Grampos descontrolados

Projeto das escutas do governo não agrada defesa, nem acusação

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7 de setembro de 2008, 0h00

O Congresso Nacional está correndo para aprovar o projeto de lei que pretende controlar os abusos no uso de interceptações telefônicas, legais e ilegais. Mas a opinião de especialistas sobre o texto que está em discussão é a de que, na prática, ele até piora a situação atual. Certo é que a proposta consegue desagradar tanto os defensores do direito amplo de defesa, quanto os que querem garantir a efetividade das investigações a qualquer custo.

O substitutivo do Projeto de Lei do Senado 525, que mescla propostas do governo federal e do senador Jarbas Vasconcelos, será votado em segundo turno, na quarta-feira (10/9), pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Como tramita em caráter terminativo, se aprovado irá direto para a Câmara.

Os senadores decidiram colocar o pé no acelerador depois que reportagem da revista Veja revelou que telefones do Supremo Tribunal Federal estavam grampeados e que agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) foram os responsáveis. A notícia trouxe a transcrição de uma conversa entre o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO), coincidentemente, relator do substitutivo que será analisado em caráter terminativo na quarta.

O deputado federal Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), presidente da CPI das Escutas, criticou a pressa do Congresso de votar o projeto que pretende revogar a Lei 9.296/96 — que regula as interceptações telefônicas. Para ele, o Congresso tem de esperar a conclusão da CPI antes de ser aprovada qualquer nova legislação. “No momento, o juiz tem de cumprir à risca, de forma rígida, a legislação atual”, afirmou à revista Consultor Jurídico. Segundo o deputado, a mudança da lei exige discussão em cima do que a CPI está apurando.

Há dois pontos da proposta que são especialmente criticados. O primeiro é a permissão para que as interceptações durem até 360 dias, com autorizações de 60 em 60 dias. O segundo é a previsão de que a escuta pode se estender por tempo indeterminado em caso de crime permanente. E as propostas chegam no momento em que a Justiça considera abusivos os grampos que duram demais.

O Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, começa a rever o entendimento sobre o tempo em que um investigado pode ter suas comunicações monitoradas. O ministro Nilson Naves, da 6ª Turma do STJ, votou em maio deste ano no sentido de que dois anos de interceptação contínua afrontam direitos fundamentais. E começam a surgir mais decisões nesse sentido.

O projeto também inova ao fixar punições para funcionários públicos que fazem grampo ilegal ou uso indevido de escutas autorizadas. Em seu artigo 18, prevê reclusão de 2 a 4 anos, mais multa, para quem violar o sigilo de comunicação telefônica sem autorização judicial. Para os funcionários públicos, a pena deve ser aumentada de um terço até metade.

O artigo 19 estabelece que, quem fizer afirmações falsas para induzir o juiz a autorizar o grampo, será punido com reclusão de um a três anos, mais multa. Para a procuradora da República Silvana Góes, apesar de válida, a discussão sobre o assunto é falaciosa. Ela não considera a Lei 9.296/96 ruim.

“Não estou dizendo que não houve erros”, observou. Para ela, os desvios são pontuais e, como tais, devem ser corrigidos. “Já temos legislação criminal e administrativa para punir esse tipo de abuso”, afirma. O debate, explica a procuradora, ocorre no momento em que pessoas são atingidas por uma evidente mudança no status de investigação de organizações criminosas no país.

O advogado criminalista Luís Guilherme Vieira também considera que a lei em vigor não é ruim e, se fosse aplicada com o sentido que o legislador propôs quando a aprovou, o resultado já seria melhor do que o atual. Segundo o advogado, o Ministério Público não exerce o controle externo como deveria e o Judiciário determina interceptações telefônicas sem fundamentar as decisões.

Em sua análise, outra grave falha do Estado foi a demora para criar e aparelhar a Defensoria Pública. Para ele, se a Defensoria funcionasse bem, não se chegaria a essa situação de descontrole. Luís Guilherme disse que mais de 80% dos grampos são feitos em pessoas assessoradas pela Defensoria. “Nem 10% contratam advogados privados. E, geralmente, são os bons advogados que levam a questão para o Judiciário”, diz.

Ou seja, a maior parte dos abusos nas interceptações telefônicas não chega a ser questionadas adequadamente na Justiça pela falta de aparelhamento das Defensorias.

