Prisão em Cuba

Suspenso o julgamento de presos de Guantánamo

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21 de janeiro de 2009, 16h16

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Guantánamo - por thepeoplesvoice.orgDois juízes militares suspenderam por 120 dias os julgamentos contra seis acusados de terrorismo nos Estados Unidos, presos em Guantánamo. O juiz militar Patrick Parrish que cuida do processo contra o canadense Omar Khadr, acusado de crimes de guerra, foi o primeiro a atender o pedido feito pelo presidente Barack Obama. O outro juiz, Stephen Henley, é responsável pelos processos de cinco acusados de participar da organização dos atentados de 11 de setembro. "A defesa não se opõe à moção", disse Jo Dellavedova, porta-voz dos tribunais militares. As informações são do The New York Times.

Essas decisões podem agora brecar o andamento jurídico de outros 15 casos.  De acordo com as agências Reuters e Associated Press, Obama pretende fechar Guantánamo em até um ano.

Logo após a sua posse, Barack Obama mandou a Procuradoria Militar dos Estados Unidos pedir a suspensão temporária dos processos contra os demais detentos da prisão em Cuba. É a primeira medida efetiva contra a prisão da Base Naval de Guantánamo (a 144 km de Miami), desde que foi criada em 11 de janeiro de 2002. Para lá, foram enviados os prisioneiros capturados pelas forças dos Estados Unidos que invadiram o Afeganistão depois dos atentados contra as torres gêmeas de Nova York, em 11 de setembro de 2001. Outros suspeitos de terrorismo também foram enviados para a prisão.

Desde sua inauguração, já passaram pela ilha 775 prisioneiros, classificados como “inimigos combatentes”, sem acusação, processo ou julgamento. Entre os presos, 17 eram menores de 18 anos. Hoje, estão na prisão 430 prisioneiros de 35 diferentes países, mas nenhum americano.

“Nunca uma questão aproximou tanto jornalistas e advogados nos EUA, desde a luta pelas igualdades nos anos 60. Guantánamo é o supra-sumo do jornalismo, direito e cidadania”, disse Chuck Lewis, em Londres, em 2005, quando ele anunciava, no congresso do International Consortium of Investigative Journalism, que o “melhor do jornalismo” deveria ser praticado para investigar a prática, instituída pelo ex-presidente George W. Bush, chamada de rendition. A melhor tradução para o português é “rendição extraordinária, sem advogados”. A expressão foi criada nos Estados Unidos graças à prisão de Guantánamo. Clique aqui para obter mais detalhes, em inglês.

Por essa prática de rendition, suspeitos de terrorismo eram levados para locais desconhecidos. E passavam a não ter direitos de verem seus advogados. As oitivas desses extraditados pela CIA dispensam acompanhamento do caso por advogados.

Todas as armas

O Congresso americano aprovou o Ato Patriótico, um pacote legislativo gerado pelo temor aos terroristas, 45 dias após o 11 de setembro sem nenhuma consulta à população. O significado da expressão Patriotic — Provide Appropriate Tools Required to Intercept and Obstruct Terrorism — explicava a intenção do governo Bush: gerar ferramentas necessárias para interceptar e obstruir atos de terrorismo.

As oitivas, nesses padrões, eram feitas em Guantánamo no chamado Campo Delta. Ali, as celas medem 2 x 2,5 metros. Cães pastores costumavam acompanhar os interrogatórios. Tudo isso a dois quilômetros do chamado GTMO Getaway Weekend: um hotel de 134 quartos, que cobra apenas US$ 7,00 para que cidadãos norte-americanos, selecionados, passem ali seu final de semana. Há 1,8 militares na base. Com ela, o governo americano gasta US$ 95 milhões ao ano.

Os detalhes das oitivas sem advogados foram revelados pela primeira vez em 11 de janeiro de 2007, numa carta escrita por Jumah Al-Dossari, hoje com 35 anos. Ele foi preso no Paquistão em 2001, sob acusação de ajudar Osama Bin Laden. Tentou o suicídio 12 vezes em Guantánamo. Em 15 de outubro de 2005, conseguiu ver seu advogado na base. Tentou enforcar-se na presença dele, no banheiro. Essa tentativa o deixou com uma vértebra quebrada e 14 pontos no braço direito.

A carta que Jumah Al-Dossari entregou ao jornal Los Angeles Times foi a principal peça empregada, pelos advogados dos detentos de Guantánamo, na luta contra os atos de George W. Bush. Alguns trechos da carta diziam: “Me mantiveram em salas geladas durante horas. Me embrulharam nu, na bandeira israelense. Me bateram até eu perder a consciência. Me privavam do sono, obrigando-me a ouvir música em volume extremamente alto e iluminavam meu rosto com luzes fortíssimas. Fui privado de comida, água, e de poder ir ao banheiro, por meses”.

Comportamento jurídico

O presidente Bush teve apoio velado da maior parte dos juízes dos Estados Unidos sobre as práticas de inquéritos na Base Naval de Guantánamo. Mesmo depois de seu ex-secretário de defesa, Donald Humsfeld, ter tornado público que viera dele a determinação de fazer interrogatórios com o uso da ameaça de cães e tortura física e psicológica.

Em junho do ano passado, a Suprema Corte americana chegou a decidir que os 255 presos de Guantánamo dispunham de direito de contestar suas prisões, desde que em ações ajuizadas em cortes federais. Mas, segundo o The New York Times, quatro meses depois da decisão da mais alta corte daquele país, nenhum juiz federal se habilitou a julgar pedidos de advogados de presos. O argumento esgrimido pela administração Bush, por meio do Departamento de Justiça, é que apenas “juízes militares podem decidir o futuro dos presos de Guantánamo”.

O jornal The New York Times sustentou que, na surdina, a administração Bush assoprava aos juízes federais, nos bastidores, que “em tempos de guerra apenas cortes marciais podem decidir pelos detentos de Guantánamo”.

A Suprema Corte dos Estados Unidos negou, em 2007, o pedido de indenização na ação ajuizada por um alemão que alegou ter sido seqüestrado pela CIA, a central de inteligência americana, sob acusação de ser terrorista. Khaled el-Masri sustentou que foi torturado durante cinco meses por agentes.

El-Masri apresentou detalhes sórdidos à Justiça. Disse ter sido colocado num centro de tortura em Cabul, no Afeganistão, chamado “Poço de Sal”, onde teria sido espancado e sodomizado com objetos. O alemão queria uma recompensa de US$ 75 mil.

A administração George Bush sempre obteve vitórias nesses casos em cortes inferiores.

A Anistia Internacional, com sede em Londres, crê que funcionários de Guantánamo passem a ser processado em outros países. Em janeiro de 2007, um Juizado de Instrução italiano indiciou 26 norte-americanos, a maioria agentes da CIA, e mais cinco italianos pela participação em um seqüestro de um religioso muçulmano em Milão, em 2003. O clérigo egípcio Osama Mustafa Hassan teria sido capturado por funcionários da agência de inteligência americana na Itália, em fevereiro de 2003, e levado para o Egito. Tudo dentro do sistema de “rendition”.

[Foto: www.thepeoplesvoice.org]

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