Caos penitenciário

Caos penitenciário deve ser combatido com fim de burocracia

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9 de janeiro de 2008, 23h00

“O comércio ficará fechado até que as normas legais sejam cumpridas”. A frase está em uma mensagem enviada por um grande grupo criminoso do sudeste brasileiro, num dia de ações por ele coordenadas tais como tiroteios, atentados, incêndios. O que os criminosos queriam: cumprimento de normas legais.

Isto parece paradoxal. Teriam eles razão?

Quando se fala na situação do sistema penitenciário nacional, é comum que cada um tenha sua própria fórmula. Uns falam na construção de novas penitenciárias, privatização do sistema, outros em mais penas alternativas, trabalho obrigatório e há até mesmo saudosistas do nazismo que defendam soluções não respaldadas pelo direito, como a pena de morte em campos de extermínio.

Em primeiro lugar, ao tratar do tema, deve-se indagar basicamente qual o perfil sócio – econômico-cultural dos apenados, os “clientes” deste sistema. A práxis mostra que, embora haja alguns ricos e instruídos nas penitenciárias, tais situações constituem uma minoria. A grande maioria dos presos é composta dos desclassificados, dos pobres coitados, dos excluídos.

É impossível prosseguir, portanto, sem um breve comentário sobre a questão da “origem do crime”, questão esta que virou ciência, a “criminologia”. O italiano César Lombroso ligava a tendência ao crime a questões genéticas e foi o cientista que inspirou o ditador Adolf Hitler.

Hoje, entretanto, a ciência sabe que o crime não está nos genes, mas nas oportunidades de instrução e trabalho. É bem verdade que existem aqueles que têm tais oportunidades e são condenados por diversos fatos. Dizem alguns que “a exceção confirma a regra” e parece que a frase se aplica aqui. Embora não seja nosso intuito neste pequeno artigo explicar tal fenômeno, a verdade é que as penitenciárias não estão lotadas com pessoas deste perfil.

Assim, se desejamos fazer um estudo pequeno, porém sério, sobre a situação carcerária, devemos em primeiro lugar excluir o fator emocional que existe em todos nós, que queremos uma melhor segurança pública, o desejo de vingança e o sadismo naturais e passarmos a um plano um pouco mais objetivo. O fato é que estamos falando de um problema de políticas sociais. E como estabelecer políticas sociais, legislativas, executivas e judiciárias adequadas, que cumpram seus objetivos?

Sabemos que o controle das soluções econômicas, populacionais, ambientais, energéticas, de saúde e educação é, essencialmente, de atribuição legislativa e executiva. Entretanto, o Judiciário, quando provocado por cidadãos individuais, por associações ou pelo Ministério Público, tem agido nestas questões com base num “ativismo judicial”, movimento que consiste em obrigar os governos a se ajustar quando extrapolam em sua ação ou omissão o princípio da razoabilidade.

Muitas decisões que se enquadram no ideal desse movimento têm sido tomadas e outras tantas idealizadas ainda no plano teórico. Exemplo são aquelas que obrigam os governos a transferir gastos que são feitos na propaganda institucional para uma melhor administração do sistema de saúde. Outro consiste em o Judiciário obrigar, em certas situações, os governos a determinadas ações, com vistas a evitar problemas potenciais de grande escassez, como o controle da natalidade, a fiscalização ambiental e investimentos nas áreas da água e da energia.

Critica-se o ativismo judicial por ele apenas atingir sua máxima eficácia se aplicado de uma forma holística, completa, sendo que decisões isoladas podem tender a criar custos adicionais pelos quais é a Sociedade quem paga. Porém, decisões isoladas são o único caminho para um bom começo e é preciso cada vez mais que os membros do Judiciário tenham consciência da importância do ativismo, para que este possa atingir sua maturidade e, afinal, a eficácia plena.

Mas o cerne de nosso tema não é a contribuição do Judiciário com o futuro, com as políticas públicas gerais, mas mais especificamente a contribuição do juiz como administrador da execução das penas.

