Protocolo de Quioto

A legalidade da comercialização de crédito de carbono no Brasil

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1 de outubro de 2008, 16h13

A exploração e comercialização dos créditos de carbono foram introduzidas em nosso ordenamento após a elaboração do Protocolo Internacional de Quioto, cujo Brasil é signatário.

Nesse sentido, o ponto inicial de nossa análise é a forma com que foi recepcionado o Protocolo em nossa legislação, já que o artigo 5º, parágrafo 2º, da nossa Lei Maior, somente admite que os direitos e garantias, inseridos na Constituição, empeçam à aplicação de normas ou princípios, decorrentes de tratados internacionais, caso o Brasil não seja signatário, vejamos:

Art. 5º…

§ 2º — Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

Como já afirmamos, a República Federativa do Brasil é signatária do Protocolo Internacional de Quioto e, como sabemos, referido tratado dispõe acerca da exploração e comercialização de créditos de carbono. Portanto, a primeira tese que podemos levantar sobre a aplicabilidade do Protocolo de Quioto em território nacional, é o cumprimento das formalidades legais para recepção do tratado internacional pelo ordenamento jurídico brasileiro.

Vale salientar, que o artigo 84, VIII, da Constituição Federal estabeleceu competência exclusiva ao presidente da República para firmar tratados internacionais com outros Estados, contudo, para que o tratado possa adquirir força legislativa em nosso território, obrigatoriamente, deverá passar sob o referendo do Congresso Nacional, a teor do artigo 49, I da Constituição Federal 1988.

Nesse viés, podemos observar que o Protocolo de Quioto, respeitou os requisitos necessários exigidos para sua admissibilidade no ornamento nacional, tanto é verdade que, após a aprovação do Congresso Nacional, o Presidente da República, com fincas no artigo 84 da CF/88, declarou a recepção do Protocolo de Quioto com a promulgação do Decreto 5.445/05, afastando, nesse diapasão, qualquer ilegalidade que possa ser suscitada sobre a inobservância das formalidades, exigidas pela legislação brasileira, para recepção de tratados em território nacional.

Superada a fase de recepção do Protocolo Internacional de Quioto é importante esclarecermos a respeito da hierarquia conferida ao Decreto 5.445/05, se possui força normativa de Lei Ordinária ou Emenda Constitucional.

Ao que parece nossa Carta Maior foi omissa no sentido de dispor acerca da força normativa dos tratados que não tratam de matéria atinente aos direitos humanos, os denominados tratados comuns, já que em seu o artigo 5º parágrafo 3º disciplina apenas a respeito da força normativa dos tratados que regulam matérias inerentes aos direitos humanos, outorgando-lhes força normativa equiparada à Emenda Constitucional, vejamos:

Art. 5º…

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

É cediço que, diante da inércia do constituinte originário, a doutrina vem se mostrando confusa, ao encarar a temática, contudo, é de observar que sábias foram às palavras do ministro Celso de Mello ao manifestar acerca da hierarquia dos tratados, quando do julgamento da Ementa de Extradição 662, vejamos:

A eventual precedência de atos internacionais sobre normas infraconstitucionais de direito interno brasileiro somente ocorrerá — presente o contexto de eventual situação de antinomia com o ordenamento doméstico — não em virtude de uma inexistente primazia hierárquica, mas, sempre, em face do critério cronológico (lex posterior derrogat priori) ou, quando cabível, do critério da especialidade.

Desta feita, devemos aqui expressar que comungamos do entendimento ofertado pelo excelentíssimo ministro Celso de Mello, pois, não obstante tal entendimento, vale lembrar que, ressalvadas às hipóteses elencadas no artigo 5º parágrafo 3º da CF/88, o procedimento legislativo inerente aos tratados internacionais é semelhante ao procedimento de lei ordinária, outrossim, tanto a norma internacional quanto possuem hierarquia normativa igual.

Porquanto, podemos afirmar que a única hipótese capaz de gerar a inaplicabilidade do Decreto 5.445/05 seria a possível existência de conflito entre o Decreto e as normas inseridas na Constituição Federal ou sua posterior revogação através da edição de alguma lei.

Nesse ponto, passaremos a demonstrar que o Decreto 5.445/05 é perfeitamente consoante às disposições elencadas em nossa Magna Carta.

É certo que com o advento do Decreto 5.445/05 foi criado no âmbito nacional mais um tipo de atividade econômica, qual seja, a exploração e comercialização dos créditos de carbono.

Nessa linha de raciocínio é relevante frisar que o desenvolvimento de atividades econômicas no país deve, segundo o artigo 170, VI da Constituição Federal, respeitar o meio ambiente condicionando a prática de determinada atividade à proteção do meio ambiente, que nos termos do artigo 225 da CF, garantirá sadia qualidade de vida a todos.

Para fundar nossos entendimentos podemos trazer ao palco de nossa discussão o entendimento ofertado por José Afonso da Silva:

As normas constitucionais assumiram a consciência de que o direito à vida, como matriz de todos os demais direitos fundamentais do homem, é que há de orientar todas as formas de atuação no campo da tutela do meio ambiente. Compreendeu que ele é um valor preponderante, que há de estar acima de quaisquer considerações como as de desenvolvimento, como as de respeito ao direito de propriedade, como as da iniciativa privada. Também estes são garantidos no texto constitucional, mas, a toda evidência, não podem primar sobre o direito fundamental à vida, que esta em jogo quando se discute a tutela da qualidade do meio ambiente, que é instrumento no sentido de que, através dessa tutela, o que se protege é um valor maior: a qualidade da vida humana.

Como podemos observar a atividade criada pelo Decreto 5.445/05, além de prestar obediência aos demais requisitos expendidos no art. 170 da CF/88, institui em nosso ordenamento a exploração de uma atividade que garante maior proteção ao meio ambiente, tendo em vista que a exploração dos créditos de carbonos obviamente será desempenhada nos rigores do Principio do Desenvolvimento Sustentável.

A quem diga que a exploração e comercialização dos créditos de carbono podem influenciar diretamente na queda do desenvolvimento nacional, contudo, tal alegação é totalmente despendida de fundamento jurídico, pois a Constituição Federal brasileira em diversos momentos determina a obrigatoriedade de defesa ao meio ambiente.

Tanto é verdade que podemos extrair, através da interpretação conjunta do artigo 225 e 1°, III, ambos da Lei Maior, que a qualidade ambiental influencia diretamente na observância do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

Porquanto cai por terra qualquer alegação fundada no conhecimento popular “ao desenvolvimento ao meio ambiente”, pois após o advento da Constituição Federal de 1988, principalmente com a alteração provocada pela Emenda Constitucional 42/2003, se tornou obrigatório o desenvolvimento de qualquer atividade com a observância do dever de proteger o meio ambiente.

Nesse diapasão, podemos concluir que a atividade econômica, que tem por objeto a exploração e comercialização dos créditos de carbono, em hipótese alguma poderá infringir o desenvolvimento nacional, ademais o desempenho de tal atividade garantirá, àquele que respeitar o meio ambiente, mais um tipo de fonte de renda e de quebra servirá como mais um suporte de proteção ao meio ambiente.

Isto posto, entendo ser legal a exploração e comercialização dos créditos de carbono com a sua respectiva aplicação do Decreto 5.445/08 em território nacional, tendo em vista sua compatibilidade com a Constituição Federal do Brasil.

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