Método de investigação

Congresso precisa detalhar uso de agente infiltrado

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12 de maio de 2009, 19h19

É preciso que o legislador discipline a infiltração de agentes para que ela comece a ser usada como método de investigação. A opinião é da juíza da 6ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, Ana Paula Vieira de Carvalho, que falou sobre o instrumento investigatório no seminário Crime organizado: mecanismos de combate e reflexos no Estado Democrático de Direito, no Tribunal de Justiça fluminense nesta terça-feira (12/5).

Segundo a juíza, além de ser pouco debatida, a infiltração como método de investigação é pouco utilizada. Ela mesma diz nunca ter autorizado o instrumento. Mais do que isso, a juíza, que já atuou em casos de grande repercussão como o banco Marka e a Operação Furacão, diz que nunca lhe foi solicitado o uso de agente infiltrado em uma investigação.

Para a juíza, além de uma questão cultural, a própria lei impõe dificuldades. A previsão vaga, constata, não oferece segurança ao juiz, ao Ministério Público ou à Polícia para adotar a estratégia nas investigações. Segundo Ana Paula Vieira, na legislação brasileira há uma simples menção à técnica e à necessidade de autorização judicial para colocá-la em prática.

O juiz Sérgio Moro, da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba, afirmou à Consultor Jurídico que já autorizou duas infiltrações, uma bem sucedida e outra não. Ele explicou que a infiltração pode ser desde uma interação rápida de um agente disfarçado de consumidor de droga, por exemplo, até alguém infiltrado em uma complexa organização criminosa por anos.

Para o juiz, a crítica em relação à legislação lacônica sobre o assunto é pertinente, mas ele considera melhor leis que dizem pouco do que uma legislação ruim. Moro acredita que o aprimoramento do uso dos instrumentos na prática, ao saber o que funciona e o que não funciona, ajudarão o legislador a regrar a matéria. 

Infiltrar um agente do estado em uma organização depende de fornecer a ele toda uma estrutura que passa por identidade, passaporte e até contas do dia-a-dia com nome que não o da pessoa. O juiz afirma que a própria administração pública pode conceder, por exemplo, uma transferência ao infiltrado depois de terminada a participação dele no caso. "Nem tudo precisa de lei", diz. Mas, lembra, a previsão em lei dá mais segurança.

Experiências internacionais

Ana Paula Vieira dá dicas de como suplantar o vácuo legislativo: aproveitar as experiências de outros países no assunto. Ela cita as legislações de Alemanha e Espanha. Na Alemanha, por exemplo, explica a juíza, o agente pode começar a agir com autorização do Ministério Público. Como há a necessidade de autorização judicial quando o agente tem de entrar na casa dos investigados, na prática, a infiltração acaba tendo respaldo do Judiciário. Já na Espanha, é definido o prazo de seis meses para a infiltração, prorrogáveis mediante justificativas.

Para Ana Paula Vieira, embora não haja previsão em lei brasileira, é importante que o juiz especifique a atuação do agente. Além da autorização judicial para o uso do método, obrigatoriedade que a juíza entende prudente a lei ter estabelecido, cabe definir um prazo e o alcance da infiltração, demonstrar que é um meio imprescindível para obtenção de provas e limitar a atuação do agente. Ela lembra que, eventualmente, o infiltrado poderá cometer um crime para não ser descoberto pela organização. O juiz tem de analisar se o crime cometido é proporcional à finalidade da investigação e se não foi provocado ou incentivado pelo próprio infiltrado.

Outro ponto abordado pela juíza se refere ao depoimento em juízo. Segundo ela, as cortes europeias entendiam que o agente infiltrado não poderia manter a identidade em sigilo, pois prejudicaria a defesa. Prevaleceu a ideia, explica, de que revelar a identidade do agente impossibilita o uso de um meio de investigação necessário para combater a criminalidade em tempos de globalização.

Segundo a juíza, não dá para se valer da prova testemunhal clássica para combater os crimes, mais sofisticados atualmente. Como as novas técnicas, em geral, são muito invasivas e colidem com direitos fundamentais, constata, é preciso trabalhar com elas de modo a serem utilizadas em um Estado Democrático de Direito.

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