Reclamação federal

OAB vai ao STF em defesa da greve dos advogados públicos

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23 de janeiro de 2008, 19h04

O Conselho Federal da OAB entrou no Supremo Tribunal Federal com Reclamação contra decisão liminar que julgou ilegal a greve dos advogados públicos federais. Na noite de terça-feira (22/1), a juíza substituta Iolete Maria Fialho de Oliveira, da 16ª Vara Federal do Distrito Federal, decidiu contra a greve deflagrada na última quinta-feira (17/1).

Os advogados públicos reclamam que o governo federal não cumpriu o acordo salarial firmado no dia 1º de novembro. De acordo com a OAB, a liminar declarando a ilegalidade da greve ofendeu as decisões do Supremo nos Mandados de Injunção nos quais se decidiu que se aplica aos servidores públicos a Lei de Greve da iniciativa privada enquanto o Congresso não regulamentar a matéria.

“O que se tem por incontroverso, portanto, é que o exercício do direito fundamental à greve no serviço público civil tornou-se viável mediante a aplicação analógica do disposto na Lei n 7.783/89″, sustenta a entidade.

“Presente essa realidade, as entidades que compõem o Fórum da Advocacia Pública Federal, premidas pelo reiterado descumprimento de compromissos de recomposição salarial firmados pelo Governo Federal, deflagraram greve, observados os parâmetros e requisitos encartados no referido diploma legal — manutenção de serviços essenciais, notificação prévia, comprovação de deliberação assemblear”, argumenta a OAB.

Nesta quarta-feira, a União Nacional dos Advogados Públicos Federais também soltou nota acusando a Advocacia-Geral da União de omitir a verdade durante as negociações. Eles criticam a decisão da juíza Iolete. “Alguns pontos da decisão causam estranheza por parte dos servidores públicos da Advocacia de Estado, principalmente o que refere-se ao fato da ação movida pela Procuradoria Regional da União (PRU) não citar em nenhum momento o acordo assinado pelo Governo e representantes da categoria no ano passado”, diz a nota.

Na ação da Justiça Federal, a Procuradoria Regional da União argumenta que a greve dos advogados é ilegal porque atinge setores essenciais e contraria o interesse público. Ela também sustentou que a greve provoca prejuízos ao patrimônio público e à ordem administrativa, pois impede a defesa dos órgãos estatais e o andamento de licitações e contratos.

A juíza Iolete citou no despacho decisões do Tribunal Regional Federal da 1ª Região considerando que “o direito de greve não é superior a nenhum outro direito, notadamente o de interesse público”. Segundo a juíza, “o direito aos movimentos paredistas, sem questionar a justeza destes, deve harmonizar-se aos ditames do interesse público, de molde a não causar dano aos serviços essenciais, como é o caso em tela”.

Leia Reclamação da OAB

Excelentíssima Senhora Ministra-Presidente do Supremo Tribunal Federal

A ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL — CONSELHO FEDERAL, autarquia federal de regime especial, representada neste ato por seu Presidente, vem, à presença de Vossa Excelência, com fulcro no art. 102, inciso I, alínea “l”, da Constituição Federal, art. 13 da Lei nº 8.038/90 e 44 do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, propor a presente RECLAMAÇÃO (com pedido de liminar em caráter de urgência) em face de decisão do JUÍZO FEDERAL DA 16ª VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL, proferida nos autos nº 2008.34.00.002.476-7, que ofendeu a autoridade da decisão dessa Suprema Corte nos Mandados de Injunção nº 670, 708, 712, conforme demonstrado a seguir:

