Coisa julgada

Juiz reconhece acordo e extingue processo da Fiesp contra Simpi

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2 de outubro de 2008, 18h11

Um acordo do Sindicato da Micro e Pequena Indústria de São Paulo com a Fiesp, firmado em 1998 e homologado pelo Tribunal de Justiça paulista, garantiu ao sindicato a legitimidade para representar as indústrias com até 50 empregados e extinguiu ação que a Federação movia na Justiça. Com base nesse acordo, o juiz do trabalho Roberto Joaquim de Souza extinguiu o processo da Fiesp e aceitou a preliminar apresentada pelo Simpi. “Em razão do acordo judicial referido, há, portanto, configurada a coisa julgada”, afirmou ele.

A Fiesp queria anular o acordo coletivo firmado pelo Simpi, em 1° de maio de 2006, com o sindicato que representa os trabalhadores de indústrias de motos da região de São José dos Campos. O juiz do trabalho condenou a Fiesp ao pagamento das custas.

Em sua defesa, o sindicato destacou que no acordo judicial firmado com a Fiesp, na Apelação Cível 213.029-2/8, ficou estabelecido que o Simpi representaria as empresas com até 50 empregados.

A briga entre Simpi e Fiesp já dura anos. Organizado com base na Constituição de 1988, o Simpi foi fundado em 1989. Em 2006, o sindicato obteve a Carta Sindical do Ministério do Trabalho e Emprego. Este fato, segundo o Simpi, despertou a ira dos sindicatos concorrentes no âmbito da Fiesp. Hoje, o sindicato representa cerca de 200 mil empresas com até 50 empregados.

O sindicato foi afastado dos quadros da Fiesp em 2006 e só voltou a fazer parte da entidade em abril deste ano, por decisão do Superior Tribunal de Justiça. A decisão foi tomada com base no voto da ministra Eliana Calmon.

Leia a íntegra da decisão:

2ª VARA DO TRABALHO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO – SP

PROCEDIMENTO ORDINÁRIO

PROCESSO: 00189-2008-044-15-00-9

RECLAMANTE: FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DE SÃO PAULO – FIESP

RECLAMADOS: SINDICATO DA MICRO E PEQUENA INDÚSTRIA DO TIPO ARTESANAL DO ESTADO DE SÃO PAULO – SIMPI e SINDICATO DOS TRABALHADORES AUTÔNOMOS AGENCIADORES E CONDUTORES DE UTILITÁRIOS EM DUAS E TRES RODAS MOTORIZADOS OU NAO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO E REGIÃO – SINDIMOTO

Data: 23/09/2008

SENTENÇA

VISTOS ETC.

I – RELATÓRIO

FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DE SÃO PAULO – FIESP ajuizou, perante o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, ação anulatória de convenção coletiva em face de SINDICATO DA MICRO E PEQUENA INDÚSTRIA DO TIPO ARTESANAL DO ESTADO DE SÃO PAULO – SIMPI e SINDICATO DOS TRABALHADORES AUTÔNOMOS AGENCIADORES E CONDUTORES DE UTILITÁRIOS EM DUAS E TRES RODAS MOTORIZADOS OU NAO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO E REGIÃO – SINDIMOTO, alegando que tomou conhecimento a partir dos veículos de comunicação e dos “sites” das entidades que compõem o pólo passivo da relação processual, que as mesmas celebraram convenção coletiva com data de 1º de maio de 2006, instrumento coletivo este que não pode ” ao seu juízo” produzir efeitos, eis que falta ao primeiro reclamado (SIMPI) o requisito do registro regular perante o Ministério do Trabalho e Emprego, por existência de divergência entre o que consta no registro sindical, e o que estabelece os artigos 1º e 2º do Estatuto social.

Afirma que o reclamado SIMPI alterou sua representação, no que perpetrou exclusão da expressão “aquelas que empregam até cinqüenta empregados”, o mesmo ocorrendo em relação à expressão “indústria do tipo artesanal”, modificada para “empresa industrial”. Acresce que as modificações levadas a efeito pelo primeiro reclamado em seu estatuto não mereceram a publicidade exigida pela Portaria 343/2000, para concluir que o Ministério do Trabalho e Emprego concedeu registro ao primeiro demandado em transgressão ao teor de sua própria norma, seja pela falta de publicidade da alteração, ou mesmo por não se atentar para a alteração estatutária de 27 de maio de 2994, fato agravado pela omissão do primeiro demandado em juntar no processo respectivo (24000.001191/90-70) a ata da assembléia geral extraordinária, de 28 de fevereiro de 1994, que aprovou a modificação autorizadora da possibilidade de celebração de acordo entre o si e o ora reclamante.