Muito se fala das políticas públicas como elementos de solução para o problema penitenciário, o que exclui o juiz ao menos de uma contribuição direta neste sentido. O que pretendo mostrar aqui é que o juiz de execução penal pode contribuir — ainda que parcialmente — para a solução deste problema. Isto implica em um ativismo judicial não exatamente como aquele já descrito, mas num ativismo indireto, como veremos a seguir.

Este artigo não é uma tese sob o aspecto acadêmico, mas sim o resultado de uma experiência prática bem sucedida, com local e tempo definidos. Trata-se do trabalho por nós realizado ao longo do ano de 2007, na 1ª Vara Criminal de Parnamirim, RN, que, como outras varas de execuções do país, acumula outras funções. O objetivo de expor o modo de realização deste trabalho e seus resultados é demonstrar que o juiz pode ser um ator importante na redução do problema penitenciário brasileiro e, através de práticas simples, pode superar as dificuldades e contribuir, ainda que dentro de suas limitadas possibilidades, para a paz social.


Como já vimos na parte introdutória, o macro — problema de que tratamos é de grande complexidade e envolve uma enormidade de órgãos em diversas atuações. O juiz é apenas um deles e, portanto, não pode ter a si imputada toda a responsabilidade pelo problema. Já a vivência prática por nós enfrentada mostra, por outro lado, que há alguma carga de responsabilidade judiciária na questão em tela, o que se origina de vários fatores, que serão abordados.

Embora o foco do artigo seja a desburocratização da execução penal, partimos de um contexto mais amplo, já abordado anteriormente, qual seja o da atuação do juiz como mola propulsora de melhorias das políticas sociais. Ainda neste contexto mais amplo, é inevitável que comentemos um pouco sobre quem é o juiz dentro da divisão de poderes, quais as dificuldades que ele encontra ao posicionar-se de forma ativa diante desses objetivos e o que fazer diante de tais dificuldades.

O Legislativo e o Executivo são poderes eleitos, o que é uma conseqüência do sistema democrático, o melhor de todos até agora testados. Ocorre que o mesmo sistema, em países como o nosso, prevê que o Judiciário seja provido por outras formas de escolha. Isto se dá pela necessidade de um contrapeso ao fato de que Legislativo e Executivo estão muito sujeitos ao que se convencionou chamar de “opinião pública”.

Enfim, o próprio sistema é desenhado de modo que o juiz seja imune à opinião pública, não só pela forma de provimento do cargo, como pelas garantias que a Constituição lhe confere. Tais mecanismos institucionais, entretanto, não são capazes, por si só, de tornar mais justas e isentas as decisões judiciais. É preciso também vocação – estes dois ingredientes, garantias e vocação, são necessários a um Judiciário justo. A vocação sem a garantia ou vice-versa implicaria numa dificuldade de “fazer justiça” em função de algum possível receio, por parte do juiz, de ser tido como mau juiz pela mídia.

O que queremos dizer aqui, basicamente, é que a ética de um juiz deve passar ao largo da opinião pública e dos grandes meios de comunicação. E o que isso tem a ver com o problema penitenciário? Aqui falamos de políticas sociais, de atuação do juiz interferindo nessas políticas, de juízes querendo mudar as coisas para melhor e, finalmente, em desburocratizar as execuções penais.

Obviamente, mudar as coisas para melhor implica em desagradar interesses do sistema vigente, bem como interferir em políticas implica em confrontar quem realiza tais políticas. Não esmorecer diante das dificuldades ao desagradar pessoas ou grupos que tenham poder político ou econômico, que possam influenciar as massas através da mídia, é requisito do juiz que queira melhorar qualquer coisa, inclusive a situação penitenciária. Tal observação é de grande importância já que as sugestões que aqui apresentamos implicam, para todo juiz cuja linha de ação siga essa direção, em um enfrentamento permanente de dificuldades das mais variadas ordens de grandeza.

