CPI do grampo

Pertence critica banalização de grampo autorizado

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26 de março de 2008, 20h55

O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Sepúlveda Pertence criticou nesta quarta-feira (26/3) a banalização das interceptações telefônicas e o vazamento de informações para a imprensa. Ele prestou depoimento na CPI das Escutas Telefônicas, na Câmara dos Deputados. Pertence foi convocado para depor porque, de acordo com reportagem publicada pela revista Veja que provocou a abertura da CPI, foi vítima de grampo telefônico quando era ministro do Supremo.

“A interceptação deve ser o último recurso da investigação e não o início das apurações. A interceptação tem sido instalada e, o que é pior, muitas vezes judicialmente autorizada, para iniciar uma investigação”, criticou. Mais do que um depoimento, Pertence deu uma aula sobre escutas telefônicas para pouco menos de uma dúzia de deputados. Respondeu com absoluta tranqüilidade a diversas perguntas do relator da CPI, deputado Nelson Pelegrino (PT-BA), mais a título de consulta do que inquirição.

O atual presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência da República também chamou a atenção também para o vazamento do conteúdo das escutas, protegido por sigilo, para a imprensa. “Existem dois pontos dramáticos. De um lado há certa banalização da própria autorização judicial, que tem se tornado cada vez mais início de investigação e não como o último recurso de uma investigação. De outro lado está o vazamento dessas informações, que a lei tenta proteger, mas que se tornou o dia-a-dia da imprensa, em publicar trechos, passagens e interpretações desta ou daquela interceptação”, afirmou.

O ministro preferiu não se aprofundar sobre a responsabilidade dos jornalistas em publicar o conteúdo das escutas, mas alertou para o papel do agente público que possivelmente repassa essas informações à imprensa. De acordo com Pertence, a criminalidade contemporânea, sobretudo, o crime organizado, reclama a interceptação telefônica. Contudo, “a sua banalização é um abuso intolerável”.

O presidente da CPI, deputado Marcelo Itagiba (PMDB/RJ), delegado de Polícia Federal antes de se eleger para a Câmara, ressaltou o papel da Comissão de tratar do grampo, seus derivados e suas conseqüências, principalmente, o problema quanto ao vazamento de informações. “O que é vazado, geralmente é filtrado com a intenção de macular imagens. É preciso disciplinar a pena para o vazamento de informações”.

Nesta quinta-feira (27/3) a CPI deve receber do governo um anteprojeto de lei que traz novas regras para as escutas telefônicas. Uma das inovações da proposta pretende, justamente, evitar vazamentos e uso indevido de escutas. De acordo com o projeto, as interceptações usadas em investigações deverão ser destruídas dois meses após o uso. Outra novidade é que nenhuma escuta deve ultrapassar o prazo de 360 dias, a menos que seja feita para acompanhar um “crime continuado”.

Grampo no Supremo

Pertence declarou ter recebido, ainda quando ministro do Supremo, de forma anônima, cópia de conversas telefônicas interceptadas com autorização judicial. O documento dizia que, nas gravações, um advogado de nome Luiz Fernando Severo Batista vangloriava-se de ter conseguido, mediante propina, agilizar o andamento de um processo que estava sob sua relatoria. Na CPI, Pertence afirmou que desconhecia o advogado.

O processo se referia a concessão de uma medida cautelar com base na Lei 9.718/88, que ampliou a base de cálculo da Cofins, assunto pacificado pela Corte. A decisão era uma daquelas em que o tribunal já fechou questão sobre o tema e decide da mesma forma em milhares de casos iguais. Ainda assim, surgiu a falsa informação de que Pertence teria recebido R$ 600 mil para dar a decisão.

Na época, a Procuradoria-Geral da República investigou a acusação e concluiu que não havia qualquer indício de que o ministro estivesse envolvido em negociação de decisões. O parecer da PGR pelo arquivamento da investigação contra o ministro foi assinado pelo vice-procurador-geral da República, Roberto Gurgel.

A acusação contra Pertence brotou de gravações da Polícia Federal que flagraram advogados dando a entender que obtiveram liminar no Supremo Tribunal Federal graças a uma propina de R$ 600 mil que teria sido paga ao ministro.

A PGR não só arquivou a suspeita sobre o ministro, como pediu abertura de investigação contra os advogados, sob a acusação de crime de exploração de prestígio, previsto no artigo 357 do Código Penal. Comete o crime aquele que solicita ou recebe dinheiro ou qualquer outra utilidade, a pretexto de influir em juiz, jurado, órgão do Ministério Público, funcionário de justiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha. A pena prevista é de um a cinco anos de reclusão, além de multa.

A CPI deverá receber por escrito possíveis declarações de atuais ministros da Corte que também se sentiram, em algum momento, vítima de interceptações. Em sua reportagem, Veja cita como eventuais vítimas das interceptações no Supremo, além de Pertence, os ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello.

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