Que o primeiro reclamado alterou seu estatuto em 20 de dezembro de 1999 para ampliar sua representação, não requerendo o registro dela, nos termos do parágrafo único do art. 3º da Instrução Normativa nº 01, de 17 de julho de 1997, ainda desta feita deixando de juntar nos autos do processo acima referido a ata da assembléia geral extraordinária, de 20 de dezembro de 1999. Em decorrência de tais fatos, o primeiro reclamado, que representava as empresas do Tipo Artesanal (aquelas que empregam até cinqüenta empregados) e integrante do 18º Grupo “Indústria de Artesanatos em Geral” do plano da Confederação Nacional da Indústria, passou a representar, com registro irregular, a categoria denominada micro e pequena empresa industrial com até cinqüenta empregados, pretendendo a representação de várias categorias econômicas industriais organizadas ou não em sindicatos, violando o princípio da unicidade sindical.


Opõe à sobrevida do primeiro reclamado a pretensão de representação pelo porte das empresas (micro e pequenas empresas), o que não é admitido pelo art. 511 da CLT, ao não contemplar esta modalidade de eleição de representação sindical das categorias profissional e econômica. Prega, ademais, número exíguo de participantes nas assembléias destinadas ao debate das alterações estatutárias, referindo a existência de 22 empresas quando no Estado de São Paulo, provavelmente deve ultrapassar a casa dos 143.000, além do que, muitos dos participantes da assembléia de 20 de dezembro de 1999 são membros da diretoria do primeiro demandado, sendo que a lista de presença respectiva não permite a identificação dos participantes, como quer o art. 577 da CLT.

Diante disso, pretende a declaração de nulidade da convenção coletiva de trabalho firmada entre os reclamados, prequestionando, em sede de cautela, para obter manifestação acerca de “ofensa às leis federais” citadas e à Constituição Federal, especificamente em relação aos incisos I a III do art. 8.

Pede o envio de ofício ao Secretário de Relações do Trabalho do Ministério do trabalho e Emprego para reexaminar o ato de concessão do registro sindical impugnado com remessa de documentos nominados; cancelamento, pelo órgão Ministerial, do registro sindical; publicação do despacho de cancelamento; expedição de ofício ao “Delegado Regional do Trabalho de São Paulo” determinando o sobrestamento de todas as convenções coletivas de trabalho subscritas pelo SIMPI e suspensão de mesas redondas por ele requeridas; ofícios ao Ministério Público do Trabalho para manifestação sobre a irregularidade apontada.

Requereu a produção de provas e a procedência dos pedidos. Atribuiu à causa o valor de R$ 1.000,00. Juntou procuração e documentos.

Regularmente citado, o primeiro reclamado apresenta defesa argüindo a inépcia da petição inicial, por não entender possível a anulação dos atos do Ministério do Trabalho e Emprego pela via da ação anulatória de convenção coletiva. Ainda em sede de preliminar, aduz carecer o demandante de interesse de agir e legitimidade ativa, pela escolha inadequada da via judicial.

Afirma que várias entidades sindicais impugnaram o arquivamento dos atos constitutivos e, depois de treze anos de embate, logrou chegar a bom termo, por “acordos e transações judiciais”, vingando o expediente administrativo, culminando na concessão do registro em 11 de janeiro de 2005.Diz que, a convalidar a convicção do próprio reclamante acerca da regularidade do primeiro reclamado, está o fato de que o presidente deste último concorreu à presidência da FIESP, sem qualquer tipo de impugnação.

Afirma que a conduta do reclamante inscreve-se no preceptivo legal que trata da litigância de má-fé (CPC, 17). Que as empresas representadas pelo primeiro reclamado atingiram tal condição por regulares acordos entabulados com as entidades patronais. Que em acordo formalizado perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos de Apelação Cível 213.029-2/8, em que era apelante o ora reclamante, restou estabelecido que a partir de sua assinatura o SIMPI ostentaria nova designação, qual seja, Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Tipo Artesanal do Estado de São Paulo, e que referida categoria abrange as empresas com até cinqüenta empregados, cabendo às empresas, se lhes convier, optar pelo sindicato da mesma atividade produtiva, ficando facultada a celebração de acordo direto com o SIMPI, a cada sindicato filiado à FIESP.

