Termômetro do perigo

Algema é para casos extremos, sustenta defesa de Cacciola

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17 de julho de 2008, 0h00

“O uso de algemas deve ficar restrito aos casos extremos de resistência e oferecimento de real perigo por parte do preso, e por expressa determinação legal.” Foi com este entre outros argumentos que a defesa do ex-banqueiro Salvatore Cacciola conseguiu garantir nesta quarta-feira (16/7), no Superior Tribunal de Justiça, que o extraditado não fosse algemado quando chegasse ao Brasil. Cacciola chegou ao Rio de Janeiro na manhã desta quinta-feira (17/7).

Os advogados de Cacciola argumentaram, ainda, que a “força” é possível apenas no caso de resistência ou tentativa de fuga, o que não é o caso do cliente. Eles argumentam que Cacciola já é idoso — 63 anos — não oferece qualquer perigo à sociedade e, ainda, tem limitações físicas porque sofre de “artrite reumatóide”, o que lhe gera fortes dores no corpo.

“Algemar por algemar é medida odiosa, pura demonstração de arrogância ou exibicionismo de alguns policiais”, afirmam os advogados Carlos Ely Eluf, Alan Bousso e Guilherme Eluf na petição encaminhada ao STJ.

A defesa pretendia evitar a exposição do cliente por meio da imprensa argumentando que não haveria necessidade alguma de mostrar o ex-banqueiro algemado para a “ingênua população” do país. “Pessoa pacifica e pacata, homem idoso e com saúde debilitada não possui sequer sentença condenatória transitada em julgado”, afirmam os advogados.

Outros dois pedidos de Habeas Corpus propostos ao STJ ainda estão sob análise do ministro Humberto Gomes de Barros. Antes de se manifestar sobre os pedidos, o ministro solicitou informações ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região e ao ministro da Justiça, Tarso Genro. Os pedidos são pela soltura imediata de Cacciola. A defesa argumenta flagrante excesso de prazo para o término da instrução criminal — a lei permite 81 dias como limite para o encerramento de instrução criminal para réus presos e Cacciola já está recolhido ao cárcere há mais de um ano.

Os advogados do ex-banqueiro pedem que ele possa aguardar em liberdade o trânsito em julgado das decisões em seu caso. Eles alegam ofensa ao princípio constitucional da isonomia (ou igualdade entre as partes), uma vez que Cacciola é o único dos 13 réus que teve prisão preventiva decretada. “Não havendo trânsito em julgado de sentença penal condenatória e tendo terminado a instrução criminal, Cacciola deve aguardar a sentença definitiva em liberdade assim como os demais co-réus”, argumenta Luís Fernando Cardieri, um dos advogados no caso.

Chuva de farpas

No pedido de Habeas Corpus enviado ao STJ, a defesa de Cacciola criticou duramente a Polícia Federal e o governo brasileiro, que, segundo os advogados, pediu a extradição do ex-banqueiro por motivação política. “No caso vertente, embora digam o contrário, é flagrante a inconfessável motivação política que levou o governo brasileiro através de seu ilustre Ministro de Estado da Justiça a requerer a extradição do paciente.”

Os advogados de Cacciola afirmam que a PF tem violado garantias fundamentais: “Vemos por meio da mídia impressa e televisiva deste país as últimas operações realizadas pela nossa Polícia Federal (que também será responsável pelo transporte do Paciente) que violam constantemente todas as garantias fundamentais previstas na Lei Maior pátria”.

As críticas continuam: “Procurando mostrar a eficácia de suas ações de combate à criminalidade, há muito tempo a Polícia Federal vem utilizando métodos que têm um sentido pretensamente simbólico ou “educativo”, tentando passar para a opinião pública a idéia de estar provada a culpa dos suspeitos antes mesmo da conclusão de inquéritos”.

Segundo a defesa de Cacciola, suspeitos são apresentados como culpados em caráter definitivo pela PF sem que tenham sido ouvidos, processados ou julgados. “Há um flagrante desprezo à presunção de inocência e ao devido processo legal”, afirmam os advogados.

Leia o pedido da defesa de Cacciola

EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA CONVOCADA NO EGRÉGIO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, DOUTORA JANE SILVA.

URGENTE

RÉU PRESO

DISTRIBUIÇÃO POR PREVENÇÃO

O advogado CARLOS ELY ELUF, brasileiro, casado, inscrito na Seccional Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil sob o nº 23.437, com endereço profissional na Avenida São Valério, nº 73, Cidade Jardim, São Paulo, Capital, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento nos artigos 5º, incisos LXVIII, e 105, inciso II, alínea “c”, da Constituição Federal e artigos 647 e 648, inciso I, do Código de Processo Penal, impetrar

ORDEM DE HABEAS CORPUS PREVENTIVO

COM PEDIDO LIMINAR

em favor de SALVATORE ALBERTO CACCIOLA, brasileiro naturalizado, separado judicialmente, economista, portador da Cédula de Identidade RG nº 01741758-5, e inscrito no CPF sob o nº 031239107-25, residente e domiciliado no Hotel 47 – Forty Seven – Albergo in Roma, Via Petroselli nº 47, 00186, Roma, Itália, contra ordem emanada pelo Excelentíssimo Senhor Ministro de Estado da Justiça, Doutor TARSO GENRO, e seus subordinados: Excelentíssimo Senhor Secretário Nacional de Justiça, Doutor ROMEU TUMA JÚNIOR, Ilustríssimo Senhor Delegado Diretor Nacional do Departamento de Polícia Federal, Ilustríssimo Senhor Delegado Chefe da INTERPOL no Brasil, Ilustríssimo Senhor Delegado Superintendente Regional da Polícia Federal no Rio de Janeiro pelos relevantes fatos e motivos a seguir expostos.


Requer, ainda, sejam oficiadas as autoridades coatoras para darem as respectivas informações e do processamento aguarda prosseguimento.

