Dívida pública

Leilão de precatórios por fisco devedor é imoral

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1 de janeiro de 2009, 23h00

Há muito tempo, a penhora de precatórios vem sendo aceita como garantia do juízo em execuções fiscais. Em um primeiro momento, houve entendimento no sentido de que o precatório equivaleria a dinheiro, para fins de penhora, enquadrado em primeiro lugar no rol do artigo 11 da Lei 6.830/80, e do artigo 655 do Código de Processo Civil.

Atualmente, o entendimento consolidado perante o Superior Tribunal de Justiça é de que a penhora de precatório equivale à penhora de crédito e, portanto, aplicável ao caso a regra do artigo 673 do CPC.

Passado algum tempo da pacificação desse entendimento perante o STJ, vem à tona a questão dos efeitos posteriores da penhora desse tipo de crédito. Ou seja, aplica-se a regra do caput do artigo 673 do CPC, onde o credor se sub-roga nos créditos penhorados, ou a exceção prevista no parágrafo 1º, onde, se observado o prazo descrito — dez dias a contar da penhora —, o credor poderá optar pela venda em leilão do crédito penhorado.

Pois bem. As primeiras insurgências a respeito da alienação judicial de créditos de precatórios estão batendo às portas dos tribunais, e é chegada a hora de o Judiciário resolver a questão sem aplicar somente a letra fria da lei, mas dirimindo todas as discussões que envolvem esse tipo específico de penhora. O crédito de precatório não é um crédito comum, mas um crédito sui generis, de dimensões muito maiores do que previu o legislador ao criar o parágrafo 1º do artigo 673 do CPC.

Por possuírem certas particularidades, distinguem-se dos créditos comuns, razão pela qual a penhora sobre os mesmos merece atenção dobrada até o desfecho da relação jurídica posta na ação executória, sob pena de a aplicação indiscriminada do parágrafo 1º do referido artigo ferir princípios de maior grandiosidade.

Temos que a penhora de precatórios em execuções fiscais, especialmente por representar a penhora de um crédito devido ao executado pelo próprio exeqüente, não estaria abrangida pela esfera de aplicabilidade do parágrafo 1º do artigo 673 do CPC, porquanto não é crível o ente público ter interesse em leiloar um crédito que ele mesmo está obrigado a adimplir.

Neste diapasão, o ente público, como devedor do crédito de precatório penhorado, deve atentar, incondicionalmente, ao princípio da moralidade, e optar pela sub-rogação em referido crédito, homenageando, também, o direito de propriedade, o princípio da coisa julgada, da economia processual, entre outros.

Desta forma, no caso da penhora de precatórios, incidiria somente a “regra” do artigo 673 do CPC onde o credor fica sub-rogado nos direitos do devedor até a concorrência de seu crédito.

Mas, infelizmente, a realidade que os credores dos precatórios estão enfrentando é totalmente diversa, uma vez que o ente público tem travado verdadeiras disputas pela alienação judicial de referidos créditos, e o faz mesmo quando já perdido o prazo de dez dias, contido na exceção prevista no parágrafo 1º do artigo 673 do CPC, e postulando, ainda, a inacreditável avaliação de referidos créditos.

Assim, nos perguntamos: será que o Estado pretende que um precatório, que é o invólucro de uma decisão judicial transitada em julgado, seja pecuniariamente avaliado?

É moralmente possível dar um preço para cada decisão judicial e bater o martelo pela melhor oferta? Algumas valeriam mais que as outras?

Afora o total desrespeito que os malfadados leilões representam para o Poder Judiciário e para com os credores dos precatórios, em face da gritante afronta ao princípio da moralidade, ainda existe a afronta ao direito de propriedade e à coisa julgada, pela sombra da possível avaliação de referidos créditos.

Não podemos olvidar que um precatório, após ser expedido, sofre atualização monetária até a data do efetivo pagamento. Assim, não há que se falar em avaliação deste crédito, seja por respeito à coisa julgada, seja por respeito ao próprio crédito e ao direito de propriedade de quem o possui.

Pois bem. Pelas particularidades que existem somente na penhora de precatórios devidos pelo próprio exeqüente é que deve ser aplicada, irrevogavelmente, a regra da sub-rogação, pois mesmo havendo a exceção no parágrafo 1º do artigo 673 do CPC, a lide deve ser resolvida com supedâneo no princípio da moralidade pública, no direito de propriedade e em respeito à coisa julgada.

Sob este prisma, é possível perceber que o legislador, ao dispor sobre a penhora de crédito, sequer vislumbrou a possibilidade de o mesmo ser devido pelo próprio exeqüente, ente público, ou que este tivesse a torpeza de invocar benefício tão absurdamente ilegal e imoral, sem temor de punição por litigância de má-fé.

Mas o fato é que o credor caloteiro tem requerido que o seu cheque sem fundos seja levado a leilão para pagar a si mesmo (e aqui vale o pleonasmo), sem sofrer penalização por retardar a Justiça e desdenhar do princípio da moralidade, que deve pautar a administração pública.

A Justiça precisa ser exemplar em tentativas vis de procrastinação processual em absoluto desrespeito a todos os princípios legais e morais, penalizando o infrator para que fatos idênticos não se repitam.

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