Direito à palavra

Regra sobre sustentação do CNJ pode ser disseminada

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20 de abril de 2009, 12h36

O regimento interno do Conselho Nacional de Justiça permite que a sustentação oral feita pelos advogados das partes possa ser feita depois do voto do relator. Para o conselheiro Técio Lins e Silva, o CNJ prestou um serviço ao estabelecer tal regra. E mais, a norma pode ser aplicada e invocada em todos os tribunais.

De acordo com o artigo 125 do regimento, o advogado tem 10 minutos para fazer a sustentação. “Apresentado o relatório, preferentemente resumido, o relator antecipará a conclusão do voto, hipótese em que poderá ocorrer a desistência da sustentação oral, assegurada pelo presidente a palavra ao interessado se houver qualquer voto divergente do antecipado pelo relator”, diz o texto.

Técio Lins, que participou de palestra realizada pela Câmara Britânica de Comércio e Indústria no Brasil, lembrou que o procedimento não está previsto em lei. Para o conselheiro, permitir que o advogado fale depois de já saber o voto do relator é democrático. “O advogado tem oportunidade de corrigir eventual equívoco do relator”, constata.

A advogada Bárbara Lupetti, do Zeraik Advogados Associados, que estuda práticas do Judiciário que não estão, necessariamente, em lei, acredita que a regra do CNJ permite que o processo de tomada de decisão seja mais consensual. Segundo ela, o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, no Rio, já atua dessa forma há muito tempo.

“É bastante interessante, do ponto de vista democrático e visando a uma lógica mais dialogal do processo, que o relator adiante o seu voto. Isso permite que, pragmaticamente, as questões sejam resolvidas de forma pontual”, afirma. Isso porque, explica, na sessão de julgamento serão discutidos os pontos de divergências. “Os advogados terão uma participação mais efetiva no processo”, constata.

A sustentação oral nos tribunais, dependendo da Câmara ou Turma, e dos ânimos de julgadores e partes, pode causar situações constrangedoras. Os tribunais costumam regulamentar o tema, mas na prática são os presidentes das Câmaras que decidem como a sustentação será feita. No Tribunal de Justiça do Rio, os advogados falam antes do relator. Em alguns julgamentos nas Câmaras Cíveis, surgem dúvidas nos outros membros do colegiado sobre determinado ponto do processo. A participação do advogado para esclarecer questão de ordem, ou que a defesa alega ser uma, depende do desembargador presidente da Câmara ou relator. Nem sempre é concedida a palavra com o argumento de que o momento do advogado falar já havia passado.

Regra debatida

Apesar de a sustentação oral não ser regulamentada por lei, mas por regimentos internos dos tribunais, o Supremo Tribunal Federal já discutiu o inciso IX, do artigo 7º, do Estatuto da Advocacia. O dispositivo previa que a sustentação oral dos advogados deveria ocorrer após o voto do relator.

Mas em 2006 a regra foi contestada no STF pela Associação dos Magistrados Brasileiros, que entrou com Ação Direta de Inconstitucionalidade, questionando, entre outros dispositivos da Lei 8.906/94, a regra para sustentação.

A Ordem dos Advogados do Brasil sustentou que, conhecendo o teor da decisão, os advogados poderiam intervir no julgamento, com base na fundamentação do voto. De maneira mais objetiva, poderiam convencer os demais julgadores, uma vez que se discutiria somente as questões traçadas pelo voto. Para a OAB, haveria uma decisão mais justa e um julgamento com mais qualidade e precisão.

Outros entendiam que a sustentação após o voto do relator intervém no resultado do julgamento. Por maioria, o STF declarou inconstitucional o dispositivo do Estatuto, entendendo que a prática representa interferência dos advogados no ato de julgar. Na época, ficaram vencidos os ministros Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence, este último já aposentado.

“Acho que essa reação da AMB tem vinculação não apenas com uma luta corporativa que, lamentavelmente, existe entre magistrados e advogados, mas também com uma questão central e muito problemática em nosso sistema: a de que os operadores do Direito não estão acostumados com o consenso, mas sim, com o contraditório, que os afasta e os torna, necessariamente, opositores contumazes”, afirma a advogada Bárbara Lupetti.

Em um processo elaborado a partir dessa perspectiva, explica a advogada, o diálogo das partes é sempre visto como uma ameaça, pois toda a lógica do processo está centrada na necessária oposição de teses e jamais em mecanismos que aproximem as versões do processo, por via consensual.

Para a advogada, quem decide no final das contas é o juiz. “Não me parece que isso vá mudar simplesmente porque o advogado vai falar após a manifestação de voto do relator”, conclui.

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