Nova gestão

Na posse de Gurgel, Lula faz advertência ao MP

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22 de julho de 2009, 11h57

O novo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, tomou posse nesta quarta-feira (22/7), em Brasília. Ele substituiu Antonio Fernando de Souza, que deixou o cargo em junho. Durante a cerimônia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez uma dura cobrança — e uma advertência — ao Ministério Público Federal: ou os procuradores param com o mau hábito de acusar pessoas sem provas ou a instituição acabará sendo alvo de uma reação dos prejudicados.

A bronca, inesperada, foi dada de improviso — depois que o presidente se derramou em elogios lendo o discurso preparado para a ocasião. Os abusos impulsionados por denúncias sem consistência, disse o presidente, prejudicam a imagem dos acusados, mas também do MP. O auditório estava cheio, mas não lotou. Diversas autoridades deixaram de comparecer, embora tenham ido à posse ministros de estado e procuradores gerais de Justiça dos estados.

O presidente Lula enfatizou que o único fator de pressão e balizador da consciência do procurador-geral e dos membros do MP devem ser as garantias constitucionais. “Caso contrário, nós estaremos absolvendo culpados e condenando inocentes, e não pode ter nada pior do que um procurador, um político, qualquer um ser humano, procurar fazer da sua atividade profissional, que pesa muito sobre a liberdade das pessoas, um show de pirotecnia antes de ter o processo final apurado, indiciado e julgado.”

Ele observa que, no Brasil, “dependendo da carga de manchetes da imprensa, a pessoa já está condenada”. Para o presidente Lula, é preciso responsabilidade no MP para que cumpra a sua missão com maior lisura. (Clique aqui para ler o discurso do presidente Lula)

Lula enfatizou que nomeou o mais votado, mas que antes quis saber quem era Gurgel, uma vez que não conhecia antes. Em seu discurso, Gurgel afirmou que a luta contra a corrupção prosseguirá sem trégua. “Multiplicaremos nossos esforços contra a criminalidade organizada de modo geral e contra a evasão de divisas, a lavagem de dinheiro, o ataque à integridade do sistema financeiro, o trabalho escravo, o tráfico internacional de pessoas e drogas, delitos que reclamam ênfase especial, sem deixar de agir nas demais frentes que integram o elenco de nossas atribuições”, afirmou.

Gurgel em seu discurso ressaltou, ainda, que o Legislativo, o Executivo e o Judiciário podem contar com o Ministério Público para o desempenho de suas funções constitucionais e que a instituição não se prestará a servir de instrumento de enfraquecimento de qualquer dos poderes. Para ele, o MP não conseguirá cumprir suas tarefas constitucionais sem a mais ampla interlocução com o parlamento, o Executivo e o Judiciário. "A ampliação da interlocução também deve compreender a advocacia brasileira e a aproximação com a sociedade. Estado e sociedade devem estar unidos para minorar os graves déficits de igualdade e as injustiças profundas que patrocinam o desrespeito maciço aos direitos fundamentais”, enfatizou.

O presidente Lula afirmou ter orgulho de indicar uma pessoa que, com uma notável carreira de serviços ao Estado e grandes conhecimentos jurídicos, terá capacidade de dar seguimento à brilhante atuação do Ministério Público Federal mantida nos últimos anos. O presidente ressaltou que essa é a quarta vez que indica o membro mais votado entre os pares, o que tem como objetivo reforçar a independência e a solidez do órgão. Para ele, o novo procurador-geral da República tem os desafios de manter a cooperação com os outros poderes da República e de contribuir para aprimorar a Justiça brasileira.  “Tenho a convicção de que o Ministério Público servirá ainda melhor à única autoridade a que deve responder — a sociedade brasileira”, ressaltou.

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, também esteve presente na posse de Gurgel. Ele falou sobre a importância do Ministério Público no país e afirmou que a posse do novo chefe da instituição representa a consolidação de um modelo de renovação, de possibilidade de novos rumos. “É extremamente importante que a cada dois anos se renove essa prática", disse. 

Gilmar Mendes comentou a crítica do presidente Lula à imprensa. Segundo ele, há um reclame grande contra a impunidade que, muitas vezes, leva a esse tipo de juízo definitivo. Para o ministro, essa postura não é apenas da imprensa e, muitas vezes, vem de algum órgão público ou agente público, como um delegado, juiz ou promotor que precipita uma conclusão. “Nunca a imprensa age de forma isolada, é preciso observar isso. Sempre tem uma autoridade que acaba por dar uma informação distorcida. Por isso, sou defensor de um novo estatuto da lei de abuso de autoridade. Estamos compromissados no pacto republicano por essa reformulação”, informou.

Perfil e sabatina
No Senado, Roberto Gurgel recebeu 60 votos favoráveis e cinco contrários. Sua indicação foi aprovada com os votos favoráveis dos 23 senadores presentes à reunião. Nascido em Fortaleza em 1954, Roberto Gurgel é casado e tem dois filhos. Graduado pela Faculdade Nacional de Direito (Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro), atuou como advogado no Rio de Janeiro e em Brasília. Ocupa o cargo de vice-procurador-geral da República desde julho de 2004.

Durante sabatina na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Gurgel prometeu um MP “discreto, independente e transparente”. “A pirotecnia em nada serve ao MP. Temos que ter uma atuação firme, sóbria e discreta”, disse. Ele  afirmou, ainda, que o “Ministério Público não pode ter a pretensão de ter o monopólio da verdade”. Prometeu ampliar a comunicação com a sociedade, Congresso e outros órgãos da Justiça. “A iniciativa de um colega não pode ter um caráter estritamente personalista”, afirmou.

Gurgel afirmou que o MP tem procurado a transparência, "mas ainda há um longo caminho". "Será uma prioridade da minha gestão”, afirmou. Reclamação recorrente entre os políticos, o futuro procurador-geral também criticou o vazamento de informações de processos para a imprensa. “A divulgação antecipada é inaceitável. Nada justifica.” Gurgel, no entanto, foi incisivo ao defender a utilização de escutas telefônicas. “As interceptações autorizadas são um instrumento relevante. Para os crimes de colarinho branco, é uma ilusão achar que meios tradicionais de prova são suficientes.” Com informações da Assessoria de Imprensa do Ministério Público Federal.

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