Por fim, requer a inclusão do nome deste subscritor, na contracapa destes autos, visando o recebimento de intimações, despachos e data para o julgamento deste writ, via Imprensa Oficial, pois, eventualmente, poder-se-á realizar a respectiva sustentação oral. Tal solicitação é perfeitamente cabível, garantindo, assim, a ampla defesa do Paciente.

RAZÕES RECURSAIS

EXCELENTÍSSIMO MINISTRO PRESIDENTE,

CULTA MINISTRA RELATORA,

NOBRES MINISTROS JULGADORES,

DIGNOS DESEMBARGADORES CONVOCADOS,

DOUTO SUB-PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA.

PRELIMINARMENTE

I) DA PRIORIDADE NA TRAMITAÇÃO DO PROCESSO DEVIDO À IDADE DO RECORRENTE – LEI Nº 10.741/2003, E PELO FATO DE ESTAR RECOLHIDO PROVISORIAMENTE AO CÁRCERE NO PRINCIPADO DE MÔNACO.

1. Antes de passarmos à análise dos fatos que geraram este recurso, importante verificarmos prima facie a prioridade que deve ser dada na tramitação deste writ uma vez que o Paciente, possui idade superior a 60 (sessenta) anos, conforme documentação acostada, razão pela qual, requeremos lhe sejam outorgados os benefícios que o ESTATUTO DO IDOSO (Lei nº 10.741/2003) prevê em seu artigo 71, § 1º:

“Art. 71. É assegurada prioridade na tramitação dos processos e procedimentos e na execução dos atos e diligências judiciais em que figure como parte ou interveniente pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, em qualquer instância.

§ 1o O interessado na obtenção da prioridade a que alude este artigo, fazendo prova de sua idade, requererá o benefício à autoridade judiciária competente para decidir o feito, que determinará as providências a serem cumpridas, anotando-se essa circunstância em local visível nos autos do processo”.

2. Isto posto, requer este impetrante a Vossa Excelência, em sede de preliminar, que seja determinada a imediata aplicação do dispositivo legal supramencionado, inclusive anotando-se sua eficácia em local visível na contracapa destes autos processuais, por se tratar de feito em curso sob este abrigo legal, outorgando-se ainda, prioridade ao julgamento da vertente impetração.

3. Ademais, é público e notório, conforme amplamente divulgado pela imprensa escrita e televisiva, que o Paciente encontra-se custodiado provisoriamente no Principado de Mônaco, em virtude de mandado de prisão expedido pelo Meritíssimo Juízo Federal da 6ª Vara Federal do Rio de Janeiro, aguardando sua extradição para o Brasil, o que pode ocorrer nos próximos dias.

DOS FATOS

4. O Paciente era gestor do Banco Marka e no ano de 1999, após uma crise financeira mundial causada por problemas ocorridos na Rússia, que gerou inúmeros prejuízos para a economia brasileira, o Banco Central do Brasil – BACEN teve que intervir naquela instituição para evitar estragos piores ou abalo no sistema de mercado.

5. O Banco Marka possuía à época patrimônio líquido aplicado em contratos de venda no mercado futuro de dólar suficiente para honrar seus compromissos, mas com a brusca desestabilização da economia e aumento avassalador do dólar norte-americano, em duas semanas, houve a necessidade de uma ajuda financeira por parte do BACEN em relação ao Banco gerido pelo Paciente.

6. Após a efetivação de tal ajuda, acusaram o Paciente, indevidamente, de se beneficiar de informações em tese privilegiadas junto ao Banco Central do Brasil, fato esse que não corresponde com a verdade, pois diga-se de passagem, o Banco gerido pelo Paciente sofreu abalo financeiro por apostar no real ao invés do dólar. Outrossim, informações privilegiadas beneficiam os vencedores e, no caso não foi o que ocorreu, pois se assim o fosse os investimentos em dólar norte-americano, e não na moeda corrente brasileira, beneficiariam o Banco Marka.

7. Alegou-se que houve prejuízos para os cofres públicos com tais transações, culminando com malsinada denúncia ministerial contra o Paciente e demais co-réus por gestão temerária de instituição financeira (crime genérico), peculato e tráfico de influência.

8. No ano de 2000 o Ministério Público Federal pediu a prisão preventiva do Paciente que, posteriormente, foi posto em liberdade por r. decisão dessa Corte Suprema. Ato contínuo, não havendo impedimento legal para o retorno do Paciente para a sua pátria natal e residência na Itália, já que é italiano, para lá retornou, tudo isso ocorrendo sem que naquela oportunidade sequer tivesse ocorrido denúncia ministerial contra o mesmo. Ou seja, não fugiu!

9. Outrossim, atendeu a todos os pedidos do Judiciário brasileiro, sendo ouvido sempre por Carta Rogatória endereçada à Itália onde sempre prestou esclarecimentos para os magistrados federais do Rio de Janeiro.


10. Passados cinco anos a MM. Juíza Federal da 6ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, para conveniência da instrução processual (que já terminou), e subsidiariamente para a garantia da aplicação da lei, decretou a prisão preventiva do Paciente novamente. Isto ocorreu no ano de 2005.

11. Tal prisão efetivamente ocorreu, no Principado de Mônaco, pela Interpol, como amplamente divulgado pela mídia impressa e televisiva, em 15 de setembro de 2007. Ato contínuo o governo brasileiro requereu às autoridades judiciárias daquele Principado a extradição do Paciente para “dar exemplo” (não se sabe a quem) e para cumprimento antecipado de sua pena.

12. Com a concordância de Sua Alteza o Príncipe Albert II de Mônaco pela extradição do Paciente, o mesmo poderá ser encaminhado para este país nos próximos dias, o que justifica o caráter de urgência deste writ.