Em 2003, Luís Guilherme Vieira participou da comissão criada pelo então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, para reformar a lei de interceptação. A chamada “Comissão Ada” tinha como integrantes, além do criminalista, Ada Pellegrini Grinover, Antônio Carlos de Almeida Castro, Antônio Magalhães Gomes Filho e Antônio Scarance Fernandes. A proposta de anteprojeto foi apresentada ao ministro, mas não chegou a ser enviada ao Congresso.


Uma das sugestões foi a criação de um marco temporário para que as interceptações fossem feitas. De acordo com a comissão, o prazo máximo de 60 dias de gravações seria suficiente para comprovar, ou não, as suspeitas. A princípio, a autorização seria de 15 dias, prorrogáveis por mais 15, até completar 60 dias. O projeto não foi em frente.

O criminalista Alberto Zacharias Toron declarou que o atual projeto que irá para votação às pressas “está aquém da expectativa dos advogados”. Para ele, as escutas não podem ser prolongas por tanto tempo. Além disso, o projeto não expõe com clareza as possibilidades de interceptações e não as restringe. No mais, “não há qualquer previsão para que o advogado tenha tempo para ouvir as escutas e apresentar a sua defesa”.

Escutas a mais

Ao contrário do que se poderia imaginar, a proposta que será votada na quarta-feira abre o leque de possibilidades de interceptações telefônicas legais. A Lei 9.296/96, que está em vigor, só autoriza grampos nos casos de crimes punidos com reclusão.

O projeto de lei prevê como requisito que o crime seja punido com privação da liberdade por no mínimo um ano, de reclusão ou detenção. Muitos advogados defendem a elaboração de uma lista de crimes que podem ser objeto desse instrumento, para restringir. Como está o projeto, se virar lei, praticamente todos os crimes poderão ser investigados com escuta.

O tempo de autorização também é uma questão polêmica quando se fala de interceptação. A lei atual, em seu artigo 5º, diz que a medida não poderá exceder o prazo de 15 dias, renovável por igual período, “uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova”. Esta previsão deu ensejo a vários tipos de interpretação.

Por ironia, o Supremo Tribunal Federal, em setembro de 2004, abriu precedente para as escutas com tempo indeterminado quando interpretou este artigo no sentido de que os 15 dias são prorrogáveis pelo tempo que for necessário. Os ministros rejeitaram pedido de Habeas Corpus (HC 83.515) em decisão foi puxada pelo ministro Nelson Jobim e seguida por Eros Grau, Joaquim Barbosa, Carlos Britto, Cezar Peluso, Gilmar Mendes, Sepúlveda Pertence e Celso de Mello. O ministro Marco Aurélio ficou vencido.

A defesa dos acusados sustentava a ilegalidade de interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça Federal do Rio Grande do Sul. Os grampos foram feitos entre abril e outubro de 2001, ininterruptamente.

Em maio deste ano, o Superior Tribunal de Justiça foi chamado a se manifestar sobre a matéria. Por enquanto, só há o voto do ministro Nilson Naves, relator do HC 76.686 na 6ª Turma. “Minha opção é pelo estado de Direito, não pelo estado de orientação policialesca”, declarou.

Segundo o ministro, não é razoável esticar várias vezes o prazo de autorização para interceptações. Ele entende que a Lei 9.296/96 permite a renovação do prazo por apenas 15 dias. “Entre a liberdade e a segurança, fico com a liberdade; entre a exceção e a regra, fico com a regra”, disse. O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Paulo Gallotti.

O substitutivo do Senado, que é uma mescla da proposta apresentado pelo governo federal (PL 3.272/08) com a do senador Jarbas Vasconcelos (PLS 525/07), prevê prazo de 60 dias, prorrogáveis por, no máximo, 360 dias ininterruptos. Quando o crime for permanente, o grampo também pode ser permanente, de acordo com artigo 4º, parágrafo 1º do projeto. Essa parte desagrada todos os lados. Polícia, Ministério Público e juízes entendem que, em muitos casos, esse limite é curto para toda a investigação. Já advogados, e alguns procuradores e juízes, acham que é tempo demais.

O problema, segundo Luís Guilherme Vieira e Alberto Toron, é que a polícia passa o processo inteiro com acesso às gravações e o advogado as consegue no final do inquérito. E não há previsão de prazo para que ele possa ouvir todas as ligações e apresentar a defesa. Para eles, seria um trabalho praticamente impossível ouvir conversas telefônicas gravadas durante um ano, período que o projeto de lei permite.

