SEGUNDA LEITURA

Anuário é ferramenta que permite conhecer o Judiciário

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

12 de julho de 2009, 11h22

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A revista Consultor Jurídico fez, junto com a Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), uma pesquisa sobre os ministros dos tribunais superiores da República, ou seja, Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunal Superior do Trabalho, Tribunal Superior Eleitoral e Superior Tribunal Militar. A iniciativa é louvável. Por muitas razões. Vejamos.

A primeira delas é que o Anuário da Justiça permite aos operadores jurídicos conhecer melhor o Poder Judiciário de seu país. Com efeito, a maioria absoluta dos operadores do Direito espalhados pelo território nacional pouco sabem dos tribunais superiores localizados na capital federal. Qual a competência de cada um, a orientação jurisprudencial e quem são os seus ministros. Para dar apenas um exemplo, poucos profissionais conhecem a competência do Superior Tribunal Militar (na verdade, um Tribunal de Apelação) ou a composição mista do Tribunal Superior Eleitoral.

A segunda é, da mesma forma, importante. O acesso a essas cortes, que nada mais é do que acesso à Justiça, é privilégio de poucos. Somente os bons advogados sabem manejar corretamente os recursos ou ações originárias nas Cortes Superiores. Torná-los conhecidos, através de publicações como a do Anuário, é uma maneira adequada de democratização da Justiça.

A terceira razão é fornecer uma visão clara de cada ministro. A exposição não se limita a uma foto e dados biográficos. Vai além, mostrando elementos da personalidade de cada um. Entre outras informações, estão a origem, atividades profissionais anteriores à nomeação, titulação acadêmica, qual a rotina de trabalho, como recebe advogados, como se posiciona nos conflitos entre o poder público e o setor privado, entre o estado e o cidadão, o contribuinte e o fisco, se é garantista ou legalista.

Nos Estados Unidos, há estudos acadêmicos minuciosos sobre as posições dos juízes da Suprema Corte. Há pesquisas sobre a orientação de cada “Justice”, quais pertencem à ala liberal, quais são mais conservadores, quem lidera as opiniões e outras tantas tendências nos seus julgamentos.

Tal análise pode ser encontrada no “The Supreme Court Yearbook, Kennet Jost, Congressional Quaterly Inc., 1994, pgs. 6-12”. Nela se verá, por exemplo, que a juíza Ginsburg destacou-se por apoiar a defesa dos direitos civis e induziu a que se evitasse denominar profissões por sexo (por exemplo carteiro, que pressupunha apenas homens). Kennedy alcançou o maior número de votos dissidentes. Sandra O´Connor combinava posições intermediárias com conservadoras. Souter notabilizou-se como liberal. Rehniquist, como conservador.

O alinhamento dos juízes, as tendências exteriorizadas nos seus votos, foram contabilizados e expostos em gráficos, com os percentuais de concordância entre um e outro (ob. cit., p. 9). Uma autêntica radiografia das posições de cada um individualmente e com cada um de seus colegas.

Mas, perguntará o mais ingênuo, que interesse há nisso?

A resposta é simples. A clareza nas posições dos que conduzem as decisões judiciais torna mais segura a aplicação da Justiça. Um escritório norte-americano, antes de tentar um recurso à Suprema Corte, sabe exatamente qual o percentual de possibilidade de vitória. E se ele for baixo, poderá optar por um acordo, ainda que menos vantajoso do que uma possível vitória.

O oposto dessa visibilidade é o desconhecimento da tendência de um tribunal. Se os julgamentos são feitos de forma massificada, contraditórios em uma mesma turma, eventualmente do mesmo magistrado, óbvio que não existe segurança alguma. Como um advogado poderá orientar seu cliente se um tribunal, por suas turmas ou câmaras, julga ora em um, ora em outro sentido?

Pois bem, pesquisa como a que foi feita no Anuário é um passo importante para o conhecimento e a previsibilidade das decisões dos tribunais superiores. E revela também uma nova postura dos ministros. No passado, dificilmente, emitiriam suas opiniões ou se deixariam fotografar. No Anuário, ainda que alguns prefiram omitir-se nas respostas, muitos opinaram com franqueza sobre temas polêmicos, como o juiz oriundo do quinto constitucional e o controle da Polícia Federal pelo Poder Judiciário.

Mas a pesquisa vai além do Judiciário. Passa pela Procuradoria-Geral da República e o então procurador-geral, Antonio Fernando Souza, que a conduziu com discrição, coragem e competência, pela Advocacia-Geral da União e seu titular, ministro José Antônio Toffoli, pelo poderoso Conselho Nacional de Justiça, presidido pelo ministro Gilmar Mendes, também presidente do STF, pelo Conselho Nacional do Ministério Público, Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Tribunal de Contas da União e Conselho Administrativo de Recursos Fiscais.

A iniciativa é oportuna e o Anuário será presença obrigatória em todos os escritórios de advocacia de nível mais elevado, além de tribunais, órgãos do Ministério Público e universidades, nestas dando suporte às pesquisas sobre o Poder Judiciário, tema que vem despertando interesse crescente.

No mais, revela-se o Anuário mais um passo na busca de transparência do Poder Judiciário, desta feita dado pela iniciativa privada e não pelo Poder Público. Esta e outras tantas medidas que vêm sendo tomadas nos últimos quatro anos (por exemplo, o fim da secular prática do nepotismo), farão com que a Justiça seja mais respeitada pelos brasileiros.

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