Vara Federal, a causa poderá ser proposta no Juizado Especial Federal mais próximo do foro definido no art. 4º da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, vedada a aplicação desta Lei no juízo estadual."

Correto o legislador ao deixar aí claro a impertinência da invocação tanto do § 3º do art. 109 da Constituição quanto da Súmula 689 do STF. Isso porque, se a sistemática dos JEFs não se aplica ao juízo estadual, foi preciso evidenciar que nem o segurado domiciliado em comarca que não conta com vara federal dispõe da prerrogativa de eleição de foro.


E nem se alegue a inconstitucionalidade desse artigo da Lei 10.259/2001. A Súmula 689 do STF surgiu da interpretação do § 3º do art. 109 da Constituição; já a disciplina legal da competência dos JEFs se fundamenta em dispositivo constitucional diverso (§ 1º incluído no art. 98 pela EC 22/99). Ademais, embora tenha sido editada em outubro de 2003, todos os procedentes que ensejaram tal súmula foram julgados antes da Lei 10.259/2001.

Logo, a opção de foro de que trata o § 3º do art. 109 da Constituição, ainda que ampliada pela Súmula 689 do STF, restringe-se às ações previdenciárias excluídas da sistemática especial dos JEFs previstos no § 1º incluído no art. 98 da Constituição pela EC 22/99. Daí a razão de se aplicar a regra especial de competência prevista no art. 20 da Lei 10.259/01.

De resto, não há como retirar da Lei 10.259/01 a mesma facultatividade reconhecida pela Súmula 689 do STF, pois isso violaria o caput e o inciso I do art. 5º, bem como o inciso III do art. 19 da Constituição.

Em outras palavras, tal como o segurado domiciliado em município abrangido por seção judiciária, o segurado com domicílio no município sede de subseção judiciária em que já instalado JEF não dispõe do privilégio para propor a reclamação em foro diverso, sob pena de inconstitucional hipótese de criação judicial e discriminatória do direito de escolha do juízo natural.

Assim, por força do princípio da isonomia, que determina não só a obrigação de tratamento igual quanto a proibição de tratamento desigual, em supostos assemelhados, trata-se de hipótese de competência absoluta. Do contrário, estar-se-ia a chancelar inconstitucional privilégio de foro de eleição baseado no inadequado critério da simples fixação do domicílio.

A Procuradoria Geral Federal, órgão da AGU, que tem como competência a representação judicial e extrajudicial das autarquias e fundações públicas federais, portanto, do INSS, entende de forma restrita a interpretação que deve ser dada a essa questão. Vejamos a defesa mínima do órgão:

“O microssistema processual imanente aos Juizados Especiais Federais se funda, primordialmente, na competência territorial absoluta dos mesmos para as causas de menor complexidade (CF/88, art. 98, parágrafo único), assim definidas as de valor inferior a sessenta salários-mínimos (Lei 10.259/01, art. 3º, caput e § 3º), nos municípios onde houver tal jurisdição instalada.

A partir dessa regula mater, assim preceitua o art. 20 da Lei dos JEF, in verbis:

“Onde não houver Vara Federal, a causa poderá ser proposta no Juizado Especial Federal mais próximo do foro definido no art. 4º da Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, vedada a aplicação desta Lei no juízo estadual.”

O dispositivo a que se fez remissão, por sua vez, é do seguinte teor, ipsis litteris:

 

“É competente, para as causas previstas nesta Lei, o Juizado do foro:

I – do domicílio do réu ou, a critério do autor, do local onde aquele exerça atividades profissionais ou econômicas ou mantenha estabelecimento, filial, agência, sucursal ou escritório;

II – do lugar onde a obrigação deva ser satisfeita;

III – do domicílio do autor ou do local do ato ou fato, nas ações para reparação de dano de qualquer natureza.”

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou os parâmetros nos seguintes termos, in verbis:

“PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL OU JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. AÇÃO DE COBRANÇA AJUIZADA EM DESFAVOR DA CEF. AUTOR DOMICILIADO EM CIDADE ONDE NÃO HÁ VARA FEDERAL NEM VARA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. COMPETÊNCIA RELATIVA.

