Responsabilidade civil

A violação do direito de imagem no Orkut

Autor

20 de abril de 2009, 6h47

Introdução

O direito à imagem é um direito inerente ao homem, o qual advém do direito à personalidade. Sua proteção é consequência da inviolabilidade da vida privada e do direito à intimidade.

Segundo Alexandre de Moraes, “o direito à intimidade e à própria imagem formam a proteção constitucional à vida privada, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas”.[1]

Como conceito de imagem pode-se trazer a definição de Walter Moraes:

Toda expressão formal e sensível da personalidade de um homem é imagem para o Direito. A ideia de imagem não se restringe, portanto, à representação do aspecto visual da pessoa pela arte da pintura, da escultura, do desenho, da fotografia, da figuração caricata ou decorativa, da reprodução em manequins e máscaras. Compreende, além, a imagem sonora da fonografia e da radiodifusão, e os gestos, expressões dinâmicas da personalidade. A cinematografia e a televisão são formas de representação integral da figura humana. De uma e de outra pode dizer-se, com De Cupis, que avizinham extraordinariamente o espectador da inteira realidade, constituindo os mais graves modos de representação no que tange à tutela do direito. Não falta quem inclua no rol das modalidades figurativas interessantes para o Direito, os ‘retratos falados’ e os retratos literários, conquanto não sejam elas expressões sensíveis e sim intelectuais da personalidade. Por outro lado, imagem não é só o aspecto físico total do sujeito, nem particularmente o semblante, como o teriam sustentado Schneickert e Koeni. Também as partes destacadas do corpo, desde que por elas se possa reconhecer o indivíduo, são imagem na índole jurídica: certas pessoas ficam famosas por seus olhos, por seus gestos, mesmo pelos seus membros.[2]

Sobre a conceituação de Direito à Imagem, Carlos Alberto Bittar amestra:

Detendo-nos em sua conceituação, consideramos que o direito à imagem consubstancia o vínculo que une uma pessoa à sua expressão externa, ou seja, ao conjunto de traços e caracteres que a distinguem e a individualizam.

Consiste no direito que tem a pessoa de impedir que outrem a utilize, sem autorização, de sorte que a fixação e a posterior utilização econômica dependem de sua anuência.

Diz respeito, como os demais direitos da personalidade, à preservação de valores fundamentais do homem (intimidade e respeito à pessoa), configurando direito irrenunciável.

Desse modo, a utilização econômica não autorizada ocasiona a satisfação de perdas e danos, levando-se em conta o prejuízo efetivo do interessado e os lucros cessantes (aquilo que deixou de auferir, em face da utilização abusiva).[3]

O direito à imagem possui natureza jurídica de direito subjetivo de caráter privado e absoluto; personalíssimo, de cunho patrimonial, uma vez que pode ser utilizado para fins econômicos, devendo o titular ser indenizado sempre que tiver esse direito violado. Trata-se de um direito inalienável, irrenunciável e, em geral, inexpropriável, além de intransmissível e imprescritível.

Devido ao seu cunho patrimonial, o direito de imagem vem sendo explorado como “produto” e, por muitas vezes de maneira irresponsável e a revelia da lei. O direito à imagem assumiu uma posição de destaque no contexto dos direitos da personalidade, devido ao extraordinário progresso tecnológico dos meios de comunicação, tanto no desenvolvimento da facilidade de captação da imagem, quanto a de sua reprodução.

Com o aumento das facilidades de acesso a informação, proporcionadas pelo crescente avanço tecnológico e com a expansão do uso da internet, o direito de imagem vem sendo banalizado pelo próprio detentor que o utiliza de forma irresponsável e negligente. O exemplo mais clássico é o site de relacionamento Orkut.

O Orkut foi criado pelo engenheiro de software Orkut Büyükkokten nascido na Turquia em 19 de janeiro de 2004.[4]


Em definição disponibilizada pelo próprio site, podemos conceituar o Orkut como: “uma comunidade online criada para tornar a sua vida social e a de seus amigos mais ativa e estimulante. A rede social do Orkut pode ajudá-lo a manter contato com seus amigos atuais por meio de fotos e mensagens, e a conhecer mais pessoas”.[5]

Atualmente o Orkut conta com mais de 60 milhões (68.182.265 em 20 de agosto de 2007) de usuários cadastrados. O Brasil é o país com o maior número de membros. Cerca de 55,29% dos usuários do sistema, declaram-se brasileiros[6].