I – DA DECISÃO RECLAMADA

As entidades integrantes do Fórum da Advocacia Pública Federal (ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS ADVOGADOS DA UNIÃO – ANAUNI, ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS DEFENSORES PÚBLICOS DA UNIÃO – ANDPU, ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES FEDERAIS – ANPAF, ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES FEDERAIS DA PREVIDËNCIA SOCIAL – ANPPREV, ASSOCIAÇÃO DOS PROCURADORES FEDERAIS DO RIO DE JANEIRO – ANPAFERJ, ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES DO BANCO CENTRAL – APBC, SINDICATO NACIONAL DOS PROCURADORES DA FAZENDA NACIONAL – SINPROFAZ, UNIÃO DOS ADVOGADOS PÚBLICOS FEDERAIS – UNAFE, ASSOCIAÇÃO NACIONAL DAS CARREIRAS DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO – ANAJUR) tiveram contra si ajuizada Ação Cominatória de obrigação de fazer e não-fazer cumulada com ação condenatória, com pedido de liminar, visando a sustação de deliberação assemblear que deflagrava a paralisação das atividades da Advocacia-Geral da União, da Procuradoria-Geral do Banco Central do Brasil e da Defensoria-Geral da União.

Na peça inicial, ajuizada junto ao juízo reclamado, a autora – União – consignou que a deflagração de greve pelas carreiras da Advocacia Pública Federal representada pelas associações antes nominadas é ilegal e abusiva, já que exercem atividades essenciais ao Estado.

Afirma que as decisões nos mandados de injunção nº 670, 708 e 712, além de não publicadas, se aplicam apenas às partes envolvidas na demanda.


Sustenta que a deflagração e a manutenção do anunciado movimento paredista ocasionará incalculáveis prejuízos ao erário federal. Aduz que o exercício ilegítimo do direito de greve tem o potencial efeito de gerar responsabilidades funcionais aos Advogados Públicos. Postulou antecipação dos efeitos da tutela. Por fim, requereu a procedência do pedido, “condenando-se os requeridos a sustarem os efeitos da ilegal deliberação de paralisação e que se abstenham de promover ou de qualquer modo concorrer para a paralisação dos serviços da Advocacia-Geral da União e da Defensoria-Pública da União, comprometidos pela ilícita paralisação, sob pena de imposição de multa diária aos Requeridos de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais)”.

Ao receber a petição inicial, o Juízo da 16ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal deferiu o pedido antecipatório, nos seguintes termos:

“Em juízo de cognição sumária, afiguram-se me relevantes as razões aduzidas pela Autora.

A realização da greve objurgada nos autos é fato notório, deliberada na Assembléia retro referida, razão por que dispensa ilações acerca da probabilidade de sua realização.

O direito aos movimentos paredistas, sem questionar a justeza destes, deve harmonizar-se aos ditames do interesse público, de molde a não causar dano aos serviços essenciais, como é o caso em tela. Estes, por analogia à lei da greve do setor privado e considerando a relevância de sua prestação, não podem sofrer paralisação. Ademais, na esteira de decisões do STF, o TRF/1 Região já teve oportunidade de salientar que ‘o direito de greve não é superior e nenhum outro direito, notadamente o de interesse público.’ Ora, mostra-se inquestionável o caráter público de que se reveste o serviço prestado pelos associados das entidades rés. A essa circunstância a associar, outrossim, as relevantes razões aduzidas pela requerente. Em especial, destaco a possibilidade de danos de difícil reparação, potencialmente causados pela perda dos prazos processuais e a conseqüente devolução de processos às respectivas chefias, conforme referido às fls. 11 in fine.

O interesse privado, em que pese lídimo, não pode sobrepor-se ao reclame público. A acenada interrupção das atividades pelo movimento grevista mostra-se hábil a causar danos também ao erário, com repercussões para o contribuinte.

Com essas considerações, tenho por bom alvitre, com espeque no poder geral de cautela e antecipando-me ao juízo de mérito, declarar a ilegalidade da agendada paralisação dos serviços da AGU, de molde a garantir a normalidade da prestação dos mesmos.

Citem-se.

Publique-se.

Brasília-DF, em 22 de janeiro de 2008.”

Não obstante os argumentos lançados na decisão reclamada, a mesma não somente desrespeita – direta e efetivamente – o que decidido por essa Excelsa Corte nos Mandados de Injunção nº 670, 708 e 712, como também encerra qualquer continuidade de diálogo entre as partes, mediante a autorização do uso de instrumentos de força pelo Estado, razão pela qual se faz necessário o ajuizamento da presente reclamação.

