Invasões de competência

Informes da Abin não chegam a Lula, reclamam servidores

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21 de setembro de 2008, 15h07

A Operação Satiagraha, da Polícia Federal, seguida pela revelação da revista Veja de que agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) estariam envolvidos com grampos ilegais no Supremo Tribunal Federal, acabou mostrando e intensificando uma disputa de poder entre instituições com competências distintas, mas subordinadas ao governo. Reportagem publicada neste domingo (21/9) pelo jornal Estado de S. Paulo sustenta que depoimentos no Congresso revelaram invasões de competências, ineficiência, falta de comando, suspeitas de práticas de espionagens ilegais e trocas de acusações abertas entre representantes do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), da Abin, da PF e do Ministério da Defesa.

O texto, dos jornalistas Felipe Recondo e Marcelo de Moraes, traz ainda a reclamação de servidores da Abin de que muitos dos documentos produzidos pelo órgão sequer chegam ao conhecimento do presidente Lula e de seus auxiliares. A insatisfação não é só na Abin. Um grupo de policiais federais também não está satisfeito desde que Paulo Lacerda foi substituído pelo atual diretor Luiz Fernando Corrêa. A reportagem afirma que Lacerda foi comandar a Abin, mas sua influência na PF não diminuiu. Agentes do órgão de inteligência participaram da Operação Satiagraha, que prendeu o banqueiro Daniel Dantas, o investidor Naji Nahas e o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta, já soltos por ordem do Supremo.

Um assessor do presidente Lula resumiu ao jornal o debate travado hoje no Planalto. “À falta de uma política de inteligência, todos os governos, sem exceção, adotaram a ‘política do fusível’. Todos tentaram escolher diretores que funcionassem como fusíveis que isolariam os problemas. Quando o problema estoura, troca-se o fusível, mas o problema é a falta de sistema elétrico, falta a política pública do setor”, afirmou.

O presidente da Comissão de Segurança Pública, deputado Raul Jungmann (PPS-PE), afirmou que o governo Lula “aumentou o potencial problemático da área ao escolher homens de investigação para um serviço de informação especial e inteligência, que não resistem à tentação de arrastar a Abin para o jeito policial de ser”.

Jungmann se refere aos casos do delegado Mauro Marcelo, da Polícia Civil de São Paulo, que caiu em julho de 2005, e de Paulo Lacerda, delegado de longa carreira na PF afastado da direção-geral duas semanas atrás. Na Abin, é grande a insatisfação com o trabalho do ministro-chefe do GSI, general Jorge Armando Félix. Os agentes da Abin acham que Félix não tem competência para coordenar as ações de inteligência. O general não quis responder aos comentários sobre sua administração.

A participação da Abin na Operação Satiagraha mostrou que o modo como cooperação se deu foi fora do comum. Lacerda cedeu 56 agentes. Mais atípico foi o fato de o diretor-geral da PF declarar que não tinha nenhum conhecimento dessa participação. “Não houve nenhuma comunicação nas instâncias superiores da polícia deste procedimento”, afirmou em depoimento à Comissão Mista de Controle de Atividades de Inteligência. Lacerda afirmou os agentes tinham permissão para participar da ação da PF e “lamentou” que o colega não soubesse do caso.

Espaço para espiões

Com a confusão nas instituições, o Brasil se torna mais vulnerável à espionagem econômica e industrial por parte de agentes internacionais. Informes da Abin já registram a presença no país de pelo menos uma dezena de espiões profissionais estrangeiros interessados em informações estratégicas na área de combustíveis alternativos, exploração de petróleo no pré-sal e avanços na área nuclear, entre outros pontos.

Segundo o Estadão, agentes da Abin têm monitorado a atividade de garimpagem de informações estratégicas, mas admitem que podem existir outros espiões não descobertos atuando no país. Os agentes se dizem preocupados com o roubo de segredos tecnológicos brasileiros e até mesmo a ocorrência de sabotagens. A preocupação seria o motivo para que uma corrente dentro da Abin defenda a aprovação de que o órgão possa fazer escutas telefônicas. Pela lei, a Abin não pode interceptar conversas nem mesmo com autorização judicial.

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