Outro ponto bastante controverso é a possibilidade de interceptação da conversa entre o advogado e o cliente que está sob suspeita. As informações coletadas, no entanto, não poderão ser usadas como prova na ação. “Em nenhuma hipótese poderão ser utilizadas as informações resultantes da quebra de sigilo das comunicações entre o investigado ou acusado e seu defensor, quando este estiver no exercício da atividade profissional”, determina o parágrafo único do artigo 2º da proposta.

Leia o substitutivo

PARECER Nº , DE 2008

Da COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO, JUSTIÇA E CIDADANIA, em decisão terminativa, sobre o Projeto de Lei do Senado no 525, de 2007, que altera a Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, com vistas a estabelecer novas condições para o procedimento de interceptação telefônica, informática e telemática, além de outras providências.


RELATOR: Senador DEMÓSTENES TORRES

I — RELATÓRIO

Vem a esta Comissão para exame, em decisão terminativa, consoante os arts. 91, I, e 101, II, d, ambos do Regimento Interno do Senado Federal, o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 525, de 2007, de autoria do ilustre Senador Jarbas Vasconcelos.

Em síntese, o PLS promove as seguintes modificações na Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, que regulamenta o inciso XII, parte final, do art. 5° da Constituição Federal:

a) prevê, como requisito da autorização da interceptação telefônica, que o crime a ser investigado seja punido com privação da liberdade por no mínimo um ano, de reclusão ou detenção. Hoje, apenas se admite a interceptação telefônica nos casos de crimes punidos com reclusão;

b) prescreve que devem constar do pedido de interceptação deve a relação dos números de telefones a serem interceptados, com a indicação do titular e da data de ativação da linha, bem como o nome da autoridade policial responsável pela execução da diligência;

c) restringe a possibilidade de pedido de interceptação deduzido verbalmente à hipótese em que a vida da vítima esteja em perigo;

d) estabelece que, finalizada a instrução processual, deve-se dar ciência a todas as pessoas que tiveram suas ligações interceptadas;

e) incrementa a pena para o crime de interceptação ilícita e insere como causa de aumento de pena a hipótese de o crime ser praticado por funcionário público no exercício da sua função;

f) cria tipo penal específico para a situação em que o interessado, mediante informações falsas, induz o juiz a determinar a interceptação telefônica.

Na justificação, o autor argumenta que “crimes de incontestável gravidade (como, por exemplo, crimes ambientais, crimes contra a ordem econômica e as relações de consumo, contra as finanças públicas) são punidos com a pena de detenção”.

Ressalta que o intuito do PLS é fazer da interceptação telefônica um procedimento mais criterioso, tendo em vista o nível de invasão na intimidade e vida privada das pessoas.

Alerta, ainda, que “No Estado Democrático de Direito não se admite desvirtuamento tão grande das técnicas de investigação policial. É preciso que a polícia e o Ministério Público tenham moderação quanto ao pedido de interceptação telefônica, e que o juiz decida com a maior prudência possível.”

Até o presente momento, não foram apresentadas emendas ao projeto.

II — ANÁLISE

Preliminarmente, cabe mencionar que a matéria está adstrita ao campo da competência privativa da União para legislar sobre direito penal e processual penal, conforme dispõe o art. 22, I, da Constituição Federal. Além disso, neste caso, qualquer membro do Congresso Nacional tem legitimidade para iniciar o processo legislativo, consoante estabelece o art. 61 da Lei Magna.

Não se observa inconstitucionalidade material, tampouco vícios relacionados à juridicidade ou regimentalidade da proposição.

A discussão sobre as hipóteses e as formas de realização das interceptações telefônicas é assunto que vem freqüentando as páginas de jornal e os noticiários televisivos já há algum tempo.

O tema, como não poderia deixar de ser, é de interesse do Poder Executivo, do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil e da sociedade.

Cumpre mencionar, neste ponto, que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) nº 3.272, de 2008, de iniciativa do Presidente da República, que regulamenta a parte final do inciso XII do art. 5º da Constituição e dá outras providências. Essa proposição objetiva dar novo tratamento à matéria, regulando-a integralmente, em substituição à Lei nº 9.296, de 1996, que pretende revogar.

Referido projeto é resultado dos trabalhos de Comissão especialmente instituída para esse fim, no âmbito do Ministério da Justiça, tendo incorporado sugestões provenientes de vários órgãos públicos, entidades públicas e privadas e profissionais da área.