São comuns as críticas sem fundamentos, incompreensões, repercussões negativas na mídia, obstáculos e oposições diversas que enfrentamos sem ressentimento e até mesmo com certa dose de estoicismo, já que convencidos da importância e correção de nossa ação, ao procurar contribuir, ainda que modestamente, no atendimento de objetivo da mais alta importância, qual seja a paz social. Este tipo de atitude, de comportamento ou filosofia, já seguido por muitos, se disseminado, pode “contagiar” positivamente a magistratura, criando inclusive barreiras contra os citados obstáculos.

A esta altura, o leitor já deve estar se perguntando a quem pode desagradar a desburocratização. Esta é uma pergunta difícil de responder, já que, aparentemente, a burocracia a todos incomoda. Já que estamos expondo um trabalho prático, é forçoso notar que a maioria das medidas por nós tomadas no sentido de desburocratizar, não só no âmbito criminal, mas em outras épocas e áreas de atuação judiciária, foram questionadas ou recorridas e, por fim, eliminadas pelos sucessores na função.

Notamos, então, que há, no Judiciário (e, por senso comum, em todo o funcionalismo) uma cultura da burocracia. Mas aqui o problema vai além dessa cultura. Desburocratizar a execução penal significa deferir direitos legítimos a excluídos, a pessoas sem voz, o que, por si só, implica na dificuldade de encontrar eco, estímulo ou ajuda eficazes nessa tarefa. O pior, entretanto, está na oposição, que surge de falsas crenças, oriundas do sensacionalismo das comunicações de massa. Nesta esteira, notamos o que se pode chamar de “egoísmo coletivo”, ou seja, “ao nosso grupo, dos cidadãos de bem, que seja deferido o Direito; aos outros, bandidos que morram”.

A paz social, entretanto, não pode surgir como decorrência deste raciocínio simplório, mas sim através do reinado do Direito para todos. Desburocratizar leva a isto e exige vocação e coragem. O objetivo deste artigo é justamente sugerir aos que desejarem medidas de desburocratização já testadas e bem sucedidas.


Tais sugestões, é preciso lembrar, têm embasamento legal, não implicam de modo algum no enfraquecimento do combate à criminalidade e não são frutos de nenhuma ideologia anarquista ou alternativa, mas da aplicação rigorosa do Direito. A maioria delas leva, simplesmente, ao deferimento célere dos benefícios que a seguir explicaremos.

Para concluir o item, lembremos a grandeza deste resultado que, mesmo em seu pequeno universo, beneficia a grande maioria dos detentos iniciantes, que cometeram delitos leves, evitando que, por revolta, retornem ao sistema penitenciário.

Em primeiro lugar, devemos dar algumas linhas de explicação do que é a execução penal, para quem não atua na área. O juiz da execução penal é o controlador da pena privativa de liberdade, o que se dá não só através de visitas ou inspeções nos presídios, mas também pelos processos de execução. Tais processos são gerados, um para cada condenação, sendo eles de caráter administrativo, porém repletos de processos incidentes jurisdicionais atípicos, como as progressões, os livramentos condicionais, as extinções, as regressões, as saídas temporárias, os indultos, as comutações, as remições, as unificações.

O condenado é sujeito ao regime progressivo, ou seja, é reintegrado na sociedade aos poucos, passando de regimes mais severos para os mais brandos, através das progressões. Quando o preso que se beneficiou de uma progressão viola as regras do novo regime, ocorre a regressão, ou seja, o retorno ao regime anterior, mais severo. Muitas vezes, ouvimos pessoas leigas, mal informadas, criticarem o sistema progressivo, afirmando que, com um sexto da pena cumprido, o condenado é solto. Dizer isto é incorreto. O que ocorre é que o condenado pode passar, na progressão, para um regime mais brando de prisão, mas continua, tecnicamente, em estado de prisão e não de liberdade, embora goze de cinco saídas temporárias por ano, se estiver no regime semi-aberto.

