Desenvolvimento limpo

Brasil tem capacidade para gerar diversos créditos de carbono

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15 de setembro de 2008, 0h00

Muito se fala entre os estudiosos e interessados no recente Mercado de Carbono sobre o enorme potencial brasileiro para o desenvolvimento dos Projetos MDL — Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. Mas do que se trata o MDL, como o Brasil se encaixa neste crescente mercado e quais os benefícios que o empresariado brasileiro poderá obter?

O MDL é definido pelo artigo 12 do Protocolo de Kyoto e tem por objetivo auxiliar os países em desenvolvimento, que não têm metas para cumprir na redução dos gases de efeito estufa a atingirem o desenvolvimento sustentável, bem como auxiliar os países que possuem metas de redução — os países chamados “Anexo I” a cumprirem suas metas de limitação e emissão das reduções.

O Brasil, bem como o restante dos países em desenvolvimentos, tem oportunidade de implementar projetos de MDL, gerando créditos em seu favor e podendo vender esses créditos para os países do Anexo I do Protocolo de Kyoto, com metas de redução para cumprir.

A vantagem de o Brasil não ter metas a cumprir é que poderá vender a totalidade dos créditos que consiga produzir na redução das emissões.

Devemos alertar ainda o fato de que o Brasil sabidamente é um país que possui uma enormidade de recursos naturais, tendo um grande potencial para desenvolver projetos nos setores energéticos, especialmente energia proveniente da biomassa e biogás produzido nos aterros sanitários, e ainda alguns tipos de projetos florestais.

Assim, a geração de créditos de carbono poderá se dar, por exemplo, por meio de projetos que visam a proteção e o aumento de sumidouros e reservatórios de gases de efeito estufa, a promoção de práticas sustentáveis de manejo florestal, florestamento e reflorestamento de algumas áreas degradadas.

Ainda, pode-se recorrer ao desenvolvimento de energias alternativas, mudança da matriz energética, substituição dos combustíveis fósseis por outros renováveis como gás natural ou biomassa, entre outros.

[1]Devemos ressaltar que os projetos devem utilizar metodologias aprovadas. Posteriormente, devem ser validados por Entidades Operacionais Designadas e posteriormente serem aprovados e registrados pelo Conselho Executivo do MDL (ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia).

Por fim, devem aprovados pelo governo do país anfitrião pela Autoridade nacional Designada, que no caso brasileiro é a chamada Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima (também ligada ao Ministério de Ciência e Tecnologia), bem como pelo governo do país do já citado Anexo I que participará da negociação.

Os projetos de MDL se iniciam com a concepção do projeto, consistente em um esboço do que vai ser o projeto. Após, deve ser preparado o Documento de Concepção do Projeto (DCP), que contém metodologias e setores estabelecidos pelo Conselho Executivo de MDL, com estimativas e cálculos de linha de base para as futuras emissões de carbono, obtendo as certificações necessárias como, por exemplo, a ISO 14000.

Assim, com o documento feito, o projeto recebe a validação das empresas certificadoras denominadas Entidades Operacionais Designadas. Essas entidades devem ser qualificadas e reconhecidas pelo Conselho Executivo do MDL e pela Comissão Interministerial de Mudanças Globais do Clima. Depois, o projeto é encaminhado para aprovação pela Autoridade Nacional Designada.

Após as validações e aprovações, a ONU (especificamente, o Conselho Executivo da CQNUMC) registra o projeto. Passadas todas essas etapas, o projeto estará pronto para ser implementado.

Ressalta-se que a cada ano o projeto deverá ser submetido por um monitoramento de uma empresa de consultoria, bem como outra de qualificação, devendo ser constatado se a quantidade de carbono emitido corresponde ao planejado no projeto.

Finalmente, com as medições realizadas, o projeto é verificado e apresentado à ONU, que certificará a empresa e emitirá Reduções Certificadas de Emissões (RCEs) — <i>Certified Emission Reductions</i> (CERs).

Devemos alertar que várias entidades nacionais e internacionais já estão se dedicando à criação e manutenção de fundos que têm o objetivo de investir nas várias fases dos projetos MDL.

Uma excelente notícia para os países em desenvolvimento, como o caso do Brasil, é a aprovação da criação dos “Fundos de Desenvolvimento do Clima” (CIF) pela Diretoria Executiva do Banco Mundial em 01 de agosto de 2008.[2]

Um dos Fundos criados foi o Fundo de Tecnologia Limpa, que irá proporcionar grandes recursos financeiros para investimento nos programas de projetos MDL. Referidos Fundos têm o condão de demonstrar, implantar e transferir tecnologias com baixa produção de carbono.

