Violação de prerrogativa

OAB-SP critica desembargador que não recebe advogados

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29 de outubro de 2008, 19h59

A OAB de São Paulo entregou ao Conselho Nacional de Justiça, nesta quarta-feira (28/10), ofício em apoio à decisão de convocar o desembargador Ferraz de Arruda, do Tribunal de Justiça de São Paulo. Ele terá de se explicar sobre o artigo publicado na revista Consultor Jurídico em que ele afirma não receber advogados em seu gabinete — clique aqui para ler o artigo. O pedido foi feito ao CNJ pela Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp).

Segundo a OAB, o CNJ já se manifestou contra a prática. Em consulta sobre o assunto no ano passado, os conselheiros editaram orientação enfatizando que todo juiz é obrigado a receber advogados em seu gabinete. A decisão foi tomada em pedido de providências contra o juiz da Vara Criminal de Mossoró (RN).

“Ante a clareza do texto legal, indiscutível é a conclusão de que qualquer medida que condicione, crie embaraço ou impeça o acesso do profissional advogado à pessoa do magistrado, quando em defesa do interesse de seus clientes, configura ilegalidade e pode caracterizar, inclusive, abuso de autoridade”, afirmou o conselheiro Rui Stoco, relator do Pedido de Providência 1.465, na época. Stoco é desembargador do TJ-SP.

No entanto, logo após a decisão, o CNJ explicou que a obrigatoriedade de os juízes atenderem os advogados em qualquer horário se restringe apenas à Comarca de Mossoró. Segundo o CNJ, a determinação não tem efeito vinculante.

Em nota divulgada nesta quarta-feira (29/10), o presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D´Urso, criticou a manifestação do desembargador Ferraz de Arruda. Para a OAB, a conduta do juiz viola as prerrogativas profissionais dos advogados. Ela cita o inciso VIII, do artigo 7, da Lei 8.905/94.

“O inciso é bem claro ao especificar que todo advogado pode dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada.”

A OAB-SP afirma que as prerrogativas dos advogados não podem ser desconsideradas, já que isso implica no cerceamento da liberdade de defesa. Para os advogados, esse tipo de discussão mostra que é preciso aprovar projeto de lei que criminalize a violação das prerrogativas profissionais dos advogados.

Já a Associação Paulista de Magistrados (Apamagis) lembra que é regra nas nações livre o juiz não receber advogado em seu gabinete.

Segundo a Apamagis, é “preocupante o fato de que uma autoridade possa ser acusada por uma entidade que congrega advogados unicamente por exercer um dos mais legítimos direitos constitucionais assegurados ao cidadão: a da livre expressão do pensamento. O mais grave desse episódio é que tudo esteja sendo feito sob o pretexto da defesa de prerrogativas da advocacia”.

Satisfação no CNJ

Como noticiou a revista ConJur, o CNJ decidiu, por oito votos a um, que o desembargador tem de ser chamado para dar satisfação à Corregedoria Nacional de Justiça sobre o que escreveu. A opinião que predominou foi a de que o desembargador defende um ato que fere a Loman e o Estatuto da Advocacia.

No artigo, o desembargador defende que o gabinete de um juiz não é um espaço público de livre acesso e ataca o que chama de lobby de magistrados aposentados que se tornam advogados e passam a atuar onde antes julgavam. As críticas, contudo, não provocaram reações. Foi o fato de escrever que não recebe advogados em seu gabinete que fez o CNJ admitir a Reclamação Disciplinar.

O conselheiro Técio Lins e Silva considerou o artigo “um deboche”. “O desembargador pode escrever o que quiser, mas têm de responder por isso”, disse Técio. O relator do pedido, juiz Antonio Humberto, considerou o pedido juridicamente inviável e determinou seu arquivamento. A Aasp recorreu. Na terça-feira (21/10), o plenário do CNJ decidiu transformar o Pedido de Providências em Reclamação Disciplinar e encaminhá-la à Corregedoria Nacional.

Leia a nota divulgada pela OAB-SP

A Ordem dos Advogados do Brasil — Secção São Paulo repudia a posição do desembargador Augusto Francisco Mota Ferraz de Arruda que, publicamente, afirmou se negar a receber advogados em seu gabinete para tratar de processos que lhe estão conclusos; uma vez que essa conduta viola flagrantemente as prerrogativas profissionais dos advogados, contempladas no Art. 7, inciso VIII, da Lei Federal 8.905/94, essenciais ao seu múnus público. O inciso é bem claro ao especificar que todo advogado pode “ dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada”.

Portanto, a defesa de qualquer violação às prerrogativas necessárias ao exercício profissional do advogado contraria os primados legais. Os advogados não podem ser tolhidos em seus direitos e prerrogativas porque isso implica em cerceamento da liberdade de defesa e da efetivação da justiça. Assim como o Ministério Público e as partes podem dirigir-se ao juiz da causa, certamente o advogado não deveria encontrar qualquer óbice para despachar com magistrados em seus gabinetes, objetivando prestar informações ou apontar fatos no interesse do jurisdicionado e da justiça.

Assim sendo, a OAB SP apóia a decisão do Conselho Nacional de Justiça que, por oito votos a um, deliberou convocar o desembargador para justificar sua manifestação à Corregedoria Nacional de Justiça, por estar ferindo o Estatuto da Advocacia e, portanto, apregoando uma ilicitude. A Advocacia apoiou a criação do CNJ por entender que o controle externo do Judiciário tende a aprimorar a atuação dos magistrados no interesse da sociedade brasileira, neutralizando medidas arbitrárias de qualquer natureza.

O próprio CNJ, respondendo consulta de um juiz de Direito Titular da Primeira Vara Criminal da Comarca de Mossoró (RN), no ano passado, divulgou orientação (Pedido de Providência nº 1465) enfatizando que todo magistrado é obrigado a receber advogados em seu gabinete de trabalho ao longo do expediente forense. “Ante a clareza do texto legal, indiscutível é a conclusão de que qualquer medida que condicione, crie embaraço ou impeça o acesso do profissional advogado à pessoa do magistrado, quando em defesa do interesse de seus clientes, configura ilegalidade e pode caracterizar, inclusive, abuso de autoridade”, pondera o voto do relator, destacando ainda ser este um dever funcional previsto na Lei Orgânica da Magistratura.

Por entender que esse lastimável episódio está criando um libelo de desrespeito às prerrogativas profissionais dos advogados, criadas para assegurar o direito do cidadão à ampla defesa e ao contraditório; reafirmamos nossa confiança no CNJ e na necessidade de aprovação do projeto que criminaliza a violação das prerrogativas profissionais dos advogados como medida necessária para coibir o descumprimento da lei por parte de autoridades, especialmente daquelas que têm de zelar pelo Direito.

São Paulo, 29 de outubro de 2009

Luiz Flávio Borges D´Urso

Presidente da OAB SP

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