Justiça efetiva

Omissão do Congresso vira processos no STF

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27 de julho de 2009, 14h35

Já há alguns anos o Poder Judiciário age com vigor no vácuo deixado pela atrofia e omissão do Poder Legislativo. Por isso, é alvo frequente de críticas de que está legislando e de que toma para si responsabilidades e atribuições que seriam dos outros poderes. Críticas registradas, o fato é que números revelam que a atual característica ativista do Judiciário, e do Supremo Tribunal Federal em especial, vem encontrando guarida na sociedade.

O crescimento vertiginoso do volume de Mandados de Injunção ajuizados no Supremo a partir do segundo semestre de 2007 demonstra muito bem isso. Na ocasião, o STF tomou duas decisões que modificaram a jurisprudência da corte, que até então dava às decisões em Mandado de Injunção um caráter meramente figurativo. De simbólicas, as decisões da corte neste tipo de ação passaram a ser efetivas.

A resposta social veio em número de processos. Em 2005 e 2006, foram ajuizados 34 Mandados de Injunção no STF. Em 2007, foram 49. Destes, 20 foram ajuizados apenas no mês de dezembro, pouco depois da virada de jurisprudência do Supremo. A partir daí, a subida não parou. No ano passado, a corte recebeu 140 Mandados de Injunção. Este ano, até 23 de julho, foram 662 ações pedindo que o tribunal haja porque o Congresso deixou de fazer o serviço que lhe competia. 

Jeferson Heroico
Número de Mandados de Injunção - Jeferson Heroico

O marco do aumento desse tipo de ação do Supremo são duas decisões tomadas em agosto e outubro de 2007. Na primeira, o tribunal deu a uma servidora o direito de ter contagem diferenciada de tempo de serviço porque exercia atividade insalubre. A Constituição Federal prevê o direito, mas ele depende de regulamentação que deve ser feita por meio de lei. Na falta de atitude do Congresso Nacional, os ministros determinaram que se use como parâmetro a lei que rege a aposentadoria especial na iniciativa privada. A decisão foi tomada em 30 de agosto.

Menos de dois meses depois, ao julgar o direito de greve no serviço público, a corte voltou a declarar quais regras devem ser observadas enquanto o Legislativo não se mexe. Em 25 de outubro de 2007, o Supremo determinou que a Lei de Greve aplicada para a iniciativa privada vale também em casos de paralisação de servidores públicos até o surgimento de lei específica regulando esse direito, conforme exige a Constituição.

A maior parte dos 885 Mandados de Injunção ajuizados no Supremo nos últimos quatro anos e meio dizem respeito exatamente a aposentadoria especial e outros direitos de servidores públicos garantidos pela Constituição, mas negados na prática pela falta de leis que os regulem.

O advogado Saul Tourinho Leal, professor de Direito Constitucional, acredita que o aumento do número de Mandados de Injunção reflete a importância que esse tipo de ação ganhou depois de o Supremo dar efetividade a ela. “Sob a jurisprudência anterior, as decisões em Mandado de Injunção apequenavam o Supremo, pois, na prática, não passavam de um mero comunicado ao Congresso Nacional.”

Sedimentada a partir do pensamento do ministro aposentado Moreira Alves, o tribunal seguia, até então, a teoria não concretista. Pelo raciocínio, o Supremo não poderia dizer a outro poder como ele deveria agir. Muitos também defendiam que, se determinasse a aplicação de qualquer regra, o tribunal estaria atuando como um verdadeiro legislador positivo.

Tourinho Leal defende que não há como acusar o STF de legislar nestes casos. “O Supremo passou muito longe de legislar. Os ministros pegaram leis o que o Congresso já havia tornado disponível para a sociedade e determinaram a sua aplicação”, afirma.

De acordo com a advogada Damares Medina, professora de Direito Constitucional, sob o entendimento anterior, o Supremo havia sepultado o Mandado de Injunção. “O instrumento havia perdido completamente o caráter concretizador do Direito que o constituinte pretendeu dar a ele”. Para a advogada, o número crescente de Mandados de Injunção mostra “como é fina a sintonia” entre o Judiciário e a sociedade. Damares acredita que a ressurreição do Mandado de Injunção tenha vindo na melhor hora: “Hoje há um ambiente institucional e político maduro o suficiente para que o Supremo possa atuar preenchendo lacunas”.

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