Conforme o Presidente do Banco Mundial, Roberto B. Zoellick: “O Plano de Ação de Bali[3] sobre as mudanças climáticas chama a comunidade internacional para agir mais, providenciando fontes financeiras e investimentos que suportem ações em mitigação, adaptação e tecnologia. Estes fundos de investimento para o clima são uma resposta do Banco Mundial aos desafios da mudança climática. Eles são o elemento chave em nosso programa de 6 pontos, especificamente para providenciar financiamento inovador e concessional afim de facilitar o investimento dos setores público e privado na baixa emissão de carbono e projetos de adaptação".

Para Katherine Sierra, vice-presidente do Banco Mundial de Desenvolvimento Sustentável, “Nós podemos começar a fazer progressos hoje, apoiando iniciativas pioneiras e inovadoras, criando assim um novo corpo de experiências e conhecimentos que irão informar sobre as negociações em curso, sobre o futuro do regime das alterações climáticas.

Dentre os diversos tipos de projetos MDL que o Brasil tem capacidade de produzir, destacamos alguns em potencial, considerando os já aprovados pela Comissão interministerial de Mudanças Globais do Clima, ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia Brasileiro.

Biomassa: Grande parte dos projetos MDL aprovados no Brasil se referem ao uso da biomassa, como por exemplo, o aproveitamento de esterco, do bagaço da cana de açúcar, dos resíduos de madeira, das cascas de arroz e outros subprodutos vegetais.

Energia Eólica: A energia eólica é uma alternativa bem mais barata do que a utilização e implantação do uso da energia solar. Os projetos que envolvam energia eólica têm grande potencial no Brasil, principalmente na região Nordeste, aonde a presença de vento é constante.

Aproveitamentos de gases emanados dos Aterros Sanitários: Os aterros sanitários são conhecidos por exalarem alguns gases. Um deles, que contribui enormemente para o efeito estufa é o gás metano. Grande parte dos projetos aprovados no Brasil se refere ao reaproveitamento do gás metano à transformação do gás metano em fonte de energia.

Substituição de fontes utilizadoras de combustíveis por fontes menos poluentes: Projetos têm, sido desenvolvidos visando a alteração das fontes energéticas. A Substituição dos combustíveis fósseis, altamente poluentes por fontes menos poluidoras, tais como o etanol, gás natural e biocombustíveis são responsáveis por uma enorme redução da emissão de gases do efeito estufa.

Reflorestamento, aflorestamento e seqüestro de carbono: Os projetos de seqüestro de carbono consistentes em reflorestamento de áreas degradadas até 1989 e aflorestamento (florestamento em áreas que originalmente nunca foram florestadas) também são potenciais geradores de créditos de carbono.

No que tange a questão de florestas, observa-se que atualmente são aceitos apenas os projetos que versem sobre os tipos acima citados. O reflorestamento de áreas recentemente desmatadas e a conservação de mata nativa não geram créditos de carbono certificados pela ONU, mas apenas para comercialização no mercado voluntário.

Destacamos a argumentação de Marco Aurélio Cabral Pinto e outros[4], no sentido de que o atual desafio é aumentar não somente a oferta dos projetos de MDL, mas também a programas do MDL ligados aos biocombustíveis e de eficiência energética, que poderiam representar volumes significativamente maiores de reduções e emissões. Tais esforços setria, condizentes com a necessidade de esforços crescentes da comunidade internacional de países para conter o aquecimento global.

Assim, terminamos esse ensaio com as palavras do estudioso colega Bruno Kerlakian Sabbag[5]

“O Brasil deve permanecer atento para as oportunidades que o Protocolo de Kyoto nos apresenta, utilizando-as sempre em prol do bem-estar da população, visando ao aumento da oferta de empregos e à geração de renda para as comunidades menos favorecidas, à luz dos nossos critérios de sustentabilidade socioambiental.”


[1] Modelagem Econômica para Análise de Perspectivas no Mercado de Créditos de Carbono – Revista do BNDES, Rio de Janeiro, V.14, N. 29– Jun 2008. Pg. 123

[2]Tradução livre da página: http://web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/NEWS/0,,contentMDK:21826304~pagePK:34370~piPK:34424~theSitePK:4607,00.html

[3] O Plano de Ação de Bali, realizado pela ONU, foi um acordo firmado por representantes de 180 países que participaram da reunião realizada em dezembro do ano passado, em Bali, na Indonésia.

[4] Modelagem Econômica para Análise de Perspectivas no Mercado de Créditos de Carbono – Revista do BNDES, Rio de Janeiro, V.14, N. 29,– Jun 2008, p. 155.

[5] O protocolo de Quito e seus créditos de carbono. 1ª Ed. LTr, São Paulo, 2008, pg: 98

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