II – BREVE RESUMO DOS FATOS: LEGITIMIDADE DO MOVIMENTO – DOS MOTIVOS QUE LEVARAM À ADVOCACIA PÚBLICA FEDERAL A ATITUDE EXTREMA DE INGRESSO NO MOVIMENTO PAREDISTA

A greve dos advogados públicos federais foi decidida em Assembléia-Geral, realizada no Distrito Federal e nos Estados, tendo sido observados, rigorosamente, todos os ditames da Lei n. 7783/89, ou seja, realizadas as notificações prévias e preservado o percentual de 30% (trinta por cento), procurando causar o mínimo de prejuízo ao Estado e à sociedade.

Em maio de 2006, sob autorização do Presidente da República, o Governo comprometeu-se a efetuar a aproximação gradual, em quatro anos, da remuneração paga pela União aos advogados públicos daquela paga aos membros do Ministério Público, que também integram constitucionalmente as Funções Essenciais à Justiça (Título IV, Capítulo IV). O compromisso, divulgado amplamente aos membros das carreiras envolvidas (doc. ), foi, no entanto, descumprido, tendo sido abandonado no Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), que impôs um padrão remuneratório que apenas agravou a já insustentável situação da advocacia pública e a intensa evasão de quadros sofrida. Esta situação restou reconhecida pelo então Advogado-Geral da União, Ex-Ministro Álvaro Augusto Ribeiro Costa, em mensagem (EM nº 11/2006) ao Presidente da República (doc. ).

Em maio de 2007, também sob autorização do Presidente da República e já na gestão do atual Advogado-Geral da União, Ministro José Antonio Dias Toffoli, o Governo (em reunião envolvendo a AGU, o MPOG e o Ministério da Fazenda) decidiu repassar aos advogados públicos – e ao aparelhamento da AGU – os recursos decorrentes de sua atuação judicial exitosa, reconhecendo que os honorários advocatícios, pagos pelas partes vencidas e não pela União, suas autarquias e fundações – em 2007 superior a R$ 750 milhões –, pertencem aos advogados, como previsto expressamente na Lei 8.906/94 (Estatuto do Advogado). Esta decisão restou amplamente divulgada pelo Advogado-Geral da União aos membros das carreiras envolvidas. O compromisso, contudo, restou mais uma vez descumprido.


Finalmente, após longa e exaustiva negociação, em 17/09/2007, o Governo apresentou proposta para a readequação emergencial da tabela de subsídios dos advogados públicos federais, tendo em vista inclusive reajuste concedido a outras categorias, durante a tramitação do processo legislativo objetivando a prorrogação da CPMF (policiais federais e do Distrito Federal). A proposta do Governo, após assembléias realizadas em todo o País, restou aceita, comprometendo-se este, após idas e vindas, a editar a medida provisória até o dia 31/10/2007.

Passado o dia 31/10/2007, o Governo não cumpriu com o seu compromisso e, por imposição do próprio MPOG, foi solicitada a formalização do acordo a que chegara a representação governamental (AGU e MPOG) e as entidades de classe, o que foi feito em 1º/11/2007.

Registre-se que, após a assinatura do acordo, o Governo, em mais uma protelação, comprometeu-se a editar o instrumento normativo (medida provisória) até, no máximo, dia 08/11/2007, o que também não restou cumprido.

Assim, após uma longa negociação, cujo início já data de quase um ano (abril/2007), chegou-se a um acordo assinado pela representação governamental, resultante da aceitação de uma proposta do próprio Governo, mas este não é cumprido, restando mais que configurada a mora. Portanto, não restou alternativa senão a via extrema da greve, como ocorreria com qualquer trabalhador em qualquer lugar do mundo.