13. Cumpre-nos esclarecer, ainda, nobre Ministra, que o Paciente possui atualmente 63 (sessenta e três) anos de idade, sempre foi pacato, pai de família, honesto e trabalhador. Ademais, não oferece qualquer perigo à sociedade tampouco condições de resistência uma vez que sofre de “artrite reumatóide”, fato que lhe gera fortes dores no corpo e necessidade constante de utilizar medicamentos.

14. Seu processo, embora tenha sentença condenatória, encontra-se no Egrégio Tribunal Regional Federal da 2ª Região, há mais de três anos, aguardando o julgamento do seu recurso de apelação. Ou seja, ainda não há trânsito em julgado definitivo da sentença!

15. Outrossim, esta defesa, assim como o Paciente, buscam amparo no Judiciário para garantia da aplicação dos seus direitos constitucionais e infraconstitucionais (estas previstas no Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil), pelas autoridades responsáveis pela extradição e custódia do Paciente em solo brasileiro, diretamente subordinadas à autoridade ora coatora.

16. E isso se faz necessário, Excelência, infelizmente, em virtude dos últimos acontecimentos envolvendo nossa Polícia Federal, que constantemente violam as leis pátrias, o que gerou consternação até mesmo do Excelentíssimo Senhor Ministro Presidente do Egrégio Supremo Tribunal Federal, Doutor GILMAR MENDES, bem como de inúmeras outras autoridades do país.

DO DIREITO

II) DA EVIDENTE REPERCUSSÃO, E UTILIZAÇÃO DESTE CASO PARA FINALIDADES DE PROPAGANDA POLÍTICA E IDEOLÓGICAS E DAS RECENTES VIOLAÇÕES À LEGISLAÇÃO PERPETRADAS PELAS AUTORIDADES DA POLÍCIA FEDERAL BRASILEIRA, QUE SUBMETEM PESSOAS SOB SUA CUSTÓDIA A GRAVÍSSIMOS CONSTRANGIMENTOS.

17. No caso vertente, embora digam o contrário, é flagrante a inconfessável motivação política que levou o governo brasileiro através de seu ilustre Ministro de Estado da Justiça a requerer a extradição do Paciente.

18. Nenhum outro acusado, em nossa nação, recebeu tratamento tão direcionado e com visos de ordem estritamente pessoal como é o caso do Paciente.

19. Para esta finalidade não pouparam nossas autoridades seguidas viagens para a Europa, efetuadas diretamente por Ministros e Secretários de Estado, sempre cercados de grandes alaridos da imprensa, com o objetivo de que segundo as mesmas, em distorcida ótica, visavam a extradição “do suposto rei da impunidade”, no caso vertente o ora Paciente, que sequer possui condenação com trânsito em julgado em nossos Tribunais e, portanto, segundo os princípios que norteiam a legislação brasileira, é presumível a sua inocência.

20. Concedida pelo Principado de Mônaco a extradição do Paciente, e estando o mesmo em vias de ser transportado para o Brasil a qualquer momento, o mesmo passa a ser objeto de preparativos providenciados pelas autoridades apontadas como coatoras no presente writ, inusuais e totalmente superdimensionados no aspecto logístico e de propaganda política, como se o mesmo fosse o terrorista mais temível do planeta terra, mais ou menos como se nossas autoridades estivessem a transportar Bin Laden para o nosso país.

21. O Paciente é pessoa idosa, vítima de artrite infecciosa, portanto doente, e que sempre teve, até o surgimento do escândalo do Banco Marka conduta pregressa irrepreensível, sem antecedentes de espécie alguma, sendo notoriamente pai de família, de filhos bem criados, homem trabalhador e possuídor de diploma superior em economia outorgado pela mais importante faculdade do Estado do Rio de Janeiro.

22. No período de onze meses em que ficou em custodia judicial no Principado de Mônaco por conta do pedido de extradição do governo brasileiro que acabou consumado o Paciente também teve conduta exemplar e irrepreensível.

23. Sucede que em decorrência do que está sendo divulgado pela mídia atualmente, referentes às estratégias a serem utilizadas pela Polícia Federal para o traslado do Paciente que deverá ocorrer no Rio de Janeiro ou no Distrito Federal (Brasília), causa grande preocupação o aparato e as providências exageradas que estão sendo tomadas para a condução de uma pessoa como é o caso do Paciente cujo grau de periculosidade é inexistente.


24. Causa grande temor ao mesmo e seus familiares, em com absoluta razão, a forma como irá ser tratado pelas autoridades apontadas como coatoras neste remédio legal.

25. Através de diversos pronunciamentos do Ministro de Estado da Justiça e de seu Secretário, Doutor Romeu Tuma Júnior, é indisfarçável e inconfessável o intento de utilização do Paciente, preso, como “exemplo” para aqueles que possam vir a cometer crimes neste país e esquivar-se de eventual punição.

26. Aquelas insignes autoridades não se cansam de comparecer perante a mídia escrita e falada, para alardearem que a extradição do Paciente é “uma grande vitória política do governo Lula” e que “o príncipe destronou o rei da impunidade”, com o fim único e exclusivo de humilhar e expor indevidamente o Paciente como se fosse um “troféu”.

27. Obviamente que a chegada do Paciente ao Brasil gera uma expectativa por parte do atual governo, mesmo porque estamos em ano eleitoral e os fatos objeto da denúncia ministerial se deram na gestão do então Presidente da República, Doutor Fernando Henrique Cardoso, que integra as fileiras do “PSDB”. Talvez isso sirva para, de algum modo, atingir a oposição daquele partido em detrimento dos escândalos que envolvem a atual gestão.

28. Aliás, isso se mostra nítido já que o próprio Partido dos Trabalhadores (PT) divulga notas em seu sítio eletrônico (Internet), propalando que “a sociedade brasileira conseguiu uma grande vitória porque o príncipe Albert II destronou o rei da impunidade”.