– Compete ao Superior Tribunal de Justiça o julgamento de conflito de competência estabelecido entre Juízo Federal e Juizado Especial Federal da mesma Seção Judiciária.

– A norma do art. 3º, § 3º, da Lei nº 10.259/01, que fixa a competência absoluta das Vara do Juizado Especial se aplica exclusivamente àqueles que tiverem domicílio “no foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial”.


– Nas demais situações, o ajuizamento da ação no Juizado Especial Federal constitui mera faculdade do autor, ainda assim condicionada à inexistência de Vara Federal em seu domicílio, nos termos do art. 20 da Lei nº 10.259/01.

– Da análise conjugada de tais dispositivos legais conclui-se que, nas cidades onde não houver Vara Federal nem Vara do Juizado Especial Federal, o autor poderá ajuizar ação (cujo valor seja de até sessenta salários mínimos e satisfeitas as condições de legitimidade do art. 6º da Lei nº 10.259/01) na Seção Judiciária que tenha jurisdição sobre tal cidade; ou, alternativamente, no Juizado Especial Federal mais próximo do foro fixado no art. 4º da Lei nº 9.099/95. Trata-se, nessa hipótese, de competência relativa, que sequer pode ser declinada de ofício, nos termos do art. 112 do CPC e da Súmula nº 33 do STJ.

Conflito não conhecido”. (CC 87781/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJU de 05/11/07)

Assim, ainda que seja faculdade do autor, na ausência de vara de juizado especial ou comum no município de residência ou de exercício de atividades econômicas, se valer da competência delegada (CF/88, art. 109, § 3º)[1], é certo que isso não significa que possa ajuizar em qualquer lugar, independentemente do critério da distância.

Importante ressaltar que a regra de competência encerra norma de ordem pública que, apesar de, no caso dos juizados especiais, servir ao melhor acesso do cidadão à Justiça, não é passível de supressão unilateral pela simples manifestação de vontade deste; seja por não haver qualquer previsão nesse sentido, seja por um imperativo de segurança jurídica.

Uma vez que a parte autora declarou solenemente que mora/trabalha no Município de ______, onde exerce suas atividades laborais, o foro do Juizado Especial Federal mais próximo é o de ______, não havendo suporte legal ou sequer explicação lícita para que se busque este Juizado de _______.

A ratio essendi dos JEF – afora a competência absoluta em relação ao município em que se instala – foi facultar aos jurisdicionados o acesso a uma jurisdição mais célere que a Justiça Comum Estadual em exercício de competência delegada ou a Justiça Comum Federal[2], jamais tendo por escopo criar uma ampla alternativa de definição do juizado especial federal que melhor lhes convém, o que seria uma temeridade.

Com efeito, como dizer que há difícil acesso quanto a uma pessoa que viaja distância consideravelmente maior para obter exatamente o mesmo provimento judicial?

O intuito da lei foi exatamente evitar esse tipo de distorção, particularmente se considerarmos que para cada pessoa que, à semelhança do(a) requerente, veio pleitear perante este Juizado, uma que efetivamente não tinha condições teve seu acesso obstaculizado.

Nesse sentido já decidiu a Turma Recursal do Distrito Federal, in verbis:

“CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REVISÃO DO CÁLCULO DA RENDA MENSAL INICIAL DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. INSTALAÇÃO DE NOVO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL EM DATA POSTERIOR AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. ART. 25 DA LEI Nº 10.259/01. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA ANULADA.

I – O juízo a quo extinguiu o processo, sem julgamento do mérito, em face do reconhecimento da incompetência do Juizado Especial Federal do Distrito Federal para o feito. Asseverou não ser extensivo ao caso a opção de foro prevista no art. 109, § 2º, da Constituição Federal, tendo em vista que a parte autora reside na cidade de Luziânia-GO e a ação fora ajuizada contra o INSS.

II – A opção pelo foro do Distrito Federal, nos termos do art. 109, § 2º, da Constituição Federal, restringe-se às causas intentadas contra a União. As ações em que figura autarquia, fundação ou empresa pública federal no pólo passivo da relação processual devem ser ajuizadas no juizado especial federal mais próximo do foro definido no art. 4º da Lei nº 9.099/95, consoante dispõe o art. 20 da Lei nº 10.259/2001.


