Pirataria tributária

Município cobra ISS de quem não deve

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15 de dezembro de 2009, 0h54

A Prefeitura de São Paulo vem lavrando autos de infração contra empresas sediadas em outros Municípios, exigindo pagamento do imposto sobre serviços, bem como multas e juros, por entender que esses contribuintes estariam “simulando” a exata localização de suas sedes com o objetivo de pagar o tributo pela alíquota menor.

A questão central nessas autuações é o local do pagamento do ISS, mas há outros aspectos a serem considerados que indicam a existência de procedimentos abusivos por parte do fisco municipal que chegam a tangenciar as raias da criminalidade. Como se sabe, o fisco não pode mentir e em determinadas situações parece que é isso que está acontecendo. 

Em vários casos verificamos que além da autuação por falta de recolhimento do ISS, lavraram-se autos por suposta falta de emissão de notas fiscais e também por não escrituração de livros.

 Nesses casos o fisco paulistano entende que, por não ter sido pago o tributo neste município, deixaram de ser aqui emitidas as notas fiscais, muito embora tenham sido emitidas aquelas correspondentes ao município onde a empresa tem sua sede. 

Esses autos devem ser declarados improcedentes , caso pretendam os órgãos julgadores do município decidir com justiça. Se assim não procederem, perderão a credibilidade enquanto órgãos de julgamento. Afinal, não pode o Fisco alterar a verdade dos fatos, ou seja: não pode mentir. Não existe o direito do fisco considerar como não emitidos, não escriturados, não existentes ou não possuídos livros e documentos fiscais, apenas porque foram adotados e escriturados em outro município, onde o contribuinte tem sede.

Quando o legislador manda aplicar multa àquele que não presta informações, isso decorre do fato evidente de que a omissão destina-se a ocultar, omitir ou suprimir o fato gerador do tributo. Se o contribuinte emitiu documentos fiscais e escriturou livros, ainda que em outro município, está comprovado que agiu sem o ânimo da omissão ou da supressão. 

A Constituição Federal, em seu artigo 37 determina:
“Artigo 37 – A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União,l dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência…”

O mandamento constitucional reflete em todo o arcabouço legislativo do País, razão que obriga seu acolhimento por todos os entes federativos. Exatamente por isso, encontramos na Lei Orgânica do Município de São Paulo o artigo 81, a saber:
“Artigo 81 – A administração pública direta e indireta obedecerá aos princípios e diretrizes da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, razoabilidade, unidade, e indisponibilidade do interesse público, descentralização, democratização, participação popular, transparência e valorização dos servidores públicos.” 

Por outro lado, o artigo 83 da mesma Lei Orgânica obriga a observância do artigo 37 da Constituição Federal, acima transcrito. Ora, aplicar multa por descumprimento de obrigações acessórias que comprovadamente foram cumpridas e, mais que isso, utilizadas pelo fisco, é violar as normas da moralidade e da razoabilidade. E mais: a aplicação de multas proporcionais a mais de 50% do valor do imposto, quando este é exigido em outro auto de infração onde também se aplica penalidade, ainda que prevista em lei, é ato de CONFISCO.

O Fisco não pode alterar a verdade dos fatos e nenhuma lei tem valor contra o texto constitucional para, mediante clara aplicação confiscatória, decretar a morte econômica de uma empresa.

A autuação que altera a verdade dos fatos é ato administrativo NULO que não merece a mínima presunção de legitimidade. Nada é legítimo quando contraria a verdade. A verdade é uma só: se o contribuinte emite documentos fiscais, mesmo que atribuídos a outro município, isso não pode ser simplesmente desconsiderado. 

O fisco paulistano deve rever suas posições no que tange à forma como vem tratando essa antiga questão que é a prestação de serviços por empresas sediadas em outros municípios. Em muitos casos os serviços, pelas suas próprias características, só podem ser prestados em local fora de São Paulo. Ora, se o prestador é de fora de São Paulo e o tomador do serviço também, não há qualquer suporte lógico que autorize a cobrança do ISS pelo fisco paulistano.

Devem os contribuintes, por outro lado, rever suas posições no que tange à manutenção de estabelecimentos em São Paulo quando aqui não prestam serviços.

Autuando empresas por não emissão de documentos que o fisco sabe que foram emitidos, não é apenas alterar intencionalmente a verdade dos fatos. Trata-se de uma nova forma de pirataria tributária.

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