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TJ-SP ainda tem decisões divergentes sobre pílulas de farinha

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25 de março de 2008, 11h42

Mesmo depois de 10 anos, o entendimento sobre a distribuição do anticoncepcional ineficaz da Schering não está pacificado no Tribunal de Justiça de São Paulo. A empresa é acusada em dezenas de ações de provocar gravidez não planejada por ter colocado indevidamente no mercado o medicamento na forma de pílulas de farinha (placebos).

Agora, o TJ paulista livrou a indústria farmacêutica de pagar indenização de cerca de R$ 40 mil a uma cliente, vítima do anticoncepcional, além de pensão mensal de 10 salários mínimos até que a criança completasse 21 anos. Ainda cabe recurso.

A 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça se sustentou na tese da falta de provas da responsabilidade da Schering. Para a turma julgadora, as informações levadas pela consumidora à justiça demonstram não há qualquer relação entre a conduta da empresa farmacêutica de deixar chegar ao mercado o anticoncepcional Microvilar e o dano alegado pela cliente de gravidez indesejada.

No ano passado, a mesma Câmara julgadora tomou decisão contrária: condenou a Schering a pagar indenização por danos morais de 100 salários mínimos e pensão mensal de R$ 700 de dano material até a criança completar 18 anos. A consumidora tomava o anticoncepcional há dois anos quando engravidou em abril de 1998.

A 9ª Câmara entendeu que a empresa não tomou as medidas cabíveis para que os placebos ficassem a salvo de outras destinações que não a incineração. Segundo o relator, o descuido da Schering permitiu que terceiros desviassem o produto.

A mesma Câmara voltou a julgar o assunto e decidiu de outra maneira. Disse que a Schering tem o direito de receber de volta indenização paga antecipadamente a uma consumidora que alegou ser vítima do anticoncepcional Microvlar e mandou depositar nos cofres da empresa cerca de R$ 12,2 mil.

A 3ª Câmara de Direito Privado do mesmo tribunal, ao julgar outro caso da Schering, tomou decisão a favor da empresa. Amparou o resultado em três fundamentos. O primeiro foi o de que não houve notícia da distribuição de placebos ter chegado na cidade onde morava a consumidora. O segundo: a falta de provas de que a cliente usava regularmente o anticoncepcional. Por último, a afirmação da usuária de que não notou nenhuma irregularidade, mesmo depois de consultar a data de validade do medicamento.

Também a 3ª Câmara de Direito Privado do TJ paulista livrou a empresa de pagar indenização, por danos morais, para a mãe e o filho. Nesse julgamento, a interpretação dada foi a de que o nascimento de uma criança é fonte de alegria e não de sofrimento exigido para a lesão moral indenizável. “Uma nova vida foi trazida para a família e o amor ao filho é conseqüência natural, embora não desejado inicialmente”, justificou o desembargador Beretta da Silveira, que abriu divergência com o relator, Donegá Morandini.

A sentença de primeiro grau favorecia a consumidora e seu filho. Por dano moral, a Schering estava obrigada a pagar R$ 350 mil, acrescida do dano material – pensão mensal de dois salários mínimos (R$ 700) e plano de saúde do garoto até ele completar 21 anos. Por maioria de votos, a turma julgadora modificou a sentença e inaugurou nova jurisprudência para o caso: afastou a condenação por dano moral, manteve na íntegra o dano material e reconheceu a sucumbência recíproca.

A defesa

A Schering tem sustentado que no caso não se aplica o Código de Defesa do Consumidor. Argumenta que a falta da figura do fornecedor impede a caracterização da relação de consumo. Sustenta, ainda, que as supostas vítimas não podem ser qualificadas como consumidoras por falta de provas da compra e uso do produto.

A empresa afirma, também, que agiu sem culpa e com diligência. Sustenta que o despejo dos placebos no mercado aconteceu por conta de caso fortuito, forma maior e culpa exclusiva de terceiro. Acrescenta que foram as clientes que se puseram em risco porque não olharam a data de validade do produto. Por fim, a empresa tenta jogar a responsabilidade, por imperícia, no farmacêutico a quem caberia verificar a idoneidade da distribuidora, do lote e da validade.

Pílula de farinha

A Schering é acusada por dezenas de mulheres, que tomavam Microvlar, de ser a responsável pela gravidez indesejada. A empresa reconheceu que no final de 1998 produziu duas toneladas do anticoncepcional. Eles foram feitos na forma de pílulas de farinha (placebo). Parte do lote foi distribuído e teria chegado ao mercado após suposto roubo.

As pílulas inócuas foram fabricadas só para teste em uma máquina embaladora do laboratório e depois foram extraviadas. Em vez de hormônios, elas continham farinha. Por causa da falha, diversas mulheres que engravidaram entraram com ações de indenização por danos morais.

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