Sua utilização se dá mediante a inscrição de um perfil, ressaltando-se que não há obrigação de informar dados verdadeiros, uma vez que não há como fiscalizar a veracidade dos dados inseridos, e a partir deste cadastro estão abertas as portas para o acesso a dados e informações, disponibilizadas pelos próprios usuários, sobre seus gostos, afinidades e até mesmo informações pessoais.

Dentro da própria definição do site de relacionamento Orkut, verificamos a possibilidade de agregar fotos aos usuários. Tais fotos ficam a disposição de qualquer usuário para acesso de qualquer usuário que pode apenas observá-las ou até mesmo copiá-las.

Não se pode esquecer que aos ilícitos ocorridos no Orkut são perfeitamente aplicadas as leis brasileiras já existentes, tanto no âmbito cível, no caso de responsabilidade por dano, quanto no âmbito penal.

Considerando a legislação nacional existente e aplicável aos ilícitos ocorridos no âmbito da internet, podemos citar o nosso Código Civil — CC e em especial, quanto ao direito à imagem podemos aplicar a Responsabilidade Civil, incluindo neste tema suas causa de exclusão.

A palavra responsabilidade vem do latim respondere, que significa responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém por atos danosos.

Segundo Rui Stoco, “a responsabilização é meio e modo de exteriorização da própria Justiça e a responsabilidade é a tradução para o sistema jurídico do dever moral de não prejudicar a outro, ou seja, o neminem laedere.”[7]

Maria Helena de Diniz conceitua Responsabilidade Civil como sendo “a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar o dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesmo praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.”[8]

Para a existência da responsabilidade civil faz-se necessária a presença de três elementos, quais sejam:

Ato Ilícito

Dano

Nexo Causal

O ato ilícito vem previamente conceituado dentro do próprio Código Civil em seu artigo 186, que assim dispõe: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Já o dano conforme definição encontrada no dicionário Aurélio, é um mal ou ofensa pessoal; prejuízo moral ou material causado a alguém pela deterioração ou inutilização de bens seus.

Por fim, temos o nexo causal como o liame entre o ato ilícito e o dano. Nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho, “o conceito de nexo causal não é jurídico; decorre das leis naturais, constituindo apenas o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado[9]

Da legislação brasileira sobre o direito à imagem

A proteção a imagem no direito pátrio vem esculpida na Constituição Federal no artigo 5º, incisos V, X e XXVIII, alinea “a” que assim dispõe:


Art. 5º todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(…)

V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

(…)

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

(…)

XXVIII – são assegurados, nos termos da lei:

a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e a reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas;

Os dois primeiros incisos estão voltados para a indenização no caso de danos decorrentes da violação do direito à imagem. Já o inciso XXVIII visa à garantia da imagem como direito autoral.

Ainda sobre a obrigação de indenizar, o Código Civil Brasileiro disciplina o assunto. Primeiramente os artigos 186 e 187 definem o que são atos ilícitos, para depois imputar a responsabilidade de indenizar ao seu causador.

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligencia ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites imposto pelo seu fim econômico ou social, pela boa –fé ou pelos bons costumes.

Assim, quem comete um ato ilícito é obrigado a indenizar o prejuízo causado. Porém, a extensão da sua responsabilidade deve ser verificada, havendo possibilidades em que a mesma pode ser excluída., sendo estas: a) culpa exclusiva da vítima; b) culpa exclusiva de terceiro; c) caso fortuito (evento imprevisível) e força maior (evento previsível, mas inevitável).

O artigo 944 do mesmo Código dispõe sobre a culpa da vitima:

Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.

Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção ente a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.

E ainda:

Art. 945. Se a vitima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.

Assim, é importante que a pessoa que venha a sofrer algum dano decorrente da violação ao seu direito de imagem, não tenha concorrido para que o evento danoso tenha ocorrido, pois nos fatos ocorridos sob a égide de culpa exclusiva da vítima estamos diante da hipótese em que o fato da vítima, através de sua própria conduta ocasiona o dano a ela mesma. Se o dano foi causado pela vítima, não há de se falar em existência de nexo causal entre o ato apontado como causador do infortúnio e o dano.

