Ética profissional

"Advogado pode anunciar, só não pode enganar"

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19 de maio de 2009, 16h19

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Antigamente, nos Estados Unidos, escritórios de advocacia que faziam marketing eram considerados antiprofissionais. As coisas mudaram. Hoje, os escritórios americanos podem distribuir folhetos, fazer propaganda na televisão e usar os espaços de outdoor para se promoverem. “A maioria dos advogados não consegue imaginar um sistema diferente do atual”, conta o professor e advogado Thomas D. Morgan, um dos pais do Código de Ética dos advogados norte-americanos.

Em entrevista à Consultor Jurídico, Morgan conta que a questão já foi levada para a Suprema Corte dos Estados Unidos. “A Suprema Corte entende que a proteção constitucional da liberdade de expressão permite esse tipo de marketing contanto que não seja enganador.” Para Morgan, o marketing não ofende a ética dos advogados. Mas admite que, se dependesse apenas dele, não seria favorável a anúncios “catastróficos, dramáticos ou sensacionais”.

O advogado também acredita que, com a globalização, as fronteiras para os serviços jurídicos terão de acabar. “O trabalho de qualquer cliente não para nas fronteiras nacionais”, constata. Ele contou que, nos Estados Unidos, onde os estados têm legislação e jurisdiçao com autônomia similar a de países independentes, houve uma tentativa de se limitar a atuação dos advogados conforme a região onde atuavam. “Não funciona. Ninguém pode defender um cliente em apenas uma jurisdição estadual.”

Thomas Morgan é professor de Direito Antitruste e Direito Regulatório de Comércio da George Washington University. Freqüentemente solicitado como consultor jurídico, já testemunhou em mais de 20 casos sobre ética profissional de advogados, tendo também submetido pareceres relativos a cerca de outros 30 casos. Serviu como assessor especial do Sub-Secretário de Defesa dos EUA (1969-70), no governo do presidente Lyndon Johnson, e foi advogado do Conselho Geral da Força Aérea dos EUA (1967-69).

O professor esteve no Brasil onde falou sobre lei antitruste e crise econômica. Ele concedeu a entrevista antes de palestra realizada pelo Instituto dos Advogados do Brasil (IAB) com apoio do Consulado dos Estados Unidos no Rio de Janeiro.

Leia a entrevista

ConJur — Como a crise econômica afetou a atividade dos advogados nos Estados Unidos em relação aos honorários e à demanda?
Thomas Morgan — Uma das relações que nós reconhecemos há muito tempo é que a demanda pelos serviços é associada fortemente ao nível de atividade econômica. Como há menos atividade econômica, a demanda pelos serviços dos advogados diminuiu. Isso já estava começando a acontecer antes mesmo da crise atual. Nós também percebemos certa pressão sobre os honorários dos advogados. Mas a crise dá aos clientes poder de barganha que eles não teriam se todos estivessem competindo pelos mesmos bons advogados.

ConJur — O que levou à pressão para diminuição dos honorários e demandas antes da crise?
Thomas Morgan — Uma das mudanças é que os que contratam advogados particulares, normalmente, também são advogados que trabalham dentro da empresa, funcionários de grandes corporações. Eles entendem como os escritórios funcionam e têm tentado um retorno melhor para as suas próprias empresas. Com isso, tem havido pressão e mais poder de barganha do que tinham antes.

ConJur — As empresas também estão mais exigentes?
Thomas Morgan — Sim, a qualidade continua elevada, mas estão exigindo mais. Um exemplo é não cobrar o trabalho dos advogados mais jovens. Eles entendem que os escritórios de advocacia é que tem de treinar os novatos. Logo, não devem cobrar pelo serviço dos estagiários e recém formados.

ConJur — A briga pelos clientes está ferrenha nos Estados Unidos?
Thomas Morgan — A receita dos escritórios de advogados depende de sua capacidade de atrair clientes. Então, eles fazem apresentações hiper elaboradas aos clientes, oferecem honorários mais baixos ou pessoal com mais experiência para determinado caso. Mas isso não é uma competição tão forte. A questão é que, se quiser ter sucesso na venda, haverá esforços vigorosos para ganhar a concorrência.

ConJur — Quais os limites da publicidade para os advogados nos Estados Unidos?
Thomas Morgan — Basicamente, nos Estados Unidos, um advogado pode fazer propaganda nos jornais ou, mais comumente, através de folhetos, material promocional, sites, tudo quanto é tipo de palestras ou seminários para clientes potenciais. Nós chamamos isso de marketing.

ConJur — E o marketing ofende a ética do advogado?
Thomas Morgan — Não. A Suprema Corte sustenta que a proteção constitucional da liberdade de expressão permite esse tipo de marketing contanto que não seja enganador. Antigamente, costumava ser considerado totalmente antiprofissional, mas hoje a maioria dos advogados nem imagina um sistema diferente do atual.

ConJur — No Brasil, a publicidade para os escritórios é restrita. O que o senhor recomendaria para o país?
Thomas Morgan — É muito difícil recomendar, porque grande parte dessa questão é cultural. Eu acho que o sistema que nós temos nos Estados Unidos funciona razoavelmente bem, embora eu, provavelmente, não permitiria anúncios que não transmitam informação. Permitiria anúncios menos catastróficos, dramáticos ou sensacionais.

ConJur — O que o senhor acha das fronteiras nacionais para prestação de serviços jurídicos?
Thomas Morgan — Meu ponto de vista é que essas restrições terão que acabar. Com o comércio internacional, o trabalho de qualquer cliente não para nas fronteiras nacionais. Os advogados, cada vez mais, vão ter que fazer algum trabalho que tem consequência em outro país. Nós vimos isso em estados dos Estados Unidos, onde tivemos restrições similares. Não funciona. Ninguém pode defender um cliente em apenas uma jurisdição estadual.

ConJur — O senhor acha que a tendência do Direito é unificar leis e códigos também?
Thomas Morgan — Acho que haverá uma pressão para que isso ocorra. As atividades das empresas ou mesmo das pessoas físicas, que têm famílias em outros países, fazem com que exista uma demanda crescente por um conjunto de leis similares aplicáveis, onde quer que a pessoa esteja. Por outro lado, há diferenças individuais nas culturas e países que tornam impossível um sistema legal uniforme.

ConJur — E quanto a ter uma Justiça privada e não pública?
Thomas Morgan — Nós já temos isso. A arbitragem é importante tanto nos Estados Unidos quanto no exterior. Eu não vejo a arbitragem como uma rejeição aos tribunais, mas como uma alternativa. Permite que as pessoas deixem os problemas nas mãos de especialistas em vez de juízes tradicionais. Eu acho ótimo que se possa deixar uma questão com pessoas capazes de compreender os detalhes técnicos do problema.

ConJur — No Brasil, um dos motivos que favorecem a arbitragem é uma decisão mais rápida do que se a mesma demanda fosse levada ao Judiciário. Nos Estados Unidos, isso também ocorre?
Thomas Morgan — Não é o único fator nos Estados Unidos. A lentidão dos processos é uma das razões. Algumas das nossas Cortes são muito lentas, outras são mais rápidas. Na região de Washington D.C. e no distrito da Virginia, há tribunais chamados de ultra rápido. É possível ter uma resposta rápida mesmo em um sistema público.

ConJur — E como são organizadas as entidades de advocacia nos Estados Unidos?
Thomas Morgan — Cada estado tem uma ordem de advogados. E muitas dessas ordens são agências oficiais do Supremo estadual. Além disso, existe uma ordem independente, a America Bar Association, a Ordem dos Advogados americanos. Os advogados se associam, mas não é obrigatório.

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