Sigilo protegido

Abin é proibida de acompanhar perícia de material apreendido

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27 de novembro de 2008, 19h26

A Justiça Federal proibiu a Abin de acompanhar perícia da Polícia Federal no material apreendido para apurar vazamento de informações sigilosas da Operação Satiagraha, deflagrada contra o banqueiro Daniel Dantas, por crimes financeiros e corrupção ativa. A decisão do juiz federal Ali Mazloum, da 7ª Vara Federal Criminal de São Paulo, é desta quarta-feira (26/11).

A Agência não poderá, ainda, interferir nos trabalhos do presidente do inquérito policial. “Fica vedada, também a participação de qualquer agente estranho aos quadros da Polícia Federal, facultando-se, unicamente, o acompanhamento pelo Ministério Público Federal, caso venha a manifestar interesse neste sentido, por ser o destinatário das provas e o titular da ação penal”, diz a decisão.

O pedido de reconsideração foi ajuizado pela Advocacia-Geral da União (AGU) para autorizar o “acompanhamento dos membros da Abin no rompimento do lacre e triagem do material apreendido”. A AGU alegou que o material apreendido na sede da Abin, no Rio de Janeiro, contém “dados sigilosos cuja publicização representa graves riscos para a segurança nacional” e que “deve indicar e aconselhar o acautelamento de determinadas informações de conteúdo protegido e que não se relaciona com a investigação”.

O juiz Ali Mazloum ressaltou que a situação apresentada pela AGU é inédita. “Este Juízo desconhece precedente investigativo envolvendo o órgão de inteligência do Estado — Abin ou predecessor —, apreensão de material em sua base e conseqüente averiguação de seu conteúdo no qual, supostamente, estariam guardados segredos de interesse para a segurança nacional”.

A Abin, como órgão da Presidência da República, tem a função de planejar, executar, coordenar, supervisionar e controlar as atividades de inteligência do país, observando os direitos e garantias individuais, mas “é a inteligência a serviço do Estado, não de governos, nem de pessoas”, registrou o juiz.

Ali Mazloum destacou, ainda, que a Abin ostenta a condição de investigada por ato de alguns de seus agentes. “A decisão autorizando buscas e apreensões na sede da Abin foi adotada não pela realização de atividade típica atribuída por lei ao órgão de inteligência, mas ante a prática, em tese, de função atípica e indícios de atividades ilícitas, inclusive possível vazamento de informações sigilosas de operação policial”.

Quanto ao argumento de existir “risco de desguarnecimento do necessário sigilo dos dados contidos nos objetos apreendidos” e “graves riscos para a segurança nacional”, caso a agência não possa participar da seleção do material, para o juiz, “é forte, impressiona, mas não convence. O foco da investigação não está na atividade própria do órgão (coleta de dados sensíveis para o Estado), mas na aludida atividade ilícita virtualmente feita por seus agentes”.

O juiz pontuou que o trabalho secreto executado pelo órgão não confere imunidade aos seus agentes. De acordo com ele, existem limites às atividades que exerce, sobretudo para que não desborde do leito legal a que se destina. “A Abin, por mais relevantes que sejam as suas funções, e são, está sujeita ao império da lei. Na condição de investigada, por ato de seus agentes, deve comportar-se como tal”.

O que transparece da investigação empreendida é que há duas diretrizes de suspeita. Uma seria que os computadores da Abin pode mostrar as técnicas do governo para anular a oposição e sobrepujar aliados eventualmente rebeldes. Outra, a possibilidade de operações da PF estarem servindo a interesses privados. Investiga-se, por exemplo, se a equipe de Protógenes se teria reunido com empresários, advogados e um jornalista antes da deflagração da Satiagraha.

De acordo com a decisão, cabe à autoridade policial assegurar no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse público. “(…) e o caso aqui tratado, realço, tramita em segredo de Justiça por determinação expressa deste Juízo, tanto pela natureza da investigação como pelo teor do material apreendido durante as buscas. Portanto, a Abin, na condição de investigada, não pode participar das diligências policiais”.

Para Mazloum, a simples presença física de agentes da agência no local da análise de material não tem o condão de evitar vazamentos. “Ao contrário, quanto mais pessoas, maior o risco do vazamento. O que efetivamente pode obstar a publicidade de informações sigilosas é a lei”.

O juiz ainda lembrou que o vazamento e a divulgação de informações resguardadas pelo segredo podem configurar graves delitos previstos no Código Penal, na lei das interceptações telefônicas, dentre outras.

E finalizou: “eventual divulgação de dados sensíveis pode até mesmo atrair crimes contra a segurança nacional previstos na Lei 7.170/83, cujas penas são bastante elevadas. O freio, pois, está no fiel cumprimento da lei e na certeza de responsabilização (regime republicano)”.

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