Ciência da vida

Biotecnologia não pode ultrapassar limites da ética

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7 de junho de 2009, 9h44

O avanço da biotecnologia levou ao Judiciário questões como reprodução artificial, uso de células-tronco, produção de alimentos geneticamente modificados e clonagem. O desenvolvimento deste conhecimento representa um avanço para a sociedade como um todo. A polêmica, entretanto, está na forma como o conhecimento está sendo usado. Prudência e responsabilidade são os limites para a questão, segundo a advogada Renata da Rocha, doutoranda em Filosofia do Direito pela PUC-SP. Ela participou do painel Biodireito e Bioética: O direito à vida, parte do XXIX Congresso Brasileiro de Direito Constitucional, promovido pelo Instituto Brasileiro de Direito Constitucional nesta semana em São Paulo.

O uso de fertilização in vitro por casais que não teriam qualquer problema em ter filhos, apenas para escolher a cor dos olhos do filho e tentar garantir a ele uma vida saudável, é um tipo de tecnologia que ultrapassa os limites da ética, na opinião de Renata.

Elaborar um design apropriado para o filho, observa o desembargador Renato Nalini, do Tribunal de Justiça de São Paulo, é fazer escolhas por alguém que não foi consultado e, depois, pode ficar insatisfeito com o resultado da sua vida. A confusão entre pessoas e coisas, diz, representará a falência do sistema de simetria das responsabilidades. “Interferir de forma irreversível na vida do outro pode acabar com essa simetria. É isso que vamos enfrentar com a abertura da acessibilidade das células-tronco”, lamenta.

Nalini, que atua na Câmara Especial de Meio Ambiente no TJ de São Paulo, afirma que são comuns processos em que empresas desmatam, destroem a natureza e, com o argumento de que “já não há nada a ser feito”, pedem para que a construção prossiga. O desembargador, que não costuma aceitar alegações como esta, diz que a linha entre desenvolvimento econômico e a preservação do meio ambiente é realmente difícil de ser limitada, assim como na bioética, mas é preciso traçar fronteiras rígidas.

“É urgente recuperar os princípios. A falta de perspectiva ética é o maior risco que sociedade pode correr”, alerta. Ele ressalta que não é contra inovações científicas que podem melhorar a vida, como o uso de células-tronco para produção de órgãos, mas extrapolar esse limite traz dilemas morais, como: “E a vida do embrião?”.

Velha vida nova
Na discussão sobre bioética e biodireito, não existem respostas certas ainda. A falta de conhecimento em relação às consequências do avanço da tecnologia não permite conclusões. Fazer as pessoas refletirem sobre o assunto, por meio de questionamentos, comparações e projeções, é o primeiro passo.

Na discussão sobre alimentos transgênicos, Renata da Rocha lembra que o discurso dos defensores das mutações genéticas era que a qualidade do produto seria bem melhor, a cor dos tomates mais brilhantes e o tamanho maior, sem falar da quantidade. A produção mais rápida e em massa poderia acabar com a fome no mundo. O resultado, diz a advogada, foi o aumento expressivo no preço dos chamados alimentos orgânicos.

Segundo ela, a massificação dos rebanhos mostrou-se um desastre: proliferação mundial de doenças como a vaca louca, gripe aviária e Influenza A. “Esse é o resultado do uso indiscriminado da tecnologia. Será que daqui a 100 anos vamos querer voltar atrás? Isso será possível?”, pergunta.

Renata defende que é preciso reafirmar os valores sociais para que a ciência se desenvolva. “A ciência não pode acabar com a miséria humana, por mais que Galileu quisesse. Uma sociedade livre, justa e solidária se faz com base na ética.”

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