Grampos em investigação

Conversas irrelevantes não são gravadas nos EUA

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6 de maio de 2009, 17h48

Nos Estados Unidos, a pessoa que tem a conversa interceptada durante uma investigação é informada posteriormente ainda que não seja investigada. A informação foi dada pelo procurador da Divisão de Investigações Especiais de Narcóticos de Nova York, Daniel Zambrano, no Congresso Internacional Organização criminosa e meios eficazes de investigação e prova: a evolução brasileira e a experiência internacional, feito pelo Ministério Público Federal no Rio de Janeiro, esta semana.

Ele explicou que conversas que não interessam à investigação não podem ser gravadas. Se o investigado fala com a mulher ou namorada, a gravação é interrompida. “Temos de desligar o aparelho, para não ouvir a conversa”, afirma. Entretanto, a pessoa é notificada posteriormente. Se o investigado fala com a mãe ou a avó, diz, é enviada uma carta a ela informando sobre a interceptação.

Outro ponto destacado pelo promotor é que, depois que o investigado é preso, a gravação deve ser repassada a ele no prazo de até 15 dias. Caso contrário, a prova obtida é considerada nula.

Daniel Zambrano explicou que, nos Estados Unidos, as regras para interceptação quanto ao prazo é semelhante às brasileiras. Enquanto no Brasil o prazo é de 15 dias, nos EUA, são 30. O promotor contou que, periodicamente, deve-se apresentar um relatório sobre os resultados das interceptações e o prazo pode ser prorrogado indefinidamente.

Outro cenário

No Brasil, a lei fixa 15 dias prorrogáveis. Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça se manifestou contra uma interceptação que durou mais de um ano e meio. O advogado e professor de Processo Penal, Maurício Zanoide, explicou à Consultor Jurídico que a decisão do STJ criou novos paradigmas ao entender que interceptação por longos períodos fere o princípio da proporcionalidade. Na prática, longas interceptações continuam ocorrendo, já que, segundo o professor, a jurisprudência precisa ser consolidada.

Zanoide disse que, no Brasil, não há previsão legal para que uma pessoa que por acaso teve sua conversa interceptada com um investigado fique sabendo da interceptação. Pior do que ter a conversa ouvida e gravada é o conteúdo acabar nos autos de um processo em que não se é investigado.

O professor explica que é isso que acontece na prática. Em vez de se eliminar as conversas totalmente irrelevantes ao caso, todas as transcrições são juntadas aos autos. Por lei, diz Zanoide, a autoridade policial que fez a interceptação tem de entregar a transcrição ao juiz do caso, este instaurar um incidente probatório, ou seja, um auto separado e abrir para que Ministério Público e defesa se manifestem sobre as transcrições que interessam à investigação. Se colocado em prática a dispensa de conversas irrelevantes, diz o professor, se eliminaria casos em que há 30, 40 CDs de conversas telefônicas gravadas. “Apenas 10% é relevante”, diz.

Maurício Zanoide diz que não sabe de conversas que foram descartadas. Ao contrário. Soube de casos em que conversas íntimas, que nada tinham a ver com a investigação, foram mantidas nos autos. Para ele, a perspectiva que norteia a escolha dos Estados Unidos em não gravar o que não serve à investigação tem a ver com a proteção do direito à privacidade exatamente de pessoas que não estão sob investigação, mas que entram em contato com investigados. “Quem tem direito de intimidade reduzido é o investigado, não a mãe dele com quem conversou”, diz.

O advogado lembrou que a interceptação é um meio de se obter prova que, por ser invasivo, não se pode usar como “rede de pesca”. Para ele, o argumento de que não se sabe quando será cometido o crime não é válido e demonstra uma investigação anterior ruim. “Se faz investigação boa, sabe-se que fatos relevantes acontecerão em breve”, diz.

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