Corte dividida

Briga no TRF-3 é exemplo a não ser seguido

Autores

9 de agosto de 2009, 9h50

Spacca
Ricardo Nascimento - Spacca

A disputa entre facções de desembargadores que se verifica no Tribunal Regional Federal da 3ª Região é um exemplo a não ser seguido. Isso não pode acontecer no tribunal federal mais importante do país. O próximo presidente deve ter humildade para tentar conciliar os dois lados e fazer com que a corte preste o melhor serviço para a sociedade, julgando com base em fundamentos jurídicos.

É assim que pensa o presidente da Associação dos Juízes Federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul (Ajufesp), juiz Ricardo Castro Nascimento, em relação à existência de dois grupos de desembargadores em permanente confronto pela direção do tribunal. As três últimas eleições na corte foram decididas pelo Supremo Tribunal Federal. Na última, o desembargador Baptista Pereira foi eleito presidente.

A desembargadora Suzana de Camargo, eleita vice-presidente, recorreu ao STF com o argumento de que Baptista Pereira não pode assumir a presidência porque ja exerceu cargos de direção por quatro anos, limite previsto no artigo 102 da da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman).

“Os projetos individuais não podem estar acima de um projeto maior para o TRF”, afirma o presidente da Ajufesp. Segundo ele, muitos desembargadores do tribunal concordam com a sua posição, “mas na hora de agir é outra coisa”.

Uma solução? Aumentar o número de desembargadores. Medida que desafogaria a segunda instância da Justiça Federal e distribuiria melhor o poder dentro do tribunal e acabaria com as divisões, de acordo com Ricardo Nascimento.

Em entrevista à Consultor Jurídico, o juiz falou sobre o seu apoio pessoal e institucional ao colega Fausto Martin De Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, depois de ter determinado pela segunda vez a prisão do banqueiro Daniel Dantas. Nascimento também fala do “excesso de controle” sobre a magistratura de primeiro grau, exercido pela corregedoria do tribunal, pelo Conselho da Justiça Federal e também pelo Conselho Nacional de Justiça.

A sanção da lei que cria 230 varas federais também esteve na pauta da entrevista. Para o presidente da Ajufesp, a demora na votação da proposta da ampliação da Justiça Federal “foi um marco de má-vontade do Poder Legislativo”, que, segundo ele, reagiu dessa forma diante do suposto ativismo judicial praticado pelo Supremo. Com a aprovação, disse, “tenho de fazer Justiça à figura do Temer [Michel, presidente da Câmara], que está mudando um pouco esse quadro ruim dos projetos de interesse da magistratura”.

Ricardo de Castro Nascimento formou-se em Direito pela USP, em 1983. Participou do movimento estudantil, foi advogado do sindicato dos bancários, trabalhou na secretaria de Abastecimento da prefeitura de São Paulo na gestão de Luiza Erundina, de 1989 a 1993, na procuradoria do INSS e da Fazenda. Entrou para a magistratura em 2000, depois do primeiro filho.

Ele também passou pela escola de teatro da USP. Durante dez anos trabalhou em teatro. “Isso deveria ser um segredo (risos). É que juiz e ator pode soar estranho”, brinca. Durante as horas vagas, participa de um cine clube, onde sentam para discutir filmes e cinema.

Como presidente da Ajufesp, em seu segundo mandato, afirma que vai trabalhar por melhores salários e na defesa do Judiciário como pilar fundamental para a democracia.

Leia a entrevista

ConJur — No Tribunal Regional Federal da 3ª Região existem dois grupos de desembargadores em confronto. Nas últimas eleições, a discussão foi parar no Supremo. Como esse impasse pode ser resolvido?
Ricardo Castro Nascimento — É comum haver divergências nos tribunais, em turmas, mas no TRF-3 essa divisão extrapolou. Lá temos um exemplo ruim de partidarização da Justiça. As últimas três eleições tiveram de ser decididas pelo Supremo Tribunal Federal. Isso é negativo para a imagem de um tribunal. Espero que o próximo presidente tenha humildade, que será ao mesmo tempo um gesto de grandeza, para cumprir a difícil missão de conciliar os dois lados. Espero que ele tenha a capacidade de reconstrução do consenso, chamar o outro lado para gerir a Justiça como antes, conjuntamente. Os projetos individuais não podem estar acima de um projeto maior para o TRF. Este é o Tribunal Regional Federal mais importante do Brasil. Isso não pode acontecer.

