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Decisão do STF sobre Battisti traz dificuldade

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5 de dezembro de 2009, 13h59

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, disse em entrevista ao portal G1 na sexta-feira (4/12), que a decisão da Corte de autorizar a extradição do ex-ativista Cesare Battisti, mas deixar a palavra final com o presidente da República, “trouxe mais dificuldade do que facilidade” para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No último dia 18 de novembro, o STF autorizou a extradição do italiano, condenado por quatro assassinatos em seus país na década de 70.

Na entrevista concedida durante um voo entre Marabá (PA) e Brasília — ele lançou na cidade paraense um mutirão voltado para o cumprimento de ordens judiciais de reintegração de posse de terras invadidas —, o presidente do STF afirmou que o mensalão do DEM de Brasília, como ficou conhecido o escândalo no qual o governador José Roberto Arruda supostamente pagava propina a aliados, contribui para o descrédito da atividade política.

Gilmar Mendes também falou sobre as autoridades com foro privilegiado no STF, como deputados e senadores. Disse que embora o Supremo nunca tenha condenado autoridades, ele acredita que agora o STF vai ganhar uma dinâmica própria e terá condenações ou absolvições. Também comemorou o que chama de “mudança significativa” nas operações da Polícia Federal, que abandonou a chamada “espetacularização”.

Leia os principais trechos da entrevista:

G1 – O que o senhor espera do presidente Lula em relação à extradição de Battisti?
Gilmar Mendes – A decisão do tribunal de anular o refúgio por si só já foi importante, como também foi importante a decisão do tribunal em relação à concessão da extradição. Acredito que o próprio pronunciamento quanto à não obrigatoriedade da extradição por parte do presidente da República tem um significado limitado. O presidente não poderá deixar de extraditar com base nas mesmas razões do refúgio e terá dificuldades, por exemplo, de conceder asilo por razões semelhantes. Então, é uma questão política delicada que precisa ser considerada com muita reflexão. Mas eu acredito que a decisão do tribunal trouxe mais dificuldade do que facilidade para o presidente da República.

G1 – Esse escândalo do suposto mensalão do DEM em Brasília envergonha o país?
GM – Sem dúvida nenhuma, esse episódio por todas as razões é lamentável. Ele na verdade contribui para o descrédito da atividade política. Talvez nós tenhamos que ser muito enfáticos em relação a esse tipo de prática e buscar novos modelos institucionais. Discutir novas formas de financiamento [de campanhas eleitorais] para realmente varrermos de uma vez por todas essas práticas que são lamentáveis.

G1 – O país tem passado por escândalos como o mensalão, o mensalão mineiro e o mensalão do DEM. Por que o STF nunca condenou autoridades?
GM – A grande clientela de agentes políticos que respondem no Supremo Tribunal Federal é de deputados e senadores. Eles não podiam ser processados sem uma licença do Congresso. Somente depois de 2002 é que houve a aprovação de uma emenda, facultando então o processo contra essas pessoas. A partir daí, então, os processos ganharam uma dinâmica. Houve muitas denúncias que foram recebidas e, agora, o tribunal vai avançar então para o julgamento de mérito dessas ações. Inclusive, o Congresso aprovou uma lei que autoriza o Supremo a convocar juiz para instruir esse processo. Estou convencido de que isso vai dar uma dinâmica própria ao processo e a partir daí certamente vamos ter condenações ou absolvições.

G1 – Desde o ano passado, o senhor faz críticas à chamada “espetacularização” das operações da Polícia Federal. Passado esse período, em sua opinião houve mudanças na forma de agir da PF?
GM – Houve uma mudança significativa. A Polícia Federal e o Ministério da Justiça passaram a ter maior cautela nessas medidas, tanto no que diz respeito à divulgação quanto na execução. Nós mesmos, no Judiciário, passamos a ter um controle maior das escutas telefônicas. O Supremo tem uma pronúncia muito clara em relação ao uso de algemas e a exposição de pessoas algemadas, editando inclusive uma súmula. Acredito que ali o tribunal deu um sinal político e contribuiu para o encerramento desse quadro.

G1 – Falta muito para o Poder Judiciário brasileiro ser eficiente? Para a impunidade ser banida?
GM – Tenho a impressão que nós já demos alguns saltos significativos. Mas certamente há muitos problemas. E esses problemas se impetram tendo em vista algumas peculiaridades locais. Temos estados em que a situação do Judiciário talvez seja favorável, em outros nem tanto. Agora, devemos ficar atentos que o Judiciário é excessivamente demandado. Por isso, em muitas coisas ele também é ineficiente. No que diz respeito à Justiça criminal, nós estamos desenvolvendo um programa especial.

G1 – O senhor considera justo um aumento salarial de 56% para servidores do Judiciário enquanto o salário mínimo tem aumentos mínimos?GM – Em geral, são técnicos altamente qualificados. Nós percebemos que diante da reestruturação das carreiras no âmbito do poder público em geral estávamos perdendo quadro, perdendo valores. Chegamos a perder em 2009 algo em torno de 20% da nossa força de trabalho de nível superior. Daí a nossa necessidade de revisão. Agora, fomos muito cautelosos para que não houvesse um impacto enorme no nosso orçamento. Estamos cuidando para que haja um decréscimo das funções comissionadas. Vamos fazer um esforço significativo de corte para compensar essa eventual elevação salarial.

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