Governo compra mais terras do que desapropria
12 de dezembro de 2009, 8h51
De cada seis decretos assinados pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva, nos últimos cinco anos (2005/2009) um tratava da desapropriação de propriedades destinadas para a reforma agrária. Em números absolutos, entre janeiro de 2005 e dezembro deste ano, a presidência da República baixou 3.615 decretos, sendo 603 declarando o interesse social por imóveis avaliados pela União e considerados improdutivos, passivos de desapropriação. Somente este ano, de 730 decretos sancionados, 130 versam sobre a expropriação de terras.
De acordo com dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, de 2005 e 2008 (os dados de 2009 não estão disponíveis) 1,7 milhão de hectares, foram desapropriados pelo Governo Federal e destinados à reforma agrária. Quando somados os períodos relativos aos dois mandatos do presidente Lula, de janeiro de 2003 até agora, os números são maiores: 1.646 imóveis desapropriados somando 3 milhões de hectares.
Quando comparado ao governo anterior, de Fernando Henrique Cardoso, os dados de hectares desapropriados por decreto ficam menores. Entre 1995 e 1998, primeiro mandato de Fernando Henrique, o governo destinou 2.223 propriedades ao programa de reforma agrária, ou 7,3 milhões de hectares. Se somados os dois mandatos de Fernando Henrique à frente do governo, os dados são ainda mais elevados: de 1995 a 2002, quando saiu para a entrada de Lula, a União desapropriou por decreto 3.536 imóveis, chegando a 10,2 milhões de hectares. Os dados demonstram que o governo Fernando Henrique desapropriou três vezes mais hectares do que o governo Lula. O que não quer dizer que FHC tenha entregue mais terra para distribuição do que Lula.
Compra direta
A expropriação por decreto presidencial é a modalidade original para obtenção de terras para a reforma. Está prevista na Lei 8.629/93, que diz: “a propriedade rural que não cumprir a função social é passível de desapropriação”. Quem estabelece se uma propriedade cumpre sua função social prevista na lei é o Incra, que a partir de índices de produtividade pré-determinados avalia se a terra é produtiva ou não. Caso o Incra conclua que a área não é produtiva, pode iniciar o processo de desapropriação e destiná-la à reforma agrária.
O governo pode prover terras para a reforma agrária também através da compra direta de terras de seus proprietários. Apesar do número de decretos de desapropriação, esta tem sido a modalidade preferida do atual governo. De 2003 até este ano, a União comprou mais de 40 milhões de hectares (bem acima dos 3 milhões adquiridos por desapropriação). Nos dois mandatos de Fernando Henrique, a área de terras compradas para a reforma agrária não chegou a 11 milhões de hectares. Demonstrando equilíbrio entre desapropriação e compra.
A compra de terras para a reforma agrária pela União foi autorizada no Decreto 433/92, que deu ao Incra competência para definir e priorizar as regiões do País consideradas preferenciais para os fins da reforma agrária. A Instrução Normativa 34/2006 do Incra também deu legitimidade a esse tipo de negociação.
Terras e impostos
De acordo com Celso Lisboa Lacerda, diretor de obtenção de terras do Incra, a modalidade de compra foi adotada por conta da conjuntura apresentada no Brasil nos últimos anos. Segundo Celso Lacerda, no Sul e Sudeste do país, por exemplo, fica cada vez mais difícil encontrar terras que possam ser avaliadas como improdutivas e que poderiam ser desapropriadas. Em contrapartida, o número de famílias em busca de terra nessas regiões aumenta.
“Só conseguimos imóvel improdutivo, hoje, no Brasil, quando ele está abandonado. No Norte, Nordeste, por exemplo. O que dificilmente acontecerá em regiões com boa produtividade atestada pelo Incra. Mas se não avançamos com as desapropriações, é necessário que se faça algo e que a reforma agrária continue. A negociação na compra de uma terra é exatamente a mesma que a usada numa desapropriação”, explica Celso Lacerda.
O diretor do Incra chama a atenção para a forma de pagamento das duas modalidades: “tanto na desapropriação como na compra, pagamos terras com TDA (Título de Dívida Agrária) e as benfeitorias são pagas em dinheiro. Tudo igual. A demanda por terra hoje é bem diferente daquela de 15 anos atrás. Os índices de avaliação de terras eram muito mais aplicáveis naquela época”.
Para Eduardo Diamantino, do Diamantino Advogados Associados, a compra da terra para a reforma agrária está diretamente ligada à impossibilidade de utilização do índice de avaliação de produtividade da terra. “Hoje, o governo não consegue desapropriar a terra usando o índice que está em vigor. Por isso discute-se sua mudança”. O advogado entende que a maior diferença entre as duas modalidades é de natureza tributária. “Na desapropriação não incide Imposto de Renda. Já na compra e venda normal, incorre o imposto. Para mim, esse é o único problema nessa opção”, explica Diamantino.
De acordo com dados informados pelo Incra, somadas as duas modalidades (desapropriação e compra), o Brasil já destinou mais de 80 milhões de hectares à reforma agrária. Desse total, apenas 16 milhões de hectares foram acumulados até 1994, antes do primeiro governo FHC.
A população de assentados no programa de reforma agrária já beira o milhão. De 920 mil beneficiados desde o início do programa, 520 mil foram assentados durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!