Verificando-se a culpa exclusiva da vítima, tollitur quaesito: indevida é, portanto, a indenização.

Jurisprudência dos tribunais

A jurisprudência pátria sinaliza no sentido de que, havendo dano à imagem, a indenização é devida. Nos casos de imagens disponibilizadas no site de relacionamentos Orkut, os julgados têm determinado que perfis falsos e comunidades com conteúdos ofensivos à imagem da pessoa sejam retirados do site.

O Tribunal de São Paulo vem pacificando seu entendimento no mesmo sentido, senão, vejamos:

Ementa: Agravo de instrumento – liminar para a retirada de comunidades criadas no site de relacionamentos “Orkut" deferida no juízo de primeiro grau, onde há utilização indevida do nome dos agravados, com comentários de caráter ofensivo à sua honra e imagem -alegação de impossibilidade técnica de cumprimento – afirmação, ainda, de personalidades jurídicas distintas – decisão mantida – agravo improvido. Vemos também através da jurisprudência, vários casos onde, o responsável pela violação do direito à imagem é condenado.[10]


A jurisprudência também denota vários casos em que o responsável pela violação do direito à imagem é condenado:

EMENTA: "APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. EX-NAMORADO. ENCAMINHAMENTO, VIA E-MAIL, DE FOTOGRAFIAS ERÓTICAS DE MULHER SEMI-NUA, COM NOME, E-MAIL E TELEFONES – RESIDENCIAL E COMERCIAL – DA AUTORA. CADASTRAMENTO DA AUTORA, EM SITES PORNOGRÁFICOS, COMO SENDO PESSOA A PROCURA DE RELACIONAMENTO HOMOSSEXUAL. GRANDE REPERCUSSÃO DOS FATOS PERANTE FAMÍLIA, AMIGOS, PROFESSORES E COLEGAS DE TRABALHO. SITUAÇÃO VEXATÓRIA E HUMILHANTE. VALOR DA INDENIZAÇÃO.

1. O réu, ex-namorado da autora, encaminhou para inúmeras pessoas e-mails com fotografias de mulher semi-nua em posições eróticas, anunciando-as como se fossem daquela. As fotografias não eram da demandante nem montagens, mas sim de uma mulher desconhecida. O demandado, então, colocou tarjas sobre o rosto, no intuito de impedir que se identificasse não se tratar da autora. Ainda, cadastrou a autora em site erótico procurando relacionamentos homossexuais, fornecendo, inclusive, para contatos, o endereço eletrônico de seu trabalho.

(…)

4. Em ação cautelar foi identificado o réu como sendo responsável pelos e-mails enviados por "Júlio Mattos", pseudônimo que usava. Esta é a comprovação inequívoca de ser o demandado o responsável pela injúria e difamação a que a autora foi submetida. Mesmo antes da realização de tal prova, já haviam indícios indicando a autoria. O fato de o demandado não ter-se conformado com o término do namoro, que perdurou por cinco anos e teve fim em 2004, e ter ficado importunando a autora e sua família, por meio de telefone, já demonstram seu intuito revanchista. Ademais, em contestação, o réu não nega que tenha enviado as fotografias.

(…)

6. Diante da situação humilhante e vexatória a que a autora foi exposta, o dano moral configurou-se in re ipsa. Dispensada a comprovação da extensão dos danos, sendo estes evidenciados pelas circunstâncias do fato.

7. Majoração do valor da indenização para R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), considerada a condição econômica das partes e, principalmente, a gravidade e repercussão dos danos. Ênfase ao caráter punitivo da indenização. Precedente desta Câmara.

9. Sanada, de ofício, omissão da sentença, consistente na ausência de distribuição dos ônus da sucumbência.

DESPROVIDO O APELO DO RÉU E PROVIDO O APELO DA AUTORA. SANADA, DE OFÍCIO, OMISSÃO DA SENTENÇA. UNÂNIME." [11]

Porém, ao analisar os casos de indenizações, os juizes têm equacionado a culpa de cada parte. Vejamos abaixo uma decisão recente na qual é possível constatar que a autora colaborou e consentiu para a ocorrência do dano:

Indenização. Foto da autora publicada no jornal com os seios a mostra que está fielmente no contexto da notícia divulgando o evento denominado Concurso da Felina 2001. Evento para o qual foram convidados fotógrafos para a divulgação do evento. Autorização tácita da autora que é inequívoca pela pose feita e pelo olhar direto para a cá mera fotográfica. Inexistência de violação à imagem ou dano moral. Entendimento da douta maioria que fica adotado como razão de decidir pela rejeição dos embargos. Embargos infringentes rejeitados.

