Candidato oculto

Em Guapimirim, eleitores votaram no tio e elegeram sobrinho

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19 de novembro de 2008, 12h43

Questionando a constitucionalidade de parte da Lei 9.504/97, que traça as normas eleitorais do país, a procuradora regional eleitoral do Rio de Janeiro, Silvana Batini Góes entrou com pedido de Mandado de Segurança, no último dia 12, junto ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio, para anular a eleição para prefeito do município de Guapimirim, na Baixada Fluminense. Ali, como ela destaca na petição, os eleitores votaram no tio e elegeram o sobrinho.

“O eleitor foi às urnas e votou em Nelson do Posto, sem ter tido oportunidade de saber que elegia outro em seu lugar. Inclusive porque da urna de votação constava o nome de Nelson e não de Júnior como sendo o cabeça de chapa”, destacou a procuradora no Mandado de Segurança.

O imbróglio foi provocado com a impugnação, pelo Tribunal Superior Eleitoral, da candidatura de Nelson da Costa Mello (PMDB), mais conhecido como “Nelson do Posto”, no chamado último minuto do tempo de jogo: às 19 horas da sexta-feira, dia 3 de outubro, antevéspera da eleição do dia 5.

Diante da impugnação, a coligação Ordem, Limpeza, Progresso e Cidadania”, encabeçada pelo PMDB, viu-se obrigada a propor a troca de candidato na mesma noite, apresentando ao juízo eleitoral da cidade o nome do sobrinho de “Nelson do Posto”, Renato Costa de Mello Júnior, o “Júnior do Posto”, tendo como vice Marco Aurélio Dias. O novo registro foi pedido pelo processo 333/08, da 149ª Zona Eeleitoral.

Diz a procuradora no MS: “Conforme se vê das cópias do referido processo, embora houvesse impugnação ao pedido de registro, foram proferidas sentenças, em 03/10/2008, julgando procedente as impugnações ao registro de candidatura, e consequentemente, deferindo o registro de Renato Costa Mello Júnior e Marcos Aurélio Dias (candidato a Vice-Prefeito).Assim é que, no dia 05/10/2008, dois dias após o indeferimento definitivo da candidatura de Nelson do Posto, sem que houvesse tempo hábil para se dar ciência à população deste fato, bem como da conseqüente substituição daquele candidato à Prefeitura por Junior do Posto, o eleitor foi às urnas e votou em Nelson do Posto, sem ter tido oportunidade de saber que elegia outro em seu lugar. Inclusive porque da urna de votação, constava o nome de Nelson e não de Junior como sendo o cabeça da chapa”.

Júnior do Posto (PTC) foi eleito prefeito com os votos dados a Nelson do Posto e que chegaram a 74,14% dos votos válidos. Em segundo lugar ficou Sebastião Medeiros da Silva (PT), com 20,63%; seguido de Paulo Micena, do PV, com 5,23% dos votos válidos. O ex-prefeito de Guapimirim Ailton Vivas não teve seus votos registrados porque sua candidatura está sub júdice, o que contribuiu para aumentar ainda mais o percentual obtido por Júnior.

O questionamento da procuradora é em cima da omissão do parágrafo 3° do artigo 13 da Lei Eleitoral (9.504/97). Neste parágrafo consta que apenas no caso das candidaturas proporcionais (para o legislativo) a substituição de candidatos “só se efetivará se o novo pedido for apresentado até sessenta dias antes do pleito”.

Para a procuradora, há uma manifesta inconstitucionalidade por omissão no parágrafo 3°, na medida em que, ao não estipular prazos mínimos para substituição de candidatos, permite registros feitos até no dia do pleito. Diz ela em seu pedido “Pelo entendimento vigente, nas eleições majoritárias, o pedido de substituição pode ser feito até o dia da eleição. Tudo com base na falta de previsão legal sobre a hipótese. Ora, o parágrafo 3º do referido dispositivo legal está eivado de manifesta inconstitucionalidade por omissão, cuja declaração incidental ora se requer. Tal inconstitucionalidade é vício que impede a diplomação do candidato ao pleito municipal eleito em Guapimirim”.

Para Silvana, “o citado dispositivo da Lei das Eleições, ao deixar de estabelecer prazo razoável para apresentação de pedido de substituição de candidato ao pleito majoritário, ofende o princípio democrático, a soberania popular, a representatividade e a isonomia das eleições, todos eles assegurados em nossa Constituição da República”.

E ela explica sua tese lembrando que “para que o povo possa exercer o poder que a ele pertence de escolher seus governantes, é necessário resguardar a lisura e a legitimidade das eleições (princípio este assegurado no artigo 14, parágrafo 9º da Constituição). Significa dizer que as eleições não podem estar eivadas de vício, corrompidas, ou com qualquer tipo de fraude; que devem se pautar na verdade, acima de tudo”.

Em seguida, conclui: “Não se pode dizer que uma eleição vencida por candidato que sequer foi apresentado aos cidadãos como tal, durante todo o período de propaganda partidária, tenha se pautado nos princípios acima elencados. Não foi dada a oportunidade à população, em tempo razoável, de conhecer, analisar as propostas, avaliar se de fato o candidato Júnior do Posto merecia ser o representante de seus interesses no Governo Municipal”.

A procuradora prossegue dizendo que o mais provável é que os eleitores sequer tomaram conhecimento da troca de candidatos, o que fere o preceito constitucional da soberania popular. E conclui que o pleito em Guapimirim foi viciado, o que, para ela, é suficiente para que seja anulado e realizadas novas eleições.

Clique aqui para ler o pedido de Mandado de Segurança

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