Mercado financeiro

Agente financeiro deve indenizar viúva por revenda de ações

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23 de junho de 2008, 10h06

Um agente do mercado financeiro foi condenado a pagar indenização de R$ 73.950,00, atualizados e acrescidos de juros, a uma viúva de 68 anos. Licinio Bithencourt da Silva convenceu Claudete Lelina Paccola Frischkorn a vender-lhe um lote de ações do ABN Amro Real S/A. Licinio comprou as ações por R$ 172.554,00 e 20 dias depois as vendeu pelo valor de R$ 246.504,97.

O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que era flagrante a inexperiência da vendedora no manejo do mercado de ações e que ela foi vítima de um profissional que conhecia o negócio. A 4ª Câmara de Direito Privado entendeu que além da lesão ao patrimônio da proprietária das ações, o negócio jurídico violou os princípios da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual. Cabe recurso.

A viúva era herdeira do lote de 116.827 ações do tipo ON, sem valor em bolsa, mas que poderia ser resgatado pelo ABN Amro, instituição financeira que emitiu as ações. Claudete foi insistentemente procurada por Licinio até que concordou em vender suas ações. Para isso, assinou um documento de procuração irrevogável.

Em primeira instância, a juíza Renata Soubhie Nogueira Borio, da 2ª Vara Cível de Pinheiros, entendeu que embora a venda tenha ocorrido com pagamento inferior ao de mercado e tenha o acusado usado de astúcia para celebrar o contrato, não ficou demonstrado o vício de consentimento de erro. Para ela, a viúva era uma pessoa esclarecida, que poderia ter procurado o banco para saber o preço real do lote de ações.

Insatisfeita, a defesa de Claudete recorreu ao Tribunal de Justiça afirmando que sua cliente foi vítima de ato doloso, arquitetado por pessoa que conhecia o mercado financeiro. Sustentou a tese de vício de consentimento, com o argumento de que Claudete não tinha noção do mercado de ações, muito menos que o lote poderia ser comprado diretamente pelo banco, sem a interferência de terceiros.

“Obvio que no caso concreto não faz o menor sentido que o réu, sem o menor risco ou esforço abocanhe valor superior a setenta mil reais simplesmente levando procuração passada pela autora ao banco emitente das ações, e as receba pelo valor real de mercado”, afirmou o relator Francisco Loureiro.

Para a turma julgadora, as partes simularam a celebração de mandato irrevogável, e o réu, representando formalmente a autora, mas agindo em interesse substancial próprio, revendeu o lote de ações diretamente ao próprio banco emitente, 20 dias depois, em 27 de agosto de 2001, pelo valor de R$ 246.504,97.

Segundo o relator, a viúva desconhecia a possibilidade de venda direta do lote de ações ao banco. Para ele, se conhecesse de mercado financeiro teria feito uma simples consulta ao departamento de acionistas do ABN Amro. “Caso contrário, não faria o menor sentido que se dirigisse a um tabelião para lavrar uma procuração e tivesse manifesto deságio com a venda indireta a terceiros”, completou Francisco Loureiro.

Para a 4ª Câmara de Direito Privado, o negócio dissimulado de compra e venda de ações está contaminado por mais de um vício jurídico. “A um só tempo, viola os princípios cogentes do equilíbrio contratual – lesão – e da boa-fé objetiva”, disse o relator.

Apelação nº 424.142-4

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