Poder de decisão

Projeto autoriza Executivo a resolver se paga precatórios

Autor

30 de junho de 2008, 19h03

Corre na Assembléia Legislativa de Minas Gerais um projeto de lei que dá ao Executivo o poder de escolha sobre o pagamento de precatórios. Isto é, permite ao próprio órgão devedor escolher se paga ou não a dívida que tem com o cidadão. Depois de perceber a manobra, que pode prorrogar ainda mais o pagamento de precatórios pelo governo mineiro, a deputada estadual Elisa Costa (PT-MG) apresentou uma emenda ao artigo 26 do Projeto de Lei 2.392/08.

A sugestão de reparação à proposta foi feita pelo advogado Bruno Mattos e Silva, em artigo publicado no dia 3 de junho no site Consultor Jurídico. No texto, o advogado ressalta que o parágrafo 2º do artigo 100 da Constituição Federal diz que as dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente ao Poder Judiciário. Não ao Executivo.

De acordo com a Constituição, o presidente do Tribunal é responsável pelas determinações de pagamentos. E se não o fizer — “retardar ou frustrar a liquidação regular de precatório” — poderá responder por crime de responsabilidade.

Se o Executivo ficar responsável pelo pagamento de suas próprias dívidas e não o fizer não há qualquer tipo de sanção para o ocupante do governo. No artigo, o advogado Bruno Mattos e Silva detalha o motivo disso. “Não há qualquer sanção (sob aspecto jurídico) pelo descumprimento da obrigação do pagamento de precatórios, pois a medida de seqüestro de verbas, prevista no artigo 731 do Código de Processo Civil, só é cabível quando a pessoa jurídica de direito público violar a ordem de pagamento: se ela deixar de pagar os precatórios ou parte deles, desde que não pague com violação da ordem cronológica, não há qualquer sanção jurídica.”

O artigo polêmico

O Projeto de Lei 2.392/08, de autoria do governador Aécio Neves (PSDB-MG), em seu artigo 26 prevê: “A despesa com precatórios judiciários e cumprimento de sentenças judiciais será programada, na lei orçamentária, em dotação específica da unidade orçamentária responsável pelo débito”.

Na emenda apresentada, a deputada Elisa Costa propõe que o artigo traga a seguinte redação: “A despesa com precatórios judiciários e cumprimento de sentenças judiciais será programada, na lei orçamentária, em dotação específica consignada diretamente ao Poder Judiciário que proferiu a decisão exeqüenda, de acordo com o parágrafo 2º do artigo 100 da Constituição da República, com a redação dada pela Emenda Constitucional 30, de 13 de setembro de 2000”.

Ao justificar a alteração, a parlamentar afirma que o Executivo pode deixar de pagar os precatórios “com a dotação prevista para o órgão devedor do Poder Executivo e não para o Poder Judiciário”. Segundo Elisa Costa, propor uma lei que pode prejudicar o cidadão é “um erro político”. E acrescenta que há ainda um erro jurídico, “consistente na existência de um dispositivo no projeto de lei estadual de diretrizes orçamentárias que, ao estabelecer que as dotações serão feitas para os órgãos ou entidades devedoras, é claramente inconstitucional, por violar frontalmente o disposto no artigo 100, parágrafo 2º, da Constituição Federal”.

Leia a proposta de Emenda

Emenda ao PL nº 2.392/2008

Dê-se a seguinte redação ao “caput” do artigo 26 do Projeto de Lei nº 2.392/2008:

Art. 26 — A despesa com precatórios judiciários e cumprimento de sentenças judiciais será programada, na lei orçamentária, em dotação específica consignada diretamente ao Poder Judiciário que proferiu a decisão exeqüenda, de acordo com o § 2º do art. 100 da Constituição da República, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 30, de 13 de setembro de 2000.

Sala das Comissões, 24 de junho de 2008

ELISA COSTA

DEPUTADA ESTADUAL (PT/MG)

Justificação:

Para resolver o grave problema do atraso no pagamento dos precatórios por parte dos orgãos da administração pública nos três níveis de poder, no ano 2000 a Emenda Constitucional nº 30 alterou a Constituição Federal para determinar expressamente que as dotações fossem consignadas diretamente ao Poder Judiciário.

“Art. 100. À exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.”

§ 1º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários, apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente.

§ 2º As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exeqüenda determinar o pagamento segundo as possibilidades do depósito, e autorizar, a requerimento do credor, e exclusivamente para o caso de preterimento de seu direito de precedência, o seqüestro da quantia necessária à satisfação do débito.”

Com a dotação prevista para o órgão devedor do Poder Executivo e não para o Poder Judiciário, pode o Executivo pagar ou deixar de pagar os precatórios. Se o Judiciário não tem a dotação, não pode fazer o pagamento do precatório, dependendo do órgão do Executivo que tem a dotação.

Há um erro político, consistente em se propor e aprovar uma lei que prejudicará os cidadãos. Há também um erro jurídico, consistente na existência de um dispositivo no projeto de lei estadual de diretrizes orçamentárias que, ao estabelecer que as dotações serão feitas para os órgãos ou entidades devedoras, é claramente inconstitucional, por violar frontalmente o disposto no art. 100, § 2º, da Constituição Federal.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!