Carnaval público

TCU lista processos sobre repasse de dinheiro ao MST

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26 de fevereiro de 2009, 20h15

O ministro Ubiratan Diniz de Aguiar, presidente do Tribunal de Contas da União, determinou, nesta quinta-feira (26/2), que a assessoria técnica do tribunal faça um levantamento dos processos que tratam do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. No Ministério Público Federal de São Paulo e Pernambuco, procuradores já investigam possíveis irregularidades nos repasses do governo federal ao movimento.

Em Presidente Prudente (SP), quem cuida do caso é o procurador Luis Roberto Gomes. No MPF de Pernambuco, seis procedimentos administrativos foram abertos desde 2001 para investigar os repasses ao MST.

Na quarta-feira (25/2), o ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal, criticou as invasões e cobrou atuação do MP para verificar a legalidade dos financiamentos públicos ao movimento. “O termômetro jurídico sinaliza que há excessos e é preciso realmente repudiá-los”, afirmou. Ele lembrou que o repasse de dinheiro público a quem comete crimes é ilegal.

O pronunciamento do ministro foi provocado pelo chamado Carnaval Vermelho. Na noite de domingo (21/2), grupos de sem-terra ligados a José Rainha Júnior, líder dissidente do MST, invadiram 20 fazendas no Pontal do Paranapanema (SP). Em São Joaquim do Monte (PE), no sábado (21/2), quatro seguranças de uma fazenda foram mortos pelos sem-terra. A investigação das mortes será feita pelo Ministério Público pernambucano. Dois integrantes do movimento suspeitos foram presos.

Segundo o MST, o Carnaval Vermelho mobilizou cerca de dois mil militantes. Rainha disse que foram ocupadas fazendas tidas como improdutivas. Nesta quinta-feira (26/2), o líder afirmou que irá desocupar as propriedades. Ele explica que se trata de um gesto de boa vontade para dialogar com o governo paulista de José Serra (PSDB). Segundo o secretário da Justiça do estado, Luiz Antonio Marrey, as invasões são políticas. A União Democrática Ruralista pediu a prisão de Rainha e de seu braço direito, Sérgio Pantaleão. O pedido foi feito no Ministério Público do estado, que ainda não decidiu.

O MST afirmou, em nota, que Rainha não faz parte de nenhuma instância do movimento e, por isso, ele não pode falar em seu nome. Para os sem-terra, as ocupações são importantes ferramentas na luta pela terra. O movimento promete continuar a invadir terras.

Sistematicamente rejeitadas

O levantamento do TCU tem importância porque, nos últimos anos, as contas do MST têm sido sistematicamente rejeitadas pelo órgão, que é subordinado ao Legislativo. Os problemas dessas contas, segundo os ministros do TCU, variam de notas frias a desvio das finalidades do dinheiro.

As auditorias fizeram com que o governo Lula diminuísse os repasses. As investigações do TCU começaram a ter mais força na CPI da Terra, instalada no Congresso em 2004. Ao final da comissão, dois anos depois, o Congresso recomendou ao tribunal que investigasse com maior rigor as contas dessas entidades. Só ano passado saíram quatro acórdãos rejeitando as contas das grupos vinculados ao movimento.

Dinheiro federal

Levantamento da ONG Contas Abertas revela que, nos últimos sete anos, o governo federal repassou R$ 49,4 milhões para o MST. Desde 2004, o movimento organizou mais de 300 invasões a propriedades privadas.

As instituições do MST que mais receberam dinheiro público, por meio de convênio, foram o Instituto de Tecnologia de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária (Iterra), a Associação Nacional de Cooperação Agrícola (Anca), a Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária (Concrab) e a Associação Nacional de Apoio à Reforma Agrária (Anara).

Outras entidades também participam do movimento, mas não assumem explicitamente esta condição. Desde 2002, o maior montante de recursos foi destinado a Anca, do Movimento de Libertação dos Sem Terra, R$ 23,8 milhões. Já no ano passado, a Concrab recebeu 90% dos recursos repassados ao MST, R$ 1,3 milhão de um total de R$ 1,5 milhão.

Essas instituições atuam como receptadoras dos recursos da União porque o MST não tem uma pessoa jurídica. A falta de registro gera discussões sobre a possibilidade de o MST ser processado. Segundo o MST, o dinheiro é usado para projetos de educação rural, construção de moradias, eletrificação, saúde, cultura, produção e comercialização agrícola.

Sem financiamento

Na entrevista coletiva de quarta, Gilmar Mendes lembrou que o Supremo já decidiu, em uma liminar, que é constitucional a Medida Provisória 2.183/01 que proíbe o repasse de recurso público a entidade, organização, pessoa jurídica ou movimento que participa ou colabora com invasão de imóveis rurais ou de bens públicos ou em conflito agrário.

“Temos inclusive uma lei que estabelece a necessidade de que o poder público não subsidie tais movimentos, cesse de repassar recursos para este tipo de movimento. Portanto, o financiamento público de movimentos que cometem ilícitos é ilegal”, afirmou o ministro na entrevista.

A Medida Provisória entrou em vigor em 2001. A norma determina ainda que as propriedades rurais invadidas ficam impedidas, por dois anos, de serem vistoriadas para fins de reforma agrária. Em caso de reincidência, este prazo aumenta para quatro anos.

A MPF foi editada pelo então presidente da República era Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Pouco tempo depois, o PT entrou com uma Ação Direita de Inconstitucionalidade 2.411 contra a MP. No dia 4 de março de 2002, o Plenário do STF seguiu, em decisão liminar, entendimento do ministro Celso de Mello, relator, de que a MP é constitucional. Desde então, o processo estava parado. No entanto, nesta quinta-feira (26/2), ele foi apensando à outra ADI 2.213, que trata da mesma questão.

Nesta última ADI, o ministro Celso de Mello afirmou que “não é lícito ao Estado aceitar, passivamente, a imposição, por qualquer entidade ou movimento social organizado, de uma agenda político-social, quando caracterizada por práticas ilegítimas de invasão de propriedades rurais, em desafio inaceitável à integridade e à autoridade da ordem jurídica”.

Lei para todos

O vice-presidente da OAB, Vladimir Rossi Lourenço, afirmou que "o Estado Democrático de Direito do país e a sociedade brasileira só vão alcançar prosperidade quando não apenas o destinatário da lei mas, também, aquele que a faz se submeterem à própria lei". Para o advogado, a lei deve valer para todos. "A lei vale para os movimentos sociais que reivindicam terras para a reforma agrária. A lei vale para o proprietário e a lei também vale para o governo", afirmou Lourenço.

"A desobediência à lei só acarreta conflitos e não se conseguirá resolvê-los com mais desobediência", alertou o advogado. E concluiu: "Fora da lei não há solução, nem para os movimentos sociais, nem para a sociedade e nem para o governo".

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