Lei seca

É preciso seguir o texto da lei e não a vontade de quem aplica

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2 de julho de 2008, 10h42

Muito se tem falado sobre o rigor das alterações introduzidas no Código de Transito Brasileiro, em especial sobre a questão ligada a alcoolemia. Antes, porém, deixo aqui registrado que o Direito Penal pouco me apraz, entretanto, tentarei me ater ao âmago das alterações, consistentes, assim poderíamos chamar, na tolerância zero ao álcool.

Informo ainda aos leitores e colegas, que nada tenho contra referidas alterações, mas por questão de direito, não pode haver crime sem que Lei anterior o defina. Li notícias publicadas em diversos periódicos e em sites das mais variadas gamas, onde inúmeros motoristas foram parados nas mais espalhafatosas blitz policiais e “convidados” a se submeterem ao teste do bafômetro.

Neste ponto chamo a atenção para as noticias que comentam a ocorrência de inúmeras prisões em flagrantes, onde o instrumento utilizado para averiguar a concentração de álcool no sangue foi o bafômetro (Etilômetro). Só que existe uma diferença crucial no teste realizado pelo bafômetro e no teste com o sangue colhido do investigado. Sustento que todas as prisões em flagrantes que ocorreram tendo como base o teste do bafômetro são ilegais e jamais deveriam ter ocorrido.

O artigo 276 (Artigo 276. Qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às penalidades previstas no artigo 165 deste Código) do Código de Transito submete o condutor a tolerância zero de qualquer concentração de álcool no sangue, vejam; escrevi e você leu no sangue. Poderão ainda sustentar que o Decreto 6.488 emanado do Poder Executivo pode conceder poderes para a ocorrência de prisão em flagrante, entretanto penso que com base em referido decreto estas prisões jamais poderiam ocorrer. É que a competência legal para definição do tipo penal está a cargo do Legislativo e não do Executivo, conforme expressamente dispõe o artigo 22, I, da Constituição.

Assim, o tipo penal da referida Lei que altera o CTB está definida pelo legislativo tornando-se crime a concentração de álcool no sangue e não pelo ar expelido dos pulmões. Indagamos, para apimentar ainda mais o debate. Pode a Lei — sob o aspecto jurídico-formal — que define como crime exprimir tipo (penal), e tal tipo (penal) ser alterado por Decreto? (Lei: concentração de álcool no sangue — Decreto: concentração de álcool por ar expelido dos pulmões?). Com todo respeito aos legisladores e doutrinadores penso que não. Alteraram o tipo penal sem qualquer aprovação legislativa. Não me consta, ou ao menos não noticiaram os periódicos que referidos motoristas se submeteram a exame de coleta de sangue para averiguação de incidência de álcool, tendo descrito as noticias que se realizaram teste com o bafômetro que mede a dosagem de álcool no ar expelido pelos pulmões.

Desta forma, não há lei que determine ou que torne crime a dosagem alcoólica em ar expelido, já que a lei é taxativa ao definir como tipo penal a concentração de álcool no sangue. Não havendo lei anterior que o defina como crime, as prisões que se seguiram com base em concentração de álcool por ar expelido dos pulmões são ilegais e nulas de pleno direito, gerando ainda por parte do Estado o dever de indenizar os que ao arrepio da lei foram ilegalmente presos.

Uma única reportagem que li noticiava que uma delegada de Policia de São Paulo não havia lavrado o flagrante porque o bafômetro declinava a dosagem alcoólica em ar expelido pelos pulmões. Assim entendendo a delegada de Policia encaminhou o investigado ao IML para o exame de sangue necessário. Notório saber desta delegada de Policia que agiu dentro dos ditames legais e não se deixou levar pelas breves luzes dos holofotes. Temos neste país que nos submetermos ao texto da lei, já que ela decorre da vontade do legislador e não dos agentes que a aplicam a seu bel prazer. Com a palavra os doutos colegas, criminalista e juízes.

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