ConJur — Quais as consequências dessa divisão para o próprio Judiciário, para a sociedade?
Ricardo Nascimento — Temos que tomar cuidado para que essas brigas não contagiem a primeira instância e as decisões judiciais. O TRF tem de decidir com base nos fundamentos jurídicos. A responsabilidade coletiva não está funcionando ali. Muitos integrantes do tribunal concordam com o que estou dizendo, mas na hora de agir é outra coisa. A Ajufesp vai se portar, independentemente com quem esteja na direção do tribunal, com responsabilidade. Não vamos nos manifestar a favor de um lado ou de outro. Como está na moda ilustrar as falas com alegorias futebolísticas, como faz nosso presidente Lula, vou dar um exemplo desses também. Anos atrás o Flamengo fez o ataque dos sonhos, com os melhores jogadores que se podia imaginar. O resultado foi pífio. Era para ser fantástico, pois só tinha craques no time, mas o que acontece: na hora da responsabilidade coletiva eles não funcionaram. Na hora de tocar a bola não foi produtivo. É exatamente isso que acontece no TRF-3. Temos pessoas ótimas, que não conseguem trabalhar em equipe.

ConJur — A atual presidência do TRF-3 não se mostra favorável ao aumento do número de desembargadores, qual a sua posição sobre essa proposta?
Ricardo Nascimento — O estrangulamento da Justiça Federal é na segunda instância. Usa-se a mão de obra de primeira instância para tentar resolver o problema, porque ninguém quer dividir o poder. Para prestar uma boa jurisdição, é preciso ter um número suficiente de julgadores. Pensar no poder é bobagem. Aumentar o número de desembargadores também seria uma forma de acabar com essa briga dentro do TRF-3.

ConJur — Como vê a decisão do corregedor do TRF-3 de punir juízes que prestaram apoio ao juiz da 6ª Vara Federal de São Paulo, Fausto Martin De Sanctis [o ministro Gilmar Mendes pediu que o juiz fosse investigado por desobediência ao STF, quando determinou a segunda prisão de Daniel Dantas, logo depois de o Supremo mandar soltá-lo]?
Ricardo Nascimento — Eu assinei o manifesto de apoio ao colega De Sanctis. Estive no ato a favor dele e, naquelas circunstâncias, era importante o apoio ao elo mais fraco no conflito. A nossa solidariedade foi fundamental para que ele continuasse na carreira. O Fausto é um cara sério, dedicado ao trabalho dele. Não estou dizendo se ele decidiu certo ou errado. Não entro nesse mérito. O certo é que ele virou um símbolo da independência do juiz de primeiro grau, porque vivemos um momento em que ser juiz no Brasil não é fácil. Mais complicado é ser juiz criminal. Pior ainda é ser juiz criminal na Justiça Federal da 3ª Região.

Conjur — Quais são as dificuldades?
Ricardo Nascimento — De um controle frágil, passamos para um excesso de controle das atividades. Hoje, temos Conselho Nacional de Justiça, Conselho da Justiça Federal, corregedoria atuante. Muitas vezes, o juiz federal não tem liberdade para levar o filho ao médico. O corregedor tem de autorizar. Outra questão é que não se pode entrar no mérito da sentença do juiz. Eu não posso ser punido pelo teor da minha decisão. Alguns entenderam que o Fausto determinou nova prisão como forma de afronta. Mas é uma decisão. Decisão se revoga. Muitas vezes, os Tribunais Superiores querem criticar os juízes, mas eles não podem ser punidos por suas decisões. O Fausto se transformou num símbolo. Se esse símbolo se transformou em um herói, infeliz do país que precisa de heróis. Agora, da mesma forma que apoiei o Fausto, apóio o Ali Mazloum [juiz da 7ª Vara Federal Criminal de São Paulo], que tem posições completamente opostas ao Fausto. O Ali sofreu três ações criminais, ficou afastado por três anos e, depois, todos os processos foram considerados ineptos. Ele voltou ao trabalho por decisão do STF. Não havia razão para ser afastado. E o que ele ganhou de presente? Um processo disciplinar por um fato acontecido em 2002.

ConJur — O senhor acredita que há uma perseguição ao juiz Ali Mazloum por parte da atual direção do TRF-3?
Ricardo Nascimento — Não digo perseguição. Eu confio no Órgão Especial do Tribunal Regional Federal para que ele decida com transparência. Portanto, os julgamentos de processos contra juízes devem ser abertos. No caso do Ali, o julgamento foi secreto. Não há razão para segredo de Justiça. É até uma forma de provar que não há perseguição.