Em razão do acordo judicial referido, há, portanto, configurada a coisa julgada. No mérito, afirma ser perfeitamente possível à realidade sindical o agrupamento de interesses pelo porte da empresa, sobretudo porque a Constituição Federal não define categoria econômica.

Acresce que descabe a aplicação do que contido na OJ 22 da SDC do TST, haja vista que o acordo judicial celebrado pôs pá de cal na discussão.Sustenta que por força do que ajustado judicialmente sua base territorial é estadual e abrange todas as indústrias com até cinqüenta empregados, salvo as exceções constantes do próprio acordo.Pugna pelo acolhimento das preliminares e, se superadas, pela rejeição do pedido, com a condenação do reclamante às penas decorrentes de litigância de má-fé.

Opinou o Ministério Público do Trabalho pela admissão da ação e extinção do mesmo, haja vista a escolha da via inadequada pelo demandante, com sua condenação ao pagamento de custas e penalidades decorrentes de litigância de má-fé.

Através de decisão de fls. 513 e seguintes, o E. TRT determinou a remessa dos autos do processo ao serviço de distribuição do Fórum trabalhista de São José do Rio Preto, SP, por entender que a questão passa pelo crivo primeiro da representatividade das entidades sindicais, como tal sujeita à competência da Justiça do Trabalho, porém, de forma originária cometida ao primeiro grau de jurisdição.


Após sucessivas juntadas de documentos (decisões judiciais) por ambas as partes, chegou-se à assentada de fl. 757, ausente o segundo reclamado, declarando as partes que não pretendiam produzir provas, pelo que foi declarado o encerramento da instrução processual.

Razões finais remissivas. Frustradas as tentativas de conciliação.

É o relatório.

Decido.

II – FUNDAMENTAÇÃO

1. Preliminar – Inépcia

A petição inicial não é inepta. O óbice ventilado pela parte reclamada não a impediu de oferecer contestação, de modo a desautorizar a providência requerida. Demais disso, a simplicidade das formas que sói nortear o processo do trabalho, a exigir da petição inicial escrita uma -breve exposição dos fatos- (CLT, art. 840, § 1º), diferencia-o do processo comum. A solução judicial que extingue o processo sem resolução de mérito deve ser evitada tanto quanto possível, a fim de que o Estado-juiz possa alcançar o desiderato de paz social, resolvendo conflitos, e não processos. Rejeito a preliminar.

2. Preliminar – Carência de Ação

A carência de ação pressupõe a ocorrência das seguintes situações, de forma simultânea ou isolada: ilegitimidade de partes; falta de interesse de agir e impossibilidade jurídica do pedido. A legitimidade se perfaz quando há pertinência subjetiva entre os atores da relação jurídica material afirmada e os sujeitos da relação processual estabelecida. Portanto, aquele que se afirma titular de um direito material tem legitimidade para, como parte processual (autor ou réu), discuti-lo em Juízo. A existência ou não do direito ou da natureza jurídica da relação, são conclusões somente possíveis após análise cognitiva. No caso concreto, a parte reclamante afirma a existência de relação jurídica com a parte reclamada. É o que basta a legitimá-la como sujeito passivo da relação processual. O interesse de agir se revela na necessidade, utilidade e adequação. Necessidade, quando a tutela jurisdicional buscada venha a ser a única alternativa que se opõe à violação de um direito afirmado; utilidade, quando o provimento requerido se presta a um resultado prático de solução do conflito, e adequação, quando a ação utilizada é consentânea com a natureza do direito afirmado e com a modalidade de tutela pretendida, segundo a legislação processual. A impossibilidade jurídica do pedido exsurge da pretensão expressamente vedada no direito positivo, por exemplo, cobrança de dívida de jogo (CCB, 814) e contrato cujo objeto seja herança de pessoa viva (CCB, 426). Analisada a situação concreta sob tais prismas, não verifico a existência de carência de ação. Rejeito.

3. Preliminar – Coisa julgada

Sustenta o primeiro demandado que a questão de fundo, qual seja, a representatividade e seu alcance, restou sepultada por acordo judicial. Sobre o tema, não houve manifestação específica da parte reclamante, que cingiu-se a discorrer sobre acontecimentos posteriores ao fato (fl. 322).

