Vida nacional

Candidato desonesto não deve ser julgado pela Justiça Eleitoral

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28 de junho de 2008, 0h00

Ninguém pode ser contrário ao impedimento de determinados candidatos a cargos públicos, inclusive pela via eleitoral. Daí ser sedutora a proposta de negarem-se registros às candidaturas de quem tiver processo por crimes e por improbidade administrativa.

Mas é preciso uma análise percuciente sobre a matéria, antes de, tocado pelo aplauso fácil, aderir-se à proposta. Primeiro, porque resta evidente a afronta aos direitos e garantias individuais do cidadão, consagrados na Constituição Federal, por constituir-se em prévio juízo condenatório da Justiça Eleitoral, sem que ao cidadão tenha sido ofertada e garantida a amplitude de defesa.

Segundo, porque o Judiciário não pode afastar-se de sua responsabilidade pela demora na prestação jurisdicional e, cabotinamente, usando de expediente temerário e demagógico, buscar atalhos jurídicos, de duvidosa constitucionalidade, para, aos olhos da população, passar a imagem de grande guardião da moralidade pública. Se candidatos desonestos infestam a vida política nacional, com inúmeros processos em tramitações em várias instâncias, cabe ao Judiciário julgá-los, dando a prestação jurisdicional que se espera deste Poder.

Com isto, evidentemente, esses políticos serão afastados da vida pública, banidos por sentença condenatória com o trânsito em julgado, na forma expressa na legislação eleitoral em vigor e em consonância com o império Constitucional. É temerário esse arroubo moralista que, cheio de boas intenções, faz uso do arbítrio para atingir objetivos almejados no plano idealístico, qual seja, dar aos cargos públicos ocupantes indenes de quaisquer máculas, com o propósito de um exercício funcional infenso aos descaminhos da corrupção.

O requisito de conduta ilibada, atestada por certidão, antes do exercício da função ou cargo, não se mostra garantia segura de que o seu ocupante não tergiversará na efetividade de suas atividades.São tantos os exemplos recentes que me abstenho de mencioná-los, isto em todos os Poderes, sem exceção. Assim, estou certo que o Judiciário deve manter-se na linha da prudência, resistindo ao apelo fácil do aplauso público. Impedir alguém de alcançar um cargo público, fora do ordenamento jurídico, é cassar-lhe a cidadania, pois ser cidadão é, substancialmente, votar e ser votado, com plena participação na vida nacional.

O arbítrio é intolerável em qualquer Poder, mas quando parte do Judiciário converte-se na consumação do horror, embalde recheado de boas intenções e com apóio público. Não custa lembrar que os inquisidores acreditavam piamente no que estavam fazendo, contando com a aprovação pública, com o povo crente que as mortes de hereges na fogueira evitariam pestes e terremotos. Naqueles idos, o processo era sumário, como também sumária condenação, estanques as prerrogativas da defesa.

Mais recentemente, no Brasil, tantos homens públicos foram sumariamente cassados politicamente que, esperava-se, a sociedade organizada e os Poderes Constituídos, por pelo menos muitas décadas, renegassem e fugissem a qualquer idéia onde os direitos e garantias individuais fossem, de qualquer modo, ameaçados. Não ceder às tentações totalitárias é afirmar o ideário de uma Constituição cidadã em vigor, ainda jovem, mas fruto de experiências dolorosas na vida política nacional.

A corrupção, peste que assola o país, necessita, sobretudo, da afirmação do escopo jurídico em vigor, com o Judiciário dando rápida resposta, dentro dos processos, àqueles que desviaram-se da legalidade no exercício de suas funções. A fogueira da mídia está acesa, não joguemos ao fogo a honra, a liberdade e a cidadania com base em processos ou acusações ainda sob o crivo do contraditório. Chega de Inquisições. Viva a Democracia e o Estado de Direito! É a minha contribuição para o debate, respeitando as idéias em contrário.

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