ConJur — Qual a sua opinião sobre a nova resolução do CJF (Resolução 58) que cria a publicidade restrita nos processos?
Ricardo Nascimento — Apesar das boas intenções, eu tenho sérias dúvidas em relação a essa resolução e também àquela do Conselho Nacional de Justiça, que obriga o juiz a explicar porque se declarou suspeito nos processos. Nós temos uma Lei Orgânica da Magistratura anacrônica, do tempo do pacote de abril de 1977, quando o Congresso Nacional foi fechado. É preciso atualizá-la. Enquanto isso não acontece, o CJF e o CNJ vão criando regras. Esses órgãos trabalham em uma zona cinzenta. Tenho sérias dúvidas sobre a competência na questão da suspeição por foro íntimo, por exemplo. Mas o poder não admite vácuo. Então, eles vão legislando. A lógica é a mesma da inércia do Legislativo e a atuação do Supremo.

ConJur — O CNJ justifica a criação dessa resolução como forma de resolver o problema que encontrou no Amazonas e na Bahia, onde muitos juízes se declaravam suspeitos para diminuir a montanha de processos sob sua responsabilidade.
Ricardo Nascimento — Por que não abrir um processo para apurar? Claro que isso deve existir, mas não pode punir todos os juízes.

ConJur — Qual a sua avaliação sobre o CNJ?
Ricardo Nascimento — O surgimento do CNJ trouxe mais transparência para o Poder Judiciário, que, no aspecto administrativo, é bastante fechado. As relações se democratizaram mais depois da reforma do Judiciário. O saldo do Conselho é bastante positivo. A Ajufesp, mesmo antes de eu ser presidente, foi uma das poucas associações que defenderam o controle externo do Judiciário.

ConJur — E como vê a presidência do ministro Gilmar Mendes, no STF e no CNJ?
Ricardo Nascimento — É um a figura extremamente polêmica que divide opiniões na magistratura. Na diretoria da Ajufesp, tem gente que simpatiza com ele e gente que não simpatiza de jeito nenhum. Pessoalmente, acho que se trata de uma pessoa franca e dinâmica, que está transferindo essas características para o Judiciário brasileiro. Causa polêmica o fato de o ministro Gilmar Mendes dar a sua opinião em questões polêmicas. Não estamos acostumados com essa postura. Penso que ele deveria segurar um pouco, mas isso é da personalidade dele. Ele não vai se calar nessa altura do campeonato. Ninguém segura o homem. Eu gosto dele no atacado. No varejo, depende da declaração. Muitas vezes usamos suas declarações quando ele fala da independência do juiz. Ele é uma figura importante nessa questão. Outra coisa: talvez ele seja a figura mais importante, individualmente, nessa transformação do Supremo Tribunal Federal em corte Constitucional. É um papel muito importante.

ConJur — Voltando um pouco à discussão sobre a atuação dos juízes, hoje, qual a principal insatisfação da classe?
Ricardo Nascimento — Ser juiz não é fácil por uma série de motivos. Como comentei antes, há excesso de controle, isolamento do juiz e há também um sentimento de auto-suficiência. O juiz, muitas vezes, acha que pode resolver tudo, como um super herói. Quando percebe que isso não é possível, sofre. Esse fato tem gerado muitos casos de depressão, maior que em outras profissões. Há necessidade de os tribunais fazerem um acompanhamento psicológico de seus integrantes. O juiz é um ser humano como qualquer outro e está sujeito a isso. É preciso olhar para esse problema com muito cuidado. Além disso, não há reajuste salarial há anos e nem perspectiva na carreira. Um rapaz que acabou de entrar na magistratura vai levar 20 anos para ser juiz titular em São Paulo. Primeiro ele vai ficar uns quatro ano no Mato Grosso do Sul, até se tornar titular no estado. Até voltar para São Paulo, 20 anos se foram.

ConJur — Em média, qual a carga de trabalho de um juiz?
Ricardo Nascimento — É muito complicado falar em média de trabalho. Pode parecer pedante o que vou falar, mas o juiz fica ligado 24 horas por dia. É claro que juiz toma cerveja, fica com os filhos, mas fica ligado 24 horas. Existe uma dificuldade de relaxar, desligar. Muitos juízes acordam no meio da noite pensando em seus julgados, em como vai resolver tal conflito no dia seguinte. Quando passamos no concurso público não existe aquilo de que seus problemas acabaram. Pelo contrário, os problemas apenas começaram.

