Situação de inferioridade

Supremo decidirá se réu pode ficar algemado durante Júri

Autor

12 de julho de 2008, 0h00

Uso de algema no Tribunal do Júri anula sentença condenatória por colocar o réu em situação de inferioridade? Essa deve ser a questão discutida nas primeiras sessões plenárias do Supremo Tribunal Federal do segundo semestre desse ano. O caso será definido no dia 7 de agosto, no julgamento do pedido de Habeas Corpus 91.952. Nele, a defesa de um condenado por homicídio qualificado pede que seja declarado a nulo o Júri porque o réu, que foi condenado, passou todo o julgamento com as mãos algemadas.

O Habeas Corpus é relatado pelo ministro Marco Aurélio, que considerou a questão relevante a ponto de submetê-la diretamente ao Pleno do STF. O principal argumento da defesa do condenado, que deve ser acolhido pelo ministro, é de que o então acusado já estava em situação de inferioridade porque o uso de algemas impressiona os jurados, principalmente os leigos.

O pedido foi negado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que indeferiu também a subida do Recurso Especial. No Superior Tribunal de Justiça, foi negado um Agravo de Instrumento. Por isso o Habeas Corpus no Supremo Tribunal Federal.

Em 1995, no julgamento do HC 71.195, o STF afirmou que o uso de algemas durante o julgamento não constitui constrangimento ilegal se essencial à ordem dos trabalhos e à segurança dos presentes. Atualmente, o uso de algemas é uma prática comum. Não só das algemas. É praxe o réu, quando preso, chegar para o Júri com o uniforme de presidiário e com sandálias de dedo. Para quem não está acostumado com a situação, a cena pode ser deprimente.

Nesse novo pedido, a orientação deve ser outra. Isso porque o julgamento pelo Supremo está marcado para três dias antes de entrar em vigor a Lei 11.689/2008, que disciplina procedimentos relativos ao Tribunal do Júri.

A lei, que passa a vigorar em 9 de agosto, dá a seguinte redação ao artigo 474, parágrafo 3º, do Código de Processo Penal: “não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes”. Ou seja, algema deixa de ser regra e passa a exceção.

O criminalista Luiz Flávio Gomes explica que as algemas são usadas no Plenário do Júri por não existir lei regulamentando a matéria. Com a nova regra, a orientação será diferente e o juiz terá de seguir. “Só se coloca algema em réu que tenta fugir ou agredir os presentes na sessão do Júri. Se não existem essas situações, o uso caracteriza sim constrangimento ilegal”, diz.

Para o advogado Jair Jaloreto Junior, o uso das algemas no Júri não é ilegal e serve para garantir a segurança das pessoas que estão com o réu naquele momento. “O que acontece como regra é que os réus em liberdade são julgados sem algema e os presos com algemas. Nem por isso, o que não está algemado é absolvido. Por isso, não acredito que o uso vá influir no resultado do julgamento. Ao contrário, os jurados podem até se compadecer da situação. Não pode ser tido como regra o fato de estar algemado pender para um lado ou para outro”, defende.

Uso moderado

Teoricamente, nem no momento da prisão o suspeito de um crime pode ser algemado. É que a regra é clara: só vai algemado quem oferecer resistência à autoridade, ou quem não tem diploma universitário. O que significa que toda vez a televisão mostrar uma cena espetacular da polícia prendendo e arrebentando, na qual o uso das algemas é visto como sinônimo da eficiência, de duas uma: ou o preso é um zé ninguém, ou a operação está coberta de ilegalidade.

A regra do uso de algema está no Decreto-Lei de 1969, que criou o Código de Processo Penal Militar. A norma diz que quem tem diploma universitário não pode ser algemado. A regra já dava para livrar juízes e autoridades da incômoda pulseira, mas o Decreto-Lei de 1969 faz questão de ser explícito. Não podem ser algemados de forma alguma juízes e também governadores, presidentes, ministros, secretários, deputados, senadores, padres e pastores e qualquer pessoa que tenha algum privilégio econômico ou social.

Não só por causa da proteção prevista na norma militar. A Lei de Execução Penal (Lei 7.210/1984) no artigo 199, prevê que “o emprego da algema será disciplinado por decreto federal”. Como ainda não foi efetuada tal regulamentação, o uso das argolas é no mínimo controvertido e deve ser evitado.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!