29. Mais ainda, que “o governo brasileiro teria feito um grande trabalho técnico com a extradição”. Com frases de efeito e visível conotação logística, asseguram falsamente que o Paciente “é um réu condenado a 13 anos e meio de prisão”. Afirmação esta mendaz, e aplicada em grosseiro erro de direito, por que é sabido que somente possui condenação quem possui sentença judicial com trânsito em julgado, fato que não ocorre com o Paciente que não teve seu recurso de Apelação à sentença monocrática julgada pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 2ª Região.

30. Nesta apologia ideológica afirmam a torto e a direito que a prisão do Paciente “funciona como exemplo para aqueles que eventualmente tenham o desejo de violar a lei” (Ministro Tarso Genro). Há utilização da imagem do Paciente de forma humilhante à sua pessoa e dignidade afrontando às escancaras qualquer principio compatível de direitos humanos vigentes no mundo.

31. E aqui pairam nossas preocupações uma vez que vemos por meio da mídia impressa e televisiva deste país as últimas operações realizadas pela nossa Polícia Federal (que também será responsável pelo transporte do Paciente) que violam constantemente todas as garantias fundamentais previstas na Lei Maior pátria.

32. Exemplo disso é a última operação, denominada “Satiagraha” onde foram presos os senhores Daniel Dantas, Celso Pitta e Naji Nahas. Não se sabe quem avisou a imprensa, mas esta acompanhou toda a ação pirotécnica engendrada pelos agentes federais, inclusive, com a utilização de armamento pesado, inúmeras viaturas, uso arbitrário de algemas, enfim, todo um circo que em momento algum teve qualquer tipo de resistência por parte daqueles que tinham mandados de prisão expedidos contra si.

33. E lamentavelmente esta vem sendo a postura adotada por aqueles agentes que deveriam fiscalizar a lei ao invés de violá-la. Aliás, tal postura vem sendo alvo de constantes recriminações por parte do preclaro Ministro Presidente da Suprema Corte, que já reconheceu as arbitrariedades perpetradas por aqueles e as constantes afrontas às garantias constitucionais.

34. No caso do Paciente certamente não será diferente, uma vez que já chegaram a anunciar até mesmo a possibilidade de mandarem para a Europa um avião da Força Aérea Brasileira para resgatar ao Brasil “o perigoso meliante” ou o “terrorista mais temível do planeta”.

35. Tentamos evitar isso, nobre Ministro, uma vez que o Paciente, pessoa pacifica e pacata, homem idoso e com saúde debilitada não possui sequer sentença condenatória transitada em julgado. Não há necessidade alguma de mostrar algemado, à nossa ingênua população, pessoa que não possui inclusive antecedentes criminais de qualquer espécie até a eclosão do caso do Banco Marka.

36. Não podemos permitir que se viole direitos humanos, a preservação da dignidade do preso, garantias constitucionais, e direitos do cidadão.

37. Note-se, Excelência, que não só o culto Ministro Gilmar Mendes (que já chamou esta “espetacularização” abusiva, de “coisa de gângster” e, comparou-os noutra oportunidade à “gestapo nazista”) vai de encontro ao nosso entendimento. Os Senadores da República também recriminam tal situação, conforme se verifica na documentação acostada.


38. Diante disso buscamos nesse digno Superior Tribunal, guardião dos direitos humanos dos nossos cidadãos, a proibição de excessos que venham a permitir que um acusado que não possui sentença definitiva e que, portanto, tem sua inocência presumida, possa ser atirado à cova dos leões e exibido em praça pública como nos lamentáveis espetáculos do antigo coliseu romano ou nos absurdos julgamentos existentes à época da famigerada inquisição.

39. Para o nobre advogado criminalista Nélio Machado (Jornal “O Estado de São Paulo”, sexta-feira, 11 de julho de 2008, página A13), ao citar casos de “tortura branca” que estariam sendo cometidos pela Polícia Federal: “Nós temos tido uma ideologização da prática persecutória, de tal modo que as pessoas estão sendo linchadas em praça pública como se estivéssemos na época medieval”.

40. Citando o jurista Norberto Bobbio em uma de suas decisões, o atual Presidente da Corte Suprema, Ministro Gilmar Mendes, disse que o respeito aos direitos individuais “é que permite avaliar a real observância dos elementos materiais do Estado de Direito e distinguir civilização de barbárie”.

41. Tal posicionamento não poderia ser mais oportuno, Excelências, afinal, procurando mostrar a eficácia de suas ações de combate à criminalidade, há muito tempo a Polícia Federal vem utilizando métodos que têm um sentido pretensamente simbólico ou “educativo”, tentando passar para a opinião pública a idéia de estar provada a culpa dos suspeitos antes mesmo da conclusão de inquéritos.

42. Isso tudo sem que aqueles tenham sido ouvidos, processados, julgados, etc. Enfim, os suspeitos são apresentados como culpados em caráter definitivo; e isso não é crível em um Estado Democrático de Direito.

43. Há um flagrante desprezo à presunção de inocência e ao devido processo legal. Prova disso ocorreu no ano de 2007, durante a famigerada “Operação Navalha”, onde um vídeo contendo cenas de uma suposta entrega de propina ao então Ministro Silas Rondeau “vazou”, tendo como fundo a trilha sonora do filme “O Poderoso Chefão”. Na mesma ocasião “vazaram” a informação de que haveria um certo Gilmar Mendes numa lista apreendida, quando na verdade sempre souberam que tratava-se de um homônimo do Ministro do Supremo Tribunal Federal.

44. Infelizmente o que temos assistido cotidianamente é um total desrespeito às regras mais elementares do direito nas operações da Polícia Federal. Incontestável que na grande maioria dos casos há exposição pública dos acusados sem que haja provas que os levem à condenação.