Já nos livramentos condicionais, sim, o condenado passa a um estado de liberdade, mas se trata de uma liberdade condicional, ou seja, que pode ser revogada a qualquer momento, desde que o condenado não cumpra as restrições impostas na sentença.

A extinção da pena, também, por exigência legal, deve ser declarada através de processo incidente, ouvido o Ministério Público.

Já os indultos e comutações são benefícios respaldados por lei, dados, por tradição, no Natal pelo Presidente da República e analisados caso a caso pelo juiz. Esta concessão normalmente beneficia os condenados por crimes mais leves que já cumpriram parte da pena e os que sofreram, já durante a prisão, doenças e deficiências físicas e mentais. Trata-se de tradição de longos anos, abraçada por presidentes de todos os partidos e todas as linhas políticas, muito bem-vindas, por sinal, a todos os que querem esvaziar os presídios com a retirada dos que não representam perigo à sociedade. Apesar de amplo consenso sobre estes, os indultos e comutações ainda sofrem críticas por parte da população, influenciada pelas falsas crenças de que já falamos.

As remições são as reduções de pena para quem trabalha ou estuda. Finalmente, as unificações são os cômputos de pena referentes a várias condenações, através de somas ou outras operações matemáticas.

Lembramos, também, que a lei exige a participação do Ministério Público (Promotoria) em todos estes incidentes. Sendo assim, as decisões de caráter executivo criminal são todas elas judicializadas, o que significa a participação direta de pelo menos três figuras: a autoridade penitenciária, o MP e o juiz. Fica aqui para reflexão: será necessária toda essa burocracia? Por exemplo, a progressão de regime se baseia em dois requisitos: tempo decorrido e comportamento. O requisito do comportamento já é acompanhado e avaliado, na prática, pela autoridade penitenciária.

Por outro lado, o requisito do tempo decorrido é baseado em mero cálculo matemático. Tão objetiva e simples é a decisão sobre progressões, extinções e talvez alguns outros benefícios que muito bem poderia ficar a cargo da própria penitenciária, desafogando assim o Judiciário para suas tarefas mais típicas, quais sejam as soluções de conflitos. O juiz só participaria do processo através de correições (inspeções) e, quanto ao MP, vemos como desnecessária sua participação.

Não temos a pretensão de veicular verdades absolutas e sabemos que a afirmação feita no parágrafo anterior pode gerar certa polêmica. Nosso objetivo, porém, é en passant questionar se a exagerada presença da jurisdição atípica (ou jurisdição de função administrativa) faz parte da cultura burocrática do brasileiro. Neste sentido, lembramos que, por exemplo, apenas recentemente o legislador percebeu que o juiz não precisa participar de separação consensual (coisa que alguns juízes já sabiam há anos e por isso dispensavam a audiência). Sabemos assim que este debate, no âmbito da execução penal, não está “em pauta”, pelo menos por enquanto, no cenário nacional. Temos, portanto, que partir da premissa de que existe um Judiciário assoberbado de execuções penais e de entraves a serem superados. É disso que tratamos neste artigo, no que nele há de mais pragmático.


Devemos, pois, lutar contra toda forma de burocracia e procrastinação e, em particular, contra a burocracia nas execuções penais, seja através da reflexão, da ação perante o Legislativo, seja no próprio dia-a-dia, cumprindo as normas legais de uma forma arrojada, porém rigorosa. A seguir, exemplos de problemas e soluções.

Há situações comuns nas varas de execuções penais, que emperram o andamento dos processos como o vai – e – vem de processos do Judiciário para o Ministério Público e vice-versa, sem solução; os ofícios (cartas) não respondidos, faltando elementos para a confecção da guia de execução, que é o documento principal para se saber o momento de possível concessão de benefícios ou então os presos com meses ou anos de atraso no deferimento de benefícios e famílias desesperadas à procura de uma solução.