A douta maioria formada pelos desembargadores Francisco Loureiro e Ênio Zuliani concluiu pelo provimento do recurso para reformar a r sentença de procedência da ação indenizatória fê-lo ao fundamento principal de que a autora anuiu tacitamente com a publicação ao posar deliberadamente para as fotografias tiradas em trajes mínimos, inclusive com os seis à mostra, quando do evento realizado em Jundiaí e denominado Concurso de Felina 2001.

Não obstante o respeito que se tem pelo posicionamento do voto vencido, a conclusão que extraio do conjunto probatório vai à direção do que decidiu a douta maioria, particularmente quando assenta que a autora desfilou em trajes sumaríssimos e depois espontaneamente posou para as fotografias tiradas pelos fotógrafos que se encontravam no local exatamente para a promoção e divulgação do evento das candidatas a Felina 2001.


(…)

A propósito, porque relevante, é bom lembrar que o jornal publica a foto em contexto de mera divulgação do evento Concurso da Felina 2001, sem exagero ou intuito apelativo, narrando o evento havido dois dias antes. O intuito narrativo se revela evidente na leitura do texto que se segue à foto da autora, cumprindo o jornal o papel de divulgar o evento para o qual foi convidado. No particular, a fundamentação e a doutrina mencionadas nos votos vencedores dos desembargadores Francisco Loureiro e Ênio Zuliani ficam inteiramente adotadas como razão de decidir pela rejeição dos embargos, evitando-se, aqui, inútil e desnecessária repetição.

Cumpre realçar que, embora a regra seja a da autorização expressa quando se trata de divulgação da imagem, por ser direito personalíssimo, há casos em que o contexto formado pela maneira e pela pose da fotografada não deixa dúvida quanto à real autorização tácita para a sua divulgação como matéria jornalística. É o caso dos autos em que a autora posou deliberadamente ao fotógrafo, com os seios expostos, para a divulgação do evento em que participava com o fim de ser eleita a Felina 2001, concurso realizado em trajes sumaríssimos com a participação da imprensa.

Se não há exagero ou desvirtuamento do jornal na divulgação do evento com uma foto da autora, e não há porque focado no evento e não em exposição maliciosa desvinculada do evento, indevida é a pretensão indenizatória por violação à imagem ou por inexistente dano moral.

(…)

MAIA DA CUNHA

PRESIDENTE E RELATOR[12]

APELAÇÃO CÍVEL. DANO MORAL. DIREITO À IMAGEM. VIOLAÇÃO. DIVULGAÇÃO não autorizada De FOTO DA DEMANDANDANTE EM PÁGINA DO ORKUT associada à pornografia.

Dano à imagem da autora devidamente comprovado nos autos. Diminuição do quantum, a fim de não representar enriquecimento ilícito à autora.

Trata-se, em síntese, de ação indenizatória por danos morais em que a autora alega ter sofrido dano à imagem, pois foto sua foi utilizada, sem autorização, em perfil de terceira pessoa que se denominava “Dany Rodrigues”, no site de relacionamentos Orkut, de propriedade da ré. Na página, a foto de rosto da autora era vinculada a diversas “comunidades” (terminologia própria do Orkut), tais como: “Lésbicas de POA, “Fantasia, Taras e Fetiches”, Sexo Ceará”, “Nós amamos as lésbicas”, “Ejaculação Feminina”, “Eu amo Calcinhas Safadas”, “Mulheres Batem Siririca”, “Minha buceta ejacula”, entre outras.

Superado este ponto, passo a averiguar a existência de culpa por parte da requerida, requisito indispensável para a configuração da responsabilidade civil extracontratual, prevista nos arts. 186 e 927 do Código Civil.

