Amarras da lei

Constituição de 1988 precisa se adaptar ao mundo global

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28 de setembro de 2008, 0h00

A Constituição Federal aprovada em 1988 cumpriu seu papel ao permitir avanços sociais e garantir princípios democráticos no país. No entanto, precisa evoluir, diz o senador José Agripino, que participou da assembléia constituinte. Para ele, o texto constitucional, que foi um reflexo do Estado gigante que era necessário naquele momento, ficou em descompasso com o processo de globalização pelo qual já passavam os países desenvolvidos.

“O que deu certo foi o mundo da economia aberta e globalizada, o Estado menor e enxuto.” Mas não foi falta de coragem da constituine brasileira, considera Agripino. “A democracia brasileira atravessa etapas. Alguns séculos separam o Brasil da Inglaterra e França. A revolução industrial, por exemplo, ocorreu no Brasil séculos depois de ter nascido na Inglaterra.” O senador aposta que o Brasil vai chegar a um Estado mais enxuto em menos tempo que os outros países levaram.

As declarações do senador foram dadas em entrevista para a jornalista Teresa Cardoso, da Agência Senado, em uma série de entrevista que a agência faz para comemorar os 20 anos da Constituiçõa Federal, completados em outubro. Para o senador José Agripino, líder do Democratas, a constituinte cometeu excessos, “mas fez o país avançar”.

Leia a entrevista

Como o senhor vê a Constituição que ajudou a escrever?

José Agripino – A constituinte cometeu excessos, mas tudo com o propósito de fazer o país avançar. Vi como foi penoso elaborar um texto. Este refletiu o viés político do momento — o do Estado gigante e socializante. O texto procurou valorizar o Ministério Público, a Justiça e os órgãos que defendem os direitos sociais. Muitas vezes, foram garantidos direitos que o orçamento não conseguia resguardar.

Quais os méritos da Constituição aprovada em 1988?

José Agripino – A constituinte serviu para promover o debate, oxigenar as idéias e fazer a sociedade refletir sobre o país que queria. Certo ou errado, todos defenderam princípios, construíram convicções, chocaram-se com idéias opostas e, ao final, votaram democraticamente. A constituinte de 20 anos atrás cumpriu seu papel; apontou para avanços sociais, garantiu os princípios democráticos com o fortalecimento das instituições, ou seja, trabalhou pelo Brasil. Teve excessos em alguns momentos, mas fez o país avançar.

Onde a constituinte errou?

José Agripino – Houve um equívoco grave. O andamento do texto constitucional apontava para o parlamentarismo e, ao final, por um ou dois votos, ganhou o sistema presidencialista. O instituto da Medida Provisória, então, assim como muitos instrumentos legislativos que diziam respeito a um sistema parlamentarista de governo e que dificilmente cumpririam seu papel em um regime presidencialista, foram preservados. Com isso, o Poder Legislativo foi desprestigiado ao longo do tempo. Tudo por culpa de uma visão equivocada cuja gravidade não foi percebida naquela época.

Enquanto a constituinte se reunia no Brasil, a então primeira ministra britânica Margareth Thatcher reduzia a presença do Estado na economia do Reino Unido e o mundo se abria para o liberalismo econômico. A Constituição brasileira ficou em descompasso com a globalização?

José Agripino – Sem dúvida. O que deu certo foi o mundo da economia aberta e globalizada, a prevalência da eficiência, da competência, a liberdade de iniciativa, o Estado menor e enxuto. Mas foi preciso coragem para alguns países e estadistas mostrarem que a perspectiva de futuro ocorreria por aquele viés, como Margareth Thatcher apontou na Inglaterra.

Faltou coragem aos constituintes para avançar?

José Agripino – Não é isso. A democracia brasileira atravessa etapas. Alguns séculos separam o Brasil da Inglaterra e França. A revolução industrial, por exemplo, ocorreu no Brasil séculos depois de ter nascido na Inglaterra. O Brasil cumpre bem etapas de um processo de amadurecimento da democracia.O Brasil vai chegar a ser um Estado menos regulador mais rápido do que outras nações conseguiram chegar.

A Constituição é culpada pelas regras que dificultam a criação de empresas no Brasil?

José Agripino – O Estado gigante, a burocracia e a corrupção são elementos que puxam para baixo o crescimento do país. Algumas dessas amarras têm origem lá atrás, mas não acho que a Constituição é a principal amarra do país. Mesmo assim, é preciso adequar o texto constitucional à realidade do mundo hoje.

A Constituição é motivo de orgulho para o senhor?

José Agripino – É motivo de respeito. Ela cumpriu seu papel em uma fase de transição da história brasileira. Seria motivo de orgulho se fosse uma peça acabada para os dia de hoje. Isso ela não é.

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