A mensagem que acompanha o PL alerta que “A quebra do sigilo de comunicações telefônicas constitui-se em poderoso meio posto à disposição do Estado para fins de obtenção de prova, mas também em instrumento insidioso de quebra da intimidade, não só do investigado como também de terceiros”.

Ressalta que a matéria há de ser regulada por lei inspirada no princípio da proporcionalidade, buscando a ponderação dos valores envolvidos e o justo equilíbrio entre os meios empregados e os fins a serem alcançados, apoiada nos elementos de adequação, necessidade e proporcionalidade estrita entre a restrição imposta e a vantagem alcançada.

Destaca que a doutrina aponta como grande defeito da Lei nº 9.296, de 1996, “a inobservância do princípio da proporcionalidade, pois ao mesmo tempo em que permite a quebra do sigilo das comunicações telefônicas de qualquer natureza relativamente a todos os crimes punidos com reclusão, independentemente da conduta criminosa, deixa à margem os crimes punidos com detenção para os quais a quebra do sigilo se apresentaria como meio mais adequado de investigação como, por exemplo, no crime de ameaça feita pelo telefone”.


Parece-me oportuna a apresentação desse PL, pois, de fato, a Lei em vigor se ressente de tantas atualizações que seria necessário remendá-la inúmeras vezes, com evidente prejuízo de ordem sistêmica.

Diante dessa realidade, debati o assunto com o autor do PLS nº 525, de 2007, nobre Senador Jarbas Vasconcelos, bem assim com representantes do Ministério da Justiça.

Dessas conversas, surgiu a idéia de apresentação de substitutivo ao PLS, cujo texto, apresentado a seguir, busca harmonizar as alterações propostas originalmente pelo Senador Jarbas Vasconcelos com as disposições do PL nº 3.272, de 2008, que lhe são complementares.

Substancialmente, o texto do substitutivo reflete o consenso a que chegaram os interlocutores, pela aprovação de quase todas as modificações pretendidas pelo PLS nº 525, de 2007, com aproveitamento da estrutura do PL nº 3.272, de 2008, que teve sua redação aprimorada.

III — VOTO

Pelo exposto, voto pela aprovação do Projeto de Lei do Senado nº 525, de 2007, nos termos do Substitutivo apresentado a seguir:

PROJETO DE LEI DO SENADO (SUBSTITUTIVO) Nº 525, DE 2007

Regulamenta a parte final do inciso XII do art. 5º da Constituição, e dá outras providências.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

CAPÍTULO I

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1º Esta Lei disciplina a quebra, por ordem judicial, do sigilo das comunicações telefônicas, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

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§ 1º O sigilo das comunicações telefônicas compreende:

I — o conteúdo das conversas e de quaisquer outras informações transmitidas ou recebidas no curso das ligações telefônicas;

II — os registros de dados referentes à origem, destino e duração das ligações telefônicas.

§ 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se quebra do sigilo das comunicações telefônicas a interceptação, escuta, gravação, decodificação ou qualquer outro procedimento que permita a obtenção das informações e dados de que trata o § 1º.

§ 3º As disposições desta Lei também se aplicam ao fluxo de comunicações em sistemas de tecnologia da informação e telemática.

Art. 2º A quebra do sigilo das comunicações telefônicas não será admitida na investigação criminal ou instrução processual penal de crimes de menor potencial ofensivo, assim definidos em lei, salvo quando a conduta delituosa tiver sido realizada por meio dessa modalidade de comunicação.

Parágrafo único. Em nenhuma hipótese poderão ser utilizadas as informações resultantes da quebra de sigilo das comunicações entre o investigado ou acusado e seu defensor, quando este estiver no exercício da atividade profissional.

CAPÍTULO II

DO PROCEDIMENTO

Art. 3º O pedido de quebra de sigilo das comunicações telefônicas de qualquer natureza será formulado por escrito ao juiz competente, mediante requerimento do Ministério Público ou representação da autoridade policial, ouvido, neste caso, o Ministério Público, e deverá conter:

I — a descrição precisa dos fatos investigados;

II — a indicação da existência de indícios suficientes da prática do crime objeto da investigação;

III — a qualificação do investigado ou acusado, ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, salvo impossibilidade manifesta devidamente justificada;

IV — a demonstração de ser a quebra de sigilo da comunicação estritamente necessária e da inviabilidade de ser a prova obtida por outros meios;

V — a indicação do código de identificação do sistema de comunicação, quando conhecido, e sua relação com os fatos investigados;

VII — a indicação do nome da autoridade investigante responsável pela execução ou acompanhamento de toda a medida.