Embora o Governo sustente que, com a não-prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira – CPMF, deu-se a alteração dos fatos, não havia qualquer vínculo entre uma coisa e outra. Tanto assim que não há essa condição no instrumento assinado e a desvinculação foi reiterada diversas vezes pela representação governamental. Com efeito, no momento em que assinado o acordo, já era apontada, pela imprensa e analistas políticos (FATO NOTÓRIO), a possibilidade concreta de rejeição da CPMF, contribuição aliás PROVISÓRIA, com prazo final previsto para 31/12/2007.

Com a medida extrema da paralisação das atividades, os advogados públicos buscam, portanto, sensibilizar o Governo para a necessidade de cumprimento imediato de um acordo firmado em 1º/11/2007 e com efeitos financeiros a partir desta data, cujo descumprimento vem provocando danos diários aos advogados públicos que, com base no acordo assinado, contraíram obrigações financeiras diversas.

Frise-se, ainda, que os Procuradores do Distrito Federal obtiveram reajuste remuneratório após a aceitação do acordo dos advogados públicos federais e o Governo Federal, tendo a mensagem do Governador do Distrito Federal, na mensagem 278/2007-GAB/GOV, de 25.10.2007, assinalado, como justificativa “o tratamento igualitário com as Carreiras Jurídicas da União”. O projeto (PL 574/07) foi encaminhado em 30/10/2007 e, em 1º/11/2007, foi aprovado pela Assembléia Legislativa do Distrito Federal, convertido na Lei n. 4042, de 1º/11/2007 (doc. ). Enquanto isso, o Governo Federal resiste em cumprir o acordo firmado e que serviu de fundamento para a concessão de reajuste aos valorosos membros da advocacia pública do Distrito Federal.

Diante do quadro, em assembléia geral ocorrida no dia 8 de janeiro do corrente, decidiram os membros das carreiras da Advocacia Pública Federal deflagrar greve, por tempo indeterminado, por descumprimento de acordo, considerado o artigo 14, parágrafo único, inciso I da Lei nº 7783/89, a partir do dia 17 de janeiro, o que foi notificado, com antecedência de mais de 72 horas, aos respectivos ministros de Estado (docs. ).

Enfim, a materialização final deste duro golpe sofrido pelos membros das carreiras da Advocacia Pública Federal encontra-se muito bem evidenciada pelas recentes declarações da autoridade máxima da instituição, o Sr. Ministro José Antônio Dias Tóffoli (doc. ) que, ultimando sua vontade de coibir o exercício de legítimo direito da categoria, editou o Comunicado Circular nº 007, de 17/01/2008, no qual dá início aos atos arbitrários de coação ao exercício de legítimo e, substancialmente, fundamentado do movimento em prol da valorização da Advocacia Pública Federal.

Visando a legitimar o referido ato, a União ajuizou ação ordinária com pedido de antecipação de tutela, pretendendo declarar ilegal a greve deflagrada e impor penalidade aos aderentes e às associações. A antecipação de tutela foi deferida em descompasso com a decisão do Supremo, suplantando totalmente, aos advogados, o direito de greve, daí o motivo da presente reclamação.

III – DA LEGITIMIDADE ATIVA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – CONSELHO FEDERAL

A presente reclamação é dirigida contra a decisão prolatada no âmbito da 16ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, que inviabilizou o exercício do direito de greve daqueles advogados inscritos na Ordem os Advogados do Brasil associados às entidades representativas das carreiras da Advocacia Pública Federal, em frontal descumprimento do decisum proferido por essa Excelsa Corte no âmbito dos referidos mandados de injunção.


Ateste-se que essa Suprema Corte, ao deferir os mandados de injunção em exame, declarou que a regulamentação do direito de greve sanada pelo acórdão aplica-se não só às partes envolvidas nestas ações, mas, por sua natureza, também a todo serviço público.