É necessário comentar que alguns juízes agem com insegurança na aplicação de mudanças legislativas ou jurisprudenciais em favor dos apenados, aguardando que outros juízes as apliquem primeiro. Agem assim como se necessitassem de amparo de um grande grupo de colegas, apesar de já estarem plenamente amparados pelo Direito. Duas situações neste sentido são emblemáticas.

A primeira diz respeito à inconstitucionalidade de um dispositivo de lei extravagante que retirou de alguns presos o direito ao regime progressivo. É preciso ressaltar, ao leitor que não atua na área jurídica, que leis extravagantes, no sentido técnico, são aquelas que estão fora dos códigos. A proliferação de tais leis é preocupante, no Brasil, tendo em vista que se tem a falsa idéia de que criar mais leis pode resolver os problemas nacionais, enquanto, na verdade, o ideal seria cumprir as já existentes.

Em 1990, entrou em vigência uma lei chamada “Lei dos Crimes Hediondos” que, além de ser extravagante por estar fora do código, também pode muito bem receber este rótulo pela falta de técnica com que foi elaborada. Na verdade, uma lei hedionda, criada para atender a uma massa manipulada pela mídia sensacionalista. Havia nela uma inconstitucionalidade, pois ela criava um regime “integralmente fechado”, retirando do preso condenado por determinados crimes o direito à progressão e, portanto, feria um preceito constitucional, a individualização da pena.

A criação do novo regime vinha da crítica que certos jornais e programas de televisão faziam ao fato de o condenado “sair por bom comportamento”. Tal crítica, entretanto, consistia num contra-senso, uma vez que o comportamento durante o cumprimento da pena é elemento evidente a ser considerado na individualização do tratamento a ser dado ao condenado.

Logo, alguns juízes perceberam a inconstitucionalidade de tal dispositivo e lhe negaram vigência, concedendo benefícios aos condenados por “crimes hediondos”. Nós mesmos tivemos decisões neste sentido reformadas pela instância superior. É de se notar que, ao longo de muitos anos, a tese da inconstitucionalidade foi minoritária no país e não abraçada pelos tribunais, que ainda se prendiam aos apelos da “opinião pública”.

Depois de cerca de quinze anos da vigência do dispositivo, uma multidão difusa de juízes de primeiro grau, ao qual temos a honra de integrar, ainda que em posição minoritária, não mudou de entendimento, conseguiu convencer o STF e o jogo virou. O STF adotou, então, a solução mais técnica (embora impopular) e declarou, no âmbito de um determinado processo, a inconstitucionalidade do regime integralmente fechado.

Notemos como funciona a dinâmica das interpretações jurídicas: é fácil repetir quem está em cima, difícil é fazer pressão contra a lei da gravidade, mas é esta pressão que faz o sistema evoluir. Assim percebe-se claramente a perversidade da aberração chamada “súmula vinculante” (à qual negamos vigência), que impede essa melhora.

Necessário notar que, após a mencionada “virada” no STF, quase todos os juízes do país também a ela aderiram, por se sentirem mais seguros e respaldados.

Outro exemplo de insegurança judiciária diz respeito aos requisitos para a progressão de regime. Antigamente, além de ficar preso durante certo tempo, o condenado tinha de se submeter a um “exame criminológico”, uma espécie de “bola de cristal” que tinha como objetivo definir se o preso tinha tendência a voltar a cometer crimes.

Ora, quase todo condenado vai voltar a cometer crimes. Isto ocorre em virtude da falta de oportunidades que a sociedade lhe dá.

Entretanto, que não se veja nisso uma razão para que lhe neguemos o benefício, ou ainda, se levarmos tal sofisma ao paroxismo, raciocinando de modo nazi-fascista, defendamos medidas como a prisão perpétua ou a pena de morte.

O legislador, inteligentemente, percebeu recentemente que deveria abolir o exame e assim o fez, substituindo-o pelo requisito do bom comportamento. Alguns juízes, entretanto, continuaram (e continuam) determinando tal exame, embora não exista no nosso ordenamento jurídico.