Art. 4º O requerimento ou a representação será distribuído e autuado em separado na forma de incidente processual, sob segredo de justiça, devendo o juiz competente, no prazo máximo de vinte e quatro horas, proferir decisão fundamentada, que consignará de forma expressa, quando deferida a autorização, a indicação:

I — dos indícios da prática do crime;

II — dos indícios de autoria ou participação no crime, salvo impossibilidade manifesta devidamente justificada;

III — do código de identificação do sistema de comunicação, quando conhecido, e sua relação com os fatos investigados;

IV — do prazo de duração da quebra do sigilo das comunicações.

§ 1º O prazo de duração da quebra do sigilo das comunicações não poderá exceder a sessenta dias, permitida sua prorrogação por igual período, desde que continuem presentes os pressupostos autorizadores da medida, até o máximo de trezentos e sessenta dias ininterruptos, salvo quando se tratar de crime permanente, enquanto não cessar a permanência.


§ 2º O prazo correrá de forma contínua e ininterrupta e contar-se-á a partir da data do início da quebra do sigilo das comunicações pela prestadora responsável pela comunicação, que deverá comunicar este fato, imediatamente, por escrito, ao juiz.

§ 3º Para cada prorrogação será necessária nova decisão judicial fundamentada, observado o disposto no caput.

§ 4º Excepcionalmente, o juiz poderá admitir que o pedido seja formulado verbalmente, desde que estejam presentes os pressupostos que autorizem a interceptação, caso em que a concessão será condicionada à sua redução a termo, observadas as seguintes hipóteses:

I — quando a vida de uma pessoa estiver em risco, podendo o juiz dispensar momentaneamente um ou mais requisitos previstos no caput do art. 4º e seus incisos;

II — durante a execução da medida de quebra de sigilo, caso a autoridade policial identifique que o investigado ou acusado passou a fazer uso de outro número, código ou identificação em suas comunicações, havendo urgência justificável.

§ 5º Despachado o pedido verbal e adotadas as providências de que trata o caput do § 4º, os autos seguirão para manifestação do Ministério Público e retornarão à autoridade judiciária, que, em seguida, reapreciará o pedido.

Art. 5º Contra decisão que indeferir o pedido de quebra de sigilo caberá recurso em sentido estrito do Ministério Público, podendo o relator, em decisão fundamentada, conceder liminarmente o pedido de quebra.

Parágrafo único. O recurso em sentido estrito tramitará em segredo de justiça e será processado sem a oitiva do investigado ou acusado, a fim de resguardar a eficácia da investigação.

Art. 6º Do mandado judicial que determinar a quebra do sigilo das comunicações deverá constar a qualificação do investigado ou acusado, quando identificado, ou o código de identificação do sistema de comunicação, quando conhecido.

§ 1º O mandado judicial será expedido em duas vias, uma para a prestadora responsável pela comunicação e outra para a autoridade que formulou o pedido de quebra do sigilo das comunicações.

§ 2º O mandado judicial poderá ser expedido por qualquer meio idôneo, inclusive o eletrônico ou similar, desde que comprovada sua autenticidade.

Art. 7º A prestadora responsável pela comunicação deverá implementar a quebra do sigilo autorizada, indicando ao juiz o nome do profissional responsável pela operação técnica, no prazo máximo de vinte e quatro horas, contado do recebimento da ordem judicial, sob pena de multa até o efetivo cumprimento da ordem, sem prejuízo das demais sanções cabíveis.

§ 1º O serviço de que trata o caput deste artigo deve ser prestado em caráter gratuito.

§ 2º No caso de ocorrência de qualquer fato que possa colocar em risco a continuidade da interceptação, incluindo as solicitações do usuário quanto a portabilidade ou alteração do código de acesso, suspensão ou cancelamento do serviço e transferência da titularidade do contrato de prestação de serviço, a prestadora deve informar ao juiz no prazo máximo de vinte e quatro horas contadas da ciência do fato, sob pena de multa diária, sem prejuízo das demais sanções cabíveis.

Art. 8º A decretação da quebra de sigilo de comunicação caberá ao juiz competente para o julgamento do crime investigado ou responsável pelo inquérito.

Art. 9º A execução das operações técnicas necessárias à quebra do sigilo das comunicações será efetuada sob a supervisão da autoridade policial e fiscalização do Ministério Público.