Do dispositivo da decisão do Mandado de Injunção n 670, tem-se clara tal circunstância:

“O Tribunal, por maioria, conheceu do mandado de injunção e propôs a solução para a omissão legislativa com a aplicação da Lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989, no que couber, vencidos, em parte, o Senhor Ministro Maurício Corrêa (Relator), que conhecia apenas para certificar a mora do Congresso Nacional, e os Senhores Ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio, que limitavam a decisão à categoria representada pelo sindicato e estabeleciam condições específicas para o exercício das paralisações. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. Lavrará o acórdão o Senhor Ministro Gilmar Mendes. Não votaram os Senhores Ministros Menezes Direito e Eros Grau por sucederem, respectivamente, aos Senhores Ministros Sepúlveda Pertence e Maurício Corrêa, que proferiram voto anteriormente. Ausente, justificadamente, a Senhora Ministra Cármen Lúcia, com voto proferido em assentada anterior”

Fixada tal premissa, cumpre consignar que a Ordem dos Advogados do Brasil, na qualidade de defensora da Constituição e da ordem jurídica , além de ser entidade representativa da classe dos advogados – aqui incluídos os advogados públicos –, detém, portanto, legitimidade para questionar decisão prolatada por juízo singular que infirma a autoridade e a eficácia de decisão dessa Suprema Corte que põe cobro à omissão inconstitucional relativa à greve no serviço público, aplicando, de modo abstrato, as disposições da Lei de Greve das entidades privadas à esfera pública (Lei n 7.783, de 28 de junho de 1989).

Em face do caráter de generalidade e abstração de que se reveste a decisão de regulamentação temporária proferida nestas ações injuncionais, é possível a qualquer um que demonstre interesse jurídico ou econômico postular a observância, por via de reclamação, da decisão prolatada com eficácia erga omnes.

Nesse sentido, cabe registrar a evolução da jurisprudência dessa Excelsa Corte, que admite, desde julgamento proferido na Reclamação n 1880 (rel. Min. Maurício Corrêa), bem sintetizada pelo seguinte excerto do voto do Relator:

“O conceito de parte interessada, a que aludem os arts. 13 da Lei 8.38/90 e 156 do RISTF, ganha abrangência idêntica aos efeitos do julgado a ser preservado, alcançando todos aqueles que comprovem prejuízo em razão de pronunciamento dos demais órgãos do Poder Judiciário, desde que manifestamente contrário ao julgamento da Corte.”

Desse modo, inequívoca a legitimidade ativa da ora reclamante para propositura do presente pleito, considerado o interesse econômico dos advogados atingidos pela medida e jurídico desta entidade representativa da classe, visando a garantir o direito fundamental consagrado na Carta de 1988.

IV – OFENSA AO QUE DECIDIDO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NOS MANDADOS DE INJUNÇÃO nº 670, 708 e 712.

De saída, convém afastar as alegações da União de que a falta de publicação dos acórdãos dos mencionados mandados de injunção autorizaria fossem eles descumpridos. O Supremo, incansáveis vezes, já asseverou que “o cabimento da reclamação não está condicionado a publicação do acórdão supostamente inobservado.” (Rcl-AgR 3632/AM, relator: Min. Marco Aurélio, relator(a) p/ acórdão: Min. Eros Grau, julgamento: 02/02/2006).

Após longo período de incerteza acerca da possibilidade do efetivo exercício do direito de greve no serviço público, essa Suprema Corte reconheceu a mora legislativa do Congresso Nacional e atribuiu concretude à norma encartada no art. 37, VII, da Constituição Federal, ordenando, com eficácia erga omnes, a aplicação da Lei n 7.783/1989, até que seja editada a legislação pertinente (MIs n. 670, 708 e 712), atuando de forma análoga à Ação de Inconstitucionalidade por Omissão, conforme consignado pelo eminente relator, ministro Gilmar Mendes.

Convém destacar que os efeitos dos acórdãos ofendidos pela decisão objeto da presente reclamação não se restringiram às partes impetrantes, abarcando todos os servidores públicos civis, consoante os estritos termos das decisões publicadas no Diário da Justiça de 06.11.2007 (MI’s 670 e 708) e de 23.11.2007 (MI 720).

