Palavra de ministro

Juiz tem de decidir de acordo com sua consciência

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19 de maio de 2009, 12h59

O ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski concedeu entrevista ao jornal O Povo durante passagem pelo estado do Ceará. Na entrevista, ele falou das últimas polêmicas que levaram a mais importante instância do Judiciário brasileiro para o centro das atenções e reclamou que houve um exagero na cobertura feita pela mídia do bate-boca entre os ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa.

Para ele, a imagem da Justiça não saiu arranhada depois do episódio. Ao ampliar a discussão para o funcionamento do sistema judiciário, Lewandowski afirma que a vitaliciedade dos ministros do STF não é um problema, que há uma “explosão de litigiosidade” no Brasil e que as decisões judiciais não devem se guiar pela vontade popular.

Leia a entrevista publicada no jornal O Povo

O bate-boca entre os ministros Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes manchou a imagem da Justiça?
Ricardo Lewandowski — Não. Esse episódio está absolutamente superado. Houve um exagero em termos de repercussão relativamente à discussão que se travou entre esses dois ministros. Uma discussão, uma troca de ideias absolutamente normal no colegiado.

Há briga de egos entre os dois ministros?
Lewandowski — Não, no Judiciário não há disputa. Essa é uma grande vantagem porque a carreira é estritamente regulada pelo critério da antiguidade. Cada um, um dia chegará à presidência do Tribunal.

O presidente Lula lamentou o episódio. Pessoalmente, qual sua avaliação sobre o caso?
Lewandowski — Realmente, o tom foi um pouco mais elevado do que o comum. Mas é um episódio normal. Pode acontecer novamente, não apenas entre os dois ministros — esperamos que não ocorra -—mas entre outros ministros quaisquer. Numa discussão um pouco mais acalorada é possível que alguém use uma palavra não tão adequada, como deveria ser, mas isso faz parte dos debates democráticos e das instituições políticas, e o Supremo Tribunal Federal, como não se pode olvidar, é um tribunal político com P maiúsculos no sentido de política institucional.

Não existiria o certo e o errado nesse episódio?
Lewandowski — Não, quem diz num colegiado o que é certo e errado é a maioria.

Depois da discussão entre os dois, surgiu a proposta de que as sessões fossem editadas. Qual a posição do senhor?
Lewandowski —
O televisionamento das sessões é uma conquista irreversível da sociedade e, portanto, da democracia. Não há como voltar atrás. Não vejo como se possa agora decidir pela edição.

Qual a avaliação do senhor sobre propostas que apontam para o fim da vitaliciedade dos membros do Supremo?
Lewandowski —
Se imaginarmos ou calcularmos a média de permanência dos ministros no Supremo Tribunal Federal, tirando uma ou outra exceção, é exatamente de 12 anos, ou de 15 anos no máximo. Então, na verdade, o próprio tempo, o próprio sistema já estabelece, digamos assim, um tempo médio de permanência dos ministros. Uma espécie de mandato não escrito.

A indicação dos membros do STF pelo presidente da República é uma interferência de um poder sobre o outro?
Lewandowski —
Não. Muitos dos que foram indicados pelo atual presidente da República tem tido, muitas vezes, posições e votos, atitudes diametralmente opostas aos desejos, digamos assim — se é que se pode dizer isso — do presidente da República, do poder executivo, do Governo Federal.

Há alguns dias, o presidente nacional da OAB, Cézar Britto, disse ao jornal O Povo que a lentidão da Justiça acontece, dentre outros motivos, por falta de empenho de juízes. A justificativa procede?
Lewandowski — Absolutamente não. Eu tenho orgulho de dizer que os magistrados brasileiros são uns dos mais preparados de todo o mundo, comparado com a América Latina.

Como o senhor avalia decisões do presidente do STF em relação a casos polêmicos e impopulares, como os dois Habeas Corpus que soltaram o banqueiro Daniel Dantas?
Lewandowski — Eu quero observar que elas tiveram o referendo do plenário do Supremo Tribunal Federal. E de outra parte, o juiz não tem que agradar ao povo. O juiz ele não é um parlamentar, ele não foi eleito. Ele tem uma função, como se diz tecnicamente, contra-majoritária. Se o juiz fosse ouvir o povo ele teria que aplicar pena de morte em alguns casos, tortura e outras coisas que a Constituição e a própria civilização hoje abominam e vedam, proíbem veementemente. Então o juiz tem que decidir tecnicamente, de acordo com a sua consciência, e no recesso do seu gabinete sem ouvir o povo.

Então, a sugestão do ministro Joaquim Barbosa, “vá às ruas, ministro”, não se aplica?
Lewandowski — Não. Cada um tem o seu estilo.

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