Art. 10. Findas as operações técnicas, a autoridade investigante encaminhará, no prazo máximo de sessenta dias, ao juiz competente, todo o material produzido, acompanhado de auto circunstanciado, que detalhará todas as operações realizadas.

§ 1º Decorridos sessenta dias do encaminhamento do auto circunstanciado, o juiz, ouvido o Ministério Público, determinará a inutilização do material que não interessar ao processo.

§ 2º A inutilização do material será assistida pelo Ministério Público, sendo facultada a presença do acusado ou da parte interessada, bem como de seus representantes legais.

Art. 11. Recebido o material produzido, o juiz dará ciência ao Ministério Público para que requeira, se julgar necessário, no prazo de dez dias, diligências complementares.

Art. 12. Não havendo requerimento de diligências complementares ou após a realização das que tiverem sido requeridas, o juiz intimará o investigado ou acusado para que se manifeste, fornecendo-lhe cópia identificável do material produzido exclusivamente em relação à sua pessoa.

Art. 13. As dúvidas a respeito da autenticidade ou integridade do material produzido serão dirimidas pelo juiz, aplicando-se, no que couber, o disposto nos arts. 145 a 148 do Código de Processo Penal.


Art. 14. Conservar-se-á em cartório, sob segredo de justiça, as fitas magnéticas ou quaisquer outras formas de registro das comunicações cujo sigilo fora quebrado até o trânsito em julgado da sentença, quando serão destruídos na forma a ser indicada pelo juiz, de modo a preservar a intimidade dos envolvidos, observado o disposto no art. 17.

Art. 15. Na hipótese de a quebra do sigilo das comunicações telefônicas de qualquer natureza revelar indícios de crime diverso daquele para o qual a autorização foi dada e que não lhe seja conexo, a autoridade deverá remeter ao Ministério Público os documentos necessários para as providências cabíveis.

Art. 16. A prova obtida por meio da quebra de sigilo das comunicações telefônicas de qualquer natureza realizada sem a observância desta Lei não poderá ser utilizada em qualquer investigação, processo ou procedimento, seja qual for sua natureza.

Art. 17. Finda a instrução processual, dar-se-á ciência a todas as pessoas que tiveram comunicações telefônicas interceptadas, tenham ou não sido indiciadas ou denunciadas, salvo se o juiz entender, por decisão fundamentada, que a providência poderá prejudicar outras investigações.

CAPÍTULO III

DAS SANÇÕES PENAIS

Art. 18. Violar o sigilo de comunicação telefônica, de informática ou telemática, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.

Pena — reclusão, 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

§ 1º Incorre nas mesmas penas quem viola o segredo de justiça decorrente do procedimento de que trata esta Lei.

§ 2º A pena é aumentada de um terço até metade se o crime previsto no caput ou no § 1º deste artigo é praticado por funcionário público no exercício de suas funções.

Art. 19. Fazer afirmação falsa com o fim de induzir a erro a autoridade judicial no procedimento de interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática.

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.

CAPÍTULO IV

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 20. A captação e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, óticos ou acústicos, e o seu registro e análise sujeitam-se às disposições desta Lei, no que couber.

Art. 21. Fica o Poder Executivo autorizado a instituir, para fins exclusivamente estatísticos e de planejamento de ações policiais, sistema centralizado de informações sobre quebra de sigilo de comunicações telefônicas de qualquer natureza, na forma do regulamento.

Parágrafo único. O sistema de que trata o caput não conterá o conteúdo das comunicações realizadas nem os códigos de identificação ou outros elementos e meios capazes de identificar os envolvidos, inclusive investigados e acusados.

Art. 22. A Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL regulamentará, no prazo de cento e oitenta dias, o padrão dos recursos tecnológicos e facilidades necessárias ao cumprimento desta Lei, a serem disponibilizados gratuitamente por todas as prestadoras responsáveis pela comunicação.

Art. 23. O art. 581 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte inciso:

“Art. 581. …………………………..

XXV – que indeferir o pedido de quebra do sigilo das comunicações telefônicas de qualquer natureza. (NR)”

Art. 24. Aplicam-se subsidiariamente a esta Lei, no que com ela não colidirem, as disposições do Código de Processo Penal e do Código de Processo Penal Militar.

Art. 25. Fica revogada a Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996.

Art. 26. Esta Lei entra em vigor sessenta dias após a data de sua publicação.

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