Tal circunstância, aliás, é reforçada por excerto do voto proferido pelo Sr. Ministro Celso de Mello, no MI 712, in verbis:

“Daí a importância da solução preconizada pelos eminentes Ministros EROS GRAU (MI 712/PA) e GILMAR MENDES (MI 670/ES), cuja abordagem do tema ora em exame não só restitui ao mandado de injunção a sua real destinação constitucional, mas, em posição absolutamente coerente com essa visão, dá eficácia concretizadora ao direito de greve em favor dos servidores públicos civis.


Por tais razões, Senhora Presidente, peço vênia para acompanhar os doutos votos dos eminentes Ministros EROS GRAU (MI 712/PA) e GILMAR MENDES (MI 670/ES), em ordem a viabilizar, desde logo, nos termos e com as ressalvas e temperamentos preconizados por Suas Excelências, o exercício, pelos servidores públicos civis, do direito de greve, até que seja colmatada, pelo Congresso Nacional, a lacuna normativa decorrente da inconstitucional falta de edição da lei especial a que se refere o inciso VII do art. 37 da Constituição da República.

É o meu voto.”

O que se tem por incontroverso, portanto, diante dos precedentes acima referidos, é que o exercício do direito fundamental à greve no serviço público civil tornou-se viável mediante a aplicação analógica do disposto na Lei n 7.783/89.

Presente essa realidade, as entidades que compõem o Fórum da Advocacia Pública Federal, premidas pelo reiterado descumprimento de compromissos de recomposição salarial firmados pelo Governo Federal, deflagraram greve, observados os parâmetros e requisitos encartados no referido diploma legal –manutenção de serviços essenciais, notificação prévia, comprovação de deliberação assemblear (docs anexos).

Não obstante o efetivo cumprimento das citadas exigências pelas entidades representativas, o juízo reclamado proferiu decisão em flagrante descompasso com a novel orientação jurisprudencial assentada por essa Suprema Corte – cujo conteúdo foi amplamente divulgado em toda a comunidade jurídica nacional, bem como nos meios de comunicação –, julgando antecipadamente ilegal o movimento paredista sem apontar qualquer defeito aos procedimentos prévios legais, atuando fora da alçada judicial, frustrando o legítimo direito dos advogados públicos, no tocante ao exercício de direito fundamental.

Com efeito, a decisão reclamada, ao atestar que “o caráter público de que se reveste os serviços prestados pelos associados das entidades” representaria óbice à deflagração de greve, além de afrontar a autoridade de decisões dessa Excelsa Corte, esvazia o conteúdo da norma encartada no artigo 37, VII, da CF, e, via de conseqüência, inviável o exercício do direito de greve.

A orientação fixada pelos acórdãos descumpridos pela decisão reclamada dirige-se no sentido de balizar o exercício do direito de greve – e não de inviabilizá-lo –, independente do caráter público e da necessidade da contínua prestação dos serviços, fixando o percentual mínimo de trabalho, que se entender necessário, conforme o caso concreto, “para garantir a normalidade da prestação dos serviços”.

Assim, não caberia, a autoridade reclamada, invocar a prevalência dos interesses públicos sobre os interesses privados, como razão suficiente para retirar dos advogados públicos o legítimo exercício do direito fundamental de greve. É que, consoante asseverado pelo próprio Supremo, a garantia ao pleno exercício do direito de greve é uma “solução constitucionalmente obrigatória”, não sendo dado, a quem quer que seja, “escolher se concede ou não o direito de greve”, seno possível, tão-somente, dispor-se “sobre a adequada configuração da disciplina” (Informativo/STF nº 485/2007).

Nas decisões paradigmas, portanto, buscou esse Supremo Tribunal Federal, em virtude da lacuna legislativa, superar a aparente contradição entre o exercício do direito de greve (art. 37, VII), constitucionalmente consagrado aos servidores públicos, e a observância do princípio constitucional da continuidade dos serviços públicos (art. 175). Para tanto, utilizando-se do postulado hermenêutico da concordância prática, reduziu o âmbito de proteção de ambos, sem, contudo, aniquilá-los.

