Calote do estado

Governo de SP briga para não pagar dívida secular

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17 de janeiro de 2009, 3h17

O governo de São Paulo tem, pelo menos, um grande problema pela frente: a obrigação de pagar um precatório no valor de mais de R$ 276 milhões. O caso diz respeito à briga pela posse de glebas de terras no município de Palmital, localizado na região de Bauru, a 420 quilômetros da capital paulista. O litígio passeia pelo Judiciário paulista há mais de um século e envolve área de 5,6 mil alqueires paulistas, que foi cortada pelos trilhos da Estrada de Ferro Sorocabana.

A palavra final será do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, que precisa decidir de uma vez sobre um dos maiores sequestros de rendas públicas determinado pela Justiça estadual. O valor exato é de R$ 276.841.156,07. O colegiado já adiou por duas vezes o julgamento de recurso da Fazenda do Estado.

Em 1907, o governo invadiu a Fazenda Palmital, que pertencia a Porfírio Alvarez da Cruz. A primeira sentença judicial foi proferida 50 anos depois. A decisão definitiva aconteceu em 1988, quando a Justiça paulista mandou indenizar em US$ 90 milhões os descendentes do fazendeiro Alvarez da Cruz. Na época, eram 16 pessoas de três famílias.

Desde essa decisão, a Fazenda do estado vem protelando, por meio de recursos, o pagamento do precatório. Agora, pede Mandado de Segurança para impedir o cumprimento de decisão do presidente do Tribunal de Justiça, que determinou o sequestro de bens dos cofres estaduais.

No recurso que está sendo julgado pelo Órgão Especial da corte, o relator, Penteado Navarro, votou pela suspensão do pagamento e o revisor, Ivan Sartori, apresentou voto contrário contra a suspensão do seqüestro. O desembargador Boris Kauffmann interrompeu o julgamento na quarta-feira (14/1) com pedido de vista.

Ganhar tempo

Um dos mais recentes capítulos dessa história, que já ganhou contornos de novela jurídica, aconteceu em 2007. Na época, o então presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Celso Limongi, determinou o sequestro de R$ 276,8 milhões do governo estadual para o pagamento do precatório. Limongi determinou que a dívida fosse quitada em 10 parcelas iguais de R$ 27,6 milhões.

O parágrafo 4º, do artigo 78, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), disciplina que o presidente do tribunal deve, vencido o prazo ou em caso de omissão no orçamento, a requerimento dos credores, determinar o sequestro de recursos financeiros do executado. Ou seja, permite o sequestro desde que o prazo esteja vencido sem a quitação da dívida.

O ato do presidente do TJ paulista ao determinar o sequestro de verbas públicas para o pagamento de dívida vencida é entendido como meramente administrativo, e não jurisdicional. A matéria já é reconhecida pela Superior Tribunal de Justiça, por meio da Súmula 311.

Mesmo assim, insatisfeito, o governo paulista entrou com diferentes recursos para adiar o cumprimento da decisão. Primeiro, ingressou com Embargos de Declaração, depois, Agravo Regimental, e, por fim, pediu Mandado de Segurança. Alega que o valor devido não corresponde ao cálculo feito pelo Departamento de Perícias do Tribunal de Justiça.

No recurso, a Fazenda do Estado pede a cassação da ordem de sequestro até a produção de nova perícia contábil ou, alternativamente, o seqüestro de R$ 143,7 milhões, em 10 parcelas, valor que governo paulista reconhece como devido. A Fazenda alega que o sequestro atinge verba indevida, pois o cálculo feito abrange parcelas de juros moratórios a que os credores não têm direito.

Mau pagador

Na outra ponta da briga, estão os herdeiros – os espólios de Syllas Camargo Schreiner e Leonel Braga e também os parentes de Noêmia Rodrigues Motta e Rubens Lazzarini. A defesa deles sustenta que o débito foi consolidado em 4 de outubro de 1988, quando da promulgação da Constituição Federal, e pedem o sequestro imediato do valor calculado para a aplicação da justiça.

De acordo com os credores, a Fazenda do Estado está criando obstáculos ao pagamento do precatório desde outubro de 2007. Os advogados argumentam que o precatório foi excluído do orçamento e da contabilidade do estado a partir de 1994 e desconsiderado como dívida.

A defesa dos credores acusa de ilegal a supressão do precatório das finanças públicas. Afirma que isso não foi explicado pela Fazenda do Estado que, segundo os advogados, só se empenham em retardar o pagamento porque a condenação tem um valor elevado.

“A Fazenda do Estado é inadimplente. Precisa pagar o que deve”, afirmou o desembargador Ivan Sartori durante a sessão do colegiado. “Há erro no cálculo da dívida. A perícia contábil fez uma conta incorreta, incidindo juros sobre juros”, rebateu o relator, Penteado Navarro. “Não existe esse erro. O que houve foi a consolidação do débito, depois da moratória, como manda a Constituição”, voltou à carga o desembargador Sartori.

A divergência no colegiado mais importante do Tribunal de Justiça paulista coloca em evidência a discussão sobre uma prática corriqueira da Fazenda do Estado que, mesmo quando inadimplente e obrigada a cumprir a lei, tenta postergar ao máximo o pagamento de seus débitos. A decisão pode sair na próxima quarta-feira (21/1).

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