Nem é o caso (apenas) de reconhecimento da incontrovérsia acerca do tema, mas, principalmente, de ausência de elementos processuais aptos a destruir a tese de resistência.

Certo é que às fls. 282 e seguintes verifico que em Apelação Cível nº 213.029-2/8, em que é apelante o ora reclamante, e apelado o primeiro reclamado, As partes compuseram-se, firmando termo de acordo (doc. 01) já aprovado pelo Conselho de Representantes da FIESP (doc. 02), bem como em Assembléia Geral do Apelado SIMPI, que atendendo ao item 01 do mencionado acordo, alterou sua denominação para SIMPI – Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Tipo Artesanal do Estado de São Paulo (doc. 03), a qual já está sendo utilizada.

Isso posto, atendendo ao item 8 do termo de acordo e tendo em vista a aprovação da Filiação do Apelado nos quadros da Apelante, as partes requerem a desistência do feito.

Através da decisão produzida pela Décima Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (fl. 285), houve homologação da transação. O art. 449 do CPC reza que “O termo de conciliação, assinado pelas partes e homologado pelo juiz, terá valor de sentença.”

De fato, “a sentença homologatória de conciliação ou de transação, ainda que inclua matéria não posta em juízo”, constitui título executivo judicial, na forma do que previsto pelo art. 475-N, III do CPC.

Desta forma, estabelecido de comum acordo pelas partes os termos da conciliação, e submetidos ao crivo judicial, opera-se, de pleno direito, a coisa julgada, assim entendida ¿a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário (CPC, 467) e que produz efeitos em relação às partes (CPC, 472).

O revolvimento dos fatos aqui debatidos somente seria possível em momento superveniente à eventual e exitosa ação rescisória, como instrumento apto de que dispõem as partes, observados os pressupostos, de ataque à coisa julgada (CPC, 485).

A solução dada à espécie é a que prevista no art. 267, V, do CPC, qual seja, a extinção do pedido, sem resolução de mérito. Impõe-me a ressalva de que vejo consistência nos argumentos do reclamante, notadamente no tocante à possibilidade (ou não) de representatividade sindical pelo porte da empresa, porém, a esta altura, já não lhe cabe protagonizar a discussão na condição de interessado, haja vista os efeitos da coisa julgada a atingir, inexoravelmente, as partes envolvidas na conciliação judicial, o que deve ser prestigiado em nome da segurança jurídica, valor atávico ao Estado Democrático de direito. Acolho a preliminar.

4. Litigância de má-fé

O primeiro reclamado irroga ao reclamante a condição de litigante temerário. Não vislumbro má-fé na postura processual da parte reclamante, notadamente porque seus argumentos encontram-se amoldados nos limites do conteúdo ético do processo.

O manejo de ação judicial, por si só, não constitui litigância de má-fé, sobretudo porque é promessa do Estado Democrático de direito (brasileiro) a realização do princípio da inafastabilidade da jurisdição, positivado no art. 5º, XXXV da CF. Rejeito.

III – DISPOSITIVO

Ante o exposto, JULGO EXTINTO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, os pedidos formulados por FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DE SÃO PAULO – FIESP, em ação trabalhista promovida em face de SINDICATO DA MICRO E PEQUENA INDÚSTRIA DO TIPO ARTESANAL DO ESTADO DE SÃO PAULO – SIMPI e SINDICATO DOS TRABALHADORES AUTÔNOMOS AGENCIADORES E CONDUTORES DE UTILITÁRIOS EM DUAS E TRES RODAS MOTORIZADOS OU NAO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO E REGIÃO – SINDIMOTO, e rejeito o pedido de aplicação das penas de litigância de má-fé, na forma da fundamentação que passa a ser parte integrante do dispositivo.Tendo em vista que o reclamante pretendeu a juntada de documentos após o encerramento da instrução processual determino a devolução das petições protocoladas sob nº 055878 e 057908.Custas, pela parte reclamante, devendo ser calculadas sobre o valor atribuído à causa de R$ 1.000,00 (um mil reais), importando em R$ 20,00 (vinte reais).Intimem-se as partes.

Nada mais.

ROBERTO JOAQUIM DE SOUZA

Juiz do Trabalho

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