III – Quando se trata de definição de competência de juizado especial federal, a regra do art. 4º da Lei nº 9.099/95 deve ser conjugada com a do art. 20 da Lei nº 10.259/2001 se, no domicílio do autor, não houver vara da Justiça Federal. Desse modo, a opção pelo foro do Distrito Federal somente é válida se este for a sede de juizado especial federal mais próximo do local onde, em princípio, deveria ser proposta a ação.

IV – Todavia, a par desse entendimento, embora funcione, desde 27-11-2006, juizado especial federal em Luziânia-GO, nos termos da PORTARIA/PRESI-TRF 1º Região nº 600-457, de 10-11-2006, tem-se que a presente ação foi ajuizada em 25-1-2006 – data anterior à instalação daquele juízo. Nessa hipótese, consoante dispõe o art. 25 da Lei 10.259/2001, não serão remetidas aos juizados especiais as demandas ajuizadas até a data de sua instalação. Incompetência do foro do Distrito Federal afastada.

V – Havendo elementos fáticos a serem definidos no processamento, não se aplica, ao caso, o art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil. Impõe-se o retorno dos autos ao juízo de origem a fim de que, após as diligências necessárias, seja proferida sentença de mérito.

VI – Recurso provido. Sentença anulada.

VII – Incabível a condenação em honorários advocatícios, nos termos do art. 55, caput, da Lei nº 9.099/95”. (RCS 2006.34.00.900605-2, Rel. Juiz Alexandre Machado Vasconcelos, em 19/02/09)

Particularmente expressiva a jurisprudência da Terceira Turma Recursal de Minas Gerais[3], valendo citar um excerto do voto-vencedor, in verbis:

“A Lei 10.259/01, seguindo a previsão do §2º do art 98 da Constituição, criou no País os juizados especiais federais e estabeleceu suas normas gerais, inclusive procedimentais. Uma das finalidades da instituição dos juizados foi justamente aproximar a justiça federal da população que a ela não tinha acesso, sobretudo a do interior dos estados-membros, que pôde contar, a partir da implantação de mais varas descentralizadas, ocorrida nos anos seguintes, com um juizado federal próximo de sua cidade. O jurisdicionado não teria, então, que se deslocar até a capital do estado para buscar a solução do problema. Isso seria feito na sua cidade, se fosse sede de vara federal, ou na cidade mais próxima que tivesse uma vara federal instalada. É de se recordar que antes só existiam três cidades no interior com vara federal: Uberaba, Juiz de Fora e Uberlândia. Hoje são inúmeras outras: Divinópolis, Montes Claros, Pouso Alegre, Varginha, Patos de Minas, Ipatinga, Sete Lagoas, Passos, Lavras e São Sebastião do Paraíso.

Foi pensando na facilidade de acesso do segurado ao juizado mais próximo do local de sua residência, que o legislador fez prevalecer a competência do juizado especial federal com jurisdição na cidade de sua residência, em detrimento de outro local, inclusive da capital do estado. Institui-se, no § 3º do art. 3º da Lei 10.259/01, regra de competência territorial absoluta, ao dizer: “no foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial, a sua competência é absoluta”.

A competência absoluta atende a um critério de política legislativa e não pode ser modificada pelas partes, ainda que estivessem em comum acordo. Assim, não pode a parte segurada escolher a capital do estado para ajuizar a demanda em desfavor do instituto de previdência; ela deve propô-la no juizado especial com jurisdição na sua cidade ou, no mínimo, no juizado federal mais próximo, por força do art. 20 da Lei 10.259/01.

E nem se diga que está havendo descumprimento da Súmula 689 do STF. Como visto, ao editá-la, o Excelso Pretório não levou em conta norma específica contida na Lei dos Juizados Especiais Federais, partindo apenas da interpretação de dispositivo constitucional que não tem relação com os juizados”.

Tampouco poderia ser levantado, nesse caso, a regra do art. 99, I, do CPC; seja por se referir à União, e não suas autarquias ou a Fazenda Pública de modo genérico; seja por se tratar de lex generalis; seja porque o escopo daquela norma era facilitar a defesa da União, e não prejudicá-la.