45. Prova disso é a última operação, denominada “Satiagraha”, onde dados sigilosos teriam vazado para a TV Globo culminando com as prisões de Naji Nahas, Celso Pitta e Daniel Dantas. Com o Paciente, que sequer possui condenação definitiva transitada em julgado, não será diferente caso esse Egrégio Superior Tribunal não impeça tais aviltamentos.

46. Do jeito que as coisas andam, nobres Ministros, dentro em breve estaremos diante de um Estado policial midiático, onde não se respeitarão mais o devido processo legal e, tampouco, as ordens emanadas pelo Poder Judiciário.

47. Estas, aliás, já estão sendo contestadas pelos agentes da lei, como no caso de Daniel Dantas que, após ser posto em liberdade pela segunda vez (por meio de decisão do Egrégio Supremo Tribunal Federal), assistiu a Associação dos Delegados da Polícia Federal rebaterem com veemência os argumentos jurídicos do Ministro julgador que ensejaram sua soltura.

48. Para o culto jurista Roberto Delmanto: “A forma com que a Polícia Federal vem executando tais prisões tem, por outro lado, desrespeitado flagrantemente garantias constitucionais com a proibição de tratamento degradante, a inviolabilidade da imagem das pessoas, o respeito à integridade física e moral das mesmas e a presunção de inocência (Constituição Federal, artigo 5º, III, X, XLIX e LVII). A imprensa televisiva e escrita é previamente avisada da hora e do local em que as prisões serão efetivadas e para onde os detidos serão levados, prende-se os acusados na presença de familiares, algema-se sem que houvesse qualquer resistência à prisão e, por vezes, jogam-se os detidos nas partes traseiras de camburões.”

49. Para o preclaro jurista Dalmo de Abreu Dallari (Jornal “O Estado de São Paulo”, 11 de julho de 2008, página A7): “Essa exposição pública ou espetáculo da algema é dispensável. Isso não é necessário para que a polícia ganhe prestígio”. A polícia precisa ter “comedimento e prudência, porque os acusados ainda não foram julgados. Em direito prevalece a presunção da inocência que está na Constituição”.

50. Em recente nota o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, por meio de seu Presidente em exercício, Doutor Vladimir Rossi Lourenço, repudiou o “Estado Policial”. Lembrou Rossi que o Ministro da Justiça, Doutor Tarso Genro, quando da posse do Doutor Luiz Fernando Corrêa à frente do Departamento de Polícia Federal, afirmou que: “a Polícia Federal continuará realizando operações de impacto no combate à corrupção e ao crime organizado, mas doravante sem pirotecnia”.


51. No caso do Paciente, como bem observou o jornalista José Nivaldo Cordeiro (Jornal “Mídia sem Máscara”, em 10 de julho de 2008): “Eu estou bastante preocupado com o que vai acontecer se o nosso ministro da Justiça conseguir pôr as mãos no banqueiro Salvatore Cacciola. Este homem é um arquivo vivo e foi figura de proa de tudo que se sucedeu no sistema financeiro nacional nos últimos anos do Governo FHC. Tem informações que poderão abalar a República e definir, antes da corrida começar, a sucessão presidencial”.

52. Para Márcio Accioly (Jornal “Brasil Wiki!”, 11/07/2008): “o ex-banqueiro Cacciola está quase chegando, para desviar a atenção da mundiça e se colocar no palco das acusações por espaço de uma semana e meia a duas”.

53. Como se vê, todos querem aparecer a seu lado, para dar a mendaz sensação à opinião pública que com a presença do Paciente no Brasil, sob custódia do Estado, todos os desmandos e descalabros financeiros que assolam cotidianamente a nação e são evidenciados diuturnamente pela mídia, estariam resolvidos. E que o governo praticou uma grande proeza ao trazer o Paciente para o Brasil “trancafiado”.

54. Evidentemente que nesta ocasião não faltará espetáculo extravagante de condutas de nossas autoridades, que conduzirão o Paciente algemado (sem que este ofereça qualquer resistência) e sem qualquer necessidade para tal finalidade, para expor a sua imagem nestas condições de desrespeito humano e humilhações para a população brasileira, e de preferência em horário que não for conflitante com a edição do Jornal Nacional ou coisa que o valha.

54. Esse temor do Paciente é plenamente justificável em decorrência de grandes espetáculos de exibição e de pirotecnia exibidos pela nossa incansável Polícia Federal, que não possui pudor algum ou constrangimento de exibir perante a mídia ou à nação em geral pessoas que são meramente suspeitas de prática de ilícitos penais à saga de repórteres, sendo as mesmas exibidas à nação ávida por estes atos de constrangimento e humilhação a que são submetidas munidas de algemas, jogadas em camburões (parte traseira), algumas vezes sem insulfilme, para que possam ser filmadas e fotografadas, assediadas por jornalistas a todo instante, presas durante a madrugada dentro de edifícios, que inexplicavelmente a Rede Globo de Televisão está presente (não sabemos como), para filmá-las até mesmo vestindo pijamas no interior de suas residências.

55. Em caso semelhante ao do ora Paciente uma brasileira foi extraditada dos Estados Unidos e sofreu assédios inoportunos de repórteres que pretendiam entrevistá-la em pleno vôo comercial que a conduzia ao Brasil. Inaceitável!

56. Casos celebres desta conduta atípica e contrárias aos princípios de direitos humanos e de profunda degradação moral aos acusados, em época muito recente somam-se às dezenas. Para mencionarmos apenas alguns, reportamos-nos às pessoas vítimas destas humilhações desnecessárias tais quais: Daniel Dantas, Naji Nahas, Ricardo Tosto, Celso Pitta.