Cumpre consignar que as decisões paradigmas foram proferidas em ações propostas por entidades representativas de servidores públicos que exercem atividades cuja essencialidade é inconteste, a saber: policiais civis, profissionais da área de educação e servidores do Poder Judiciário. Mesmo em tais hipóteses, houve por bem esse Supremo Tribunal Federal garantir a plena eficácia do direito, respeitados os condicionamentos da Lei n 7.783/89.

Assim, observa-se que a decisão reclamada desrespeitou a autoridade dos acórdãos proferidos nos Mandados de Injunção nº 670, 708 e 712, os quais – convém relembrar – possuem efeito erga omnes, os quais foram fruto de longa e intensa discussão no âmbito dessa Suprema Corte. Impõe-se, pois, a procedência da presente reclamação.

V – DO PRECEDENTE DA RECLAMAÇÃO 5.650/AL:

Em hipótese jurídica que em tudo se assemelha à versada nos presentes autos, essa Corte, recentemente, em precedente da lavra do Ministro Eros Grau, assim decidiu (DJU de 20.11.2007):

“9. Na Ação Declaratória de Ilegalidade de Greve, proposta pelo Estado de Alagoas, o Juízo da 16ª Vara Cível da Capital – Fazenda Pública Estadual concedeu tutela antecipada, nos termos do artigo 273, do CPC, em 5 de novembro de 2007. Afirmou que o perigo na demora estaria traduzido na relevância do fundamento da demanda, tendo em conta os eventuais danos advindos dos atos dos servidores grevistas. E observou: “[i]n casu, constata-se o fumus boni iuris na medida que o direito ora discutido, qual seja, o de que a greve dos Procuradores de Estado foi deflagrada, conforme documentos de fls. […], bem como a inexistência de lei específica que torne legítimo o movimento ora repelido” grifei [fl. 68].


10.O Plenário deste Tribunal, em 25 de outubro de 2007, julgou procedente o pedido dos Mandados de Injunção ns. 670, 708 e 712. Embora os acórdãos relativos aos MI’s ainda não tenham sido publicados, não há como negar a vinculação da decisão desta Corte em ações de índole constitucional.

11. No caso de MI n. 712, de que sou Relator, o resultado do julgamento é o seguinte: “[o] Tribunal, por maioria, nos termos do voto do Relator, conheceu do mandado de injunção e propôs a solução para a omissão legislativa com a aplicação da Lei n. 7.783, de 28 de junho de 1989, no que couber, vencidos, parcialmente, os Senhores Ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio, que limitavam a decisão à categoria representada pelo sindicato e estabeleciam condições específicas para o exercício das paralisações. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. […]Plenário, 25.10.2007”.

12. A restrição da aplicação apenas às categorias ou sindicatos impetrantes foi superado. A decisão deve ser aplicada às situações de greve de servidores públicos em geral. O julgamento dos mencionados mandados de injunção ocorreu em 25 de outubro passado, é cronologicamente anterior à decisão impugnada nestes autos.

Presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, defiro a medida liminar para suspender os efeitos da decisão reclamada proferida pelo Juízo da 16ª Vara Cível da Comarca de Macéio/Alagoas, nos autos da Ação n. 001.07.079180-6/2007, até o julgamento final desta reclamação.”

Como se pode extrair da decisão proferida, atestou-se a natureza abstrata dos provimentos jurisdicionais exarados no âmbito dos referidos writ, bem como a legitimidade daqueles que não foram parte dos processos então julgados para postular a observância do que decidido nos processos apontados paradigmas.

Consigne-se, aliás, que, no precedente citado, a Associação dos Procuradores do Estado de Alagoas figurou como reclamante, tendo-lhe sido deferido provimento capaz de assegurar o exercício do direito à greve, a despeito de não ter sido parte nos mandados de injunção paradigma.

Nota-se, pois, que solução idêntica deve ser adotada no caso concreto, a bem da autoridade da Corte guardiã da Lei Fundamental.

