Vítima da talidomida

União é responsável por efeitos colaterais de remédio

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15 de julho de 2009, 15h45

A União é responsável por fiscalizar medicamentos comercializados no país e, por isso, responde sim pelos efeitos colaterais causados pelos produtos. Este foi o entendimento da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que determinou que a União pague indenização para a segunda geração de vítimas de medicamentos à base de talidomida. A decisão, publicada em abril deste ano, foi tomada em Ação Civil Pública.

O tema será novamente aprecidado nesta quarta-feira (15/7) pelo tribunal. Estará em debate o valor da indenização. Atualmente, cada vítima recebe pensão mensal vitalícia estimada entre R$ 465 e R$ 1,9 mil. O valor depende das sequelas deixadas pelo medicamento. A primeira instância da Justiça Federal definiu a indenização por danos morais em parcela única no valor de 20 vezes o recebido pela pensão. O valor é contestado pelas vítimas, que reclamam o mínimo de 500 vezes o que recebem como pensão pelos danos materiais.

A medicação atingiu pessoas que nasceram entre 1966 e 1998 com encurtamento dos braços e pernas e falta de mãos e dedos, entre outras deficiências físicas. A talidomida foi usada em vários países. A droga foi vendida no Brasil entre 1957 e 1965 para combater enjoos da gravidez. Depois ficou comprovado que era capaz de atacar o feto

O uso da talidomida foi proibido, inicialmente, em 1962, mas a droga voltou ao mercado três anos depois. Em maio de 1966, com a publicação de uma portaria do Ministério da Saúde, a droga foi regulamentada, processo que só foi concluído em 1997. O medicamento é indispensável no tratamento de outras doenças, entre elas a hanseníase.

“Houve omissão da União ao não fiscalizar a produção, a venda, a distribuição e embalagem de tal produto, e assim sendo, tem a responsabilidade de indenizar as vítimas”, afirmou o desembargador Roberto Haddad, relator do recurso da União. O julgamento foi unânime e teve a participação dos desembargadores Salette Nascimento (revisor) e Fábio Prieto. A turma julgadora entendeu que a liberação da droga em 1965, quando o governo já sabia dos efeitos da medicação, comprova que a União não agiu com a prudência necessária, permitindo o surgimento da segunda geração de vítimas da doença.

“A União tinha e tem o dever de exigir que na embalagem do produto estejam assinaladas as possibilidade da ocorrência de efeitos colaterais nefastos, como os relatados nos autos, além de proibir a venda de tais produtos à população sem que seja por receita médica, pois há casos em que tal produto até hoje é usado”, disse o relator.

A ação foi proposta pela Associação Brasileira dos Portadores da Síndrome de Talidomida (ABPST). O caso tramitou na 7ª Vara Federal de São Paulo, que aceitou parcialmento a reclamação da entidade. A juíza de primeira instância condenou a União a pagar de uma única vez indenização correspondente a 20 vezes o valor da pensão paga, mensalmente, pelo INSS. A pensão, de caráter especial, foi estabelecida pela Lei 7.070/82.

A ABPST considerou “irrisório” o valor da condenação e apelou ao TRF-3 reclamando o aumento da indenização. A entidade alega que, enquanto outros países proibiram a venda da droga logo que surgiram os primeiros sinais de anomalias, a maioria a partir de 1961, o Brasil só tomou medidas nesse sentido quatro anos depois.

A União também recorreu sustentando que é ilegal as vítimas acumularem indenização por danos morais com a pensão especial. A União alegou ainda que só poderia ser responsabilizada no caso de comprovação de que tinha o dever de impedir o dano e que agiu de forma culposa omitindo-se de agir. A União sustentou também que o valor da indenização era muito alto e que a juíza de primeiro grau não observou o princípio da razoabilidade ao estabelecer o montante a ser retirado dos cofres públicos. Pediu que o TRF-3 reduzisse para cinco salários mínimos o valor a ser pago a cada uma das vítimas pois, do contrário, estaria configurado enriquecimento ilícito do particular em detrimento do erário público.

O relator entendeu que a quantia fixada em primeiro grau como dano moral não era “absurda”, como tentava garantir a União, nem também “módica”, como pretendia a ABPST. “Na indenização por dano material (pensão especial), procura-se repor os valores dos prejuízos causados e usa-se a moeda para tal”, disse o relator. “Na indenização por dano moral, como no caso dos autos, fiza-se a indenização pelos prejuízos estéticos, angústia, dor, sofrimento”, completou Roberto Haddad.

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