ConJur— Como avalia os concursos públicos para juízes. Eles são eficazes para recrutar candidatos preparados?
Ricardo Nascimento — É fácil fazer críticas, sem propor algo melhor. Por enquanto, não tenho uma sugestão melhor, mas entendo que é preciso atrair pessoas com mais experiência de vida para a magistratura. O salário preciso ser dos melhores mesmo, diante das suas responsabilidades e também para atrair pessoas da iniciativa privada. Simpatizo também com o quinto constitucional, que dá uma arejada interessante na magistratura. Muitos colegas veem problemas nesse instituto. Eu não. Normalmente, o pessoal do quinto é mais articulado politicamente e isso faz parte do jogo.

ConJur — Recentemente, publicamos uma pesquisa feita com juízes mineiros que apontou 95% de rejeição ao quinto constitucional. Eles entendem que para ser juiz tem de seguir a carreira.
Ricardo Nascimento — O juiz tem um problema. Somos levados a achar que a forma da nossa ascensão social é a mais justa. Então o que é o juiz? Muitas vezes é o aluno que entra na faculdade vê no concurso público estabilidade financeira e muitas vezes status. Estabilidade é importante, mas não pode ser um valor absoluto. Então, se depender do padrão seria tudo concurso público. Até para presidente da Republica. O pessoal da área jurídica tende a ser conservador nesse aspecto de concurso.

ConJur — O presidente Lula sancionou lei que cria 230 varas federais no país e caberá ao CNJ decidir onde cada vara será instalada. Quais os critérios usados para definir onde há necessidade de uma vara?
Ricardo Nascimento — O CJF criou o Indicativo de Carência de Varas da Justiça Federal, que analisa o número de processos em tramitação e julgados por vara federal, o PIB e a população local para a criação de uma vara. Mas ainda há interferência política na instalação de varas, às vezes de um senador, de um deputado, que pede ao presidente do tribunal, sem qualquer critério objetivo. O critério para criação de varas não deve ser absoluto, mas tem de ser objetivo. No Vale do Ribeira, por exemplo, que é a região mais pobre de São Paulo, não existiria a necessidade de uma vara ou de Juizado Especial pelos critérios objetivos. No entanto, ali a presença do Estado é importante. Tem que ter uma vara lá. Hoje, a região mais carente de varas é a terceira, que cobre São Paulo e Mato Grosso do Sul. É onde a demanda é maior.

ConJur — É preciso, então, analisar os números e relativizá-los?
Ricardo Nascimento — Sim. Não podemos ser escravos dos números. Em São Paulo, há muita atividade econômica e a demanda de execução fiscal é maior. É preciso enxergar as diferenças em relação às outras justiças. Outra questão que precisa ser levada em conta é a da transferência de renda. A Justiça Federal é muito forte no aspecto previdenciário. A partir do momento que eu estou concedendo um número X de aposentadorias, estou tirando orçamento da União e dando para quem precisa. Sem contar que gera mercado para o advogado. É muito melhor eu advogar na minha cidade do que vir para São Paulo, por exemplo. Estamos nesse caminho. Os dados do Justiça em Números, do CNJ, também ajudam nesse trabalho.

ConJur — Haverá concurso para juiz ou já existem juízes designados para as varas que serão criadas?
Ricardo Nascimento — A lei previu que as varas serão implantadas de forma gradativa: 46 varas por ano até 2014. Ou seja, haverá um crescimento da Justiça com consistência. Então, obviamente, haverá concurso. Quando se cria uma vara, criam-se cargos de juiz e de servidores também.

ConJur — O Justiça em Número de 2008 mostrou que o número de decisões na Justiça Federal caiu e a quantidade de novos processos aumentou em relação ao ano de 2007.
Ricardo Nascimento —Esse quadro precisa ser melhor analisado. Existem demandas de massa, como a da correção da poupança, empréstimo compulsório de veículos da década de 80, bloqueio do Plano Collor. Quantitativamente, essas demandas representam grande porcentagem dos processos em tramitação. Na questão dos planos econômicos, por exemplo, uma decisão do Supremo Tribunal Federal pode resolver e baixar o número de ações. Quando eu assumi o cargo de juiz, metade do volume da minha vara tratava de um só tipo de ação: Fundo de Garantia. Então, os números do CNJ, por si só, são insuficientes para tomar uma decisão gerencial. É preciso saber as características da demanda e o seu histórico.