(…)

O agir omissivo da ré configurou-se no momento em que esta se negou a atender a solicitação do advogado da autora (fls. 50/51) para que a página de “Dany Freitas” fosse imediatamente excluída do site de relacionamentos. Além do mais, exigir que a pessoa lesada faça um requerimento em língua inglesa para serem retiradas informações inverídicas a seu respeito é um tanto absurdo, pois, conforme é divulgado na imprensa, o Brasil é o país com o maior número de pessoas cadastradas no Orkut e o mínimo que se pode esperar é que haja a possibilidade de comunicação em língua portuguesa entre os usuários e os responsáveis pelo provedor. Fora isso, a própria ré admitiu na contestação que só tomou providências para retirar a foto da autora da rede após determinação judicial, com a imposição de multa diária de R$ 1 mil, caso fosse descumprida a ordem. Portanto, devidamente caracterizado o agir omissivo da ré, surge o direito de indenizar, com fulcro no artigo 186 do CC.

(…). No caso em apreço, considero que a autora, pelo simples fato de se ter cadastrado no Orkut, assumiu o risco de que situações como essa acontecessem. Ora, navegar pelo Orkut não representa nada mais do que uma simples passatempo ou um mero lazer do usuário. Ninguém é obrigado a se associar nele ou divulgar na Internet fotos pessoais, as quais poderão ser vistas por uma infinidade de pessoas. Participar de comunidades de relacionamento na Internet é uma opção da pessoa, não sendo, por exemplo, algo imprescindível ao exercício da atividade profissional ou uma forma necessária para se relacionar bem em sociedade.


(…), tendo em vista que a requerente, tendo ingressado no site de relacionamentos Orkut e lá divulgado fotos pessoais, assumiu o risco de que danos à sua imagem ocorressem. A quantia deve ser corrigida monetariamente, pelo IGP-M, desde a data da sessão de julgamento, e acrescida de juros moratórios, a partir da citação, fixados no percentual de 1% ao mês, por força do artigo 406 do Código Civil c/c o artigo 161, §1º, do CTN.

DES. LEO LIMA – Presidente – Apelação Cível nº 70019724475, Comarca de Porto Alegre: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA RÉ, JULGANDO PREJUDICADO, EM PARTE, O RECURSO ADESIVO DA AUTORA E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVERAM-NO. UNÂNIME."[13]

O próprio STJ decidiu que há casos em que a indenização pela divulgação de imagem sem autorização era indevidas:

DIREITO CIVIL. DIREITO DE IMAGEM. TOPLESS PRATICADO EM CENÁRIO PÚBLICO.

Não se pode cometer o delírio de, em nome do direito de privacidade, estabelecer-se uma redoma protetora em torno de uma pessoa para torná-la imune de qualquer veiculação atinente a sua imagem.

Se a demandante expõe sua imagem em cenário público, não é ilícita ou indevida sua reprodução pela imprensa, uma vez que a proteção à privacidade encontra limite na própria exposição realizada.

Recurso especial não conhecido.[14]

Os tribunais brasileiros vêm enfrentando e resolvendo a questão da indenização proveniente da divulgação danosa e/ou indevida, sinalizando a favor da responsabilização do causador do dano. Desta feita, quando o dano ocorrido foi ocasionado por terceiro, a indenização a vítima é devida porém quando a própria vítima concorre ou ocasiona o dano, sua contribuição deve ser analisada para mensurar o quantum indenizatório ou até mesmo a existência do dever de indenizar.

Conclusão

Há tempos, o ser humano se preocupa com a integridade do seu direito à imagem, pois verificamos legislações que datam do início do século, principalmente as européias, demonstrando, assim, a antiga necessidade de se fixar normas para balizar a conduta sobre o direito e a especulação de sua imagem.

Atualmente, o direito à imagem tomou uma repercussão muito grande devido à multiplicidade de meios para sua divulgação e a superexposição causada por tais meios.

A internet, com suas facilidades e atrativos, tornou-se um “prato cheio” para a exposição de fotos pessoais, sem que um efetivo controle pudesse ser feito. Existem blogs, fotologs e sites de relacionamentos que passam a falsa impressão de privacidade, mas, na verdade, são grandes vitrines no mundo virtual.

É sabido que a internet é um lugar de acesso ilimitado, que pode ser vista por todos em qualquer lugar, podendo ser considerado como um meio público, assim como os dados lançados no Orkut poderão ser acessados por qualquer internauta.

Sites e e-mails reunindo fotos descuidadas e inconvenientes expostas no orkut, sem a intenção de ofender o fotografado, são comuns e circulam normalmente pela internet.

