MST no carnaval

Gilmar Mendes critica invasões de terra em SP e PE

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25 de fevereiro de 2009, 19h26

O ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal, criticou as invasões de terras em São Paulo e Pernambuco organizadas pelo MST durante o carnaval e cobrou uma atuação do Ministério Público para verificar se existe financiamento público a estes movimentos. “O termômetro jurídico sinaliza que há excessos, e é preciso realmente repudiá-los”, afirmou.

As duas regiões são palco de conflitos agrários que se arrastam há tempos. No entanto, durante o carnaval a temperatura esquentou. Em Pernambuco, foram mortos quatro seguranças de uma das fazendas invadidas. Já no Portal do Paranapanema (SP), 20 fazendas foram invadidas.

Em entrevista coletiva nesta quarta-feira (25/2), Gilmar Mendes salientou que deve ser respeitado o direito de manifestação dos sem-terra, desde que não haja invasão da propriedade. “Se alguém pode invadir sem autorização judicial, ele se torna soberano, e logo está num quadro de ilicitude. É preciso encerrar esse quadro”, disse o ministro. Segundo Gilmar Mendes, o Estado Democrático de Direito não permite a existência de soberanos.

O financiamento público dos movimentos sociais que comentem crimes também foi criticado pelo ministro. “Dinheiro público para quem comete ilícito é também uma ilicitude. E aí a responsabilidade é de quem subsidia”. O ministro chegou a comentar que, por algum tempo, o Estado tolerou excessivamente esse tipo de ação, “talvez um certo paternalismo”, diz o ministro, “Mas isso não é compatível com a Constituição, nem com o Estado de Direito”, concluiu.

Leia a entrevista

Conflitos como os que aconteceram no interior de São Paulo e em Pernambuco extrapolam os limites da legalidade?

Gilmar Mendes — Eu já tinha falado no meu discurso de posse que os movimentos sociais devem ter toda a liberdade para agir, para manifestar, protestar, mas respeitando sempre o direito de outrem. É fundamental que não haja invasão da propriedade privada ou pública. Temos inclusive uma lei que estabelece a necessidade de que o poder público não subsidie tais movimentos, cesse de repassar recursos para este tipo de movimento. Portanto, o financiamento público de movimentos que cometem ilícito é ilegal. É ilegítimo. Essa norma foi submetida a ADI 2.213, aqui no STF, houve uma liminar do relator, ministro Celso de Mello, e o Tribunal rechaçou a inconstitucionalidade pelo menos em sede de liminar.

E o que pode ser feito nesses casos? Porque as invasões foram feitas.

Gilmar Mendes — A Justiça tem que dar a resposta adequada. Há meios e modos jurídicos para se ter uma resposta serena, mas firme. Eu repito sempre: no Estado de Direito todos estão submetidos à lei. Não há soberano. Se alguém pode invadir sem autorização judicial, ele se torna soberano, logo ele está num quadro de ilicitude. É preciso, portanto, encerrar esse quadro.

O senhor acha que há um desmando por parte do poder público nesse caso?

Gilmar Mendes — A sociedade tolerou excessivamente esse tipo de ação. Por razões diversas, talvez certo paternalismo, certa compreensão. Mas isso não é compatível com a Constituição, nem com o Estado de Direito.

O senhor mencionou que a Justiça vai dar uma resposta célere, que resposta seria essa?

Gilmar Mendes — Certamente mandados de reintegração, todas as medidas necessárias. Agora, é preciso que a Justiça dê a resposta adequada, que o Ministério Público tome as providências, inclusive para verificar se não está havendo financiamento ilícito a essas instituições.

A Justiça pode agir de ofício?

Gilmar Mendes — Certamente [a Justiça] está sendo provocada pelos próprios proprietários. No caso de Pernambuco, em que se trata de assassinatos, a ação deve ser tomada pelo próprio MP.

A Justiça tem dado essas reintegrações de posse, há mais de dez anos, mas isso não tem adiantado nada…

Gilmar Mendes — Nós temos esse instrumentário todo à disposição, e é preciso que se sinalize a intolerância com esse tipo de prática.

O senhor acha que o governo está sendo leniente com esses movimentos?

Gilmar Mendes — Não vou falar sobre isso. Eu só estou dizendo que há uma lei que proíbe o governo de subsidiar esse tipo de movimento. Dinheiro público para quem comete ilícito é também uma ilicitude. E aí a responsabilidade é de quem subsidia. A MP é muita clara nesse sentido.

O movimento está se tornando armado, isso preocupa mais a Justiça?

Gilmar Mendes — Com certeza, isso passa a ter outras conotações. Quanto a isso nós temos que dar uma palavra de repúdio a esse tipo de movimento. Liberdade de manifestação, sim. Liberdade de reunião, sim. Mas com respeito ao Estado de Direito.

Os repasses do Ministério do Desenvolvimento Agrário estariam ilegais?

Gilmar Mendes — Tem que se fazer esse tipo de avaliação, e aí cabe ao Ministério Público pedir as informações devidas.

O senhor acha que o MP não tem fiscalizado?

Gilmar Mendes — Não vou emitir juízo. A pergunta do colega indica que está faltando, talvez, uma reação coordenada e ativa nesse sentido.

O senhor defende, nesses casos, o uso da força policial?

Gilmar Mendes — Não vou falar sobre isso. O direito dispõe de toda uma farmacologia para responder a esse tipo de desmando. Mas que se trata de desmando jurídico, e que precisa ter uma resposta, isso é evidente.

Em Pernambuco, quatro seguranças chegaram a ser assassinados. Como o senhor vê isso?

Gilmar Mendes — Em geral, esse tipo de conflito começa com característica de manifestação política, protesto, e tem redundado em violência. Às vezes contra os próprios invasores, às vezes contra pessoas que eventualmente defendem áreas ou terras. Isso na verdade não interessa à ordem pública, não interessa à paz social. O direito deve repudiar isso. O atingido, seja alguém do movimento ou alguém que defenda a propriedade, não interessa para esses fins. É lamentável esse tipo de episódio.

O senhor acha correto o governo continuar apoiando e financiando movimentos como esse?

Gilmar Mendes — Não vou fazer juízo sobre isso. A lei é muito clara, no sentido de que não pode haver incentivo — dinheiro público —para esse tipo de finalidade.

Essas ações estão sendo atribuídas à dissidência do MST. O senhor acha que o MST todo pode ser responsabilizado por isso?

Gilmar Mendes — Isso é coisa para sociólogos. Não vou fazer esse tipo de análise. O que se sabe é que o termômetro jurídico sinaliza que há excessos. E que é preciso realmente repudiá-los.

Existe punição, prevista na lei, para quem continua financiando [esse tipo de movimento]?

Gilmar Mendes — Certamente essas pessoas podem ser acionadas por responsabilidade, se elas estão cometendo um ilícito. Se elas repassam recursos sem base legal, estão operando num quadro de ilicitude. E cabe ao MP, inclusive, por cobro a esse tipo de situação.

Com assessoria de imprensa do STF

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