VI – DA CONCESSÃO DE LIMINAR

A hipótese dos autos contempla os requisitos indispensáveis à concessão da medida liminar. O fumus boni iuris resta evidente diante da já demonstrada afronta à decisão proferida por essa Suprema Corte no âmbito dos mandados de injunção em análise.

No tocante ao periculum in mora, cumpre observar que a manutenção da decisão reclamada tem o condão de tornar sem efeito toda a movimentação – de âmbito nacional – já deflagrada pelas carreiras da Advocacia Pública Federal, bem como as deliberações assembleares – tomadas de acordo com as prescrições da Lei n 7.783/89 – que legitimam a greve das carreiras envolvidas.

Mais do que isso, a decisão ora impugnada intensificou o quadro de grave crise entre as mencionadas carreiras e a Administração Pública, ante a cominação de penalidades funcionais e de medidas de retaliação contra os participantes do movimento paredistas, o que vem estimulando as bases a aumentar o confronto, tendo em conta a autorização judicial potencializar a negativa de diálogo pelo Governo, que detém o poder da força. Enfim, a decisão acirra os ânimos e cabe ao Poder Judiciário restabelecer a relativa paridade de condições, viabilizando o caminho equitativo do acordo.

Sobre os riscos e as conseqüências potencialmente gerados pela produção de efeitos da decisão reclamada, lúcidas as palavras do Ministro Marco Aurélio, quando da decisão da SS n 2.061:

“Assentado o caráter de direito natural da greve, há de se impedir práticas que acabem por negá-lo. É de se concluir que, na supressão, embora temporária, da fonte do sustento do trabalhador e daqueles que dele dependem, tem-se feroz radicalização, com resultados previsíveis, porquanto, a partir da força, inviabiliza-se qualquer movimento, surgindo o paradoxo: de um lado, a Constituição republicana e democrática de 1988 assegura o direito à paralisação dos serviços como derradeiro recurso contra o arbítrio, a exploração do homem pelo homem, a exploração do homem pelo Estado; de outro, o detentor do poder o exacerba, desequilibrando, em nefasto procedimento, a frágil equação apanhada pela greve. (…) Põe-se por terra todo o esforço empreendido em prol da melhor solução para o impasse, quando o certo seria compreender o movimento em suas causas e, na mesa de negociações, suplantar a contenda, cumprindo às partes rever posições extremas assumidas unilateralmente. Em suma, a greve alcança a relação jurídica tal como vinha sendo mantida, mesmo porque, em verdadeiro desdobramento, o exercício de um direito constitucional não pode resultar em prejuízo, justamente, do beneficiário, daquele a quem visa a socorrer em oportunidade de ímpar aflição.”

Dessa forma, considerando o evidente desrespeito à autoridade de decisão desse Supremo Tribunal Federal, e, sobretudo, a possibilidade real de dano irreparável ao exercício do direito constitucional à greve no serviço público (art. 37, VII), impõe seja deferida liminar a fim de se suspender, com urgência, a decisão reclamada.

VII – DO PEDIDO

Diante de todo o quadro delineado, requer a concessão de medida liminar inaudita altera parte, a fim de suspender os efeitos da decisão proferida pelo juízo da 16ª Vara Federal, nos autos da Ação Ordinária nº 2008.34.00.002.476-7, que declarou, em sede de antecipação de tutela, a ilegalidade de movimento grevista, sem fundamentação na lei aplicável.

No mérito, requer a procedência do pedido a fim de que seja cassada a decisão reclamada, preservando-se a autoridade do que decidido por essa Corte nos autos dos Mandados de Injunção n 670, 708 e 712.

Requer seja observado o procedimento traçado pela Lei 8.038/90 e pelo RISTF, pugnando pela prova do alegado por meio dos documentos ora anexados.

Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

Nestes Termos

Pede Deferimento.

Brasília/DF, 23 de janeiro de 2008.

ESTEFÂNIA FERREIRA DE SOUZA DE VIVEIROS

OAB-DF 11.694

IBANEIS ROCHA BARROS JUNIOR

OAB-DF 11.555

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