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Fisco busca manter contribuição sobre aviso-prévio

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6 de abril de 2009, 17h40

Mesmo com a chuva de decisões judiciais contrárias à cobrança de contribuição previdenciária sobre o aviso-prévio pago pelas empresas aos empregados demitidos, o fisco aposta firmemente numa virada de jogo. A incidência das contribuições foi ressucitada pelo governo federal em janeiro, com a edição do Decreto 6.727.

Os contribuintes alegam que a norma não poderia criar novo tributo, função conferida apenas a leis complementares. Até agora, o argumento tem convencido os juízes em todo o país, que já expediram diversas liminares e uma sentença — única da qual se tem notícia. O argumento da Fazenda para reverter essas decisões, no entanto, é semelhante ao dos contribuintes: que o decreto que isentou essas verbas das contribuições, em 1999, foi além do que a lei permitia, e que a norma baixada em janeiro corrigiu esse erro.

Desde 1991, a lei que dita as regras das cobranças previdenciárias — a Lei 8.212/91 — prevê que valores pagos a título de aviso-prévio indenizado não fazem parte da base de cálculo para os recolhimentos das empresas, nem sofrem retenção da parte que coubesse ao empregado demitido. O aviso-prévio indenizado é pago pelo empregador quando quer demitir um funcionário imediatamente, sem dar-lhe o prazo de 30 dias de antecedência a que ele tem direito, como prevê o artigo 487 da Consolidação das Leis Trabalhistas. Até 1997, a verba estava livre da contribuição de acordo com o artigo 28 da Lei 8.212, no inciso I, parágrafo 9º, alínea “e”. Mas a Medida Provisória 1.596, de novembro de 1997, retirou do texto da Lei 8.212 a exceção concedida no artigo 28. A MP foi convertida, no mesmo ano, na Lei 9.528.

O cenário voltou a mudar com a publicação do Decreto 3.048, de 1999. O artigo 214, parágrafo 9º, inciso V, alínea “f”, excluiu as indenizações por aviso-prévio não trabalhado da lista de recebimentos tributados pela contribuição previdenciária. “O decreto de 1999 contraria a nova redação dada à Lei 8.212”, afirma o procurador-geral adjunto Fabrício Da Soller, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. A constatação foi o motivo da promulgação da nova norma em janeiro, que revogou o trecho do Decreto 3.048 relacionado ao aviso-prévio indenizado.

Na opinião dos contribuintes, no entanto, o fisco insiste em uma batalha perdida, já que decisões de dois tribunais superiores refutaram esse tipo de cobrança. A mais recente é do Tribunal Superior do Trabalho que, em fevereiro, não conheceu um recurso da PGFN contra um supermercado que se opôs ao recolhimento. A ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, da 8ª Turma, entendeu que “os valores pagos a título de aviso prévio indenizado, por não se destinarem a retribuir trabalho, nem a remunerar tempo à disposição do empregador, não se sujeitam à incidência da contribuição previdenciária”. Assim, os ministros rejeitaram o Recurso de Revista 483/2005.003.01.00.9.

Em 2007, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça foi clara nesse sentido: “Os valores pagos relativos ao auxílio-acidente, ao aviso-prévio indenizado, ao auxílio-creche, ao abono de férias e ao terço de férias indenizadas não se sujeitam à incidência da exação, tendo em conta o seu caráter indenizatório”, disse em seu voto o ministro José Delgado, relator do Recurso Especial 973.436, movido pelo Instituto Nacional do Seguro Social, que acabou sendo derrotado pela empresa Cremer S/A.

O argumento tem sido o mais forte contra a tese da cobrança e garantido os resultados positivos até agora aos contribuintes. “Verba indenizatória não pode sofrer incidência da contribuição porque não é retribuição por trabalho feito”, diz o advogado Alexandre Furtado, do escritório Dias de Andrade Furtado Advogados. O tributarista acaba de conseguir uma liminar em favor das empresas filiadas ao Sindicato do Comércio Varejista de Gêneros Alimentícios do Estado de São Paulo (Sincovaga) — como os hipermercados Wall Mart, Carrefour e Pão de Açúcar —, expedida pelo juiz Wilson Zahuy Filho, da 13ª Vara Cível da Capital — clique aqui para ler.

A decisão se baseou no artigo 195, inciso I, alínea “a”, da Constituição Federal, que restringe a cobrança de contribuições sociais incidentes sobre “folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço". Para o juiz, o texto constitucional “não abrange as parcelas percebidas a título de indenização”. Decisões semelhantes também já foram dadas pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, no processo 2001.03.99.007489-6, e pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, no processo 00001.2007.441.02.00.00-6.

O procurador da Fazenda Fabrício Da Soller lembra, no entanto, que o STJ também já afirmou que nem tudo o que é indenização está livre de tributação. “É o caso das indenizações de horas trabalhadas, consideradas como acréscimo patrimonial”, afirma. Em novembro, a 1ª Turma da corte acolheu um recurso da União que exigia o pagamento de Imposto de Renda de Pessoa Física sobre as verbas. A decisão foi dada no Recurso Especial 921.671.

Para o advogado Alexandre Furtado, um dos motivos da mudança é a tentativa da União em compensar o déficit previsto para o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), divulgado pelo Ministério do Trabalho em R$ 3,7 bilhões até 2011, principalmente devido ao aumento do número de parcelas do seguro-desemprego a serem sacadas pelos trabalhadores. “A outra razão foi tentar tornar as demissões mais caras, mas o governo não pode querer ditar às empresas se elas devem ou não demitir empregados”, diz.

O efeito da obrigação para as empresas é um repasse de 20% de todos os valores pagos a título de aviso-prévio indenizado. Para os funcionários demitidos, o desconto varia de 8% a 11% das verbas recebidas, como lembra a advogada Sarina Manata Sasaki, da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio), à qual o Sincovaga é vinculado. “Não há como contestar um decreto por meio de ação de controle concentrado. Portanto, a saída são ações coletivas movidas pelos próprios sindicatos”, explica.

Processo 2009.61.00.004954-6

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