57. Ou seja, numa notória inversão de valores, nossa polícia prende para apurar ao invés de apurar para depois prender.

58. Do mesmo modo, esta defesa busca preventivamente a determinação para que as autoridades envolvidas nesta questão (extradição), a partir do momento em que o Paciente lhes for entregue, observem todas as garantias e prerrogativas profissionais a nós inerentes, conforme estabelece a Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, fornecendo, inclusive, ainda que em caráter confidencial, informações acerca da chegada ao Brasil do Paciente, onde pousará a aeronave que o trará, para onde o mesmo será levado, etc.

III) DA INCONSTITUCIONALIDADE DO USO ARBITRÁRIO DE ALGEMAS

59. O uso de algemas, para muitos, ainda seria um assunto tormentoso por falta de disciplina jurídica específica sobre o assunto. O artigo 199 da Lei de Execução Penal sinalizou com seu regramento, ao determinar que “o emprego de algemas será disciplinado por decreto federal”, mas até hoje não temos esse decreto federal que cuide da matéria.

60. Porém, cabe recordar que o uso de força física está excepcionalmente autorizado em alguns dispositivos legais, como por exemplo no Código de Processo Penal:

“Art. 284. Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso; (…)

“Art. 292. Se houver (…) resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência…”.

61. Depreende-se, portanto, do texto vigente que a força é possível tão somente quando indispensável no caso de resistência ou tentativa de fuga e quando for necessária para a defesa ou para vencer a resistência.

62. Todo uso de algemas que exorbitar desse limite constitui abuso, nos termos dos artigos 3º, “i” (atentado contra a incolumidade do indivíduo) e 4º, “b” (submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei) da Lei 4.898/65 (Lei de Abuso de Autoridade).

63. O que se depreende, Excelência, é que algemar por algemar é medida odiosa, pura demonstração de arrogância ou exibicionismo de alguns policiais, que, como bem patenteado devem responder pelo crime de abuso de autoridade.

64. Se um cidadão tiver que ser conduzido a uma delegacia de polícia, que o seja sem atingir-lhe inutilmente o decoro, evitando-se a todo custo aumentar ainda mais a sua aflição. O uso de algemas, em conclusão, deve ficar restrito aos casos extremos de resistência e oferecimento de real perigo por parte do preso, e por expressa determinação legal.

65. Nossa preocupação se dá, nobre Ministro, pois em primeiro lugar abuso constitui crime e, em segundo lugar, decorre da regra de tratamento o princípio constitucional da presunção de inocência e a dignidade da pessoa humana que rege nosso Estado Constitucional e Democrático de Direito.

IV) DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA OU NÃO CULPABILIDADE E A INVIOLABILIDADE DA HONRA E DA IMAGEM DA PESSOA

66. O artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal determina que:

“ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

67. Por este princípio não se admite que se dê tratamento de condenado a alguém que não tenha, sequer, esgotado todos os recursos cabíveis.

68. O artigo 11, item 1, da Declaração Universal dos Direitos do Homem garante que “todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”.

69. Portanto, isso deve ser aplicado ao caso do Paciente!

70. Importante trazermos à colação a esclarecedora decisão do culto Ministro CELSO DE MELLO, do Egrégio Supremo Tribunal Federal, acerca do tema:

“A submissão de uma pessoa à jurisdição penal do Estado coloca em evidência a relação de polaridade conflitante que se estabelece entre a pretensão punitiva do Poder Público e o resguardo à intangibilidade do jus libertatis titularizado pelo réu. A persecução penal rege-se, enquanto atividade estatal juridicamente vinculada, por padrões normativos, que, consagrados pela Constituição e pelas leis, traduzem limitações significativas ao poder do Estado. Por isso mesmo, o processo penal só pode ser concebido – e assim deve ser visto – como instrumento de salvaguarda da liberdade do réu. O processo penal condenatório não é um instrumento de arbítrio do Estado. Ele representa, antes, um poderoso meio de contenção e de delimitação dos poderes de que dispõem os órgãos incumbidos da persecução penal. Ao delinear um círculo de proteção em torno da pessoa do réu – que jamais se presume culpado -, até que sobrevenha irrecorrível sentença que, condicionada por parâmetros ético-jurídicos, impõe ao órgão acusador o ônus integral da prova, ao mesmo tempo em que faculta ao acusado que jamais necessita demonstrar a sua inocência o direito de defender-se e de questionar, criticamente, sob a égide do contraditório, todos os elementos probatórios produzidos pelo MP. A própria exigência de processo judicial representa poderoso fator de inibição do arbítrio estatal e de restrição ao poder de coersão do Estado. A cláusula nulla poena sine judicio exprime, no plano do processo penal condenatório, a fórmula de salvaguarda da liberdade individual” . (STF – 1ª T. – HC 73.338/RJ – Rel. Min. Celso de Mello – RTJ 161/264).

71. O Paciente, que não possui condenação definitiva, aguarda o julgamento do recurso de apelação, pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 2ª Região, contra a respeitável sentença monocrática condenatória, é inocente até que se prove o contrário.

72. Em recente decisão a Egrégia Corte Suprema, por meio de sua Colenda 2ª Turma, à unanimidade, quando do julgamento do habeas 84.029/SP, acompanhando o culto Ministro Relator, GILMAR MENDES (atualmente Presidente daquela Corte Suprema) na seguinte decisão que se assemelha em muito com o presente caso:

“(…) o Plenário deste Tribunal discutiu amplamente a possibilidade de reconhecimento do direito de recorrer em liberdade desde o início do julgamento da RCL nº 2.391/PR, Rel. Min. Marco Aurélio. (…) o entendimento que estava a se firmar, inclusive com o meu voto, pressupunha que eventual custódia cautelar, após a sentença condenatória e sem o trânsito em julgado, somente poderia ser implementada se devidamente fundamentada, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal. Também considero que não se pode conceber como compatível com o princípio constitucional da não-culpabilidade qualquer antecipação de cumprimento da pena. (…) o cerceamento preventivo da liberdade não pode constituir um castigo àquele ou àquela que sequer possui uma condenação definitiva contra si. (…) uma execução antecipada em matéria penal configuraria grave atentado contra a própria idéia de dignidade da pessoa humana. Caso se entenda, como enfaticamente destacam a doutrina e a jurisprudência, que o princípio da dignidade humana não permite que o ser humano se convole em objeto da ação estatal, não há como compatibilizar semelhante idéia com a execução penal antecipada. (…) o recolhimento à prisão, quando não há uma definitiva sentença condenatória, determinada por lei, sem qualquer necessidade de fundamentação, tal como disposto no art. 9º, da Lei nº 9.304, de 1995, afronta, a um só tempo, os postulados da presunção de inocência, da dignidade humana e da proporcionalidade. Justamente porque não se trata de uma custódia cautelar, tal como prevista no art. 312, do Código de Processo Penal, que pode efetivar-se a qualquer tempo, desde que presentes os motivos dela ensejadores, o recolhimento à prisão por força legal, tal como previsto para ações praticadas por organizações criminosas, afigura-se-me uma antecipação da pena não autorizada pelo texto constitucional. (…) o recolhimento à prisão quando ainda cabe recurso da sentença ou acórdão condenatório há que ser embasado em decisão judicial devidamente fundamentada em quaisquer das hipóteses previstas no art. 312 do Código de Processo Penal”. (STF – HC 84.029/SP – DJ 06.09.2007 – Min. Rel. Gilmar Mendes) (grifo nosso)

73. No presente caso, Excelência, deve-se considerar o princípio constitucional da presunção de inocência, Não é admissível que se dê ao Paciente tratamento que atente contra a Constituição Federal.

74. Há pouco mais de um ano tivemos uma discussão na Egrégia Suprema Corte, em relação ao uso injustificado de algemas pelas autoridades policiais.

75. Como já dito, culto Ministro, estão armando um circo para repatriar o Paciente e, possivelmente, as regras constitucionais serão ignoradas pelas autoridades policiais que exibirão o Paciente para a platéia num verdadeiro “show” de demagogia operacional, como se tivessem trazendo ao país o terrorista mais procurado do planeta.

76. E certamente será isso que ocorrerá com o Paciente nesta hipótese, que será aviltado e exposto a humilhações e constrangimentos.

77. Assistimos, cotidianamente, nas últimas e espalhafatosas, operações da Polícia Federal pátria, a exposição de presos temporários a ações devastadoras da mídia e imprensa nacional, a qual, em total desrespeito às garantias constitucionais individuais dos cidadãos, os mesmos não pouparão o Paciente também dessa humilhação. Assim como recentemente fizeram com outros presos como o ilustre advogado Ricardo Tosto, que foi algemado e exposto à mídia para poucos dias depois ser colocado em liberdade. Essa Corte jamais seria provocada se não houvesse registros de tais desmandos no Brasil.

78. Neste clima nebuloso de propaganda política e usurpação dos sagrados princípios de preservação da imagem dos acusados, e lembramos novamente, com a devida vênia a Vossa Excelência, que o Paciente não possui condenação definitiva em nenhum Tribunal brasileiro, é plenamente justificável o temor de que o mesmo venha a ser conduzido desde que em poder de nossas autoridades algemado, exibido à imprensa nessas condições, fotografado, filmado, importunado por repórteres, jornalistas, radialistas e cinegrafistas, exibido para fotos de cunho político com autoridades governamentais, terá cerceado o seu direito de estar fisicamente com seus representantes judiciais e será vítima de chacotas e pilherias durante a sua condução até o local em que deverá permanecer custodiado.

79. E isto não pode ser tolerado uma vez que o Brasil é membro signatário da Convenção das Nações Unidas de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), sendo que tal tratado o qual aderimos de forma incondicional possui dispositivos que proíbem este tipo de ação nefasta e degradante à pessoa humana.

80. O artigo 5º, item 4, daquele tratado (inserido no ordenamento jurídico nacional por meio da Emenda Constitucional nº 45/2004), determina que: “Os processados devem ficar separados dos condenados, salvo em circunstâncias excepcionais, e devem ser submetidos a tratamento adequado à sua condição de pessoas não condenadas”.

81. Do mesmo modo, o artigo 8º, item 2, alínea “d”: “Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa (…) d) direito do acusado de defender-se pessoalmente ou de ser assistido por um defensor de sua escolha e de comunicar-se, livremente e em particular, com seu defensor”

82. O artigo 11 determina que: “Toda pessoa tem direito ao respeito da sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade. 2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação. 3. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais ofensas.”

83. Evidentemente que este Tribunal tradicional por seu amor à aplicação das regras de direito e de principio de humanidade e preservação da dignidade do ser humano, que não pode ser submetido a este tipo de servicia moral, contrários aos princípios de direitos humanos, não ira agasalhar a possibilidade manifesta de ocorrerem esses atos anticivilidade em relação ao Paciente e a qualquer outro ser humano que pudesse ser submetido a condições tão anômalas de custodia judicial.

84. É sabida e notória a vigilância e o destemor de nosso Poder Judiciário para coibir atos dessa natureza, que jamais poderão ser permitidos em tempo algum, mais que infelizmente estão se tornando um cotidiano amargo e uma nódua que está assolando nosso país, hoje transformado em um Estado policial, quando devia a qualquer custo prosperar os nobres preceitos de um Estado Democrático de Direito, que certamente não pode compactuar com essas condutas dúbias e extremadas que comumente presenciamos através da mídia, enxovalhando e denegrindo a honra de pessoas e de suas próprias famílias em episódios que amanhã poderão reverter até mesmo com a declaração de inocência das mesmas.

85. Porém, nessas alturas o dano moral irreversível já estará consubstanciado nestas anômalas condutas e espetaculosidades.