De acordo com a legislação brasileira, aquele que provocar dano a outrem será obrigado a indenizá-lo, porém tal indenização deverá respeitar a proporção de culpa de cada uma das partes, conforme o artigo 927 do Código Civil Brasileiro.

Ao disponibilizar fotos particulares e até intimas na ferramenta “álbum” do referido site, a vítima assume o risco de vê-las circulando pela internet. Portanto, estando as mesmas sem qualquer material que agregue conotação pejorativa, estaremos diante do caso de culpa exclusiva da vítima, não sendo devida a indenização prevista no artigo 927 do Código Civil.

A jurisprudência também sinaliza neste sentido, diminuindo o valor das indenizações ou, em alguns casos, julgando as mesmas indevidas.

Assim, a melhor forma de proteção é o bom senso e a cautela na hora de divulgar suas imagens na internet bom senso para selecionar as imagens divulgadas e cautela no modo de sua divulgação.


Referências

BIANCO, João Carlos. A obra fotográfica, o direito à imagem, à vida privada e à intimidade. Disponível em: . Acesso em 04/06/2008.

BRASIL, Constituição Federal de 1988. São Paulo: Saraiva, 2006.

BRASIL, Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2004.

BITTAR, Carlos Alberto. Contornos atuais do direito do autor, 2ª ed., revista atualizada e ampliada de conformidade com a Lei nº 9.610, de 10.12.1998,

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 16. ed.. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 7.

FRANCIULLI, Domingos Netto. A Proteção ao Direito à Imagem e a Constituição Federal. Disponível em: : . Acesso em 03/06/2008.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 13º ed. São Paulo: Atlas, 2003

MORAES, Walter. Direito à própria imagem. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 61, n. 443, setembro de 1972, p. 64, et seq.

SOBRE O ORKUT. Disponível em: <http://www.orkut.com/About.aspx>. Acesso em: 26 de agosto de 2007.

STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.p.118

WIKIPEDIA. Disponível em:

. Acesso em 04/06/2008.


 

[1] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 13º ed. São Paulo: Atlas, 2003.

[2] MORAES, Walter. Direito à própria imagem. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 61, n. 443, setembro de 1972, p. 64, et seq, por FRANCIULLI, Domingos Netto. A Proteção ao Direito à Imagem e a Constituição Federal. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace>. Acesso em 03/06/2008.

[3] BITTAR, Carlos Alberto. Contornos atuais do direito do autor, 2ª ed., revista atualizada e ampliada de conformidade com a Lei nº 9.610, de 10.12.1998, por EDUARDO CARLOS BIANCO BITTAR. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, pág. 212..

[4] Wikipedia. Disponível em:

. Acesso em 04/06/2008.

[5] Sobre o orkut. Disponível em: <http://www.orkut.com/About.aspx>. Acesso em: 26 de agosto de 2007

[6] FRANCIULLI, Domingos Netto. A Proteção ao Direito à Imagem e a Constituição Federal. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace>. Acesso em 03/06/2008.

[7] STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.p.118

[8] DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 16. ed.. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 7.

[9] por STOCO, Rui, op. Cit 9

[10] Agravo de Instrumento 5566584700, Comarca: Bauru, Relator(a): Piva Rodrigues, Órgão julgador: 9ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 20/05/2008, Data de registro: 29/05/2008.

[11] TJ/RS – 9ª Câmara – Apelação n.º 70018031955 – Rel. Des. Iris Helena Medeiros Nogueira – Julg. 14.02.2007

[12] Embargos Infringentes 3487714201, Relator(a): Maia da Cunha, Comarca: F.D. Ferraz de Vasconcelos/POA, Órgão julgador: 4ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 29/11/2007, Data de registro: 03/01/2008.

[13]TJ/RS – Apelação Cível n.º 70019724475, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Quinta Câmara Cível, Data de Julgamento: 01/08/2007, Publicação: Diário de Justiça do dia 08/08/2007

[14] REsp 595600 / SC Recurso Especial 2003/0177033-2, Relator(a): Ministro Cesar Asfor Rocha, Órgão Julgador: T4 – Quarta Turma, Data do Julgamento: 18/03/2004, Data da Publicação/Fonte: DJ 13.09.2004 p. 259, RDR vol. 31 p. 442, RSTJ vol. 184 p. 386.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!