Fora dos autos

Questões polêmicas e posicionamentos discutíveis

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14 de abril de 2009, 16h22

A leitura do artigo “O papel político do Judiciário na ordem constitucional vigente”, do professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho (Revista do Advogado da Aasp, n. 91 e nesta revista eletrônica, no último dia 8 – clique aqui para ler), sugere que a visibilidade e o prestígio dos juízes, ao lado de aspectos positivos, também podem trazer distorções. Mais peso político implica mais influência. Mais influência traz responsabilidades maiores. E diante desse quadro há que se fazer opções — o que aumenta o risco do erro. No caso, pela possibilidade de perda da imparcialidade porquanto, ao decidir questões políticas, o Judiciário fica sujeito, ele próprio, a um viés ideológico inapropriado.

O ponto de vista do professor não deve ser abraçado sem reflexão. Ao contrário, sugere um bom debate. Afinal, não há um único setor da vida nacional que não esteja fadado a aperfeiçoar-se com a prática regular da crítica e da autocrítica. O Judiciário há de beneficiar-se também com isso.

Desse contexto do exercício da atividade política, dois exemplos muito presentes de iniciativas de entidade que pretendeu mostrar  todos os anseios da Magistratura, foram a tentativa de proibir registro a candidatos a cargos eletivos, por figurar no pólo passivo de processos judiciais e, a proposta de revisão da Lei da Anistia.

A entidade, a Associação dos Magistrados Brasileiros, explorou intensamente, com ares de campanha cívica, as duas bandeiras. A primeira delas diz respeito ao processo eleitoral de 2008. Questionável. Afinal, juízes não têm atribuição legislativa e, ressalva feita ao Tribunal Superior Eleitoral, competência jurisdicional para impor normas inexistentes ao registro de candidatos. A campanha chamou a atenção para o fato de que muitas pessoas passam anos respondendo a processos exatamente por causa da morosidade. Tivessem julgamento definitivo, não seria necessário produzir “listas sujas”. O impedimento estaria configurado. Em caso de absolvição do acusado, a lista suja divulgada antes configura uma injustiça. Ou, meio complicado,  quando praticada em nome da Magistratura.

Agora, o que é bem mais atual, divulga-se “o posicionamento” da entidade na discussão da chamada “lei da anistia”. Pelo que se sabe, alguns colegas já decidiram a esse respeito. Nem todos com a “interpretação” e “convicção” informadas na nota e em um ofício da associação, favorável à revisão. Outros ainda devem fazê-lo, quer porque está em pauta, quer porque também se informou que um Ministro de Estado sugeriu quebrar alguma resistência contrária ao seu entendimento dessa lei, “pelo cansaço”, conclamando “as vitimas da repressão militar, seus familiares e as entidades de direitos humanos a abarrotarem os escaninhos do Judiciário de processos” (Blog do Josias, Folha de S. Paulo, 28 de fevereiro de 2009 — clique aqui para ler). 

Daí porque também registro a dúvida quanto à oportunidade da manifestação. Afinal, “… a percepção de que o judiciário tem um papel político pode criar a tentação de afeiçoá-lo ao partido ou partidos que prevaleçam naquele momento na cúpula governamental. À perda da imparcialidade, aí, somar-se-ia a perda da independência.” (confira artigo citado).

Contudo, como se sabe, também no Poder Judiciário, uma coisa é o que decorre do exercício de  mandato conferido por alguns, necessariamente associados, outra, é a toga. Aliás, consta que essa deliberação do Conselho de Representantes da entidade não foi unânime — o que, por si só, indica que a iniciativa não reflete essa vontade da corporação.

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