Os dois exemplos mostram como, infelizmente, há uma mentalidade burocrática no Judiciário das execuções penais, movida por tradições ou mesmo ideologias. Quando se tem a ampla liberdade de decidir, segue-se a maioria ou a autoridade superior, em detrimento da celeridade e da função social da pena. Por outro lado, quando a lei impõe o fim de uma burocracia, “mitiga-se” (ou seja, desconsidera-se) a inovação e continua-se a aplicá-la.

Algumas propostas

É preciso haver uma Justiça especializada das execuções penais, em todos os territórios dos estados. Neste sentido, propusemos, através de ofício, o desmembramento da 1ª Vara Criminal de Parnamirim, com a criação da Vara especializada em execuções penais, o que depende de mensagem a ser enviada pelo Chefe do Judiciário à Assembléia Legislativa, e ainda da aprovação e sanção.

Além disto, naquelas varas que ainda acumulam competências, é preciso a prioridade à execução penal, pois é tema que detém enorme importância e urgência maior que qualquer outra. Sabemos ainda que tal afirmação seja discutível e está sujeita ao questionamento, aprofundamento, discussão e depende, sobretudo, da visão política e estratégica de cada juiz. O objetivo aqui é expor nosso entendimento diante da ponderação de valores que se apresenta muitas vezes em situações caóticas, as quais levam as difíceis decisões no que tange a definir prioridades. Embora outras competências criminais também não possam ser de modo algum esquecidas, a decisão política aqui defendida se justifica tendo em vista algumas peculiaridades da execução penal. Entre elas, em primeiro lugar, os exíguos prazos para deferimento dos benefícios e as amplas conseqüências do eventual descumprimento destes, como rebeliões ou mesmo insatisfações generalizadas com relação direta ao desprezo do Judiciário por um dos maiores bens do homem, a liberdade.

Em segundo, a necessidade de um sistema administrativo totalmente estruturado para o cumprimento de tais prazos. E por fim, a existência de um interessado determinado para cada um dos processos e não uma prestação de contas à Sociedade, por amostragem, como ocorre em algumas outras competências.

É preciso também implantar a cultura do respeito ao número de vagas, como requisito para a aplicação da pena. Se o estado não pode acomodar os condenados em regime fechado de acordo com as condições legais, a solução está em decretar, antecipadamente, aos que excederem as vagas, o regime semi-aberto. Se ainda assim restar ineficaz a medida, decreta-se, antecipadamente, aos excedentes, o regime aberto. Como última medida, decreta-se a prisão domiciliar.

É necessário levar a sério o princípio da duração razoável do processo. Sendo assim, ofícios não respondidos, após reiteração, devem determinar presunção em favor do apenado. Autos não recebidos, igualmente após reiteração, fazem presunção de inexistência. Cargas ao MP devem obedecer ao princípio da concentração, trazendo opinião sobre todas as questões suscitadas, ainda que use da prerrogativa da impugnação genérica, mas assim abrindo mão da específica. Ou, em resumo, se o que chamamos de “sistema” é falho, não é o Judiciário que deve ficar refém do “sistema”, mas sim é o Judiciário, através de sua atuação, que deve forçar o “sistema” a funcionar.

É fundamental realizar o atendimento ao público, uma vez por semana, em horário pré-estabelecido, possibilitando a conversa direta com parentes dos presos e diagnosticando defeitos do programa concebido. Ouvir cada um dos presos, pelo menos uma vez ao ano e anotar sua suposta situação, para posterior investigação e retorno.

Com estas medidas, o sistema prisional de nossa jurisdição, a cidade de Parnamirim (RN) se tornou exemplo de funcionamento célere de execuções penais, com repercussão até mesmo interestadual, tanto que temos hoje alta rotatividade e alta ressocialização.Tais medidas contribuem para a paz social, na medida em que presos não se revoltam contra o desrespeito a seus direitos, evitando-se assim rebeliões e outros casos de violência. Lanço-as, portanto, como sugestão ao meio judiciário e à sociedade, em geral, para apreciação.

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