País da grampolândia

Juiz precisa ser mais seletivo ao autorizar escutas telefônicas

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30 de julho de 2008, 10h39

Editorial da Folha de S.Paulo

Foi preciso que o chefe-de-gabinete da Presidência da República, Gilberto Carvalho, fosse flagrado por uma escuta telefônica em diálogo comprometedor com um advogado do banqueiro Daniel Dantas para que o Planalto se mexesse. Mas o governo finalmente decidiu mobilizar sua base parlamentar para votar o projeto de lei que regulamenta a utilização de grampos em investigações criminais.

O desafio é encontrar o equilíbrio entre o direito da sociedade de proteger-se contra bandidos e o direito de cada cidadão à intimidade e à vida privada. A Constituição enuncia a regra geral: as comunicações estão protegidas por sigilo que só pode ser violado mediante ordem judicial para fins de investigação criminal ou instrução processual.

Na prática, entretanto, verifica-se que tanto a norma genérica como sua regulamentação, a lei 9.296, são insuficientes para coibir abusos. A proliferação de grampos legais e ilegais observada nos últimos anos é claro indicativo de que a interceptação telefônica se tornou o principal “método de investigação” da polícia brasileira, quando deveria, por lei, ser o último recurso.

Faz sentido, portanto, aumentar o controle sobre o grampo, como agora quer o governo. Dentre as medidas disciplinadoras, o projeto institui teto de 360 dias para a manutenção da escuta, que hoje pode ser prorrogada indefinidamente, e a necessidade de que o pedido de interceptação passe pelo Ministério Público.

São aprimoramentos razoáveis, mas, para que o Brasil deixe de ser aquilo que Lula pleonasticamente definiu como “país da grampolândia”, será necessário também que os juízes se tornem mais seletivos ao autorizar as escutas. Em teoria, o magistrado só pode expedir o mandado caso a polícia demonstre que esse é o único meio de obter a prova. Não é o que tem ocorrido.

[ O editorial foi publicado nesta quarta-feira, 30 de julho]

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