ConJur — A valorização das ações coletivas poderia ajudar a resolver o problema?
Ricardo Nascimento — A desvalorização desse tipo de ação é culpa da jurisprudência dos Tribunais Superiores e do Poder Público, que prefere diluir seus riscos em ações individuais do que priorizar a Justiça coletiva. O Judiciário também poderia priorizar o julgamento de ações coletivas, mas isso não costuma acontecer. A meu ver o MP e as entidades de classe fazem o seu papel. Ingressam com as ações. Elas são julgadas. Muitas vezes, o juiz tem uma postura mais ativa para provocar uma solução mais rápida e obter decisão do Poder Judiciário como um todo. A Repercussão Geral, por enquanto, só está resolvendo a vida do Supremo. Mas é uma questão de tempo para atingir as instâncias inferiores.

ConJur — O Executivo ainda tem o hábito de não aplicar as decisões do Judiciário no seu dia a dia?
Ricardo Nascimento — Isso foi uma realidade. Até o Plano Real nós juntávamos esqueletos nos armários, como as questões dos planos econômicos, do empréstimo compulsório. Situações absurdas. Do governo Fernando Henrique para cá, e nesse ponto o governo Lula está dando sequência, estamos caminhando para uma relação mais racional. A reestruturação da Advocacia-Geral da União levou a uma defesa mais técnica. As últimas grandes demandas coletivas, que põem em risco o equilíbrio orçamentário, são anteriores ao Plano Real. As respostas coletivas, principalmente nas questões Estado-cidadão, que é forte na Justiça Federal, estão melhorando.

ConJur — Com a criação de Súmulas Vinculantes, a situação deve melhorar ainda mais?
Ricardo Nascimento — Como presidente de associação, defendo a independência do juiz, especialmente, daqueles de primeira instância. É fundamental em uma democracia. Mas temos a obrigação de darmos respostas coletivas. Enquanto sistema, temos que dar uma única resposta para a sociedade. Às vezes, não é a que mais agrada. Nunca achei que a Súmula Vinculante interferisse na independência do juiz. Na Justiça Federal, é importante, porque há muitos processos repetitivos. No atacado, vejo com simpatia a criação de Súmulas Vinculantes. No varejo, discordo.

Conjur — Como deve ser a relação entre o Supremo Tribunal Federal e o Poder Legislativo.
Ricardo Nascimento — Não pode existir vácuo. Se o Legislativo não cumprir a sua tarefa, o Judiciário vai ocupar esse espaço. A decisão no caso de infidelidade partidária é emblemática. O Supremo interpretou a Constituição no sentido que qualquer cidadão defenderia, que era o princípio de que o mandato pertencia ao partido, não ao deputado. O Supremo está acabando com a inércia.

ConJur — O Supremo está se aproximando da sociedade?
Ricardo Nascimento — Quando a Constituição de 88 entrou em vigor, os ministros do Supremo ainda pareciam decidir com o pensamento da Carta de 69, imposta pelo Regime Militar. Hoje, temos um STF com uma boa composição e com a vontade de aplicar a atual Constituição. Eu simpatizo com o chamado ativismo judicial. Me lembra momentos importante da vida americana. Estamos vivendo um momento rico. Essa nova função do Supremo, de ocupar os vazios deixados pelo Congresso, é uma conquista feita com o tempo, iniciada com a queda da ditadura militar. Espero que não redunde em passos para trás.

ConJur — Qual a sua opinião sobre a PEC dos precatórios? Críticos dizem que o projeto é um desrespeito às decisões anteriores tomadas pelo Judiciário. O senhor concorda?
Ricardo Nascimento — Não vejo com simpatia a PEC dos precatórios. A partir do momento em que o Estado está inadimplente, fica difícil exigir o contrário dos cidadãos e empresas. A proposta significa um passo atrás na credibilidade das instituições e é contra a sociedade. E isso não constrói instituições confiáveis.

ConJur— O senhor se reelegeu presidente da Ajufesp. Pretende concorrer à Ajufe?
Ricardo Nascimento — Não quero concorrer. Sei que existem pessoas bem preparadas, como Fernando Tourinho Neto (ex-presidente da Ajufe), Gabriel Wedy (presidente da Associação dos Juízes Federais do Rio Grande do Sul), Moacir Ramos (presidente da Associação dos Juízes Federais da Primeira Região). Essas três pessoas têm potencial e estatura para presidir a Ajufe. Com eles, me sentiria representado na associação. Entendo, entretanto, que a organização dos juízes federais precisa ser reformulada. Na Justiça do Trabalho, temos a Anamatra, que é uma associação de associações regionais. Entre os juízes federais, temos a Ajufe, que é uma associação nacional importante e temos as associações regionais, que infelizmente não se comunicam, não se articulam. Precisamos repensar o modelo associativo dos juízes federais.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!