86. Como já dissemos anteriormente, o nobre Ministro GILMAR MENDES, da Suprema Corte, comparou-os à “Gestapo da Alemanha Nazista” (Jornal “O Globo”, edição de 28 de setembro de 2007). Recentemente, o mesmo Ministro, comparou-os “gângsters”, dizendo perante a mídia que: “É preciso encerrar com esse quadro de intimidação típico de terrorismo” (“Folha Online”, edição de 01 de julho de 2008). Esta conduta abominável é a que deverá ser reservada ao frágil Paciente, impotente para conter a saga de seus incansáveis algozes.

87. Além disso, a Carta Política de 1988 determina que:

“Art. 5º. (…)

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”

88. Os direitos à intimidade e à própria imagem, Excelência, formam a proteção constitucional à vida privada, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas.

89. Tal proteção constitucional refere-se, inclusive, à necessária proteção à própria imagem diante dos meios de comunicação de massa.

90. Tudo isso deve ser observado no caso do Paciente, impedindo que ocorram abusos e violações aos direitos fundamentais.

V) DA OBSERVÂNCIA IRRESTRITA DO QUANTO DETERMINADO NA LEI Nº 8.906/94 E NO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA PELAS AUTORIDADES RESPONSÁVEIS PELA EXTRADIÇÃO DO PACIENTE

91. Outra questão que se busca no Judiciário, preventivamente, a aplicação é em relação aos direitos garantidos constitucionalmente e pela legislação pátria.

92. Esta defesa possui o direito de saber o dia exato em que o Paciente chegará ao Brasil, como será transportado e, principalmente, ter acesso irrestrito a ele a partir do momento em que aquele for entregue às autoridades brasileiras.

93. A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XV, garante o direito à ampla defesa e a Lei nº 8.906/94, em seu artigo 7º, e seus incisos, que deverão ser observadas e respeitadas pelas autoridades judiciárias e policiais envolvidas neste caso.

94. Reclama-se, desde já, que tais normas sejam objeto de estrita observância e cumprimento por parte dos agentes responsáveis pela operação de transporte e chegada ao país do Paciente, o que requeremos seja determinado por essa Egrégia Corte Superior.

DO PEDIDO

95. Nesta conformidade, o Paciente, bate às portas desse Egrégio Superior Tribunal de Justiça e aguarda que seja recebido e procedimentado a presente ORDEM DE HABEAS CORPUS requisitando-se, caso necessário, as informações da autoridade apontada coatora, se assim o entender esse Juízo, para o fim de ser concedida a ordem, neste Writ.

96. Por tratar-se de medida urgente, uma vez que o Paciente está na iminência de sofrer flagrantes constrangimentos ilegais com a sua chegada ao país nos próximos dias, conforme informações das próprias autoridades coatoras à imprensa nacional, a demora na concessão da ordem poderá significar gravame irreparável a este Paciente, pelo que se requer a respectiva concessão

LIMINARMENTE,

DETERMINANDO-SE À AUTORIDADE APONTADA COATORA E AOS SEUS SUBORDINADOS (DEPARTAMENTO DE POLÍCIA FEDERAL) A ESTRITA OBSERVÂNCIA A TODAS AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS DESCRITAS NESTE WRIT, TANTO EM RELAÇÃO AO PACIENTE COMO EM RELAÇÃO AOS SEUS DEFENSORES LEGALMENTE CONSTITUÍDOS, para que:

a) o Paciente não seja exposto algemado perante a imprensa, autoridades, público em geral, filmado ou fotografado nestas circunstancias;

b) seja conduzido, sempre que houver necessidade do seu deslocamento no interior de veículos, sendo o mesmo colocado no banco de passageiros daqueles meios de transporte;

c) não seja permitida a aproximação de repórteres, jornalistas, radialistas, fotógrafos, cinegrafistas, a partir do momento em que o Paciente estiver sob custódia das autoridades brasileiras e, inclusive, durante seu transporte da Europa para o Brasil, no cumprimento da extradição e que esse procedimento também seja adotado até que o mesmo seja instalado em estabelecimento de custódia a cargo das autoridades, valendo esta mesma determinação em deslocamentos que se fizerem necessários do Paciente para Tribunais, estabelecimentos destinados a eventuais perícias médico-legais;

d) garantia da presença de seus representantes judiciais, advogados, signatários da presente, em todos estes tramites para estabelecimento de sua custódia judicial e seu efetivo cumprimento, inclusive com eventual presença da OAB, setor de prerrogativas e direitos humanos, na eventualidade daquele conceituado órgão houver por bem em se fazer representar nestes atos caso solicitado pela defesa do Paciente;

e) que seja o Paciente submetido a custódia judicial, preservando-se integralmente os direitos em que o mesmo é possuidor referentes a prisão em cela especial ou de Estado Maior, em decorrência da prerrogativa legal que possui por ter formação universitária sendo o mesmo graduado em Economia;

f) para que seja garantido ao Paciente a aplicação incondicional da Lei nº 8.906/94, Estatuto da OAB, inclusive para que o mesmo possa manter diálogos reservados com seus representantes judiciais para elaboração de sua defesa nas acusações que lhe são imputadas pelo Parquet federal.

e tudo isso é necessário, pois de pronto, poder-se-á evitar um mal maior, ressaltando-se a presença da “fumaça do bom direito” além do “periculum in mora”, evitando-se, assim, os eventuais constrangimentos ilegais que possam se apresentar, em respeito às normas infraconstitucionais, à Constituição Federal brasileira e, principalmente, como medida de Justiça.

De São Paulo (SP) para Brasília (DF), 14 de julho de 2008.

p.p. Carlos Ely Eluf

OAB/SP nº 23.437

p.p. Alan Bousso

OAB/SP nº 122.600

p.p. Guilherme Eluf

OAB/SP nº 159.141-E

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