 

Ademais, a mens legis subjacente aos dispositivos transcritos também prima pelo direito de defesa dos entes estatais federais. Nesse sentido, a Autarquia Previdenciária, como qualquer pessoa jurídica, é uma ficção legal que apenas para fins de sua representação perante terceiros é ubíqua, sendo óbvio que a sua defesa técnica em diversos pontos do território nacional não pode ser pressuposta como idêntica, como se o conhecimento de todas as causas ajuizadas contra o INSS pudesse ser, em uma manobra de prestidigitação, transcedentalizado para os diversos responsáveis por sua representação em juízo.

 

Nesse sentido, a previsão do juiz natural (CF/88, art. 5º, LIII[4]) é, antes de tudo, garantia de que as preferências das partes autoras no tocante à escolha do juízo não poderão implicar em abuso de direito, servindo não em favor daqueles, mas em prejuízo dos réus. E, sem dúvida, há notório prejuízo, na medida em que a própria organização das procuradorias segue a distribuição dos órgãos judiciários judiciária, que por sua vez segue critérios populacionais, e, abrindo-se a possibilidade de exercer direito de ação perante qualquer juizado especial, torna-se impossível a já considerável carga de serviço, bem como o planejamento da defesa.

Vale ressaltar, ademais, que a intepretação da regra de competência fixada pela Lei dos JEF não se resigna a impor divisão interna de competências do INSS (arts. 7º, parágrafo único[5], e 8º, § 1º[6]), mas, em homenagem ao princípio da concentração dos atos instrutórios, versa a inviabilidade de se atribuir aleatoriamente a outro órgão regional, que não àquele que provavelmente é o responsável pelo processamento do requerimento administrativo, o ônus de defender uma causa cujos elementos probatórios tem seu acesso dificultado inclusive por obstáculos hierárquicos.

 

Em suma, a noção de celeridade processual não pode servir de apanágio à malversação da defesa da Autarquia Previdenciária em juízo, por mera inclinação de satisfazer um princípio geral cuja aplicação na espécie é nenhuma, vez que o Juizado Especial de ______ não só já atende tal pressuposto como é mais próximo do domicílio da parte autora.”

 

A incompetência relativa dos Juizados Especiais Federais no tocante as demandas previdenciárias tornou-se uma questão recorrente no âmbito dos Juizados Especiais Federais, sobretudo, no que tange à possibilidade de escolha do Juizado pela parte demandante.

O STF não dirimiu de forma definitiva a celeuma anteriormente existente, pois a opção de foro de que trata o § 3º do art. 109 da Constituição, ainda que ampliada pela Súmula 689 do STF, restringe-se às ações previdenciárias excluídas da sistemática especial dos JEFs previstos no § 1º incluído no art. 98 da Constituição pela EC 22/99.

Do exposto, da análise das correntes divergentes sobre a faculdade na escolha do foro no ajuizamento de demandas previdenciárias, entendemos que a competência dos JEFs é absoluta, podendo ser conhecida de ofício pelo magistrado, não sendo possível juridicamente até o momento, a sua livre escolha pelos jurisdicionados.

BIBLIOGRAFIA

Constituição da República Federativa do Brasil, 13.ª edição256 páginas Volume: 5 Editora: Revista dos Tribunais , 2008.

Lei 9.099/95 e Lei 10.259/2001.


[1] AG 157104/SP, Rel. Des. Leide Polo, DJU de 24/01/08.

[2] Cf. CC 4422/SP, Rel. Des. Marisa Santos, DJU de 04/11/03.

[3] RI 2008.38.00.700114-5, Rel. Juiz Gláucio Maciel Gonçalves, em 05/06/08.

[4] “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”.

[5] “A citação das autarquias, fundações e empresas públicas será feita na pessoa do representante máximo da entidade, no local onde proposta a causa, quando ali instalado seu escritório ou representação; se não, na sede da entidade”.

[6] “As demais intimações das partes serão feitas na pessoa dos advogados ou dos Procuradores que oficiem nos respectivos autos, pessoalmente ou por via postal”.

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